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Ilustração: Shutterstock
Edição 219

O problema é fiscal

E a nova presidente da Petrobras mal tomou posse e já começou a preparar o terreno para atender aos desejos do governo

Carlo Cauti
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Para o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, o problema dos juros no Brasil é muito claro: o descontrole das contas públicas. Em discurso durante um almoço empresarial organizado em São Paulo pelo Lide, Campos Neto explicou que “o Brasil tem um problema: a taxa de juros neutra é mais alta do que em outros países”.

E isso, segundo ele, é “em parte gerado por um tema fiscal”. Para o presidente do Banco Central, “é importante pensar em harmonia entre políticas fiscal e monetária”, pois “ambas sofrem questionamento de credibilidade no momento”.

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Governo arrecada mais, mas a conta ainda não fecha

As receitas do governo continuam subindo em 2024, graças ao aumento da carga tributária decidido ao longo dos últimos meses.

Segundo o Tesouro Nacional, os ganhos do governo registraram uma alta real — ou seja, descontando a inflação — de 7,8% em abril em relação ao mesmo mês de 2023. Desde o começo do ano, a alta foi de 8,6% em termos reais.

Todavia, as despesas aumentaram ainda mais, com um alta real de quase 13%. Com as despesas obrigatórias por lei que chegaram a mais de 18%.

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Mais impostos à vista

Desesperado por mais recursos, o governo federal quer mais impostos. Desta vez sobre os cigarros. A equipe econômica estaria estudando elevar o preço mínimo do cigarro para compensar parte da desoneração da folha de pagamentos de 17 setores da economia e dos municípios mantida em 2024.

A proposta deve ser editada por decreto e pode ser incluída na medida provisória (MP) que vai conter todas as alternativas para compensação da política salarial. A previsão é de uma arrecadação adicional entre R$ 3 bilhões e R$ 4 bilhões para os cofres públicos.

A Receita Federal calcula que serão necessários cerca de R$ 26 bilhões para restituir a perda arrecadatória com a prorrogação da desoneração.

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Afazeres na Petrobras

A nova presidente da Petrobras, Magda Chambriard, mal tomou posse na sede da estatal e já começou a preparar o terreno para atender aos desejos do governo.

A primeira demanda da lista é o contrato com a fábrica de fertilizantes Unigel. O Tribunal de Contas da União (TCU) já classificou o acordo como prejudicial às finanças da Petrobras. Mas o setor de fertilizantes está no coração de Gleisi Hoffmann, presidente do PT, Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia, e de Rui Costa, ministro da Casa Civil.

Logo em seguida estão as obras da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, e do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), em Itaboraí. Ambos epicentros de escândalos de corrupção descobertos pela Operação Lava Jato.

E, por último, mas não menos importante, a volta do setor da indústria naval. Que deverá ser reanimada por meio de encomendas da estatal petrolífera. Algo já proposto pelo menos três vezes desde o primeiro governo do PT, mas que, pontualmente, deu errado.

Magda Chambriard, presidente da Petrobras, fala à imprensa sobre sua gestão da companhia, no Rio de Janeiro (27/5/2024) | Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
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De volta ao passado

O governo também não perdeu tempo e tentou enfiar um jabuti no Congresso com o objetivo de reanimar o conceito de conteúdo nacional. Ou seja, a obrigação das empresas que atuam no setor de petróleo e gás de adquirir insumos fabricados no Brasil.

O projeto de lei aprovado pela Câmara sobre o Programa Mover, que fornece recursos para a indústria automotiva, foi modificado de última hora. Foi incluída uma exigência de conteúdo local de 20% a 40% para a exploração feita em regime de partilha.

A Associação Brasileira das Empresas de Bens e Serviços de Petróleo (AbesPetro) e o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) criticaram a inclusão de uma emenda que não tem nada a ver com o tema do projeto de lei.

Segundo as associações do setor, os contratos firmados pela ANP com as empresas vencedoras nas rodadas de licitações já incluem a cláusula de conteúdo local.

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Sem vergonha de serem controladores

Para o ministro Silveira, quem deve decidir o rumo da Petrobras é o governo. Mesmo se os outros acionistas privados não concordarem. “Somos controladores e não podemos nos envergonhar disso”, declarou Silveira.

Comparando com a Vale, onde o governo não tem participação de controle, Silveira disse que na Petrobras “podemos muito mais do que isso”. O mercado não gostou, e poucas horas após essa declaração o banco americano J.P. Morgan cortou o preço-alvo para as ações da Petrobras, que passou de R$ 46 para R$ 43,50.

Lula e Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia, participam da solenidade de assinatura da medida provisória sobre energias renováveis e redução de impactos tarifários, em Brasília (9/4/2024) | Foto Valter Campanato/Agência Brasil
Chupando petróleo de canudinho

O ministro Silveira também quer que a Petrobras atue na exploração das jazidas petrolíferas da margem equatorial. “Não é foz do Rio Amazonas”, disse o ministro, salientando o fato de a área de operação da Petrobras estar a 500 quilômetros do local.

Segundo Silveira, a Guiana estaria “chupando de canudinho” o petróleo presente abaixo do solo brasileiro, pois “estão explorando na divisa”.

Faltou combinar com a Marina

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, já deixou claro no passado que é contra a exploração dessa área petrolífera. Desta vez, todavia, o fogo cruzado poderia ser fatal. Silveira já declarou que a ministra nunca trouxe “dados objetivos” nas discussões sobre a margem equatorial.

Fontes do Ministério do Meio Ambiente deixaram claro à coluna que “nada mudou” em relação à posição contrária à exploração. E que a questão é “meramente técnica”, conforme indicado pelo Ibama em sua negativa de 2023.

Marina Silva, ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, discursa em Brasília (22/5/2024) | Foto: José Cruz/Agência Brasil
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Acabou o home office

Os preços dos imóveis comerciais estão mostrando que o home office, definitivamente, chegou ao fim. Segundo o Índice FipeZAP, os preços de venda de salas e conjuntos comerciais de até 200 metros quadrados registraram uma valorização de 0,25% em abril, enquanto os preços de locação do segmento avançaram mais de 1% no mesmo período.

No caso das vendas, os preços registraram uma rápida aceleração em relação aos preços de março, e a maior alta desde janeiro de 2018. As locações, por sua vez, registraram o maior aumento mensal desde novembro de 2013.

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Surge um novo gigante do varejo

O Grupo Mateus está prestes a comprar o Novo Atacado Comércio de Alimentos Ltda. (Novo Atacarejo), criando um gigante do varejo na Região Nordeste. O Novo Atacarejo possui estabelecimentos de atacarejo, varejo e atacado de distribuição localizados nos Estados de Pernambuco, Paraíba e Alagoas.

A empresa resultante deve ter um faturamento de R$ 6,8 bilhões anuais nos três Estados, com um total de 50 lojas e um atacado. O mercado gostou da operação, e as ações subiram mais de 4,5% em um único pregão na Bolsa de Valores de São Paulo.

Unidade do Novo Atacarejo | Foto: Divulgação
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Cade tomou uma decisão política no caso da Petrobras

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) atendeu aos pedidos da Petrobras e do governo e acabou com os acordos que obrigavam a estatal petrolífera a vender refinarias e ativos de gás natural.

Durante o governo de Jair Bolsonaro, a Petrobras e o Cade assinaram dois termos de compromisso de cessação (TCCs) que previam a venda de oito das 13 refinarias da estatal, a privatização de três gasodutos e o fim das participações da antiga Gaspetro (atual Commit Gás).

“Foi uma decisão política, embora tomada por um órgão técnico”, explica a Oeste Evaristo Pinheiro, presidente-executivo da Associação Brasileira dos Refinadores Privados (Refina Brasil). O Cade, de fato, atendeu a uma das bandeiras do presidente Lula, que desde a campanha eleitoral vinha prometendo impedir novas privatizações e até mesmo reverter as já realizadas em governos passados.

“Mas o que o governo parece não entender é que o Brasil precisará cada vez mais de refinarias privadas. Ou, em breve, começaremos a racionar o combustível no país”, explica Pinheiro. Confira os melhores trechos da entrevista.

Evaristo Pinheiro, presidente-executivo da Refina Brasil | Foto: Divulgação
A decisão do Cade foi política ou técnica?

Foi uma decisão política, embora tomada por um órgão técnico. O que nos preocupava com o Refina Brasil era a situação em que ficariam as refinarias já independentes. Aparentemente, isso não vai mudar, e esse é um ponto muito importante. Essas refinarias precisam sobreviver, prosperar e crescer. É algo que interessa ao Brasil. Pois essas refinarias independentes fornecem gasolina, diesel e álcool para o mercado. Hoje o Brasil tem um déficit diário de 650 mil barris de derivados. Sem as refinarias privadas, essa situação pioraria ainda mais, e começaria a faltar combustível. 

Não surpreendeu o fato de o Cade ter anulado uma medida que ele mesmo tinha tomado há cinco anos?

Estou muito curioso para saber qual foi a justificativa técnica que o Cade utilizou para mudar a rota em 180 graus. O que causava dano para a concorrência em 2019 não causa mais em 2024? Como isso é possível? A gente precisa entender o que guiou essa mudança completa de posição. Esse é um ponto relevante. Será fundamental para o Cade manter sua autoridade e garantir que o mercado privado de refino continue a existir. Ou o Brasil terá graves problemas. Inclusive desabastecimento.

Existe o risco de o governo tentar retomar as refinarias já privatizadas?

Acho que risco de retomar todas, não. Mas sem dúvida essa decisão deixa livre a negociação para uma recompra de refinarias. Dentro do cenário atual me preocupa menos se uma refinaria vai querer vender sua planta para a Petrobras. Essa é uma questão comercial. O que me preocupa mais é por qual razão um eventual operador privado vai querer vender para a Petrobras. Se em condições normais o negócio é bom e lucrativo, se sou mais eficiente que a Petrobras, por que vou querer vender para a estatal? Se for uma escolha regulatória e política, teremos um problema. Pois é papel do governo garantir condições isonômicas de concorrência.

Leia também “Quem vencerá a disputa entre a indústria e o povo?”

3 comentários
  1. FERNANDO
    FERNANDO

    O Brasil é o único país do mundo, que se esforça ao máximo para tudo dar errado!!!

  2. Antonio Carlos Neves
    Antonio Carlos Neves

    Queria ver esse tal de Silveira arrotar essa picanha em cima da Petrobras, se fosse ministro em 2016 pegando aquela Petrobras quebrada e a empresa mais endividada do mundo. Infelizmente isso é obra desses insanos TUCANOS que arquitetaram a volta dessa cambada “a cena do crime”.

  3. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Magda Chambriard é mais uma peça da quadrilha de volta a cena do crime.
    O prefeito de Recife, João Campos, filho do Eduardo Campos, já está animadinho em voltar a corrupção na Refinaria Abreu e Lima. Tal qual seu falecido pai.

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