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Edição 237

Recivilizados

Só as ideologias estatizantes, que sempre são totalitárias, decidem que o Estado é que impõe civilização ao povo

Alexandre Garcia
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Dentro de um ano, estaremos totalmente recivilizados, a valer o que anunciou o presidente do Supremo, ministro Barroso, numa entrevista em jornal. Ironicamente, em países com tradição civilizatória, juízes não dão entrevistas, jamais se vangloriam de vencer eleições, muito menos em convescotes juvenis. A presidente do TSE, ministra do Supremo Cármen Lúcia, acaba de submeter-se a programa de entrevistas na TV e fez manifestações que podem antecipar juízo como, por exemplo, no caso X. Isso já não causa escândalo e é assimilado, sem digerir, como normal. Esquecemos todos de um dos truísmos do Judiciário civilizado: juiz só fala nos autos. Se esquecemos, precisamos sugerir a reinclusão disso, no tal processo de recivilização.

@rodavivatvcultura Cármen Lúcia, presidente do Tribunal Superior Eleitoral e ministra do STF, comenta no Roda Viva sobre as propostas na Câmara que buscam sobrepor decisões do Supremo Tribunal Federal. A ministra afirma que respeita as decisões do Legislativo, desde que não ultrapassem os limites constitucionais que asseguram a autonomia do Judiciário. Confira o programa completo em nossas redes sociais! #RodaViva #TVCultura #CármenLúcia #Eleições2024 ♬ som original – Roda Viva

O presidente do Supremo disse que em um ano haverá total recivilização, pelo que se pode prever um recrudescimento do atual processo de poder supremo sobre os demais Poderes e a própria Constituição. Essa ameaça poderia muito bem estar no livro de Orwell, 1984, que satiriza o que os soviéticos fizeram com os povos sob o seu domínio, recivilizando-os. Pelo que fizeram na pandemia, sem reação da população nem de seus representantes, estão seguros de que podem avançar mais, porque, depois do choque do primeiro dia, as vítimas esquecem e vão cuidar da próxima refeição e do próximo jogo de futebol. 

Como na pandemia, assim nesta eleição municipal. Estamos preparados para receber, sem dúvidas, os resultados deste domingo? Estamos nós seguros de que o que será anunciado pela contagem oficial refletirá a verdade, a realidade dos votos que foram digitados? Ou restarão dúvidas, como restaram nas eleições anteriores? O fato é que não se compreende o processo de apuração, que deveria ser transparente, como indica o artigo 37 da Constituição. Agimos como eleitores que não ligam para o valor do próprio voto. Em países já civilizados não é assim. Nem na Venezuela.

Agimos como eleitores que não ligam para o valor do próprio voto | Foto: Shutterstock

Lá, não foi possível Maduro convencer pessoas e países de que ganhara a eleição, pois o sistema tem fácil consulta digital. Tudo indica que Maduro mandou interromper a contagem quando percebeu que perdia por larga margem, mas tardiamente, já com a apuração em eloquentes 83,5%. O Centro Carter, credenciado pelo Acordo de Barbados que possibilitou a eleição, acaba de apresentar à Organização dos Estados Americanos as atas, com mais de 60% dos votos para Edmundo González. Lá é possível isso, porque existe acesso às apurações. Aqui, precisamos incluir o comprovante do voto no processo de recivilização.

E rumamos para as urnas de novo, mesmo sem comprovante físico ante os mistérios digitais. A falta disso gerou o 8 de janeiro. Seria recivilizatório ter comprovante do voto, como em países civilizados.

Os paulistanos, que vão para uma eleição cuja campanha destoa da importância de São Paulo, têm na bandeira um dístico em latim que diz: “Não sou conduzido, mas conduzo”. Fico me perguntando quanto permitimos que nos conduzam. Na relação entre a nação e seu Estado, é a nação que reciviliza o Estado, se necessário — e não o inverso. São os valores culturais da nação que criam uma civilização, como criaram essa que Sérgio Buarque de Holanda procurou explicar.

Não custa insistir no óbvio: civilização começa na nação, não no Estado. Só as ideologias estatizantes, que sempre são totalitárias, decidem que o Estado é que impõe civilização ao povo. Aqui no Brasil vai deixar de valer também o primeiro artigo da Constituição, se o poder — inclusive o civilizatório — não emanar do povo. Mas também é preciso que o povo queira exercer o seu poder. Talvez julgue ser mais confortável deixar-se conduzir. Pois todo poder emana do povo se o povo souber exercê-lo. É preciso querer ou aprender a conduzir, para não ser conduzido e ser escravo.

São Paulo tem na bandeira um dístico em latim que diz: “Não sou conduzido, mas conduzo” | Foto: Reprodução/SP In Foco

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2 comentários
  1. LUANA MARINHO DE OLIVEIRA
    LUANA MARINHO DE OLIVEIRA

    Como, meu caro Alexandre, como vamos exercer nosso poder. O sistema não permite. Enquanto for assim, estamos perdidos. Voto distrital puro com contagem pública dos votos e recall dos políticos eleitos e confirmação dos mandatos dos juízes. É disso que o Brasil precisa. E nem a velha nem a nova falam disso com a devida urgência.

  2. LUANA MARINHO DE OLIVEIRA
    LUANA MARINHO DE OLIVEIRA

    Como, meu caro Alexandre, como vamos exercer nosso poder. O sistema não permite. Enquanto for assim, estamos perdidos. Voto distrital puro com contagem pública dos votos e recall dos políticos eleitos e confirmação dos mandatos dos juízes. É disso que o Brasil precisa. E nem a velha nem a nova falam disso com a devida urgência.

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