Se você ainda não descobriu isso, preciso lhe contar: uma das coisas mais complicadas é a procura do amor. Um homem — e aqui eu falo de pessoas do sexo masculino, como eu — passa boa parte da vida em busca dele.
Ainda que não saiba disso.
É grande a lista de filósofos, biólogos e antropólogos que atribuem à busca de uma companheira todos os grandes esforços e conquistas dos homens. Tudo seria uma eterna busca pela segurança e prosperidade necessárias para atrair uma parceira, construir um lar e proteger uma família.
Há quem considere isso uma visão reducionista. Há quem identifique nisso sua história.
É o meu caso — embora só tenha percebido isso tarde na vida.
Meus filhos me ensinaram.
Quem tem filhos vive diferente. O amor pelos filhos não é um genérico amor “pela humanidade”. O amor paternal é um amor concreto, do aqui e agora. Do acordar cedo demais para ir buscar o filho numa festa; de não dormir enquanto não escutar o barulho da porta abrindo de madrugada.
Quem tem filhos se preocupa com o futuro: o seu próprio e o deles.
Há muito tempo li, em uma revista semanal, uma matéria idiota sobre o alto custo de ter filhos. Fiquei com vontade de responder com um artigo explicando o custo de não os ter — na minha experiência, um custo que beira o infinito — e que, levado ao extremo, significa o fim da humanidade.
Filhos são o alarme do relógio da vida. Christopher Hitchens, em sua autobiografia Hitch-22, descreveu o sentimento que o tomou quando teve pela primeira vez seu filho recém-nascido nos braços: “Esses são os olhos que verão a minha morte”.
Uma das partes mais difíceis de ser pai é refletir sobre tudo aquilo que seus pais sacrificaram por você. Infelizmente a maioria de nós só chega a essa compreensão quando os pais já não estão mais disponíveis para uma conversa sincera.
É impossível para um filho corresponder plenamente ao amor dos pais. O amor recebido deles só será respondido através do amor que teremos por seus filhos.
Uma vez recebi uma excelente oferta de emprego, que exigia que eu passasse a semana trabalhando em outra cidade. Longe da família. Recusei. Depois disso, enfrentei tempos difíceis, de dinheiro escasso, e aquela recusa me assombrou. Os tempos difíceis passaram. Meus filhos estão aqui comigo. Olhei eles crescerem, fui buscá-los na escola e levá-los ao dentista, segurei sua mão quando estavam com medo do escuro até que dormissem. Aquela oferta de emprego e o dinheiro que ela teria trazido sumiram no passado.
Quem é casado e tem filhos vive em perpétuo estado de falta de dinheiro. Não é difícil entender o porquê. Alguém que tem uma esposa e dois filhos, por exemplo, vê todos os seus sonhos, desejos, vontades e aspirações multiplicados por quatro. A renda geralmente não aumenta na mesma proporção. Mas é como disse um homem muito sábio e gentil com quem eu conversei uma vez: cada filho traz o seu próprio pão. Ele tinha 11 filhos.
Houve um tempo em minha vida em que eu não tinha certeza se ainda seria pai. A paternidade, depois que chegou, nunca deixou de parecer um milagre. Não são poucos os momentos em que olho para mim mesmo e digo com espanto: “Você é pai! Você tem um filho e uma filha!”. Pronuncio essas palavras como se fossem um encantamento, mas são um despertar. Não se pode deixar que uma coisa tão prodigiosa pareça banal.
Pessoas que não têm filhos, e que encontram os filhos dos outros de tempos em tempos, ficam impressionadas com a mudança que o tempo opera, transformando crianças em adultos. Parece um milagre. Então me deixe dizer isto a vocês: quem é pai se sente da mesma forma. Parece que foi ontem que fechei a porta do quarto de uma garotinha rechonchuda que dançava pulando em um pé só; hoje, quando abri a porta, encontrei uma adolescente que já quer sair sozinha e que me dá bronca pelas roupas que visto.
O assunto principal dos pais são os filhos — é natural. Você só compreende isso depois que tem filhos. É que temos muita coisa para contar — inclusive coisas para as quais nem conseguimos encontrar palavras adequadas.
Por volta dos 5 anos de idade, meu filho cunhou uma palavra nova: “táquiles”. Era uma expressão genérica, usada quando ele não queria responder a alguma coisa
Estou sentado no escritório trabalhando e pela janela posso ver meu filho e minha filha. Neste momento, por uma fração de segundo, minha mente resolve confundi-los com meu irmão mais novo e minha irmã caçula que, durante um tempo na minha vida, tinham quase a mesma idade que meus filhos têm agora. Os truques que a mente prega na gente. Os truques do tempo.
Quem observa a transformação de uma menininha em uma moça percebe que nós, homens, não temos nenhuma chance. A delicadeza, a perspicácia e a sensibilidade de uma mulher superam qualquer recurso do qual os homens possam dispor. Minha filha amada me livrou de um dos maiores perigos pelos quais passei na vida, ao insistir que, em determinado dia e hora, eu a levasse para fazer compras. Estar ali, com ela, me colocou distante de uma situação na qual eu, de outra forma, estaria envolvido. Escapei de um perigo imenso. Nossa vida poderia ter sido afetada de forma irremediável.
Por isso eu serei grato a vida inteira à minha pequenina.
Como ela sabia que precisava manter o pai a seu lado, naquele momento?
Por volta dos 5 anos de idade, meu filho cunhou uma palavra nova: “táquiles”. Era uma expressão genérica, usada quando ele não queria responder a alguma coisa. Funcionava assim: “Filho, o que você lanchou na escola hoje?”. Ele respondia: “Táquiles”. “Qual é o nome daquele seu amigo? Quanto é 3 × 5? O que você quer comer no jantar?”
“Táquiles, táquiles, táquiles.”
Uma vez, numa madrugada fria, quebrei todos os recordes de velocidade na Via Dutra, com meu filho delirando de febre no colo da minha mulher, no banco de trás. Seguiram-se cinco dias de desespero no hospital, de combate a uma pneumonia grave, com antibióticos injetados por uma agulha que perfurava a veia da sua mãozinha de 6 anos de idade. Como ele não podia mover o braço, ou a agulha sairia, minha mulher e eu nos revezávamos ao seu lado segurando sua mão. Quando ficou claro que ele não corria mais perigo, fui a uma loja de brinquedos próxima e comprei um helicóptero e um navio da Lego.
Minha filha já me levou para conhecer a emergência de um hospital na Região dos Lagos, no Rio de Janeiro, depois que uma quantidade enorme de picadas de mosquitos provocou uma reação alérgica que a ameaçava de sufocamento.
Agora está tudo bem, claro. Mas eu lembro exatamente do que aconteceu em cada minuto desses episódios.
Meu filho gostava de organizar seus bichinhos de brinquedo em enormes fileiras, que iam do seu quarto até a sala. A diversão da minha pequena, quando tinha a mesma idade, era gravar vídeos para um canal de YouTube imaginário.
Quando tinha uns 7 anos, minha filha fez o vídeo mais lindo do mundo. Não posso mostrar para vocês — ou ela me mata. Mas é um depoimento sobre ela, sobre mim e as coisas que faço como pai. Suas declarações são engraçadas e comoventes. Ela termina a gravação dizendo: “Mas eu gosto mesmo é da minha mãe” (emoji triste).
Eu e a mãe dela choramos toda vez que assistimos ao vídeo (emoji alegre).
Filhos são um presente que damos ao mundo, e eu só queria que o mundo entendesse. Há muito tempo, em algum lugar, li uma frase que nunca esqueci: “Quem tem filhos é refém do acaso”. Lembro-me do que disse a esposa do avô da minha mulher, no dia em que meu filho nasceu. Eu segurava o neném pela primeira vez, quando ela se aproximou e disse, baixinho e sorrindo: “Você nunca mais vai dormir tranquilo”.
Ela tinha razão. Mas eu nunca fui tão feliz.
Leia também “Murro em ponta de faca: enfrentando o superpoder judicial”
Que texto maravilhoso!
Sou pai de três meninas (5, 3 e 1 ano) e digo que cada dia é desafiador, principalmente em relação à preocupação quanto ao futuro delas, pois um dia não estarei mais junto, pois essa é a lei natural da vida!
Peço a DEUS que me dê força e sabedoria para ser um bom pai, enquanto estiver aqui, apesar de todos as dificu
Ora, que lindo texto! Parabéns! Tenho dois filhos e vivenciei tudo isso também .
Um filho é uma dádiva que não conseguimos, sequer, imaginar, até o dia que o temos. MEU FILHO, MINHA VIDA.
Lindo! Lindo!! Obrigada por esse artigo
Que texto emocionante, Motta! Em um momento em que vivemos tempos de total incerteza sobre nosso querido país, ele trás alento.
Linda msg,cheia de verdades! Sou mãe e abençoada com uma neta pequena que me fez reviver aquele instinto materno de puro amor!
Parabéns Motta. Texto espetacular.
Parabéns Motta. Texto espetacular.
Que texto lindo e sensível! Parabéns, Motta.
Muito bom, Motta. Penso da mesma maneira. Tenho uma filha de 3 anos, e quero mais. Minha esposa que se prepare rs.
Parabéns.
Texto de puro amor.
Sensacional!
Concordo plenamente! Lindo texto.
E quando um filho vira um jumentólogo esquerdista nessas faculdades de Haddad e Marilena Chaui?
Obrigada, Motta. Você nos presentiou, novamente, com um texto brilhante.
Nada conforta mais do que iniciar o dia nessa Poesia de rara Beleza. Um primor de texto. Haverá de ser recepção em todas as maternidades, instrução em todas as escolas e advertência em todas delegacias.
Amém!
Realmente, como não pude e não posso ter meu próprio filho, Deus me agraciou com um enteado (filho) que desde o primeiro contato me traz toda sorte de preocupação, porém preocupações que nos enche de orgulho e de esperança em dias melhores.
Lindo texto Motta. Tenho três filhos, um homem e duas mulheres e concordo com cada palavra sua. É maravilhoso ser pai. Tive quatro momentos divinos em minha vida, quando recebi a minha esposa no altar e no nascimento dos filhos. Depois vieram três netos, então lembrei do meu sogro que dizia que vô é o burro que o filho domou para o neto montar. Saúde e paz. Feliz Ano Novo, para você e sua família.
Lindo texto!! Emocionante!
Eu concordo, acho importante ter filhos mas também não se pode menosprezar quem os não tem pois as vidas das pessoas são diferentes e cada uma tem suas peculiaridades . E também acho que criar um filho como se deve hoje no Brasil é caro sim, começando pelas escolas . Não adianta ter muitos filhos e não dar a criação adequada a elas. No restante concordo com o Motta a quem admiro .
Eu concordo, acho importante ter filhos mas também não se pode menosprezar quem os não tem pois as vidas das pessoas são diferentes e cada uma tem suas peculiaridades . E também acho que criar um filho como se deve hoje no Brasil é caro sim, começando pelas escolas . Não adianta ter muitos filhos e não dar a criação adequada a elas. No restante concordo com o Motta a quem admiro .
Bravo!
Filhos são um presente de Deus para os pais
Para quem estava com o orçamento apertado comprar um helicóptero e um navio da Lego não é um gasto alto demais? Qual foi a lição que o seu filhou tirou disto?
Motta, que deliciosa reflexão! Tenho um filho, duas filhas e duas netas. Todos os sacrifícios do mundo não se comparam às mensagens de Amor que tenho recebido dos meus filhos. Deus abençoe você e sua família. Feliz Natal.
Motta,sempre acompanho as suas lives,agora nesse artigo,comprovou mais uma vez que grande caráter tem vc.Parabens!
Sensacional. Emocionante do começo ao fim. Parabéns pelo artigo!