Sorvete de arroz. Arroz com queijo. Esse seria o resultado do escandaloso leilão que só não foi adiante porque a reação do público foi exemplar. Lula, pressionado, cancelou o leilão do primeiro lote da importação de 1 milhão de toneladas de arroz. Uma pequena mercearia de Macapá, “Queijo Minas” assumia a importação de 147 mil toneladas; e um fabricante de sorvete, de 20 mil toneladas. Com capital de R$ 80 mil, a mercearia deveria dar caução de R$ 36 milhões. Lula foi o autor da ideia de interferir no mercado, mesmo prejudicando os arrozeiros gaúchos, afetados por três anos consecutivos de secas e pela enchente deste ano. Eles haviam colhido mais de 7 milhões de toneladas desta safra, e, com o arroz dos outros Estados, principalmente Goiás, o Brasil tem arroz até para exportar. O presidente da Conab, Edegar Pretto, gaúcho como os arrozeiros prejudicados, deputado estadual por três legislaturas, criador e coordenador da Frente Parlamentar Gaúcha em Defesa da Alimentação Saudável, lavou as mãos e não se insurgiu contra a compra. O autor da ideia desastrosa é Lula, mas o bode expiatório foi do ex-ministro da Agricultura de Dilma, Neri Geller, então secretário de Política Agrícola, que havia indicado o funcionário que fez o leilão. Geller perdeu o cargo e saiu revelando que os técnicos do ministério recomendaram não importar. Agora na Câmara, colhem assinaturas para uma CPI.
Está literalmente na nossa genética o pecado de transferir para os outros as nossas culpas. O Livro do Gênesis conta que Adão, para justificar-se por ter comido o fruto proibido, diz a Deus que foi Eva quem lhe ofereceu. Eva, por sua vez, põe a culpa na serpente, que acaba amaldiçoada. Racionais, o homem e a mulher, no início de tudo, na gênese, põem na genética da humanidade o lavar de mãos com que depois Pilatos permite crucificar Jesus. A culpa é dos outros e, enfim, do irracional. Está no dia a dia e mais se evidencia na prática política.
Os prefeitos de Porto Alegre que por anos não fizeram a manutenção dos diques e comportas são todos responsáveis pelas consequências da inundação. Mas assinaram uma nota denunciando o atual prefeito. Os prefeitos dos municípios inundados, no entorno do Guaíba e do Taquari, que permitiram o “habite-se” para edificações em bairros que ficaram embaixo d’água em 1941 e em enchentes subsequentes, são todos responsáveis pelo desastre, assim como os vereadores que votaram em permissões para empreendimentos imobiliários em áreas de risco certo. Mas fica mais fácil todos endossarem os ambientalistas que culpam o irracional, a serpente, isto é, o clima, que é inimputável, diferentemente das autoridades irresponsáveis. Os que entraram na Justiça para suspender dragagens necessárias nos rios assoreados agora inventaram um sinônimo para a enchente: “catástrofe climática”, que papagaios repetem no noticiário. Com isso, empurram a culpa para o Sol.
Aqui em Brasília não há enchente do Lago Paranoá, mas estão sendo recorrentes as enxurradas de votos derrubando vetos do governo, como devolveram a mais recente medida provisória, que pretendia tirar mais de R$ 29 bilhões dos pagadores de impostos. Com erros e derrotas, o presidente, que não pode usar o engodo de “catástrofe climática”, prefere culpar suas lideranças no Congresso e seus ministros por não conversarem com deputados e senadores, nem com os que empregam, produzem e pagam impostos. No entanto, o líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães, se queixa de falta de comando. As pesquisas de opinião mostram queda na aprovação do governo e alta na desaprovação; e o presidente culpa seus marqueteiros, encarregados da propaganda.
Os que estão mandando e desmandando foram eleitos por nós. Assumamos a responsabilidade — ou a culpa — do nosso voto e tratemos de recusar o fruto proibido, que nos oferecem como delicioso na campanha eleitoral
Adão e Eva precisam parar com isso. A culpa é da serpente, mas os expulsos do paraíso foram eles. E transmitiram a genética aos descendentes. Assim, não são apenas os políticos a praticar o jogo de empurra. Descartamos lixo, entupimos bueiros, mas a culpa é dos governos que não limpam. Criamos mosquito em casa, mas a culpa da dengue é da falta do fumacê. Pagamos propina, mas a culpa é dos políticos que a embolsam. A vida seria melhor se nos livrássemos do pecado original do “não fui eu, foi o outro”. Os que estão mandando e desmandando foram eleitos por nós. Assumamos a responsabilidade — ou a culpa — do nosso voto e tratemos de recusar o fruto proibido, que nos oferecem como delicioso na campanha eleitoral. Depois não aleguemos que foi a serpente que nos ensinou a comer abóbora com sabor de picanha.
Leia também “A vontade do povo”
Parabéns Alexandre Garcia, pelo artigo. Como eu gostaria que mais brasileiros lessem pelos menos 30% dos artigos que a revista OESTE pública.
ISTO É ARROZGATE !!!!!
CADE O ARAUTO DA HONESTIDADE ???? AQUELE QUE PRENDEU PESSOAS QUE PROTESTAVAM SEM DEFINIR OS BADERNEIROS.
Cadê o pronunciamento dos “ambientalistas” que proibiram as dragagens?
👏👏👏👏 perfeito Alexandre
Alexandre Garcia e sua moral raiz, de Pai, Avô, sábios que povoam minha consciência e caráter!!! Grande prazer da leitura revisitado a cada texto. Espetacular!!!
Esse Lula é tão jumento como idiota, não tem culpado nenhum pelo insucesso deste governo fraudado, o culpado é a evolução, pois tudo vai se transformando. A pressa das transformações é a tecnologia. O homem está hoje num futuro que os retrógrados ainda não enxergam. Não se pode mais fazer política com enganação. O mundo da Internet e IA é da transparência
Alexandre Garcia, sempre preciso nos seus artigos.
Concordo plenamente.
Com boas exceções !
Retrato do Brasileiro!
Retrato do Brasileiro!
Só discordo da parte que diz que “os que estão mandando e desmandando foram eleitos por nós”. Em primeiro lugar, dos 513 deputados da câmara só uns 20 foram eleitos com votos próprios, os demais o foram pelo infernal “quociente eleitoral”. E o executivo… bem, o executivo quem elege é a urna sacrossanta e quem conta esses votos é um ladrão perigosíssimo. De resto concordo com o texto, mas essa ressalva sobre os eleitos acho fundamental.
Perfeito !