Vai alguma coisa mudar com a eleição dos novos presidentes da Câmara e do Senado? Não tenho bola de cristal, mas consideremos que o Legislativo é o primeiro dos Poderes, o mais poderoso dos Poderes e o Poder dos que representam a fonte do poder, que é o eleitor/cidadão/pagador de impostos. Com o poder de fazer e revogar leis, de aprovar e destituir ministros do Supremo e até de tirar presidente da República, o Congresso pode quase tudo, menos mudar cláusulas pétreas da Constituição. Assim, seus mandantes, os eleitores e pagadores de impostos, precisam saber que, se seus mandatários não exercem os poderes que têm para corrigir o que está errado e dificulta a vida no Brasil, é porque não querem.
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Nos discursos de vitoriosos, os novos presidentes do Senado e da Câmara revelaram princípios. Alcolumbre disse que vai continuar a defender “a condição de um parlamentar poder viabilizar recursos para levar aos seus municípios”. Deixou claro que continuará sendo um paladino de emendas orçamentárias, embora concorde em debater anistia para os presos do 8 de Janeiro. Hugo Motta ergueu a Constituição, imitando o Doutor Ulysses, e falou em “Câmara forte com garantia de nossas prerrogativas e defesa da imunidade parlamentar”. Isso significa a volta do artigo 53 da Constituição: “Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”. Para deixar qualquer um entusiasmado, não tivesse ele votado pela prisão do deputado Daniel Silveira, por manifestação de opiniões. Os dois são jovens: Alcolumbre tem 47 anos, e Motta, 36. Alcolumbre é senador reeleito e antes chegou à Câmara Federal, em 2003. Já foi o senador mais jovem, assim como Motta foi o deputado mais jovem, com 21 anos. Motta está no seu 15º ano na Câmara; equivale a um doutorado.
A eleição dos dois deixou muita gente ainda mais pessimista com o futuro do Legislativo, que vem se encolhendo há algum tempo. Era mais aguerrido antes do AI-5. Paulistas não entendem como o Astronauta teve quase 11 milhões de votos diretos e, para presidente do Senado, só quatro, enquanto Alcolumbre foi reeleito com menos de 200 mil votos. Não se conformam que, com todo o poder econômico e eleitoral de São Paulo, os presidentes do Legislativo federal sejam do Amapá e da Paraíba. Para entender, teriam que separar a eleição, digamos, primária, das secundárias, em que votam seus representantes, na Câmara e no Senado. Nessas, prepondera a articulação pessoal e partidária, por cargos nas mesas diretoras e nas comissões.
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Outro estranhamento foi o apoio de Bolsonaro a ambos. Quando a oposição concentrou forças em Rogério Marinho para presidente do Senado e ele perdeu para Rodrigo Pacheco, a oposição ficou sem outro poder na Casa além do microfone. Agora o ex-líder do governo Bolsonaro é o substituto do presidente do Senado — o vice-presidente Eduardo Gomes, do PL. Damares ficou com a Comissão de Direitos Humanos; Flávio Bolsonaro, com a de Segurança Pública; Marcos Rogério, que brilhou na CPI do Circo, com Infraestrutura — todos do PL. A importante Comissão de Constituição e Justiça, por onde tudo tem que passar, ficou com o senador Otto Alencar, do PSD de Gilberto Kassab, que é secretário do governador Tarcísio. Otto Alencar foi um inquisidor na CPI do Circo; ortopedista, preferiu ficar com as “verdades” do doutor Fauci.
O PL, pois, ficou com as vice-presidências das duas Casas. Na Câmara, com Altineu Côrtes, do Rio de Janeiro. Para o PT, sobrou a 2ª Vice-Presidência no Senado (Humberto Costa) e a 1ª Secretaria na Câmara (Carlos Veras), ambos de Pernambuco. Lula não deve ter gostado desse conjunto de resultados, pois o poder no Congresso ficou ainda mais distante do Palácio do Planalto. Talvez nem adiante trocar ministros para agradar partidos, e parece que ele está pensando muito antes de tornar realidade o anúncio de reforma ministerial. Como disse o presidente do PSD, Gilberto Kassab, o PT perde protagonismo e, vale dizer, Lula perde ainda mais seu minguado poder, ainda que distribua cargos e libere emendas. É um círculo vicioso onde entram inflação, juros, preços altos, déficit e falas que teimam em não se atualizar com a realidade. E ainda tem Trump e Musk. E essa nova administração na Câmara e no Senado é a dos anos que preparam a sucessão presidencial. O governo Lula diz que são “anos de colheita”. Mas o que foi semeado?
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Como Lula é de palanque, pensa que a solução é a propaganda e contratou marqueteiro. Até agora não deu certo — e a boca de Lula ajuda a não dar certo. É à base de provocar eventos. A entrevista coletiva que chamou uma multidão de repórteres e cinegrafistas, como se fosse o anúncio do Armagedom, já estava vazia dois dias depois. Então veio o boné, como se fosse uma resposta a Trump e seus apoiadores no Brasil. A frase veio do Conselheiro Acácio, que certamente escreveria para o Chega: “Portugal é dos Portugueses”. A direita portuguesa se antecipara a Trump, em campanha contra imigrantes ilegais e avessos à cultura lusa. A esquerda portuguesa chama isso de xenofobia. A esquerda governista preferiu ficar com a frase da direita. E com a cor também. Depois de ceder o verde e amarelo do Brasil, a esquerda trocou o vermelho do boné pelo azul, cor preferida da direita.
A incompetência do governo é geral; ao dobrar o número de ministérios, dobrou a meta de incompetência. Os números da inflação, dos preços, dos juros, da dívida pública aí estão. A perda de poder no Congresso fica maior depois da eleição interna. Lula está em dívida com o Supremo e finge que não fez o juramento de defender a Constituição. Sua aprovação despenca até no Nordeste. E o Brasil ainda tem dois anos pela frente, sem indícios de que não piore ainda mais. Afeta todos os brasileiros. A menos que o Congresso cumpra com os seus deveres.
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