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Edição 217

A ruína das viagens de avião

Estou escrevendo de um voo doméstico atrasado em 19 horas que faz parte de uma viagem internacional que já dura um dia e meio

Jeffrey A. Tucker.
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O melhor momento para escrever sobre quanto as viagens de avião se tornaram terríveis é imediatamente após, ou, neste caso, durante um desastre de agendamento e atraso que bagunce completamente a sua rotina.

Quando não acontece, e tudo corre bem no seu voo, você simplesmente não se importa muito. Mas quando se está no meio do caos — estou escrevendo de um voo doméstico atrasado em 19 horas que faz parte de uma viagem internacional que já dura 36 horas — parece o apocalipse.

Tornou-se mais comum do que consigo me lembrar. Cheguei ao ponto de tentar não viajar a menos que fosse necessário, porque parece que três em cada cinco viagens minhas acabam assim. Comecei a esperar desastres e, consequentemente, a me preparar para eles. Mas a maioria das pessoas começa supondo que tudo vai correr bem, porque era assim que sempre funcionava no passado.

Observe as três jovens que estão tentando viajar com os cachorrinhos fofos que são seus melhores amigos. Esses cães são animais bem-comportados e lindos que lidam bem com a situação, a menos que ocorra um problema. Quando a comida acaba e a natureza chama, a história é outra. Os aeroportos não oferecem áreas para os cachorros fazerem suas necessidades. Então os pets e suas donas entram em pânico e começam a chorar. É realmente horrível.

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Depois, temos os idosos e seus remédios e outras necessidades especiais. Podem ser injeções ou outras coisas que exijam condições especiais. Eles podem não ter o suficiente. Podem ter feito as malas para uma viagem de uma semana e ficar sem remédios pouco antes de o desastre acontecer. Não me lembro de ter visto farmácias nos aeroportos dos Estados Unidos.

Também temos as famílias com filhos pequenos. As crianças estão infelizes, gritando, chorando. O leite acabou, e a criança está com fome. Acabaram as fraldas, não há trocadores disponíveis, e os resíduos humanos começam a se espalhar por todo lugar, sendo que não há chuveiros. A sujeira começa a tomar conta de tudo.

Máscaras de oxigênio caem do teto

Todo mundo tem necessidades pessoais, e cada situação é diferente. Por todos os lados, férias felizes são arruinadas: pais perdem a partida dos filhos na Liga Infantil, damas de honra não conseguem chegar aos casamentos, executivos perdem reuniões internacionais importantes, pessoas têm que usar seus dias de folga remunerada.

A cada passo, surgem oportunidades para gastar mais dinheiro, com lojas e bares prontos para passar o seu cartão de crédito, mas sem nenhum remorso pela sua situação. Eles só ganham mais dinheiro com os planos arruinados. Os funcionários da companhia aérea se sentem mal, mas não há nada que se possa fazer.

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A circunstância mais bizarra afetou o meu voo. No pouso anterior, as máscaras de oxigênio caíram de repente do teto. Então, a manutenção teve que verificar isso, mas é claro que não há número suficiente desses profissionais, e eles passam o dia todo correndo de avião em avião para tentar fazer as luzinhas mudarem de vermelho para verde. Ninguém entende de fato como nada funciona, então você mexe nas coisas até a máquina dizer que está funcionando.

Levou muitas horas, mas, por fim, embarcamos. A decolagem começou e estávamos quase no ar, mas outra luz acendeu na cabine. Aparentemente, a porta de uma saída de emergência não havia sido fechada por completo, então o voo todo teve que ser abortado pouco antes da decolagem. Descemos do avião. E tivemos que esperar a manutenção aparecer de novo, mas ela demorou uma eternidade.

O voo atrasou, e os algoritmos assumiram o controle. Os voos foram automaticamente remarcados para centenas de pessoas. As instruções iam mudando loucamente: “vá para o D37 e remarque o voo”; “não, mande E19 para um novo voo”; “não, mande D3 para este voo com uma nova tripulação”; “não, mande D40 para um novo avião”; “não, espere aqui porque o voo vai partir em 30 minutos”. A cada nova instrução, a multidão se dispersava e corria de um lado para o outro por longas distâncias, só para ter que voltar.

A estadia no hotel durou apenas duas horas, porque o voo foi remarcado para as 5h30 da manhã, então todo mundo se levantou e saiu correndo, sem esperar o inevitável: novo atraso

Algoritmos são os verdadeiros chefes

Ficar com raiva não faz diferença. Os algoritmos não se importam. Eles apenas geram novas instruções. Ao longo de sete horas, os atrasos e as promessas continuaram, mas ficou claro o que realmente estava acontecendo. A companhia aérea não quer cancelar o voo porque teria que pagar hotel para todo mundo. É muito melhor atrasar o máximo possível e ver a multidão se dispersando aos poucos e custeando seus novos planos.

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Finalmente, à 1h30 da madrugada, anunciaram: “Cancelado. Vá para o outro lado do aeroporto para pegar seu voucher de hotel e alimentação”. Chegando lá, todos aceitaram alegremente o voucher de US$ 12 (R$ 60) e a comida e as bebidas que estavam ali no check-in. Um iogurte: US$ 12 (R$ 60). Um pacote de batata chips: US$ 12 (R$ 60). Um suco de maçã: US$ 12 (R$ 60). Tudo armado para cobrar o dinheiro falso e fazer as pessoas gastarem mais. Mas, veja, você tem uma escolha!

A estadia no hotel durou apenas duas horas, porque o voo foi remarcado para as 5h30 da manhã, então todo mundo se levantou e saiu correndo, sem esperar o inevitável: novo atraso para o meio-dia. Algumas pessoas se deram conta disso e voltaram para a cama, mas outras foram ao aeroporto para dormir encolhidas em uma cadeira, com as mesmas roupas do dia anterior.

Depois de todo esse desastre, muitos se perderam no caminho. As moças com os cachorros sumiram, assim como muitos idosos. Só restaram os fortes e extremamente sonolentos, que gastaram dinheiro em café para acordar e em bebidas alcoólicas para anestesiar a dor.

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Em algum momento, você se dá conta de que ninguém está tomando decisões de fato, então ninguém é responsável. Máquinas controlam tudo, e elas são impiedosas. As pessoas no comando não operam as máquinas; é o contrário. Os algoritmos estão nos controlando, eles são os verdadeiros chefes e não dão a mínima para as suas inconveniências.

Saudade do trem e do navio

O alto-falante agradeceu a nossa paciência, mas a paciência já tinha acabado. Parecia uma operação psicológica. Estávamos abalados pelas inspeções, pelas verificações dos documentos, pelos sistemas de segurança, pelos celulares apitando com novas instruções, pelas câmeras de vigilância em todo lugar, pelos atrasos intermináveis e pela pura incerteza do que viria a seguir.

Em dado momento, eu estava parado no corredor do aeroporto quando alguém me pediu para sair do caminho. Virei e vi apenas um robô tentando passar, então cedi aos seus desejos. Assim como todo mundo. Os robôs têm mais direitos do que nós. Foi assim que o sistema foi montado.

A classe dominante sádica que está no comando odeia a capacidade das pessoas comuns de viajar como fazíamos décadas atrás. Muitas elites sonham em acabar completamente com as viagens aéreas comerciais porque, segundo elas, seria bom para o planeta. Mas não ousam fazer isso, então o caminho mais fácil é impor um profundo arrependimento a todos os que estão dispostos a sair de suas “cidades de 15 minutos”. É o melhor jeito de acabar com a era das viagens: uma cortina que se fecha lentamente para o que costumávamos chamar de civilização.

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É claro que eles ainda terão seus jatos particulares, que não precisam cumprir nenhuma das exigências citadas, sempre partem e chegam na hora, e provavelmente até permitem que você aterrisse com a mesinha abaixada. É provável até que a internet funcione nesses voos, ao contrário dos nossos.

Viajar de avião hoje em dia não é nada parecido com o que era cinco anos atrás. As exigências de vacina afastaram muita gente da indústria, e os problemas na cadeia de suprimentos e de mão de obra causados pelos lockdowns deixaram frotas inteiras em péssimo estado, nos obrigando a correr riscos. Os inconvenientes e a brutalidade em nome da segurança cuidam do resto.

É impressionante pensar que o auge das viagens acessíveis, confiáveis e convenientes foi há mais de 25 anos. Desde então, só piorou. Isso tudo me faz sentir saudade de uma boa viagem de trem ou de navio, algo que todos devemos fazer antes que estraguem essas também.


Jeffrey Tucker é escritor, fundador e presidente do Brownstone Institute. Também é colunista sênior de economia do Epoch Times, além de autor de dez livros, incluindo Life After Lockdown, e de milhares de artigos na imprensa acadêmica e popular. Ele trata amplamente de temas ligados a economia, tecnologia, filosofia social e cultura.

Leia também “Covid-19: quatro anos depois”

2 comentários
  1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Já tive a experiência de viajar de trem de Orlando a NY, um dia de viagem. Foi excelente.

  2. Soniascf
    Soniascf

    Trens por aqui já existiram. Eram ótimos. Os navios eram linha de passageiros e não cruzeiros que se degradam a cada ano.

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