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Edição 233

A ‘criatividade’ do atraso

Como gastar menos em algo que o presidente Lula quer expandir é um fenômeno contábil

Adalberto Piotto
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Duas notícias econômicas dos últimos dias chamaram a atenção do país: o PIB do segundo trimestre de 2024 e o projeto de Orçamento para 2025. Ambas surpreenderam, não há dúvida. Mas só uma tem alguma explicação plausível. A outra, não. E o problema maior é que as duas têm futuro incerto. É aí que o governo de Lula 3 joga a economia brasileira no passado, não no futuro.

Para resumir, o PIB avançou 1,4% no trimestre encerrado em junho. Houve avanços na indústria, nos serviços e no consumo das famílias e do governo. Gastos maiores de um governo afundado em déficits é sempre uma temeridade. Volto ao assunto mais à frente.

De outro lado, o governo apresentou uma peça praticamente ficcional, o que é chamado de Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa). Em síntese, é onde o governo detalha ao Congresso as expectativas de receitas e despesas para o ano seguinte. Com isso, explica as fontes de arrecadação para justificar quanto e como vai gastar o dinheiro público. E, neste caso, a conta não fecha, porque as receitas são exageradas ou incertas, e os gastos continuam aumentando.

O produto interno bruto, a soma de todas as riquezas geradas no país no último trimestre, não deixa de ser uma notícia boa. A questão é que só crescimento da economia não basta. É preciso ser sustentável no longo prazo. Se o avanço do segundo trimestre deste ano consolida um período de 12 trimestres consecutivos de PIB positivo, de acordo com os dados do IBGE, isso é notoriamente positivo. Mas também significa que um ano e meio desse crescimento veio do governo anterior. E a política econômica de Bolsonaro era de abertura ao investimento privado, de responsabilidade fiscal e segurança jurídica, ou seja, completamente oposta ao que faz o governo Lula. 

O que se colhe hoje na economia foi plantado ontem. A analogia com a agricultura é mais que simbólica. Todo agricultor que já domina seu negócio com conhecimento e tecnologia de ponta, como é o caso do brasileiro, só teme as intempéries do clima. E o que temos é justamente uma tempestade de insegurança jurídica sobre o Brasil, com perda da previsibilidade institucional como nunca se viu desde a redemocratização nos anos 1980, no século passado. Apesar da notável resiliência da economia brasileira, um ataque de gafanhotos é sempre destrutivo. 

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Por mérito próprio, avançamos muito em competitividade e conexão com as cadeias globais de produção e distribuição de mercadorias. De forma competente, geramos demanda fixa e praticamente dependente do que produzimos. Isso criou uma ligação direta entre o Brasil produtivo, sobretudo a parte mais voltada para o mercado externo de nossa economia, e o o mundo consumidor. Consegue-se assim contornar governos e alguns dos solavancos internos, porque são contratos de longo prazo, incluindo os que vieram para cá em grandes investimentos em infraestrutura, desde a retomada da seriedade econômica reconquistada no governo de Michel Temer e que se estendeu e foi ampliada com Bolsonaro, depois da tragédia do lulopetismo de Dilma Rousseff. Parte do crescimento resiliente do PIB neste momento se explica aí. Na economia real, o gráfico de avanço não recua de repente, portanto, não mudaria de sentido rapidamente, apesar da chegada de um governo completamente oposto em ideias e práticas. Mas a economia vive de expectativa. Que ambiente de negócios se está construindo com o atual governo Lula? Será a colheita do amanhã.

Duas são as realidades que já prejudicam o presente e assombram o futuro. O modelo fiscal de matriz gastadora inconsequente é anabolizado pela insegurança jurídica, advinda do consórcio entre o Palácio do Planalto de Lula e o Supremo Tribunal Federal. 

E uma coisa leva à piora ou à falta de perspectiva para a outra. Tempos atrás, o STF entendeu que poderia rever o próprio entendimento a respeito de processos sobre pagamento de tributos. Foi o caso em que subverteu a coisa julgada, decisões de última instância que foram revistas, e obrigou a cobrança retroativa de impostos. Mudou-se a regra depois do jogo jogado e também o resultado, com derrota para o contribuinte. O ministro Dias Toffoli tem dado decisões monocráticas que trazem de volta aos negócios empresas envolvidas em casos concretos de corrupção. Como explicar a ética na governança que prevalece no país às empresas que reformularam o seu departamento de compliance depois da Lava Jato? Recentemente, o poderoso ministro e ex-presidente do TSE, Alexandre de Moraes, baniu numa canetada a plataforma X, sob a alegação de descumprimento de ordens judiciais que, na verdade, eram ilegais sob a Constituição. Sem nenhum vestígio de obedecer ao devido processo legal e garantir ampla defesa à empresa e seus representantes, transferiu para outra a obrigação de se responsabilizar pelas multas que havia aplicado ao X. A Starlink, de outro segmento e com diferente quadro societário e CNPJ, teve as contas bloqueadas apenas porque Elon Musk é sócio das duas. Nenhuma das medidas tomadas por Alexandre de Moraes é permitida na legislação brasileira, mas ambas aconteceram e estão em plena vigência suprema. Como fazer crescer o PIB com a espada injusta da imprevisível Justiça brasileira de última instância na cabeça do investidor? Sem crescimento econômico, sem aumento da arrecadação. A matemática não liga para o STF e está acima da Têmis. Mas o governo depende dessa relação diretamente proporcional para pagar as contas. E que contas!

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Em julho, no início do terceiro trimestre, o déficit primário do setor consolidado (União, Estados, municípios e estatais), sem ainda levar em conta o pagamento dos juros, foi de R$ 21,3 bilhões. Quando considerados os juros, o déficit nominal vai a R$ 101,5 bilhões, o maior rombo da série histórica iniciada em 2002, elevando a relação dívida/PIB a 78,5%. Estava na casa dos 71% antes de Lula assumir. No acumulado de 12 meses, já se adicionou à dívida bruta do país R$ 1,127 trilhão. No total, a dívida pública brasileira já ultrapassa os R$ 8,8 trilhões. 

Uma comparação de modelos é necessária. Em 2022, o Brasil sob o governo Bolsonaro e com a política econômica de Paulo Guedes foi um dos três países do mundo a conseguir reduzir a sua dívida pública, apesar da pandemia e da guerra na Ucrânia. E, mesmo assim, fez o PIB avançar 2,9%. Sem guerra e sem pandemia, o atual governo esgarça as contas do governo para produzir um crescimento que nunca é sustentável quando baseado em gasto público descontrolado. Lula 3 é cada vez mais Dilma 1 e 2.

Arrecadar mais R$ 166 bilhões em 2025 vem de aumento sobre o lucro das empresas, o que geraria uns R$ 21 bilhões de receita extra. No entanto, o sucesso da medida depende do Congresso, que já sinalizou que é contra

Vamos ao Ploa, uma oportunidade perdida para mostrar que o governo poria rédeas nos gastos e em si mesmo. Fez o contrário. Com a promessa de zerar o déficit no ano que vem, a equipe econômica recorreu à criatividade na contabilidade e a um exagerado “capricho” nas receitas.

A estimativa de arrecadar mais R$ 166 bilhões em 2025 vem de aumento sobre o lucro das empresas, o que geraria uns R$ 21 bilhões de receita extra. No entanto, o sucesso da medida depende do Congresso, que já sinalizou que é contra. De outro lado, para fechar as contas que não param de crescer, quer retirar do cálculo de superávit primário algumas das despesas, como sentenças judiciais que é obrigado a pagar. Como num passe de mágica, gastou, mas não põe na conta. Além disso, tem subestimado outras despesas para dar brilho aos números. O auxílio-gás, que custa neste ano R$ 3,5 bilhões, aparece como gasto de apenas R$ 600 milhões no Oorçamento de 2025. Como gastar menos em algo que o presidente Lula quer expandir é um fenômeno contábil.

A fórmula com Dilma não deu certo. Deu impeachment.

Além do que, “criatividade” e “capricho” são duas palavras usadas pelos juízes auxiliares do ministro Alexandre de Moraes, que agiam a mando dele, no que já se tornou o maior escândalo da Justiça do país. Bom evitar.

Leia também “Lula chamuscado queima a imagem do Brasil”

4 comentários
  1. COLETTO ASSESSORIA EM SEGURANÇA DO TRABALHO LTDA
    COLETTO ASSESSORIA EM SEGURANÇA DO TRABALHO LTDA

    IMPEACHMENT SEM DUVIDAS !!!

  2. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    É difícil acreditar no IBGE atualmente, sendo comandado por uma figura como Márcio Pochmann.
    E mais, a sanha é tanto de tirar dinheiro do bolso do brasileiro, que a quadrilha PT/STF combinaram para permitir que os bancos repassem todos os dados dos usuários ao governo.

  3. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Tudo que o IBGE diz é mentira

  4. Elias José de Souza
    Elias José de Souza

    Um governo irresponsável, um PIB alto com deficit mais alto ainda só serve para o consorcio de mídia divulgar para seus telespectadores somente o que interessa a eles.

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