Em 27 de setembro de 2023, o Congresso Nacional aprovou o projeto que regulamentava o marco temporal das terras indígenas, o qual determinava a demarcação de novos territórios ocupados por esses povos até 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal. Em 25 de outubro daquele ano, o Legislativo decidiu por estender a desoneração da folha salarial a 17 setores da economia. Mais recentemente, em agosto deste ano, as Casas Legislativas tiveram suas emendas parlamentares bloqueadas. Os três casos têm um ponto em comum: a interferência de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de decisões monocráticas, em assuntos que versam às Casas Legislativas.
Com o avanço da intervenção do Judiciário em matérias do Congresso, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, sob a presidência de Carol de Toni (PL-SC), aprovou três projetos que tentam frear o STF: Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 8/2021, das decisões democráticas dos ministros da Corte; PEC nº 28/2024, que permite ao Legislativo suspender uma decisão da Corte que ultrapasse sua competência; Projeto de Lei (PL) nº 4.754/2016, que estabelece a possibilidade de impeachment de ministros do STF que interfiram nas competências do Congresso Nacional; e PL nº 658/2022, o qual determina novos crimes de responsabilidade dos magistrados do Supremo.
Em entrevista a Oeste, Carol de Toni (PL-SC) afirma que vivemos um “regime judicial brasileiro” e, por isso, é necessário “restabelecer o equilíbrio entre os Poderes” com o avanço de pautas que freiem a atuação arbitrária da Suprema Corte. A deputada analisa que o Legislativo precisa defender a sua competência como um Poder da República para garantir a democracia no Brasil.
Carol de Toni, que atualmente é cotada para assumir a liderança da Minoria na Câmara dos Deputados no próximo ano, e um dos principais nomes para concorrer ao Senado por Santa Catarina nas eleições de 2026, também realiza um balanço da sua gestão à frente da CCJ em 2024.
Como foi conciliar o comando da Comissão de Constituição e Justiça com a maternidade, tendo uma recém-nascida?
O maior desafio para uma mãe que trabalha, especialmente à distância, é lidar com a saudade e a culpa. Nesse período, fui mãe de primeira viagem e trouxe minha filha para Brasília com 50 dias, sem saber se conseguiria a presidência da CCJ ou não. No início, tive um pouco de rejeição com a disposição do meu nome, por ser de direita e da oposição do governo Lula. Inicialmente, os deputados de esquerda não queriam meu nome, mas conseguimos vencer essa dificuldade. Foi uma experiência desafiadora. No entanto, consegui superar isso graças ao apoio incondicional da minha família. Ele foi fundamental para que eu conseguisse enfrentar os dois maiores desafios da minha vida, que ocorreram simultaneamente.
Como avalia seu trabalho à frente da CCJ, que teve um ano marcado por avanços em pautas conservadoras?
Avalio de forma bastante positiva, pois tivemos a aprovação de projetos de diversas áreas. Pautamos, por exemplo, importantes propostas contra o movimento criminoso de invasão de terra e enaltecimento da propriedade privada, assim como do agronegócio, que é a grande locomotiva econômica do país. O Brasil é um dos países com maior número de leis protetoras do meio ambiente do mundo, com cerca de 60% do território nacional protegido e, mesmo assim, o agronegócio é visto como um vilão. Sendo que, atualmente, o setor ocupa cerca de 8% do território brasileiro. A minha meta como presidente da comissão foi dar concretude ao artigo 5º da Constituição, que é a base dos direitos constitucionais, protegendo de forma inviolável a vida, a liberdade, a propriedade e a segurança.
Sobre o pacote que busca limitar os poderes do STF, qual é sua importância e como a oposição deve agir para avançar com as propostas no plenário?
É importante esclarecer que o pacote não “freia” o STF, mas busca restabelecer o equilíbrio entre os Poderes. Há anos denunciamos que o Judiciário tem ultrapassado suas competências, interferindo nos outros Poderes. O equilíbrio é essencial para a democracia, e o Legislativo precisa cumprir seu papel de fiscalizar e conter abusos, garantindo a harmonia institucional. Cito como exemplo desses abusos a desoneração da folha de pagamento dos 17 setores da economia, que nós aprovamos no Congresso Nacional. O presidente Lula vetou o projeto, nós derrubamos o veto, e a desoneração deveria estar valendo no país. Mas Lula não ficou satisfeito, peticionou ao STF, e o ministro Cristiano Zanin, por decisão monocrática, obrigou o Congresso a legislar contra a sua vontade sobre um assunto que já tinha sido decidido. Outro caso é o do marco temporal, em que nós estabelecemos, por meio de lei, para não demarcar novas terras indígenas, pois temos 14% do território nacional demarcado. Mais uma vez não gostaram de uma decisão do Congresso, que deveria prevalecer, e o ministro Gilmar Mendes determinou uma mesa de negociação para tentar um acordo sobre os casos em litígio. Então, nós temos a PEC nº 8, de 2021, que já veio do Senado, que estabelece que não se deve, por decisões monocráticas, violar a vontade do Congresso Nacional. A PEC nº 28, de 2024, vai além, ao estabelecer que, caso o Judiciário invada as competências do Congresso e legisle no seu lugar, nós podemos sustar a decisão. Isso é extremamente importante para restabelecer o equilíbrio.
As recentes intervenções do STF em questões legislativas reforçam a necessidade de avançar esse pacote?
Sim, e a omissão dos presidentes das Casas Legislativas em pautar essas propostas só agrava a situação. Se nada for feito, corremos o risco de ver o Congresso Nacional se tornar irrelevante. O Judiciário continuará ultrapassando limites por ausência de regras claras para a atuação de cada um dos Poderes da República. É nossa obrigação, como representantes do povo, garantir que cada Poder atue dentro de sua competência, protegendo a democracia brasileira.
Como o ativismo judicial do STF afeta a democracia?
Em uma democracia séria, o ativismo judicial e a usurpação de competências seriam intoleráveis. Esse protagonismo judicial exacerbado é algo que está, sim, prejudicando a democracia brasileira. Esse protagonismo do Judiciário sobre os demais Poderes desequilibra o sistema e enfraquece nossas instituições. Enquanto esse cenário persistir, não podemos afirmar que vivemos plenamente em uma democracia. Atualmente, nós enfrentamos o que se pode chamar de um “regime judiciário brasileiro”.
A investigação de deputados por discursos na tribuna da Câmara representa perseguição à direita?
Sem dúvida alguma. A perseguição à direita é evidente e vai além dos parlamentares, pois há um esforço constante para silenciar vozes contrárias. Durante o governo Bolsonaro, vimos a esquerda se expressar livremente, muitas vezes de forma leviana, e isso nunca foi questionado. Agora a verdade não pode ser dita. Parlamentares, manifestantes e veículos de comunicação da direita são censurados, multados e perseguidos. Vivemos tempos em que a liberdade de expressão está sob constante ameaça. Esse direito está resguardado apenas para a esquerda.
A regulamentação das redes sociais seria mais uma tentativa de censura?
Com certeza. A esquerda não controla o debate nas redes sociais como faz com a mídia tradicional, e isso expõe suas narrativas. Por isso, busca regulamentar as redes sob o pretexto de combater “fake news”. Sou grande defensora da liberdade de expressão. Tanto que, quando recebo críticas, não processo quem me critica. Entendo que dentro da lei já existem os mecanismos, que são injúria, calúnia e difamação. Se for preciso processar alguém por uma crítica muito árdua ou que se configure uma ameaça, já existem os meios legais para isso no Código Penal. A polícia também tem meios para investigar esses crimes cometidos no ambiente on-line, como a própria quebra de sigilo. Isso não é argumento para censurar e dar poder às agências de checagem, assim como responsabilizar as redes sociais por falas de terceiros. As plataformas são uma grande praça em que as pessoas exercem as suas liberdades e, se houver excesso, podem ser penalizadas pela lei já vigente no país.
A prisão de Walter Braga Netto indica risco de prisão para Bolsonaro?
Esse é o objetivo do sistema. Já tentaram de tudo para incriminar Bolsonaro. Tornaram-no inelegível por uma reunião, não por corrupção ou crime, mas por questionar, algo essencial em uma democracia. Agora buscam criar uma narrativa de “golpe”. Mas que “golpe” é esse? Sem armas, sem organização, sem base. Seguirão tentando criar essa narrativa, mas o povo sabe a verdade.
Qual será o foco da oposição em relação ao PL da Anistia, retirado da CCJ?
Tínhamos uma grande expectativa para aprovar esse projeto no plenário, mas não descansaremos enquanto a justiça não for feita. Trata-se de uma proposta importante para dar liberdade a pessoas que estão sendo injustiçadas. Houve uma pressão grande da direita para pautar o projeto, assim como da esquerda para que a proposta não avançasse. Nós trouxemos o debate à CCJ, mas, infelizmente, o projeto foi retirado. Nós continuaremos trabalhando para que o tema não caia no esquecimento, mobilizando esforços para que avance na comissão especial e no plenário da Câmara dos Deputados.
Como será sua atuação caso se torne líder da Minoria?
Se tiver essa oportunidade, minha atuação seguirá os moldes da CCJ: organização, diálogo e foco em resultados. Buscaremos avançar com tudo nas pautas conservadoras.
Acredita no crescimento do conservadorismo no Parlamento em 2026?
Acredito que teremos um Parlamento ainda mais conservador. O eleitor está mais consciente e sabe que não basta se dizer de direita, é preciso mostrar trabalho e resultados. Em 2018, tivemos pouco mais de 50 deputados eleitos com Bolsonaro. Metade o traiu. Em 2022, foram 99 eleitos pelo PL. Em 2026, temos uma grande oportunidade de formar uma maioria sólida, inclusive no Senado.
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Sou eleitor catarinense e acompanho e admiro o trabalho da Deputada Carol.
Como ela mesma disse na entrevista precisamos avançar na quantidade e principalmente de qualidade de parlamentares comprometidos com o país e seu povo.
Caroline Di Toni é uma das melhores do calabouço parlamentar brasileiro, a coisa é difícil de resolver quando se tem 80% de ladrões no parlamento. Nunca vai viver em harmonia os três poderes porque não se pode mensurar a quantidade de dinheiro roubado, além de uma infinidade de modalidades de roubo. Tem que agir como Bukele e Milei pra tratar com ladrões e economia
A maioria cobservadora no senado será fundamental para conter os avanços inconstitucionais do judiciário
O foco é esse, Senado. Para que ministros da suprema corte sejam alvos do que merecem, serem expulsos.
Carol é corajoso e impõe respeito no comando da CCJ e entendo que poderá ser uma grande liderança para levar parlamentares, empresários, juristas, religiosos, militares e outros representantes da sociedade a EXIGIR a implantação do VOTO IMPRESSO, já devidamente testado e aprovado em Lei, como o APRIMORAMENTO necessário para pacificar o pais.
Excelente entrevista,o Brasil que pensa agradece muito seu sacrifício pessoal, sua coragem e ética Carol de Toni.pessoas como você e alguns outros nós dá esperança de um país melhor.