A redução das emissões de CO₂ em escala planetária só será possível com a maior adoção de energias renováveis e o menor uso de combustíveis fósseis (petróleo, gás e carvão mineral). Na descarbonização da matriz energética e na transição energética, o Brasil é uma liderança pouco conhecida e, muito menos, reconhecida: 49,1% da matriz energética brasileira é renovável.
Matriz energética é o conjunto de fontes de energia para suprir as demandas de eletricidade, aquecimento e transporte. O uso de energias renováveis no Brasil é três vezes superior à média mundial (14,7%). Ou seja, 85% da energia consumida pela humanidade é fóssil e poluente. Se o planeta multiplicar por três o uso de fontes renováveis de energia (solar, biomassa, eólica, hidráulica…), ainda assim não alcançará o Brasil. Quem sabe disso?
Nos países da OCDE, a situação é ainda pior. Sua proporção de energia renovável é inferior à média mundial: 12,6%, segundo a Agência Internacional de Energia. Quase 90% da energia usada nos países desenvolvidos é suja, de origem fóssil (petróleo, gás e carvão mineral), altamente emissora de CO₂ e gases poluentes. E eles ainda pressionam alegremente o Brasil em matéria ambiental.
Em dez anos, o Brasil saiu de 39,7% de energia renovável em sua matriz energética para 49,1%. A cada ano, a matriz energética brasileira se torna mais limpa, graças ao crescimento da energia solar, eólica e, sobretudo, da agroenergia. Há 20 anos, a participação das energias renováveis na Oferta Interna de Energia se manteve em patamar elevado, até o recorde de 2023. Esse esforço será mostrado na 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), a ser realizada em Belém em 2025? Será cobrado o mesmo de outros países? O Brasil pratica, como ninguém, ações para a transição energética pela inserção crescente de novas fontes renováveis em sua matriz energética, sobretudo oriundas da agropecuária, da agroenergia.
A agroenergia é a energia solar transformada em energia química pelas plantas por meio da fotossíntese. Ela fica armazenada nas folhas, sementes, caules e raízes. Quanto mais longo o ciclo temporal, maior a insolação recebida pela planta e maior o acúmulo de energia química. Como em cultivos plurianuais e perenes: cana-de-açúcar, mamona, dendê, mandioca, macaúba, pastagens etc. A agroenergia é sinônimo de cultivos tropicais, cujos ciclos de produção são longos: de 250 a 300 dias e até mais.
No Brasil, mesmo nos grãos (soja, milho, arroz…), a pesquisa agropecuária, com tecnologias inovadoras para as condições tropicais, viabilizou duas colheitas anuais no mesmo local. A soja, por exemplo, é plantada na primavera e, logo em seguida, vem o milho de segunda safra, colhido no outono. Isso amplia a produção de alimentos para humanos e animais (farelo de soja, DDG, fubá…) e de energia (biodiesel de soja e etanol de milho), num “ciclo longo” de produção (de 150 a 180 dias), inédito e virtuoso: duas colheitas de grãos por ano na mesma parcela. Alimento e agroenergia.
Em países temperados, como nos EUA e na Europa, as baixas temperaturas e a pouca insolação no outono e no inverno limitam a atividade fotossintética das plantas de 90 a 120 dias, entre primavera e verão. Uma única colheita por ano de cereais, beterraba, canola… para biocombustíveis, tudo de ciclo curto, é pouco sustentável em termos energéticos.
Em 2023, a agropecuária garantiu 32,7% da matriz energética do Brasil, ou 102,7 milhões de toneladas equivalentes de petróleo (TEP). Por ordem de importância, contribuem com a parte renovável da matriz energética a cana-de-açúcar, ao fornecer etanol para veículos, gás biometano e cogeração de energia elétrica com o bagaço da cana; as florestas energéticas de eucalipto, ao fornecerem lenha e carvão; os óleos vegetais, sobretudo da soja, e o sebo de boi, ao entrarem na composição do biodiesel; os resíduos agrícolas e florestais (licor preto, palha de arroz, cavacos, biogás de dejetos animais…), ao gerarem calor e energia elétrica.
A contribuição da cana-de-açúcar (etanol, biometano e cogeração do bagaço) na matriz energética brasileira em 2023 foi de 16,9%, bem superior aos 12,1% de todas as hidroelétricas no mesmo período! Quando cresce a demanda por açúcar, um alimento, aumenta a produção de bagaço e energia pela cana.
Lenha e carvão vegetal são produzidos por florestas energéticas plantadas, essencialmente eucalipto, e utilizados desde por siderúrgicas de ferro gusa e aço verde, passando por usos industriais e domésticos, até por pizzarias. As siderúrgicas brasileiras Gerdau, Aperam, ArcelorMittal e Vallourec são as maiores consumidoras de carvão vegetal. Maior produtor mundial, o Brasil atingiu 24,2 milhões de metros cúbicos em 2023. Substitutos do carvão mineral, lenha e carvão contribuíram com 8,6% da matriz energética em 2023, o dobro dos aportes das energias eólica (2,6%) e solar (1,7%).
No sistema de transporte, o consumo do etanol combustível cresceu 5,4% em relação a 2022 e atingiu 32,1 bilhões de litros em 2023. Além do etanol da cana-de-açúcar, o de milho não para de crescer e representou 15,8% da produção total, um crescimento de 18,1% em relação a 2022. O uso do etanol ou sua adição à gasolina contribuem na melhoria da qualidade do ar nas aglomerações urbanas.
Outro combustível renovável produzido pela agricultura é o biodiesel. As matérias-primas mais usadas são óleo de soja (80%) e sebo de boi (20%). O Brasil é um dos maiores produtores de biodiesel. Seu consumo crescente é favorecido pela política de adição desse combustível renovável ao diesel fóssil. Seu uso alcança todos os ônibus, caminhões, tratores e outros utilitários. Muitos não se dão conta. Pior: alguns ainda falam contra soja e bois em seus discursos ecológicos!
A Lei Combustível do Futuro ampliou a demanda. Em 2025, o teor de biodiesel será de 15% no diesel e chegará a 25% até 2035. Isso exigirá um volume de óleo de soja 296% superior ao utilizado em 2023. Há 12 anos, a produção de biodiesel era de apenas 2,4 bilhões de litros. Em 2024, foram produzidos 9,3 bilhões de litros de biodiesel. A produção deverá alcançar 12,3 bilhões de litros em 2027. A capacidade de esmagar soja da indústria passará dos atuais 59,8 milhões de toneladas para 72,1 milhões em 2027. O processamento industrial aumentará mais de 11 mil toneladas/dia até 2027.
Em 2023, biodiesel, licor preto e outros subprodutos da biomassa de uso energético representaram 7,2% na matriz energética brasileira. Um valor superior, por exemplo, ao da participação do carvão mineral (4,4%).
A eficiência da agropecuária brasileira na produção de agroenergia é enorme. Para produzir 32,7% da oferta interna de energia, o setor agropecuário consome apenas 5% da matriz energética. Essencialmente em diesel e eletricidade. O consumo de energia da agricultura é inferior ao de qualquer outro setor da economia. Eles não geram quase nada e têm um consumo bem superior ao da agropecuária. O transporte é o maior consumidor de energia: 33% da matriz. A indústria consome 31,8%. Residências alcançam 10,7%, e serviços, 5,1%. Até o setor energético tem um consumo superior ao da agricultura, ao gerar e distribuir energia: 8,8%.
A sociedade brasileira começa a descobrir outra dimensão da agricultura: gerar energia, além de produzir alimentos e fibras. A agricultura e o setor florestal são máquinas movidas a energia solar, a não confundir com a energia fotovoltaica. A agropecuária brasileira na produção e na reciclagem (economia circular) é exemplo de geração de energia limpa, verde e solar.
Com a COP30 no horizonte, enquanto seguem a crise energética e a queda brutal na venda de carros elétricos na Europa, a produção de etanol e biodiesel avança no Brasil com o desenvolvimento de carros híbridos e do hidrogênio verde. E alhures. Dadas as oportunidades das políticas de descarbonização nos EUA, a Eco-Energy, braço norte-americano da Copersucar, a maior comercializadora de etanol do Brasil, ampliou seu programa voluntário de emissão de créditos de carbono (TERC).
Com a COP30 no horizonte, a participação do setor agropecuário na produção de combustíveis limpos de aviação (Revista Oeste, edição 234), o sustainable aviation fuel (SAF) avança. Óleos vegetais, como o de soja, podem ser a base da produção de SAF e de diesel verde (HVO). Esse mercado, estimado em US$ 1,1 bilhão em 2023, deverá chegar a US$ 16,8 bilhões em 2030. No Minnesota (EUA), o investimento de US$ 5 bilhões numa usina de SAF criará centenas de empregos e atenderá a metade da demanda de SAF do Minnesota International Airport. E por aqui?
Com a COP30 no horizonte, quem sabe o Ministério do Meio Ambiente e o Itamaraty possam defender a exploração do petróleo na Margem Equatorial na Amazônia. E explanar como isso serviria para financiar o investimento em uma grande indústria de produção de SAF no Pará e quanto serviria na descarbonização do setor aéreo brasileiro e mundial. Haveria notícia melhor para a Amazônia, o Brasil e o mundo? Pouco provável.
Com a COP30 no horizonte, o país chegará a Belém exibindo seu complexo de vira-lata, com o obscurantismo de ministros de governo, estatais e ONGs ambientalistas? Eles combatem o agro nacional, o tratam de ogronegócio, modelo de morte e impedem o desenvolvimento social e econômico da Amazônia. Ao contrário da agroenergia, essa energia do atraso, negativa e eugenista, precisa ser varrida energicamente do horizonte da COP30 e do Brasil, para o bem de todos e felicidade geral da nação.
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