Na terça-feira 23, a Universidade de São Paulo (USP) deu um grande passo na biotecnologia com a inauguração de um centro dedicado à criação de suínos geneticamente modificados, destinados à produção de órgãos para transplantes em seres humanos.
Esse laboratório, situado na Cidade Universitária, no Butantã, zona oeste de São Paulo, representa o primeiro empreendimento do tipo em território nacional, segundo informações da própria universidade.
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O espaço, referido pelos pesquisadores como pig facility, é uma peça-chave do projeto Xeno BR. Trata-se de um esforço inovador na América Latina, focado no xenotransplante — procedimento de transplante de órgãos entre diferentes espécies.
O professor Silvano Raia, da Faculdade de Medicina da USP e coordenador do Xeno BR, destacou a relevância do projeto para a saúde pública. Ele mencionou que a alternativa de utilizar órgãos de animais em humanos poderia ajudar a reduzir a longa espera por transplantes no Brasil.
“A importância desse projeto pode ser avaliada sabendo-se que, em 2022, faleceram no Brasil sete inscritos por dia à espera do procedimento”, disse Raia ao portal Metrópoles.
Transplante a partir de órgãos de porcos se tornaram comuns
Um marco significativo nessa área ocorreu em março, em Boston, nos Estados Unidos. Na ocasião, o médico brasileiro Leonardo Riella, do Massachusetts General Hospital, transplantou um rim de porco em um ser humano.
No Brasil, um time de cientistas vem dedicando os últimos seis anos ao aperfeiçoamento da edição genética de embriões suínos, com o objetivo de produção de doadores de órgãos, como rins, corações, pele e córneas.
Os desafios da USP
A professora Mayana Zatz, do Instituto de Biociências e coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano e Células-Tronco (Genoma) da USP, lidera essa frente de pesquisa. Ela explicou ao Metrópoles que as semelhanças entre os órgãos suínos e humanos são conhecidas há décadas, mas a transposição direta resultaria em rejeição imediata.
A clonagem da ovelha Dolly e o mapeamento genético dos suínos, por exemplo, abriram caminho para esse projeto. “Essas descobertas revolucionárias permitiram aceitar esse desafio, o que reforça a importância da pesquisa básica”, ressaltou Mayana.
O sucesso do xenotransplante depende não apenas da manipulação genética, mas também do avanço em campos como a biologia molecular e a imunologia, para garantir que os órgãos modificados sejam aceitos pelo organismo humano.
Mayana detalhou que já foram criados embriões com genes de rejeição aguda silenciados. O próximo passo é implantá-los em fêmeas suínas, que serão mantidas em um ambiente estéril (objetivo principal do recém-inaugurado pig facility).
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