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Edição 245

Declaração dos Direitos Robóticos

Como está cada vez mais escassa a inteligência natural, que venha a artificial para acabar com o drama

Guilherme Fiuza
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Essa angústia em torno do que é ou não é liberdade de expressão, do que é ou não é censura, vai acabar em breve. A inteligência artificial vai resolver tudo. Será a grande saída para a humanidade. Como está cada vez mais escassa a inteligência natural, que venha a artificial para acabar com o drama.

Tudo será simplificado. Acabaram-se os dilemas, as controvérsias, os conflitos. O ser humano se recolherá à sua insignificância e passará a responder a robôs muito mais inteligentes que ele. Essas consciências fluidas e idiossincráticas que andam criando problema por aí, reivindicando autoridade moral (rsrs) e coisas do tipo estão com os dias contados. Vai ficar tudo limpinho e pacificado.

Criticou o sistema? Narrativa antiestatal, conta suspensa. E ponto final. Viu? Nada de debates inúteis e chiadeira tóxica. Onde já se viu criticar o sistema? O sistema é a emanação civilizada da democracia. Onde está escrito isso? Aqui, ora bolas. Na artificialidade inteligentérrima do robô que vos fala.

Quem me programou? Francamente, isso não é pergunta que se faça. Duvidar da inteligência artificial: crime de negacionismo. Além da conta suspensa, acumula-se o cumprimento de um ano ouvindo palestras diárias do Raí em francês. Punição pedagógica para o cidadão pensar duas vezes antes de sair falando do que não sabe.

Ilustração: Shutterstock

Criticou a nova legislação? Narrativa antidemocrática. Lei não se questiona, se cumpre. Punição: ajoelhar no milho plantado pelo MST. Por que não pode ser outro milho? Não interessa, querido. Vai discutir com a inteligência artificial? Se insistir, será enquadrado em assédio ideológico rural: dois anos de podcast do Stédile com o Boulos.

Falou mal das invasões de propriedade alheia e da depredação do patrimônio público e privado? Discurso de ódio: seis meses de aula obrigatória de pacifismo e empatia com Datena e Marçal.

Se ao final do curso não tiver aprendido a dar cadeirada na cabeça dos outros, mais seis meses de punição: uso obrigatório de versão do Waze narrada por Marina Silva, com alertas a cada 100 metros sobre o nível de ansiedade climática. Pode parecer rigor excessivo, mas é para o cidadão arruaceiro pensar duas vezes antes de sair de casa e criar problema para os outros.

Ficou alguma dúvida sobre o que é liberdade de expressão? Então guarde pra você, que ninguém te perguntou nada. Viva a democracia artificial!

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