Sou um engenheiro que criou um partido, e que virou político, depois escritor e, finalmente, jornalista e comentarista. Mas sou um cidadão comum, que tenta apenas dar testemunho de tudo o que vi e vivi.
E, meninos, já vi muita coisa. Fui fiscal do Sarney. Testemunhei inflação de 70% ao mês. Fiz conta em URV. Paguei US$ 3 mil por uma linha de telefone fixo e precisei esperar dois anos pela instalação. Dirigi carro a álcool de primeira geração (tinha que dar partida com gasolina e esperar meia hora para esquentar o motor) e comprei kit de primeiros-socorros.
Programei em computador da Cobra e tive um TK 85 com um gravador de fita cassete acoplado.
Fui ao comício pelas Diretas Já, em 1984, na Candelária, no Rio (sim, a esquerda já me enganou um dia), ouvi pelo rádio do meu Chevette a notícia da internação de Tancredo Neves e assisti ao debate final da eleição de 1989.
Boa parte dessa história está nos meus livros.
Publiquei o primeiro, Ou Ficar a Pátria Livre, em 2016. Foi o mesmo ano em que me desliguei do partido que ajudara a criar, o Partido Novo. Meu primeiro livro é um manifesto, o grito de indignação de um cidadão que subitamente desperta para uma realidade perigosa, violenta e corrupta.
O segundo livro foi publicado em 2018. Ele se chama Jogando Para Ganhar: Teoria e Prática da Guerra Política. A intenção do livro é servir como um manual para liberais e conservadores, que encontram dificuldades em um campo dominado pelo populismo e pela ideologia. Uma segunda edição do livro, revisada e reduzida, acaba de ser publicada.
Em 2018, deixei meu último cargo no mundo corporativo para me candidatar pela primeira vez em uma eleição. Apesar de ter sido o segundo candidato a deputado federal mais votado do partido, não fui eleito, mas acabei convidado a participar da transição do governo estadual. O Rio de Janeiro se encontrava sob intervenção na área de segurança. Coordenei a transição do gabinete de intervenção federal para as recém-criadas Secretarias de Polícia Civil e Militar, e depois permaneci por 17 dias comandando a Secretaria Estadual de Segurança, que foi então extinta.
Em janeiro de 2021, quebrei o tornozelo e fui forçado a passar três meses imobilizado. Um amigo me disse: “Aproveite esse tempo e conte a história do Novo”. Foi assim que nasceu meu terceiro livro, Os Inocentes do Leblon, que conta a verdadeira história da criação e dos primeiros anos do partido.
No início de 2022, em um jantar em São Paulo, conheci dois executivos de uma empresa de mídia que estava promovendo uma revolução cultural no país. Conversei com eles sobre um sonho antigo: um documentário sobre o panorama da segurança no Brasil. Eu já tinha feito várias tentativas anteriores, mas ninguém se interessava pelo tema.
Dessa vez dei sorte. A empresa resolveu levar o projeto adiante. O nome da empresa é Brasil Paralelo. O documentário que eles produziram se chama Entre Lobos, e bateu recorde de espectadores. Mas era preciso registrar tudo aquilo por escrito, e assim surgiu meu quarto livro, A Construção da Maldade.
Minha experiência na política me convenceu da importância dos valores morais. Política sem moral é uma das piores atividades nas quais o homem pode se envolver. A política sem moral é, invariavelmente, voltada para o engrandecimento pessoal do político ou para seu enriquecimento.
A política sem moral flerta com regimes totalitários, com o populismo rasteiro, e subscreve, ou considera aceitável, a pregação revolucionária.
Para mim se tornou evidente que a moral deve preceder a política e a economia. Mas eu tinha dificuldade de encontrar confirmação para meu posicionamento. Até que um dia, lendo autores como Edmund Burke, Russell Kirk, Roger Scruton e Olavo de Carvalho, descobri que outros pensavam da mesma forma que eu.
Foi aí que eu, que fui enganado pela esquerda quando jovem e comecei na política como liberal, me descobri conservador. Para mim, o conservadorismo é o aperfeiçoamento do liberalismo.
O primeiro fundamento do conservadorismo é a crença em uma ordem transcendente, uma lei natural que funciona como a consciência da sociedade. O conservador acredita em preceitos morais e éticos que independem da época em que ele vive. Ele sabe que uma racionalidade estreita não pode, sozinha, satisfazer as necessidades humanas.
A realização plena da vida não depende da construção de uma sociedade perfeita, utópica, nascida dos devaneios de planejadores todo-poderosos e implantada a ferro e fogo através da destruição de todo o legado da humanidade. Isso é o que Hayek chama de racionalismo construtivista: a ambição de redesenhar a sociedade do zero, esquecendo o passado. Esse é o núcleo do projeto revolucionário comunista, socialista ou progressista.
Mas homens não são anjos; portanto, não é possível construir um paraíso terrestre. O conservador reconhece nessa utopia política quase uma religião, e se recusa a adotá-la.
A satisfação do ser humano depende, na verdade, do cumprimento de um pacto transcendente, feito entre os que já morreram, os vivos e os que ainda vão nascer. É em nome desse pacto que nos dedicamos a proteger e cuidar de nossas famílias, de nossa cidade e de nosso país, e a trabalhar para conservar a liberdade, a lei, a educação, os empregos, a saúde e o meio ambiente. Conservar é o ato que dá nome ao pensamento: conservadorismo.
Em vez de se apegar a dogmas, o conservador guia sua atividade política por princípios gerais. Esses princípios foram formulados ao longo de anos, com equilíbrio, através do desenvolvimento dos costumes e tradições. Mas até esses princípios precisam ser aplicados com prudência, de forma adequada a cada nação e a cada época. Esta é outra definição do conservadorismo: a política da prudência.
Tanto o impulso de renovar quanto o desejo de conservar são necessários ao perfeito funcionamento de uma sociedade. A hora de adotar uma ou outra estratégia depende das circunstâncias. É preciso reconhecer que nem toda mudança é positiva; inovações ou reformas inadequadas ou mal planejadas, em vez de sinalizar progresso, podem representar o início de graves conflagrações sociais. Por isso o conservador desconfia, acima de tudo, de mudanças radicais.
Toda a civilização ao nosso redor levou séculos para ser construída, mas pode ser destruída em pouco tempo. Esse é o objetivo dos revolucionários. O conservador sabe disso. Por isso não existe “conservador radical”.
O conservador não deve ser confundido com o reacionário, que deseja o retorno a uma época imaginária no passado, na qual tudo era perfeito. Nunca existiu época assim. Na verdade, o reacionário é a imagem espelhada do revolucionário
Os conservadores acreditam na igualdade diante de Deus e perante a lei, mas reconhecem no conceito de igualdade material uma impossibilidade lógica e moral — já que a condição de cada um depende sempre, em maior ou menor grau, do resultado dos seus esforços. A busca pela igualdade material a qualquer custo é um instrumento de criação de regimes totalitários. Todos os homens têm os mesmos direitos, mas não têm direito às mesmas coisas.
O Estado que se propõe a fazer a distribuição da riqueza é, necessariamente, um Estado que viola o direito natural à propriedade. Os direitos de propriedade e de liberdade estão intimamente conectados. Quebrada essa conexão, o Estado se torna senhor de tudo e de todos.
O conservador não deve ser confundido com o reacionário, que deseja o retorno a uma época imaginária no passado, na qual tudo era perfeito. Nunca existiu época assim. Na verdade, o reacionário é a imagem espelhada do revolucionário. Os dois desejam uma mudança radical: o reacionário quer a mudança radical para voltar ao passado, e o revolucionário quer a mudança radical para criar uma utopia.
O conservador sabe que o caminho para o progresso é uma evolução cautelosa, com prudência, sem experimentos radicais, respeitando a tradição, a liberdade e os direitos, e adaptando os conceitos teóricos às exigências práticas da vida real.
Nossa civilização foi construída em cima da filosofia grega, do direito romano e da ética e moral judaico-cristãs. Há muita gente tentando destruir isso:
- Os radicais que pregam o abandono da cultura ocidental e buscam reescrever a história, menosprezando grandes conquistas e líderes do passado.
- Os que defendem pautas como coletivização, censura e liberação das drogas.
- Aqueles que sabotam o Direito, transformando a Justiça em instrumento de engenharia social.
- Aqueles que promovem ideologia como se fosse cultura e “desconstroem” sistemas de ensino, trocando matemática, português e ciência por promoção de conflito étnico, luta de classes e demonização da prosperidade.
É preciso resistir a esses ataques. Por isso me tornei conservador.
Na minha opinião, construída ao longo de muitos anos através de custosas lições, é essencial que toda atividade política e social incorpore aspectos do conservadorismo, especialmente preocupações com a preservação da cultura, com a defesa incondicional da liberdade, opondo-se a todo tipo de totalitarismo, e com a apresentação de uma pauta clara de valores morais — esta última, elemento essencial para enfrentar as questões mais críticas do país: a impunidade e os ataques ao sistema de Justiça criminal.
Como conservador, não acredito em nenhuma ideologia. Minhas ações são determinadas por meus valores e pelo princípio da prudência.
Na minha opinião, ser conservador no Brasil hoje é defender, no mínimo, liberdade econômica, liberdade de expressão, liberdade de ir e vir, direito inviolável à propriedade privada, igualdade perante a lei, combate rigoroso ao crime, educação sem ideologia e redução da máquina do Estado e da carga de impostos
Não acredito em revoluções, apenas no progresso construído com trabalho e sacrifício. Não acredito em nenhum tipo de coletivismo ou socialismo e rejeito todos os regimes totalitários. Por isso me tornei conservador.
Leia também “O preço da democracia”
Admiro você, Roberto Motta. Tem muito a ensinar, principalmente a nova geração, que nunca fez nada na vida e já se acha dona da verdade.
Obs: também sou engenheiro, aqui de Maceió.
“Na minha opinião, construída ao longo de muitos anos através de custosas lições, é essencial que toda atividade política e social incorpore aspectos do conservadorismo, especialmente preocupações com a preservação da cultura, com a defesa incondicional da liberdade, opondo-se a todo tipo de totalitarismo, e com a apresentação de uma pauta clara de valores morais – esta última, elemento essencial para enfrentar as questões mais críticas do país: a impunidade e os ataques ao sistema de Justiça criminal.”
Este trecho do seu artigo mostra claramente qual deve ser o papel do Estado na sociedade. Estado mínimo, porém, forte para dedicar-se às suas atividades típicas quais sejam: saúde, educação e segurança.
Olhando o histórico da nossa república que em 2023 completa 134 anos, não consigo identificar um período com democracia plena.
Somos uma economia extremamente fechada e isso afugenta investimentos, negócios e desenvolvimento tecnológico.
Nosso sistema tributário é uma Medusa que petrifica a economia, barra o crescimento e desenvolvimento, beneficiando uma pequena casta que consegue aplicar seus recursos em paraísos fiscais.
Nosso sistema político é um balcão de negócios com 30 partidos políticos em atividade que tem “donos” e seus coronéis ditam as regras do que pode ou não ser apresentado para discussão independente da vontade dos eleitores que tem como única obrigação comparecer à seção eleitoral e depositar seu voto na urna inviolável do SFT / TSE.
Como consequência do que foi acima colocado temos uma tragédia denominada educação. Pioramos ano a ano e as consequências serão catastróficas já que é possível qualificar alguém instruído, mas impossível fazer o mesmo com um analfabeto funcional que infelizmente existem aos milhares no nosso Brasil.
Ao ler esse belo texto do Roberto Mota, como se estivesse olhando para o espelho (da vida), excetuando os livros que – ainda – não escrevi, poderia dizer que fui eu quem o escreveu. Professo dos mesmos valores, li os mesmos livros, secretário de estado, presidente de partido de esquerda (PSB) e fiscal do Sarney também já fui. Ademais, para não dizer que não falei de flores: como engenheiro, mestre e doutor em engenharia, professor universitário aposentado, até reitor de universidade federal já fui, por dois mandatos. Fui contra as cotas raciais, as mudanças no FIES, a criação de cursos direcionados “unicamente” aos filhos dos membros do MST e era considerado por uns como reacionário, enquanto que para outros um “conservador ultrapassado”. C’est la vie.
Excelente!
Excelente artigo
Sábias palavras Mota. Sempre falo para meus alunos se guiarem pela ética e moral em suas condutas e na política, não se pautaram por ideologia, mas por ações.
Como aprendo lendo vocês conservadores.
Um dos melhores textos que já li… quem sabe se não o melhor? Inteligência, clareza, o dom de escrever… Parabéns! Não fique pretensioso… mas se considere um grande ser humano!!!!
Existem dois grandes problemas com o conservadorismo:
Primeiro, ele é ruim de “marketing”, nasce perdedor na guerra cultural, a começar pelo significado das palavras. Enquanto o “progressista” entrega retrocesso e decadência, o “conservador” busca, na prática, a mudança do tipo de status quo que temos no Brasil. Até explicar que focinho de porco não é tomadas, Inês já morreu.
E por falar na morte da Inês, conservador não tem instrumentos nem o ímpeto para frear a escalada autoritária dos revolucionários destrutivos, que ainda insistem em chamar de “progressistas”.
Apesar de simpatizar com as ideias, eu não tenho a menor esperança de que o conservadorismo de boa estirpe seja capaz de prosperar no Brasil. Antes disso, vamos venezuelizar geral.
Sugiro estudar o caso da Acton Academy, do visionário casal Sandefer, que já gerou filhotes no Brasil. Provavelmente sem querer, eles, que são conservadores, criaram um modelo de escola que contém um DNA conservador, ao mesmo tempo que inocula uma vacina contra a esquerdopatia vitimista e propõe um eixo de propósito transformador nas crianças, uma espécie de ética revolucionária através de empreendorismo e inovação com impacto social.
Me encaixo em sua exposição do que é ser conservador hoje no nosso querido Brasil, perfeito Motta.
Digo também que fui enganado pela esquerda brasileira – e olha que neste quesito eles são bons, de enganar o povo – durante quase minha vida toda, nunca me interessei por política e apenas agora com a chegada da direita ao poder, acordei e fui ver que também sou um conservado puro – o que antes nem ideia eu tinha disto tudo – mas o ditado diz, antes tarde do que nunca, e pelo menos isto veio antes de minha passagem e estamos aqui vivenciando estes descalabros que vem de cima – e o povo está acordando, como eu acordei.
Não sou Bolsonarista e nunca fui, mas tenho convicção que ele foi o estopim para minha saída da hibernação política que me encontrava e olha o que vemos hoje em nosso país, sabotaram TUDO na eleição e hoje vejo que isto já vem acontecendo há um bom tempo, triste tudo isto, muito triste para nosso amado país.
Roberto você tá coberto de razão, mas o povo não tem seu preparo mas vamos vencer, o Brasil não pode continuar do jeito que está
Excelente texto. Irretocável. A política sem moral é o que estamos vivendo. Retrocesso.
Vou comprar os seus livros. Não os conhecia.
Amo seus textos, Motta!
Sempre lógicos, racionais e sucintos.
Me identifico com o pensamento conservador.
Acredito na meritocracia e capacidade de cada indivíduo.
E tento – mesmo timidamente – continuar aprendendo sobre o verdadeiro.
O Mota é Dez!
Aliás, é fantástico o time da Revista Oeste!
👏👏👏
Parabéns Mota! Você é uma das grandes vozes no tempo complicado que vivemos.
Como um conservador pode mudar um jogo sem uma revolução? Dar a outra face e que não é! No meu entendimento lutar pela liberdade é um conservar a vida! Se não serei engolido pelo estado.compactuo com suas ideias e me atrevo a brigar pela minha liberdade!
Isso aí! A moral é a síntese das tradições, dos costumes e do respeito das relações sociais vigentes numa determinada época e num determinado lugar !!! Temos um governo que é contra tudo isso . Temos que lutar desesperadamente pra mudar esse governo nocivo e inepto !! O Mota é um importante companheiro que temos nessa luta !!! Parabéns pelo artigo !!
Parabéns Motta, pelo brilhante artigo. Apesar de não ter sua experiência de vida, tive a mesma impressão no início da minha carreira, quando me achava um liberal. Sempre me via representado por políticos de corrente neo-liberal, procurando no escuro, alguém que representasse aquilo que eu achava correto. Enfim, despertei e hoje reconheço que sou conservador. Você demonstra com maestria o que é o pensamento conservador. Sinto-me, enfim, muito bem representado por você e por tantos que tiveram a coragem de defender isso abertamente, e não de forma velada, como ocorria no passado.
A maioria do povo brasileiro é conservadora ,mas nem sabe.
Parabéns, Motta! Brilhante, como sempre!
Brilhante, como sempre (mesmo comentário sobre o texto do Rodrigo Constantino, ambos excelentes).
Brilhante, como sempre (repetindo meu comentário sobre o texto do Rodrigo Constantino, pois ambos dão aulas espetaculares sobre o que é ser conservador, o que pouca gente sabe, devido as distorções criadas pela esquerda com suas narrativas, a começar pelo apropriamento da palavra ‘progressista’ quando são exatamente o oposto disso)
Artigo muito bem escrito. Escalpeliza e aprofunda tudo o que se pode pensar de modo sintético sobre conservadorismo na sociedade ocidental, de base judaico-cristã. Parabéns!