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A rendição do menino judeu, no Levante do Gueto de Varsóvia, em 1943 | Foto: Anônimo Nazista/Domínio Público
Edição 191

Imagem da Semana: o olhar do medo

Fotografia icônica de autor desconhecido revela um garoto assustado rendendo-se a oficiais nazistas, em 1943

Daniela Giorno
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Sob a mira de uma metralhadora, um garoto judeu-polonês com olhar aterrorizado e braços levantados se rende aos oficiais nazistas. A foto, registrada em 1943 por um autor anônimo durante a Revolta do Gueto de Varsóvia, tornou-se uma das imagens mais tristes e emblemáticas do Holocausto.

Antes da guerra, cerca de 380 mil judeus viviam na Polônia, o equivalente a um quarto de sua população. Depois da invasão alemã, em 1939, tiveram que se sujeitar às leis antijudaicas. Em 1941, foram forçados a se mudar para Varsóvia, capital do país, onde foi criado um gueto delimitado por muros de 3 metros de altura e 18 quilômetros de extensão no total. Dessa forma, os judeus ficaram isolados dos demais habitantes. Era oferecida uma ração alimentar de apenas 180 calorias diárias por pessoa. A partir de julho de 1942, soldados alemães enviaram cerca de 5 mil judeus de Varsóvia para campos de concentração. Na medida em que as notícias dos extermínios se espalharam, residentes do gueto formaram um grupo de resistência contra a ocupação nazista e começaram a cavar bunkers e contrabandear armas, o que ficou conhecido como a Revolta do Gueto de Varsóvia.

A fotografia revela o momento em que um grupo de pessoas foi retirado à força do bunker e capturado pelas tropas alemãs. A maioria usa roupas esfarrapadas e tem poucos pertences. Todos foram deportados para os campos de extermínio de Majdanek ou de Treblinka. O medo fica evidente no olhar do menino.

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O major-general da Schutzstaffel (conhecida como SS), Jürgen Stroop, foi enviado por Heinrich Himmler para acabar com a revolta. A SS mandou caminhões-tanques, lançou gás venenoso nos bunkers e incendiou grande parte do gueto. O conflito arrastou-se por quatro semanas. Foi o maior ato de resistência judaica contra o Holocausto na Europa.

A famosa imagem do menino faz parte de uma série de fotos e documentos do que foi chamado de “O Relatório Stroop” (The Stroop Report). Nele, Stroop escreveu: “Hoje, 180 judeus, bandidos e sub-humanos foram destruídos. O bairro judaico de Varsóvia não existe mais”. A liquidação dos insurgentes foi relatada com muito orgulho num álbum revestido com capa de couro e 75 páginas de anotações, resumos de operações e detalhes de como era realizado o assassinato do povo judeu, além de mais de 50 fotos comoventes tiradas no front. A maioria das imagens que compõem o álbum é composta de cliques do oficial da SS Franz Konrad, conhecido como “Rei do Gueto”. Mas não é possível afirmar com exatidão que a foto do menino de Varsóvia foi registrada por ele. O álbum acabou sendo mais tarde a ruína de Stroop e de outros oficiais da SS durante os julgamentos de Dachau e Nuremberg. As fotografias encontradas no álbum serviram de prova documental do horror do Holocausto e dos efeitos da doutrinação cruel e doentia antissemita.

A única pessoa identificada na foto foi o soldado nazista que segura a metralhadora e posa para a câmera com uma expressão de orgulho e empáfia. Seu nome é Josef Blösche, um oficial de alta patente da SS. Foi julgado no Tribunal de Nuremberg e sentenciado à morte por crimes contra a humanidade. O menino com meias até os joelhos e aparência de seis ou sete anos de idade — cuja identidade nunca foi confirmada — passou a representar a violência praticada contra as crianças indefesas e todos aqueles que sofreram com as atrocidades cometidas pelo Terceiro Reich.

Manter a memória viva passou a ser um desafio, uma vez que as testemunhas oculares do Holocausto praticamente desapareceram. A Segunda Guerra Mundial, um dos piores capítulos da história da humanidade, trouxe lições que não podem ser esquecidas.


Daniela Giorno é diretora de arte de Oeste e, a cada edição, seleciona uma fotografia relevante na semana. São imagens esteticamente interessantes, clássicas ou que simplesmente merecem ser vistas, revistas ou conhecidas.

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7 comentários
  1. Luiz Carlos M A de Figueiredo
    Luiz Carlos M A de Figueiredo

    Assinei a Revista Oeste hoje.
    Este foi o 1° artigo lido na revista, assunto que tenho grande interesse em conhecer, pelas atrocidades nazistas cometidas pela população civil, principalmente os judeus.
    Parabéns Daniela pela bela reportagem!

  2. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Chocante.

  3. Gilson Herz
    Gilson Herz

    E tem crápula e canalha que defende isso. O grupo terrorista hamas é o exemplo da crueldade. Tem que ser totalmente eliminado.

  4. Luzia Helena Lacerda Nunes Da Silva
    Luzia Helena Lacerda Nunes Da Silva

    Esta imagem é uma das provas definitivas da torpeza inerente à condição humana. Somos capazes dos maiores heroísmos e das piores crueldades.
    Há que se ter coragem para olhar.
    Entre tantas imagens do horror do HOLOCAUSTO, a escolha foi precisa. Pior, só crianças decapitadas pelo Hamas.

  5. Maki K
    Maki K

    De faz necessário a leitura do livro “Maquiavel Pedagogo” do Pascal Bernardin para que todos possam ter a noção do que órgãos supranacionais vieram fazendo para que o Mundo pós WWII chegasse onde chegou através dos meios de ensino.

    1. Maki K
      Maki K

      *Se faz necessário

  6. ARIOVALDO HERMINIO BRAGA
    ARIOVALDO HERMINIO BRAGA

    Naquela época, os nazistas, levavam os judeus para os campos de concentração e depois de uma seleção rigorosa, para detectar e separar os possíveis trabalhadores braçais em seus projetos, os demais, homens mulheres e crianças, eram conduzidos à câmara da gás e depois aos fornos.
    Hoje temos o Hamas, que invade um território soberano, mata indiscriminadamente seus habitantes, estupram, mutilam, degolam e incineram inocentes, em nome de Deus.
    Evoluímos tecnologicamente, mas moralmente continuamos os mesmos bárbaros de sempre!
    Tenho dó dos que justificam e apoiam esta barbárie!

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