Nesta segunda-feira, 2, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), dobrou a aposta na queda de braço com o dono da rede X, Elon Musk. O juiz do STF conseguiu aprovar na Primeira Turma da Corte a decisão, que ele mesmo havia proferido três dias antes, de suspender a rede social no Brasil. O referendo dado por outros quatro ministros alinhados a Moraes ampliou ainda mais a tensão entre a Corte e o empresário sul-africano que começou a aumentar a partir de março deste ano. Segundo o STF, o entendimento de Moraes é correto porque Musk não indicou um representante legal no Brasil. Além disso, o bilionário teria desrespeitado “o Estado Democrático de Direito” ao não tirar do ar a conta de investigados pelo STF.
Em reação, Musk decidiu abrir uma página exclusiva no próprio X para “lançar luz sobre os abusos cometidos por Moraes em face da lei brasileira”. Por isso, desde o início da semana, o perfil batizado de “Alexandre Files” vem divulgando “ordens ilegais contra pessoas censuradas” pelo ministro. Resumidamente, o novo escândalo consiste em um lote de documentos que inclui despachos e ofícios secretos enviados à antiga representação da big tech no Brasil, com ordens imediatas e ameaças de multas abusivas em caso de descumprimento. De acordo com o dono da rede social, sua iniciativa de expor Moraes para o Brasil e para o mundo se deu porque “não há transparência, por parte do STF, e as pessoas na mira do tribunal não dispõem de meios para contestar as medidas”. “Justiça secreta não é justiça”, afirmou Musk. “Entendemos que isso precisa mudar agora.”
Ordens sigilosas e ilegais
A primeira denúncia publicada pelo empresário na conta dedicada a Moraes trata de um ofício, com data de 8 de agosto, assinado pelo ministro do STF. Sem qualquer justificativa, o magistrado dá “duas horas, e em segredo”, para a big tech tirar do ar uma série de contas, entre elas a de figuras conhecidas na internet. Moraes ordenou a queda dos perfis de Mariana Eustáquio (menor de idade), filha do jornalista Oswaldo Eustáquio; Sandra Maria Pedro, mulher de Eustáquio e mãe de Mariana; Josias Lima, um pastor conhecido nas redes sociais; Paola Silva, mulher do ex-deputado federal Daniel Silveira; e de um parlamentar no pleno exercício do mandato, o senador de oposição Marcos do Val (Podemos-ES), crítico do ministro. Todos são apoiadores declarados do ex-presidente Jair Bolsonaro. Além disso, Moraes pediu a quebra do sigilo das contas deles e o envio ao STF de dados pessoais e de uso da rede, sob pena de multa diária de aproximadamente R$ 50 mil.
Os documentos ajudam a explicar alguns fatos que, até recentemente, eram um mistério. Há poucos dias, a família Eustáquio acordou com a Polícia Federal (PF) batendo na porta de sua casa, em Brasília. Agentes levaram celulares de Mariana e de sua mãe e, com um ofício, advertiram ambas de que suas redes sociais deveriam ficar fora do ar, por ordem de Moraes. O mesmo aconteceu com Paola Silva. A mulher foi surpreendida por agentes descaracterizados da PF munidos de uma intimação também assinada pelo ministro do STF. De acordo com o documento, os perfis dela nas redes sociais estavam cancelados a partir daquele momento, assim como o passaporte, que a mulher precisou entregar.
Dez dias depois da primeira ordem, Moraes reiterou o pedido ao X e concentrou a artilharia em Marcos do Val, por críticas ao delegado Fábio Alvarez Shor, da PF. Em uma sequência de posts logo depois de Shor indiciar Bolsonaro no caso das joias sauditas, Marcos do Val resgatou o passado do agente, como o fato de ser próximo a Moraes, sua atuação na Operação Spoofing, que prendeu hackers envolvidos na Vaza Jato, e entrevistas negativas sobre a Lava Jato. Marcos do Val prometeu acionar os meios legais para investigar o delegado, em virtude da atuação dele na PF como “capataz de Moraes”. Para o juiz do STF, no despacho publicado por Musk, a ofensa do senador caracterizou um grave crime e um “ato antidemocrático” contra a instituição. Uma semana antes de acionar o X, Moraes havia determinado, sem muitas explicações, o bloqueio das contas bancárias (inclusive a conta salário) e de outros bens do parlamentar, como carros e afins.
Ainda no ofício, e sem citar provas, o ministro advertiu a big tech para a existência de uma suposta rede de ataques direcionados a delegados da PF. Além de Marcos do Val, um dos membros dessa “milícia digital” seria o jornalista Allan dos Santos, que estaria divulgando fotos, nomes e dados pessoais desses agentes na plataforma de Musk. Em nenhum momento o juiz do STF apresentou evidências das acusações. Moraes viu também a presença de outros “criminosos no esquema”. Por isso, ampliou a lista inicialmente apresentada ao X de envolvidos que teriam de ser tirados da rede, sob alegação de cometimento de “atos antidemocráticos” e uma tentativa de “ruptura do Estado Democrático de Direito”.
Em um novo bloco de denúncias, Musk revelou ordens de Moraes enviadas ao Twitter em 2023 contra outros parlamentares no exercício do mandato. No começo do ano passado, o ministro mandou derrubar as contas do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) e do senador Alan Rick (União Brasil-AC). Há ainda pedidos pelo fim dos perfis do youtuber Monark, que acabou saindo do país com medo de ser preso. Novamente, não há fundamento nos processos. O magistrado lembrou à big tech que as decisões são “sigilosas” e, por isso, não deveriam ser expostas. “A decisão foi proferida em sigilo, violando o artigo 5º, inciso LX, da Constituição, segundo o qual a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social assim exigirem”, constatou Musk no mesmo post da denúncia. “No caso mencionado, não há justificativa para a confidencialidade da decisão.” O empresário apresentou mais quatro ilegalidades de Moraes.
A cada denúncia, Musk anexou uma explicação com base nas leis do Brasil. No entanto, a crítica comum a todas as ordens diz respeito à violação das liberdades de expressão e de imprensa e a trechos do Marco Civil da Internet
Tampouco gente simples escapou da fúria de Moraes. A denúncia mais recente sobre o ministro mostra que o juiz do STF mandou censurar perfis de apoiadores comuns de Bolsonaro, por “posts antidemocráticos”. Os perfis têm poucos seguidores e pertencem a pessoas que não têm qualquer tipo de influência sobre a opinião pública. Os documentos exibidos por Musk revelam que até a PF recebeu uma cópia dos ofícios. Assim como os demais casos expostos pelo bilionário, as ordens de Moraes são vagas, sem explicações e com ameaças explícitas de pesadas multas diárias ao X. Não há, inclusive, justificativas para as investigações contra os alvos sem foro privilegiado.
A cada denúncia, Musk anexou uma explicação com base nas leis do Brasil. No entanto, a crítica comum a todas as ordens diz respeito à violação das liberdades de expressão e de imprensa e a trechos do Marco Civil da Internet (MCI). “O artigo 19 fala que ‘a ordem judicial ao conteúdo ilegal deverá conter, sob pena de nulidade, identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita a localização do material’”, escreveu o dono do X, em alusão ao MCI. Na sequência, o empresário observou ainda que o artigo 220 da Carta Magna estabelece ser “livre a manifestação de pensamento, a criação e a expressão da informação, sob qualquer forma ou processo”.
Samantha Meyer, doutora em Direito Constitucional e integrante da Academia Paulista de Letras Jurídicas, não vê com bons olhos todos esses ofícios secretos. “Tirar o direito de manifestação das pessoas tem um caráter ditatorial, sem sombra de dúvidas”, afirmou a especialista, ao criticar o banimento do X do Brasil. “Foi uma medida desarrazoada, sobretudo pela multa para quem usar a rede por VPN. Ele quer punir pessoas que nem sequer são parte desse processo.”
‘Vaza Toga’
O escândalo “Alexandre Files” se soma a outro ainda mais escabroso, o da “Vaza Toga”. Com base em diálogos vazados de um grupo de WhatsApp praticamente no mesmo período de algumas das ordens divulgadas por Musk, o jornal Folha de S.Paulo revelou que Moraes usou o Tribunal Superior Eleitoral, quando era presidente, para fortalecer inquéritos que ele próprio comanda no STF. Em uma das ordens de seus auxiliares para produzir relatórios com a finalidade de desmonetizar opositores, um deles cita Oeste como parte de um grupo de “revistas golpistas”. Depois de vasculharem o veículo, chegaram à conclusão de que a empresa publica apenas conteúdo jornalístico. Na sequência, vem a ordem: “use a criatividade”.
Na publicação mais recente, a Folha informou que Moraes, em março de 2023, mandou seus auxiliares no STF “endurecerem” com Musk, a fim de obrigar o empresário a cumprir as ordens do ministro. “Prepare relatórios em relação a esses casos e mande para o inquérito das fake news”, disse Moraes a seus juízes. “Vou mandar tirar sob pena de multa.” Até agora, a maioria do STF não viu nada de mais em tudo isso e tem atuado sistematicamente para blindar Moraes das denúncias que surgem diariamente. Sem perceber, o tribunal que ama fazer de conta que é a Suprema Corte dos Estados Unidos fica cada vez mais parecido com um ministro que age fora da lei. Os livros ensinam que a história de ditadores e de seus colaboracionistas nunca termina bem.
P.S.: Os tuítes sobre o ‘Alexandre Files’ foram enviados por uma fonte com acesso ao X no exterior.
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Cada vez mais se igualando ao Supremo da Venezuela!
Que Alexandre de Moraes é um criminoso o mundo todo já sabe.
Minha pergunta é: vai continuar impune?
Impublicável o que vai em minha cabeça. Não pela censura de Moraes mas pela minha educação.
Gostaria de saber como são arbitrados os valores das multas aplicadas pelo Sr Alexandre de Morais. Não me consta que tenha como o código de trânsito algo específico , infração tal multa ” x” . Ele aplicou 22,9 milhões ao PL por litigância de má fé quando contestou a eleição. Agora 50 milhões ao senador Marcos Duval. Tal como Sarney em determinada época mandou caçar bois no pasto ele vai mandar controlar as redes sociais e multar no varejo com 50 mil reais quem usar a rede “X”. Multou o deputado em quase 300 mil e depois cobrou juro e correção monetária. Gostaria de saber qual o critério para o valor na aplicação das multas ou se existe uma tabela própria no STF .
Num dos guichês de embarque de determinado aeroporto na União Européia, o funcionário pergunta ao turista:
-Nacionalidade?
O turista:
-Brazuelano!
Parabéns Cristyan pelo texto. Os demais do colegiado totalmente omissos, apoiando as arbitrariedades desse ditador.
Parabéns Cristyan, por mais um belo artigo, como de costume.
As outras peças do supremo não se levantam contra o Moraes, acredito eu, por temer que a queda dele os levem juntos.
Essa composição atual do STF é a pior possível. Espero que essas desgraças morram logo e nos livrem de sua presença nefasta.
O caminho que o Brasil está seguindo é um dos mais perigosos. Haja visto o que a história descreve sobre um sistema totalitário. Alexandre de Moraes deve estar seguindo ordens do sistema, como podemos averiguar pela tomadas de decisões de nosso ministro da justiça, ou seja, o crime organizado que está dominando todos os setores. Não é atoa que temos como governante um expresidiário, corrupto e ladrão.
Parabéns Cristyan Costa, hoje dia sete de setembro, você tirou uma foto que ficará na história do jornalismo brasileiro, a esplanada dos ministérios vazia.Essa imagem representa o povo brasileiro.
Obrigado, caro Teresa. Forte abraço
Tem que jogar todos no lixo da história. Quadrilha do Satanás esse stf.
Ditadura comunista explícita em curso no Brasil. A Constituição já era.
“Vai dar ruim pra esse careca”. Muito boa matéria.