Não, este não é um artigo de 2022. A guerra contra a imprensa, declarada abertamente na campanha presidencial do ano passado com a censura de veículos de informação e jornalistas pelo Supremo Tribunal Federal — via Tribunal Superior Eleitoral —, ganhou mais um perigoso capítulo. Na última quarta-feira, 29 de novembro, o STF determinou que veículos jornalísticos podem ser condenados por realizar entrevistas caso haja “indícios concretos” de falsidade de acusação por seus entrevistados. A tese, para a surpresa de absolutamente ninguém, é do excelentíssimo ministro Alexandre de Moraes.
Em junho deste ano, participei de um encontro organizado pelo jornalista norte-americano Michael Shellenberger para discutirmos o declínio da liberdade de expressão pelo mundo. Shellenberger, jornalista premiado e encarregado de abrir os “arquivos do Twitter”, vem chamando a atenção do mundo para o que ele chama de “Complexo Industrial da Censura” — agências governamentais, organizações não governamentais e grandes empresas de tecnologia trabalhando juntas para suprimir opiniões e perseguir pessoas.
Durante três dias em Londres, em uma sala de uma biblioteca ao lado da Abadia de Westminster, pessoas de todo o espectro político-ideológico discutiram a nova censura, que usa como subterfúgio termos mal definidos e com enorme abrangência, como “discurso de ódio” e “desinformação”. Do encontro nasceu a Declaração de Westminster — um documento pela liberdade de expressão, com assinaturas de 141 jornalistas, artistas, escritores, ativistas e acadêmicos de 21 países que denunciam a escalada de um “Complexo Industrial da Censura” pelo mundo.
O manifesto, subscrito por acadêmicos e jornalistas do mundo inteiro e de visões políticas distintas, tem o apoio, por exemplo, do psicólogo conservador canadense Jordan Peterson, que assina ao lado do pensador marxista esloveno Slavoj Žižek. O jornalista cristão Peter Hitchens assina junto com o zoólogo ateu Richard Dawkins. Além de personalidades como a escritora ex-muçulmana Ayaan Hirsi Ali e seu marido, o historiador Niall Ferguson, assinam o manifesto Glenn Greenwald, Edward Snowden, Julian Assange, Tim Robbins, Oliver Stone, entre outros nomes importantes em várias áreas. Representando o Brasil, tive a honra de assinar o documento ao lado do jornalista Leandro Narloch, mas a maior e mais impactante participação do Brasil no evento não foi nossa. O Supremo Tribunal Federal não apenas deixou todos os participantes chocados com a exibição de vários vídeos levados por mim com legendas em inglês, mas é citado no documento por criminalizar “o discurso político” e por outras incursões na liberdade de expressão e perseguições a jornalistas e cidadãos comuns.
Além do nome em um documento histórico pela defesa da liberdade de expressão e contra a espiral do silêncio, nossos “supremos fiadores da democracia” também já encabeçaram matérias sobre a tirania do Judiciário em jornais como The New York Times, The Guardian, Washington Post, The New York Post e Wall Street Journal. Embora o ativismo da Corte como um todo seja sempre mencionado, a figura central dos artigos é sempre ele, o magnânimo Alexandre de Moraes.
No Brasil, nem mesmo os setores da imprensa tradicional, outrora simpáticos às decisões de Moraes, concordaram com a sua mais recente e estapafúrdia determinação de responsabilizar veículos de imprensa pelo conteúdo dito ou produzido por entrevistados. Em artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo, o colunista Luís Francisco Carvalho Filho afirma que a nova tese de Moraes para calar veículos de imprensa é um desatino que pode conduzir o país a tempos obscurantistas (perguntar não ofende — mas onde estavam os colunistas e jornalistas, agora estarrecidos com a mordaça, desde 2019?): “Agora, o STF pretende estabelecer um regime político de intangibilidade da honra de personalidades e políticos, inclusive corruptos e pilantras. Nem a ditadura foi tão ambiciosa”. Sobre o ministro Cristiano Zanin, que salientou que a Justiça pode determinar a remoção do conteúdo “com informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas”, Carvalho Filho dá o nome correto ao ato: “escorregadela tirânica”. Segundo o colunista, tal medida causaria inveja aos “juristas” do regime militar.
Vou além. Tal medida causaria efusivos aplausos dos maiores ditadores que o mundo já viu. A liberdade de expressão, uma pedra angular das sociedades democráticas, tem sido frequentemente uma vítima face aos regimes totalitários ao longo da história. Não estamos diante de apenas uma coincidência no tempo.
Na União Soviética, Josef Stalin implementou um sistema abrangente de censura para consolidar o seu poder e manter a pureza ideológica do Partido Comunista. A Glavlit, a agência de censura, tinha ampla autoridade para aprovar ou rejeitar qualquer forma de expressão artística ou jornalística. Escritores e jornalistas enfrentaram a ameaça constante de serem rotulados como inimigos do Estado, levando à autocensura para evitar repercussões. O governo controlava não só o conteúdo, mas também os canais de distribuição, garantindo que apenas as narrativas aprovadas chegassem ao público. A atmosfera de medo das palavras sufocou ainda mais a liberdade como um todo.
Na Alemanha Nazista, o Ministério da Propaganda, liderado por Joseph Goebbels, orquestrou uma supressão sistemática da liberdade de expressão. A Lei de Imprensa do Reich de 1933 centralizou o controle dos meios de comunicação social nas mãos do governo, levando ao encerramento de publicações consideradas prejudiciais ao Estado. A Gestapo, a polícia secreta de Hitler, monitorou e puniu vozes dissidentes, criando uma atmosfera onde a oposição foi recebida com graves consequências. O uso da propaganda pelo regime, juntamente com a supressão de pontos de vista alternativos, resultou na prevalência de uma narrativa singular e autoritária que serviu à visão de Hitler de censura e extermínio.
O regime fascista de Mussolini, na Itália, controlou firmemente a liberdade de expressão para promover a sua agenda nacionalista. O Ministério da Cultura Popular, sob o comando do filho de Mussolini, Vittorio, detinha autoridade sobre a mídia, determinando o que poderia ser publicado e divulgado. Os jornais que se desviaram da linha oficial do partido enfrentaram o fechamento, e os jornalistas críticos do regime foram sujeitos à prisão. O regime promoveu ativamente a autocensura, incutindo medo entre jornalistas e escritores e suprimindo diversas perspectivas. O objetivo era criar uma consciência nacional homogênea em apoio aos ideais fascistas, erradicando qualquer dissidência que pudesse desafiar a autoridade do regime.
A ministra Cármen Lúcia, em um vexaminoso pronunciamento no TSE, disse que a censura estava absolutamente vedada em nossa Constituição, mas que, sim, censurariam veículos de imprensa e jornalistas “só até segunda-feira, 31 de outubro”
O governo de Mao Tsé-Tung, na China, testemunhou uma supressão sustentada da liberdade de expressão para manter o controle ideológico. O Estado regulamentou rigorosamente todas as formas de comunicação social, garantindo o alinhamento com os princípios comunistas. A Revolução Cultural (1966-1976) viu a perseguição de intelectuais, escritores e jornalistas, com muitas obras consideradas contrarrevolucionárias e expurgadas. O sistema educacional controlado pelo Estado impôs a conformidade ideológica, moldando a narrativa apresentada ao público. O regime de Mao silenciou de maneira eficaz as vozes dissidentes, criando uma ideologia monolítica que serviu aos interesses do partido no poder.
Na Cuba de Fidel Castro, amigo íntimo de Lula, a supressão da liberdade de expressão foi executada através de várias táticas para estabelecer um Estado socialista. O governo assumiu o controle da mídia, transformando jornais, rádios e televisão em instrumentos de propaganda estatal. O jornalismo independente foi sistematicamente reprimido por meio da censura, e os jornalistas críticos do regime enfrentaram a prisão e o exílio. O Comitê de Defesa da Revolução (CDR) facilitou uma cultura de vigilância e autocensura, incentivando os cidadãos a denunciarem uns aos outros. O controle do regime estendeu-se à educação, garantindo que a narrativa do Estado se enraizasse na consciência pública, limitando efetivamente o acesso a pontos de vista alternativos.
Em cada contexto histórico, a supressão da liberdade de expressão foi uma estratégia multifacetada que envolveu meios de comunicação controlados pelo Estado, agências de censura, perseguição de dissidentes e a forte promoção da autocensura. As consequências para aqueles que desafiavam as narrativas estabelecidas variaram da ruína profissional à prisão ou mesmo à execução, criando uma atmosfera de medo que impediu o discurso aberto e as diversas perspectivas de debate. Esses casos servem de alerta, enfatizando a importância de salvaguardar a liberdade de expressão como um pilar fundamental da democracia, no sentido real da palavra, e não como é usada pelo STF.
Calaram jornalistas nas eleições de 2022. A ministra Cármen Lúcia, em um vexaminoso pronunciamento no TSE, disse que a censura estava absolutamente vedada em nossa Constituição, mas que, sim, censurariam veículos de imprensa e jornalistas “só até segunda-feira, 31 de outubro”, ao término das eleições presidenciais. Estamos em dezembro de 2023, jornalistas estão sem redes sociais, sem passaportes, sem contas bancárias, sem voz. O que restou será vigiado e amordaçado. A “segunda-feira” de dona Carmen não tem fim.
E não foi por falta de aviso. A velha e carcomida imprensa fingiu que não viu as inúmeras inconstitucionalidades que o STF e o TSE cometeram nos últimos anos. Jornalistas beijaram o anel do sistema e fecharam os olhos para derrotar um fascismo imaginário, achando que apoiar todo tipo de perseguição do Judiciário contra pessoas comuns, só porque elas eram incômodas ao projeto do bom ladrão, era “defesa da democracia”.
Com o retorno do governo petista à cena do crime, tese de Geraldo Alckmin, e a batida imparável das inconstitucionalidades e tiranias do STF, a imprensa adormecida agora será tão “golpista” quanto o “blogueiro” Allan dos Santos, ou os jornalistas Rodrigo Constantino e Guilherme Fiuza, ou a juíza que ajudaram a perseguir, hoje exilada nos Estados Unidos, Ludmila Lins Grilo. Infelizmente, a outrora bela e adormecida imprensa ajudou a criar esse monstro que agora ameaça a todos nós. Bem-vindos ao exílio político. Vocês apostaram que a censura seria para poucos e alimentaram a Stasi e a Gestapo no Brasil. A conta chegou.
Todo sistema totalitário se volta contra toda a imprensa. Todo jacobino morre decapitado.
Leia também “Um ano de Oeste Sem Filtro”
Vocês imprensa alternativa que falam um pouco da verdade , atrapalham os planos deles . Vocês estão acordando uma multidão das mentiras e desgovernos de décadas, e isso é péssimo para eles . Eles vão fazer de tudo para calá-los . Como disse se não me engano o Flavio Morgenstern – Eles querem que vocês façam programas de receitas de bolo . Muito triste ???? Beijos Ana Paula musa querida ????????????
Belíssima Ana Paula jogando informações importantes para nosso conhecimento da política mundial
No regime totalitário ninguém está a salvo. Stalin dormia trancado e morreu praticamente sem ser socorrido, mesmo porque os socorristas tinham medo de que sobrevivesse, pois condenava à morte por nada.
LAMENTÁVEL O QUE ESTAMOS PRESENCIANDO E TENEBROSO, SOMBRIO O QUE ESTÁ POR VIR. REZEMOS.
Ana Paula, você e outros brasileiros que moram fora tem o dever de continuar expondo aos estrangeiros os absurdos cometidos especialmente pela quadrilha do Supremo.
Excelente texto! Infelizmente… verdades.
Parabéns Ana, excelente texto. Rodrigo Pacheco o maior responsável por ter permitido um Judiciário ditatorial.
O STF/TSE impuseram a volta do Lula a cena do crime. A corrupção e os desmandos VERGONHA.
Eu acho é pouco….Como dizem aqui no Pará: TOMA-TE!
Ana Paula excelente a sua participação nesse evento apresentando vídeos sobre as decisões do STF sobre a liberdade de expressão! Você não só a fantástica Ana Paula do Voley com está se se consolidando com a jornalista brilhante que cresce a cada dia! Muito obrigado!
Excelente artigo, defesa admirável da liberdade. Já dizia R.Reagan:
“Estamos caminhando para o socialismo, um sistema que, como se diz, só funciona no Céu, onde não precisam dele, e no Inferno, onde ele já existe.”
Excelente artigo. Parabéns Ana. Espero de alguma forma que o seu texto ajude a tirar a venda dos olhos dos que ainda estão cegos para as atrocidades cometidas pelo STF.
CONGRATULATIONsss!!! It’s fantastic, amazing, cool and MARVEL… Opening my MIND!!! QSM TKsss Att.
A pergunta que resta, é o que acontece com o país depois de totalmente dominado pelo regime? Algumas das consequências já são aparentes. O regime tem que comprar o apoio dos militares e seus apoiadores, isso custo muito dinheiro. Obviamente o regime vai confiscar o dinheiro do resto da população que passa a viver na pobreza extrema.
Mas o regime após se consolidar-se e fortalecer-se dentro do país, ele tambem é ganancioso e sempre quer mais. Veja o exemplo da Venezuéla que esta prestes a invadir o país vizinho.
Com o tempo, todos os paises totalitários perdem qualquer competitividade e capacidade produtiva ficando dependentes de outros para itens básicos como papel higiênico, e muitos outros após terem confiscado todo o dinheiro do povo, sofrem um colápso sob seu próprio peso tendo que re-começar do zero com anos de atraso quando comparados com paises que permaneceram livres durante sua história.
Tempos difíceis, só nos resta a esperança.
Adoro seus pensamentos! Porém, constatado o câncer. Qual o tratamento; pois senão corremos o risco de ficar vendo os avanços da doença e calarmos estarrecidos. Existem tratamentos conservadores, mas há os radicais e curativos.
Grato por me colocar ao par da realidade.
Excelente artigo. You’re the one, spkr!
CUIDADO COM OS VIZINHOS???? SIM
ESTIVE EM CUBA 2002 E VI DE PERTO AS ” POLICIAS DE QUARTEIRÕES ”
PESSOAS??? INTERROGAVAM VIZINHOS POR QUE VC TEM ESTA CALÇA JEANS : É CAPITALISMO EXPOLRADOR!!!! DO SOCIALISMO
NOSSO GUIA PEDIA NOSSAS ESPOSAS COMPRAREM ROUPAS INTIMAS PARA SUAS ESPOSAS!!!! TODOS DO GRUPO TURISTICO S EM EXCEÇÃO COMPRAVAM E DAVA AO GUIA!!!! PERPLEXOS NOS OLHAVAMOS …
ESTIVE EM CIENFUEGOS UMA CIDADE ONDE VIMOS DIGO VIMOS CADERNOS COM ANOTAÇÕES DE ALIMENTOS DADOS…. E SEM PEDIR NOVAMENTE
UM CASAL DESTA CIDADE GENTILMENTE NOS MOSTROU SUA CASA OK SIMPLES ISTO NAO TEM IMPOTANCIA: ORGULHO DELES: ” TEMOS BANHEIRO”….. e vi….
Pois é cocluam vcs defensores : TEMOS BANHEIRO
H
Excelente análise do terrivel caminho que o Brasil, sob o comando do STF “presidido” pelo Alexandre de Moraes vem tomando, a partir da perseguição aos que se posicionam no espectro do Conservadorismo ou do Liberalismo.
Brilhante Ana Paula. Nota-se com clareza da sua exposição que aqui não se inventou nada, que segue-se a receita já tão testada e aprovada por muitos tiranos mundo e história a fora. Entretanto, esses que aplicam a receita deveriam lembrar-se do fim que tiveram muitos dos tiranos que a usaram.
A punição aos veículos da imprensa que entrevistarem algum propagador de mentiras e fake News vale inclusive para quando o entrevistado for de esquerda, tipo o presidente Lul* ou nesses casos um decreto transformará a mentira em verdade automaticamente?