Em 1957, na capital do Arkansas, sul dos Estados Unidos, nove adolescentes afro-americanos foram impedidos pela Guarda Nacional do Estado de entrar na escola Little Rock Central High School, até então frequentada apenas por brancos, e forçados a retornar a suas casas — em oposição à decisão da Justiça Federal. Os estudantes ficaram conhecidos como Little Rock Nine.
Carlotta Walls LaNier, Elizabeth Eckford, Ernest Green, Gloria Cecilia Ray, Jefferson Thomas, Melba Pattillo Beals, Minnijean Brown, Terrance Roberts e Thelma Mothershed Wair foram cautelosamente selecionados pela direção do colégio para cumprir uma decisão histórica da Suprema Corte dos Estados Unidos de 1954 que declarou inconstitucional a segregação em escolas públicas. O critério se concentrou no rendimento acadêmico elevado, na resiliência para sobreviver às provocações e não revidar às agressões, além da docilidade. Deveriam ser também magros e não chamar muito a atenção, para minimizar a rejeição dos 2 mil estudantes brancos que os afrontariam. Os nove escolhidos se matricularam no ensino médio da Little Rock High School em 4 de setembro de 1957.
Os pais dos nove foram instruídos a não acompanharem os filhos naquele dia 4, pois as autoridades temiam que a presença deles poderia inflamar ainda mais os ânimos. Por isso, os escolhidos agruparam-se na casa de uma ativista dos direitos civis e de lá seguiram juntos para o seu primeiro dia de aula. Elizabeth Eckford, porém, não recebeu o aviso para se encontrar com os demais e acabou encarando sozinha uma multidão de brancos ensandecidos ao chegar a seu destino.
Havia um cordão de isolamento nas principais entradas da escola, feito pela Guarda Nacional do Arkansas sob ordens do governador Orval Faubus, para impedir que os nove entrassem nas instalações. Elizabeth notou que os colegas brancos passavam livremente por esse cordão. Mas, ao tentar fazer o mesmo, foi barrada pelos soldados. A adolescente recuou e, sem correr, foi até o ponto de ônibus mais próximo. Um aglomerado de cidadãos brancos passou a seguir seus passos, proferindo inúmeros xingamentos. “Vamos linchá-la!”, “Dá o fora, macaca”, “Vai pra casa, negona!”. Imediatamente às suas costas vinha um trio de adolescentes, alunas do colégio. Foi nesse instante que a câmera de Will Counts, fotógrafo do Arkansas Democrat, captou a histórica imagem de Hazel Bryan, bem atrás de Elizabeth, vociferando insultos com o rosto distorcido de raiva. Bryan se tornou um símbolo notório do ódio e da intolerância racial. Elizabeth, que manteve a calma, representou a luta por uma sociedade igualitária e bandeira para várias outras gerações não recuarem. A fotografia de Counts foi a mais cotada para o Prêmio Pulitzer de 1958.
Quando o grupo restante chegou, também foi expulso da escola.
O impasse se estendeu por três semanas. Em 24 de setembro, o presidente Dwight Eisenhower emitiu uma proclamação ao povo de Little Rock para “cessar e desistir de interferir nas ordens dos tribunais federais sobre integração escolar”. No dia seguinte, dissolveu a Guarda Nacional do Arkansas e enviou tropas de paraquedistas da 101ª Divisão do Exército para garantir e proteger a entrada e a permanência dos nove alunos negros no Ginásio Central de Little Rock, cumprindo assim a decisão das Cortes Federais.
O dia 25 de setembro marcou o primeiro dia de aula completo dos nove estudantes. Uma van militar ladeada por jipes armados escoltou os alunos até Little Rock, mas não havia autorização para protegê-los durante as aulas. Um perímetro de segurança foi montado ao redor da escola.
Os primeiros dias foram os mais intensos, segundo Jack Damron. Jovem tenente na época, ele fazia parte do comboio que escoltava os Nove de Little Rock na ida e na volta da escola.
“Havia uma expressão de espanto e perplexidade em muitos rostos enquanto nosso comboio passava pela cidade a caminho da Central High School”, disse Damron, mencionando que os moradores ficaram surpresos com a presença militar. “Fiquei honrado em ser escolhido como oficial de escolta dos estudantes”, disse ele. “Foi uma grande responsabilidade e felizmente não houve incidentes ou ameaças contra os estudantes enquanto eles estavam sob minha responsabilidade.”
Mas dentro da escola os Nove de Little Rock enfrentavam constantes insultos e ameaças. Seus armários foram vandalizados, o dever de casa era destruído, e eles passaram por vários outros abusos físicos e verbais. No dia 4 de outubro, o jornal noticiou que 75 estudantes brancos saíram da escola quando os alunos negros entraram.
Melba Pattillo teve ácido jogado em seus olhos e também relembrou em seu livro, Warriors Don’t Cry, um incidente em que um grupo de meninas brancas a prendeu em uma cabine no banheiro feminino e tentou queimá-la atirando pedaços de papel em chamas. Outro estudante, Minnijean Brown, foi confrontado verbalmente e abusado.
O racismo no sul dos Estados Unidos estava de tal maneira arraigado que, quando o ano letivo terminou, os funcionários do sistema público de ensino de Little Rock preferiram fechar a escola — no que foram seguidos por outras escolas do Estado e do sul do país — a permitir o cumprimento da lei que determinava a integração racial.
A luta dos nove estudantes contribuiu para a aprovação de uma nova lei de direitos civis em 1957, que exigia igualdade de tratamento para os negros.
A coragem dos Nove de Little Rock rendeu inúmeras homenagens. O presidente Bill Clinton presenteou cada um, em novembro de 1999, com uma medalha de ouro do Congresso. Em 2005, foram imortalizados em um monumento em tamanho real, projetado e esculpido pelo artista local John Deering. O memorial está localizado no terreno do Capitólio Estadual do Arkansas, em Little Rock.
Daniela Giorno é diretora de arte de Oeste e, a cada edição, seleciona uma imagem relevante na semana. São fotografias esteticamente interessantes, clássicas ou que simplesmente merecem ser vistas, revistas ou conhecidas.
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Amei! Muito interessante!
Muito bom conteúdo.
Não se esqueçam: nessa época o Partido Democrata apoiava a segregação racial.