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Avenida da Liberdade, na cidade histórica de Lisboa, a capital portuguesa | Foto: Shutterstock
Edição 213

A Avenida da Liberdade

A Constituição proíbe qualquer restrição à manifestação do pensamento, à criação, à expressão e à informação, sob qualquer forma ou veículo

Alexandre Garcia
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Estou em Lisboa e tenho passeado bastante na Avenida da Liberdade, a mais bela avenida que já conheci. Jardins, árvores frondosas, espelhos d’água, monumentos e fachadas de prédios que são obras de arte. E o melhor da avenida é o nome: Liberdade. Agora mesmo, em 25 de abril, Portugal está comemorando a Liberdade, depois de um longo período de ditadura, em que havia censura e não havia liberdade de expressão. Liberdade é assim como a avenida de Lisboa, onde tudo floresce e embeleza o ambiente. Até o ar que se respira é outro. É um oxigênio que estimula as mentes a criar, produzir, achar soluções.

No Brasil temos uma “Avenida da Liberdade” na Constituição. O ministro aposentado do Supremo, Marco Aurélio Mello, explica, a quem ainda não percebeu, que a medula da Constituição é a liberdade. Se nos surpreendemos com essa informação, é porque estamos precisando ler a Constituição com a mesma frequência e intimidade com que os evangélicos leem e citam a Bíblia. Afinal, a Constituição é livro sagrado nas nações democráticas. Precisamos ter os princípios da Constituição como uma questão de fé — uma fé racional —, porque estão passando por cima do que foi promulgado há 36 anos, e ainda estamos discutindo se isso é permitido ou não, como se já não estivessem fixados em pedra. Com Moisés no Sinai, o doutor Ulisses nos apresentou as tábuas pétreas da Lei Maior e, por serem fáceis de ler e de entender, chamou o conjunto de princípios de Constituição Cidadã, uma garantia contra qualquer tipo de tirania. “Tenho nojo de ditadura”, proclamou ele na promulgação da Lei Maior.

Marco Aurélio Mello explica, a quem ainda não percebeu, que a medula da Constituição é a liberdade | Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

A liberdade está em todas as páginas do nosso livro sagrado. A Constituição proíbe qualquer restrição à manifestação do pensamento, à criação, à expressão e à informação, sob qualquer forma ou veículo — como está escrito no artigo 220. O mesmo artigo vai além: estabelece que “nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística, em qualquer veículo de comunicação social” — e observe que o constituinte não escreveu apenas a palavra “liberdade”, mas a adjetivou: “plena liberdade”. Para os nossos representantes no Congresso, a Constituição garante, no artigo 53, que deputados e senadores são invioláveis, civil e criminalmente, por quaisquer palavras.

O inimigo da liberdade de expressão é a censura. Para ela, o artigo 220 reserva uma arma letal: “É vedada toda e qualquer censura, de natureza política, ideológica e artística”. Qual é a exceção? Os valores éticos e sociais da pessoa e da família. É o que estabelece o artigo seguinte, mandando que a programação da TV e do rádio respeite esses valores, isto é, respeite a família. O incrível é que está desde 1988 na Constituição e parece que ainda não circula por todos os nervos, veias, vasos e artérias do país. E na medula da Constituição está a liberdade. Como vamos exigir que respeitem o Código Penal, que é lei ordinária, se não respeitam a Lei Maior? Se não respeitam a Lei Maior, por que iriam respeitar as menores?

Hoje, o que blinda os que querem viver em liberdade é a Constituição de 1988, que está sendo bombardeada em sua medula

O inimigo da liberdade de expressão é a censura | Foto: Shutterstock

O mais incrível é que autoridades com ou sem mandato, que juraram cumprir e defender a Constituição, só fizeram isso protocolarmente. Ex-presidente do Supremo, o ministro Marco Aurélio, falando no último Fórum da Liberdade, lembrou que a Corte tem que ficar restrita às funções que lhe atribui a Constituição; não poderia julgar os manifestantes do 8 de janeiro, que ficaram sem direito ao recurso; tampouco caberiam julgamentos à distância. No entanto, estamos convivendo com brasileiros que não são analfabetos nem alienados, mas aceitam decisões claramente contrárias ao que está na Lei Maior.

Em 1932, os paulistas deram o sangue por uma Constituição. Foram bombardeados pela aviação de um governo que não queria ser limitado por uma Constituição. Fabricaram blindados e resistiram. Hoje, o que blinda os que querem viver em liberdade é a Constituição de 1988, que está sendo bombardeada em sua medula. Medula atingida leva à paralisia. O “cale-se” é a paralisia da liberdade. Isso pode ser revertido se a Constituição se tornar o livro de cabeceira da cidadania — e não ficar apenas na cabeceira, mas ser posta em prática todos os dias. Porque é prazeroso circular numa avenida de liberdade.

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6 comentários
  1. Luiz Alberto Almeida
    Luiz Alberto Almeida

    O triste é que aqueles que desrespeitam a lei são sempre beneficiados por privilégios e como ninguém quer por a perder seus privilégios se submetem a viver fora de lei e omissos. Lutar pelo outro da muito trabalho, então e muito mais confortável ser omisso e manter a vida fácil, mas lá no fim todos serão atingidos, até os omissos…

  2. Hans Herbert Laubmeyer Filho
    Hans Herbert Laubmeyer Filho

    Texto inspirado e inspirador. Parabéns!

  3. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    A quadrilha suprema é feroz contra senhorinhas com terço na mão, e mansa com corruptos do mais alto escalão.

  4. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Pelo visto só quem obedece a constituição é a rede globo

  5. LEO FERREIRA PINTO
    LEO FERREIRA PINTO

    Pena que os magistrados ignoram isso a todo tempo.

  6. MB
    MB

    Excelente artigo. Já adquiri o meu LIVRO de cabeceira.

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