Uma grávida de 27 anos passou mais de 20 horas com o bebê morto no ventre depois de buscar atendimento na rede pública de saúde do Distrito Federal. Gabriela Cezaria dos Santos e o marido, Carlos Nataniel, de 24 anos, apresentaram a queixa na Polícia Civil do Distrito Federal pela demora no atendimento médico.
O caso ocorreu em 14 de maio, mas só ganhou repercussão nos últimos dias depois de denúncia à 33ª Delegacia de Polícia, em Santa Maria, e à Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) — que deve instaurar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar as recentes mortes registradas na saúde do Distrito Federal.
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Gabriela e Carlos esperavam o terceiro filho do casal quando buscaram atendimento no Hospital Regional de Santa Maria (HRSM), da rede pública de saúde do DF. A jovem deu entrada na unidade às 21h30 de 14 de maio, com contrações, sangramento e o tampão rompido. Com a unidade lotada, foi instruída a esperar do lado de fora, enquanto sentia as contrações.
Depois de aguardar mais de três horas no local para atendimento médico, Gabriela e o marido foram instruídos a ir para casa e retornar pela manhã seguinte. Um funcionário do HRSM alegou falta de médicos disponíveis para realização do atendimento.
O casal seguiu a orientação e voltou às 10h para o hospital. Entretanto, durante a triagem, os profissionais de saúde não conseguiram escutar os batimentos cardíacos do bebê. Solicitou-se uma ecografia, que só foi realizada à tarde. O resultado confirmou a morte do bebê.
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Mesmo com o diagnóstico, Gabriela passou a noite e madrugada no corredor do hospital para realizar o procedimento cirúrgico. Em entrevista ao site Metrópoles, relatou que acabou expelindo o corpo do filho já sem vida sozinha.
“No histórico do hospital mostra que eu fui atendida por um médico, o que não aconteceu”, declarou Gabriela. “Proibiram a gente de ficar com telefone. Retiraram o QR code da ouvidoria. Não queriam me dar alta.”
Depois de longa espera na unidade de saúde, Gabriela e Carlos decidiram ir embora para casa. Posteriormente, denunciaram a falta de atendimento e suposta negligência médica.
Oeste procurou o Instituto de Gestão Estratégica de Saúde do Distrito Federal, responsável pela administração do HRSM, assim como a Secretaria de Saúde do DF, que não retornaram o contato.
Outras mortes de crianças na saúde do DF
Desde fevereiro, a Secretaria de Saúde do Distrito Federal contabilizou pelo menos oito mortes que foram denunciadas por suposta negligência médica. Desse total, cinco foram de bebês e crianças (leia todos os casos mais abaixo).
Os casos de mortes estão sob investigação na Polícia Civil. Em 22 de maio, a promotora de Justiça do Distrito Federal e Territórios, Hiza Maria Silva Carpina Lima, abriu um inquérito para investigar possíveis irregularidades na prestação de serviços da Secretaria de Saúde.
Leia os casos de morte na Saúde do DF que são investigados:
- Helena Alves — bebê de 8 meses de idade morreu por causa de complicações da dengue e da covid-19, em 28 de fevereiro; família alega negligência depois de a neném passar por vários hospitais públicos e ser liberada sem tratamento;
- Jefferson Jonathan Oliveira da Silva — o homem de 29 anos morreu em 6 de abril, na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Samambaia, enquanto estava internado em surto psicótico; ele foi encontrado por outro paciente no banheiro da unidade;
- Jasminy Cristina de Paula Santos — neném com 1 mês de vida, que sofreu duas paradas cardíacas e morreu esperando atendimento na UPA do Recanto das Emas, em 14 de abril;
- Enzo Gabriel — menino de 1 ano morreu, também na UPA do Recanto das Emas, depois de esperar mais de 12 horas por uma ambulância, em 14 de maio; tinha sido diagnosticado com pneumonia e derrame pleural, que é o acúmulo de líquido entre os tecidos dos pulmões e do tórax;
- Anna Júlia Rodrigues Galvão — criança de 8 anos, que morreu em 17 de maio no Hospital Materno Infantil de Brasília; antes, passou por quatro unidades de saúde do DF buscando atendimento médico;
- Aurora — recém-nascida com 3 dias de vida que morreu por complicações causadas durante trabalho de parto no Hospital Regional de Taguatinga; a mãe, Isadora Cristina de Sousa, tinha recomendação para cesárea, mas só passou pelo procedimento uma semana depois; denúncia foi feita em 21 de maio;
- Nair Ferreira — idosa de 89 anos morreu, em 27 de maio, uma hora depois de ter recebido alta do Hospital de Base, mesmo com uma fratura no quadril;
- Ivanildes Mendes Pires — mulher de 53 anos morreu depois de receber alta na UPA do Núcleo Bandeirante em 26 de maio, depois de ter sido atendida com quadro grave de pressão alta; família alega negligência pela falta de exames para liberação da mulher.
Saúde do DF deve ser investigada em CPI
As mortes por suposta negligência também devem ser alvo de apuração de deputados distritais da CLDF. O requerimento de abertura da CPI foi apresentado na última segunda-feira, 27, por parlamentares e já alcançou as oito assinaturas necessárias para sua instauração.
Pelas redes sociais, o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), afirmou que desde 2019 — quando iniciou seu primeiro mandato — a área da saúde “tem sido uma pauta prioritária” da gestão.
“Por isso, em cinco anos, investimos mais de R$ 48,4 bilhões para elevar a qualidade dos serviços, com a aquisição de atendimento e a contratação de profissionais qualificados”, disse Rocha. “E vamos continuar trabalhando para que todos tenham acesso a uma saúde de qualidade do Distrito Federal.”
Depois dos casos de mortes de Nair e Ivanildes, o governador se pronunciou novamente no Twitter/X. Usou o espaço para anunciar a contratação de mais profissionais.
“Acabo de autorizar a contratação imediata de 221 técnicos de enfermagem, 122 enfermeiros e mais 149 médicos, totalizando mais de 492 profissionais para a saúde”, afirmou Rocha, na última segunda-feira, 27. “Seguimos firmes, trabalhando por todo o DF.”