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Flávio Dino, ministro da Justiça e Segurança Pública, e José Sarney | Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock/Reprodução/Lula Marques/Agência Brasil
Edição 180

O Maranhão é aqui 

De José Sarney a Flávio Dino, o Estado nordestino é campeão em pobreza e falta de infraestrutura

anderson scardoelli
Anderson Scardoelli
Evellyn Lima
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Na campanha eleitoral de 2014, Flávio Dino, então filiado ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB), prometeu implementar uma série de mudanças no Maranhão. Objetivo: livrar o Estado das garras da oligarquia Sarney, que havia 50 anos impunha uma situação de miséria aos maranhenses. As promessas contidas em seu programa de governo visavam, entre outros pontos, a “educação de qualidade, acesso à saúde, água, saneamento e casas boas para morar”.

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Com essa série de compromissos firmados junto ao povo, Dino foi eleito governador pela primeira vez há nove anos, com 63,52% dos votos no primeiro turno. Seguindo com o discurso de lutar contra os Sarney e anunciando avanços para o Estado, ele foi reeleito em 2018. Com dois mandatos à frente do Palácio dos Leões, os dados atuais mostram que o Maranhão do hoje ministro da Justiça do governo Lula é tão pobre quanto o Maranhão da Família Sarney. 

O ensino público, por exemplo, está longe do regular. A edição mais recente do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) mostra o Estado na 25ª posição entre as 27 unidades do país, à frente apenas do Amapá e do Rio Grande do Norte. Algo incoerente para um local que foi a terra natal de grandes nomes da literatura, como Artur Azevedo, Gonçalves Dias, Ferreira Gullar, Maria Firmina dos Reis e Josué Montello.

Além do Ideb, a edição de 2022 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apresentou números alarmantes em relação ao nível de alfabetização no Estado. Depois de dois mandatos de Dino como governador, o Maranhão contabilizava no ano passado mais de 12% da população com 15 anos ou mais sem saber ler ou escrever. Somente outros três Estados, também nordestinos, apresentaram índices piores: Paraíba (13%), Alagoas (14%) e Piauí (15%).

Um estudo organizado neste ano pela FGV revelou que a renda média mensal do maranhense é de R$ 409. A menor do país

Dino não falhou apenas na promessa de melhorar a qualidade da educação maranhense. Também não conseguiu aprimorar outros indicadores locais. A população com acesso à água potável é de pouco mais da metade (55,8%), segundo o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, com dados relativos a 2021 — penúltimo ano de Dino no comando do governo. A mesma edição do estudo constatou que menos de 12% dos maranhenses têm rede de esgoto.

“Sem um sistema de saneamento básico minimamente eficaz, outros problemas surgem”, afirma Paulo Uebel, que foi secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia (2019-2020) e é fundador da Cristalina Saneamento. “O modelo estatal de saneamento aprofundou as desigualdades sociais. O déficit de saneamento é muito maior justamente nas áreas mais carentes. Inclusive, as ocupações ilegais, consolidadas há mais de dez anos, nem sequer são computadas nos indicadores de falta de saneamento. São áreas completamente ignoradas nos indicadores.”

Destaque na pobreza

O Maranhão também é destaque negativo em dados socioeconômicos. Um estudo organizado neste ano pelo economista Marcelo Neri, diretor do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV), revelou que a renda média mensal do maranhense é de R$ 409. A menor do país. 

No Distrito Federal, por exemplo, a renda média mensal é de mais de R$ 3 mil. São Paulo e Rio de Janeiro completam o pódio de maiores valores, com cerca de R$ 2 mil e R$ 1,7 mil, respectivamente. Na outra ponta estão Alagoas (R$ 552) e Pará (R$ 507). A renda média mensal no país é de R$ 1.310

Com cálculos e métodos diferentes, o IBGE chegou a uma conclusão similar. Entre todas as unidades federativas do Brasil, o Maranhão aparece na última posição no quesito PIB per capita — indicador que divide de modo igualitário todo o Produto Interno Bruto entre a população local.

O problema socioeconômico se reflete nas cidades maranhenses. Isso porque os dez municípios com menores PIBs per capita estão no Estado. Na lanterna está Matões do Norte, com R$ 4,9 mil, em valores anuais. Localizado no norte Maranhense, tinha uma população estimada em 17 mil habitantes em 2022. 

A primeira cidade de fora do Estado que aparece entre os piores do ranking é Santa Isabel do Rio Negro (AM), com PIB per capita anual de R$ 6,1 mil. Há apenas três cidades maranhenses entre as cem primeiras colocadas: Tasso Fragoso (13º), Santo Antônio dos Lopes (38º) e Godofredo Viana (88º), onde os PIBs per capita são de R$ 260 mil, R$ 164 mil e R$ 110 mil, respectivamente.

Em primeiro lugar no ranking está Canaã dos Carajás (PA), com PIB per capita de R$ 591 mil. Desde 2016, o município conta com a operação da mineradora S11D, da Vale. Completam o top five Selvíria (R$ 406 mil), em Mato Grosso do Sul, e as paulistas Louveira (R$ 357 mil), Paulínia (R$ 344 mil) e Gavião Peixoto (R$ 333 mil).

Doutor em ciências sociais, Diogo Gualhardo reforça que a pobreza é um problema antigo no Maranhão. “É uma pobreza histórica”, enfatiza. “Não é um fenômeno recente. Não foi criada pelo Flávio Dino nem pelo José Sarney. É uma situação conjuntural, centenária ou até mesmo bicentenária.”

Para Gualhardo, embora Dino não tenha criado a pobreza no Estado, ele perdeu a chance de fazer mais pelo social e acabou adotando a mesma estratégia de Sarney. “A grande preocupação de Dino foi trazer grandes empresas para o Estado, e nisso ele não teve êxito”, afirma o cientista social. “Nenhuma grande empresa se instalou por lá durante os dois governos dele. Basicamente, seu grande erro foi a repetição das mesmas estratégias pensadas na década de 1960.”

Maranhão pobre, Dino rico

Eleito governador em 2014 e reeleito em 2018, Flávio Dino renunciou no fim de março do ano passado. Deixou o cargo para poder concorrer à vaga de senador na disputa eleitoral de 2022. Eleito, nem chegou a assumir a cadeira por ter sido o escolhido de Lula para o Ministério da Justiça e Segurança Pública. Seu salário mensal é de R$ 41 mil, valor muito acima da renda per capita média do povo maranhense. Na última declaração à Justiça Eleitoral, Dino informou ter R$ 825 mil em total de bens. 

José Sarney, ex-governador do Maranhão | Foto: Reprodução/Redes Sociais
De 1966 a 2023

Ex-governador do Maranhão, ex-senador e ex-presidente da República, José Sarney disputou a última eleição em 2006, quando foi reeleito para mais um mandato no Senado — desde 1991, ele concorre pelo Amapá. Na ocasião, declarou ter R$ 4,6 milhões em bens. 

“O Maranhão não quer a miséria, a fome, o analfabetismo”
(José Sarney, em 1966)

Em 1966, ano em que foi eleito governador do Maranhão pela primeira vez, Sarney, então com 35 anos, pediu ao cineasta baiano Glauber Rocha que produzisse um documentário para denunciar a miséria em que vivia o povo maranhense — e que ele prometia combater. Passadas quase seis décadas, essas mazelas continuam existindo.

“O Maranhão não suportava mais nem queria o contraste de suas terras férteis e seus vales úmidos e suas fabulosas riquezas potenciais com a miséria, com a angústia, com a fome e com o desespero”, disse Sarney ao tomar posse como governador maranhense, em 1º de fevereiro daquele ano, conforme registrado em Maranhão 66, o filme produzido por Glauber. “O Maranhão não quer a miséria, a fome, o analfabetismo.”

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Desenvolvimento por meio do agronegócio

Os dados atuais mostram que, ao contrário do que prometeu em sua posse, Sarney não conseguiu fazer com que o Maranhão deixasse de ser destaque negativo em índices socioeconômicos. Dino também não conseguiu tirar o Estado das últimas posições de indicadores relacionados à educação, ao PIB per capita e à taxa de alfabetização. 

Para Diogo Gualhardo, contudo, independentemente do governante de plantão, há um setor que pode ajudar a mudar essa situação: o agronegócio. Segundo o doutor em ciências sociais, investimentos no agro podem fazer com que, finalmente, os registros de Maranhão 66 deixem de simbolizar a realidade local.

“O agronegócio é a única via palpável real de superação da pobreza do Maranhão”, avalia Gualhardo. “Você tem todo um sistema de trabalho, acessório para a produção. Há fábricas, lojas que vendem equipamentos para a produção, serviços de transporte, obras de infraestrutura. Existe todo um acervo de atividades no entorno para tornar uma fazenda do agronegócio produtiva, e esse acervo de negócios que circulam em torno dessa atividade é grande empregador.”

Segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), há potencial para o agronegócio se desenvolver no Maranhão. Dos 217 municípios do Estado, a maioria — 135 — integra, legalmente, a fronteira agrícola do Matopiba, que reúne áreas produtivas de quatro Estados brasileiros: Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.

Enquanto o investimento no agro não vem…

Apesar da constatação da Embrapa e da avaliação de Gualhardo, os investimentos no agronegócio parecem não ser o foco da atual gestão do Maranhão. Em seu programa de governo apresentado durante a campanha eleitoral do ano passado, o hoje governador Carlos Brandão (PSB), que foi vice de Dino e segue como seu aliado, cita o setor de forma superficial. 

Eleito governador em 2022, o programa de Brandão renova, mesmo que com outras palavras, as promessas feitas por Sarney e Dino em ocasiões anteriores: ações em prol do social, da educação e de questões relacionadas ao saneamento básico. O documentário quase sexagenário de Glauber Rocha nunca esteve tão atual.

Carlos Brandão, governador do Maranhão, Janja e Lula | Foto: Reprodução/Redes Sociais

Leia também "A danação de Dino"

14 comentários
  1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Essa matéria precisa chegar ao povo maranhense.

  2. Antonio de Pádua Muniz Corrêa
    Antonio de Pádua Muniz Corrêa

    Seria interessante pode compartilhar este artigo, mas parece fechado para tanto.

  3. Paulo Antonio Neder
    Paulo Antonio Neder

    Será mera coincidência que estados (e também países) onde a esquerda domina são pobres?! Pergunte a um esquerdista se ele tiver que se refugiar se irá para um país capitalista ou socialista/comunista. Qual país onde se vive melhor – socialista ou capitalista? O capitalismo tem seus males, sem dúvida, mas ainda tem muitas coisas boas.

  4. Nilson Abrao Porto
    Nilson Abrao Porto

    Estado rico, povo pobre e governantes milionários.

  5. Marcelo Martins
    Marcelo Martins

    PIB per capita não é um bom indicador para se medir a riqueza de uma população. Se eu tenho dois habitantes e um ganha R$ 100 mil por mês e o outro ganha R$ 2 mil por mês, a média é R$ 51 mil per capita e aí aférese que a população, na média é rica. Mas e a disparidade entre os salários?
    A grande maioria dos municípios vivem hoje do Fundo de Participação do Governo Federal, e no final, essa verba é alocada na burocracia municipal: prefeitos, secretários, servidores, vereadores, e a população mesmo, fica a ver navios. Esses municípios deveriam todos ser absorvidos pela maior cidade da região, ou voltar a integrar o município de onde saíram, gerando uma economia de dinheiro gigantesca.
    As oligarquias continuam propagando e mantendo a miséria.

  6. Rosangela J . Dias
    Rosangela J . Dias

    Texto muito informativo, parabéns!

  7. DONIZETE LOURENCO
    DONIZETE LOURENCO

    A região nordeste comandada a décadas – ou séculos – por coronéis dificilmente sairá do seu estado de subdesenvolvimento. Os estados e municípios são capitanias hereditárias.
    A esquerda está no controle da região há décadas sem entregar resultados que indiquem alguma possibilidade de melhora e continuarão com as promessas nunca cumpridas.
    Há menos de uma década fiz diversas incursões pelo Nordeste e o contraste é enorme.
    Transitei pelo polígono da maconha em Salgueiro/PE e Cabrobó/PE.
    Cheguei a Petrolina/PE em pleno sertão e fiquei impressionado com o que vi. Uma cidade rica – IDH 0,702 – com concessionárias de todas as marcas de automóveis, comércio e serviços diversificados. Seu aeroporto movimenta cargas de frutas tropicais para o mundo em número superior ao de passageiros.
    Na Chapada Diamantina/BA o potencial turístico é imenso e desafiador, mas não temos políticas para este setor e as opções existentes exploram o turista e não o turismo.
    A chegada de emigrantes do sul do país e até imigrantes fez surgir o MATOPIBA.
    Balsas/MA há 30 anos nem escola tinha. Hoje já ostenta IHD médio. Um grande avanço.
    Barreiras/BA e Luís Eduardo Magalhães/BA, onde estive em 2016, são exemplos de cidades que se desenvolveram com o agro e hoje é uma das grandes fronteiras agrícolas do país.
    Embora o agro movimente toda a cadeia produtiva e de serviços, começando pela mundialmente respeitada EMBRAPA, é classificado pelo presidente em exercício de fascista. Um claro desprezo por qualquer iniciativa que possa reverter a letargia da região beneficiando sua população, os estados e a união.

    1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
      Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

      Correto Donizete. Sou alagoano, de Maceió.

  8. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Você ter um continente rico desse e ficar na mão desses vermes. Olha sinceramente às vezes bate um desespero

  9. MNJM
    MNJM

    E o povo continua apoiando esse picareta. Teve oportunidade de melhorar a vida das pessoas, não o fez e agora veio para Brasília para detonar o país com seu cinismo, arrogância e incompetência.

  10. Nerivaldo Carvalho dos Santos
    Nerivaldo Carvalho dos Santos

    E o povo maranhense continua idolatrando esses pilantras , engraçado quanto mais os caras são pilantras , mais o povo do maranhão Gosta ( Acorda Maranhense )

  11. Celso Ricardo Kfouri Caetano
    Celso Ricardo Kfouri Caetano

    Rodrigo, sua pergunta é interessante e muitas vezes tenho pensado dessa forma. Elencando alguns atores do governo atual começando pelo próprio: Lula -Pernambuco, Dino -Maranhão – Lyra -Alagoas, Calheiros (pai e filho) Alagoas, Barbalho – Pará Jaques Wagner – Bahia, Rui Costa – Bahia, Camilo Santana, Jorge Messias ( O Bessias lembram) e tantos outros que não vou me esforçar em elencar. A maioria desses senhores tem um particular, a oportunidade muitas vezes de ter desenvolvido seu Estado e não o fizeram e hoje o destino do nosso País está na mão desses Senhores. Como paulista pergunto por que?

  12. Jaime Sá Batista Gonçalves
    Jaime Sá Batista Gonçalves

    Certamente, será dada aos chineses a oportunidade de desenvolver a agropecuária maranhense nos latifúndios que implantarão em breve por ações do governo e do supremo.

  13. RODRIGO DE SOUZA COSTA
    RODRIGO DE SOUZA COSTA

    Por que esse pessoal toma conta de Brasília e dos nossos futuros depois de destruir os seus estados?

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