Presidente Donald Trump tem demonstrado insatisfação com a entidade e já ameaçou tirar os EUA dela
Com a saída do brasileiro Roberto Azevêdo, fica mais nítido o impasse pelo qual passa a Organização Mundial do Comércio. Fundada em 1995, a entidade busca se reinventar para continuar tendo relevância no cenário internacional.
Azevêdo deixou o cargo antes de concluir o segundo mandato, que duraria até 31 de agosto de 2021, e assumiu as funções de vice-presidente-executivo e diretor de assuntos corporativos do gigante PepsiCo.
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“Me parece que a saída dele tem inclusive a ver com a frustração dos poucos avanços nos últimos anos, particularmente por conta da postura dos Estados Unidos perante a OMC”, afirma Carlos Gustavo Poggio, professor de Relações Internacionais (RI) da Faap.
A definição do novo diretor-geral da entidade deve levar meses, o que contribui para o clima de incertezas. O principal desafio da organização é o protecionismo, que vem ganhando força devido à pandemia do novo coronavírus.
“A tendência é de um pouco mais de protecionismo em resposta à pandemia e também para poder defender interesses mais locais”, afirma Ricardo Balistiero, economista e coordenador do curso de administração do Instituto Mauá de Tecnologia.
O mais provável é que a OMC fique em stand-by até as eleições norte-americanas, marcadas para 3 de novembro.
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem demonstrado insatisfação com a entidade e já ameaçou sair dela. Em maio, ao comentar a saída de Azevêdo, o republicano foi taxativo: “Para mim, não é um problema, a OMC é horrível”.
“Trump é um crítico da OMC. Na verdade, ele enxerga todo o sistema internacional que os Estados Unidos criaram no pós-Segunda Guerra Mundial como tendo sido montado para tirar vantagem do país”, diz Poggio.
Órgão de apelação
A mais alta corte da Organização Mundial do Comércio está parada desde dezembro do ano passado por falta de juízes.
O governo Trump decidiu bloquear as nomeações para o tribunal e, até a resolução desse impasse, a OMC está sem o poder de fazer valer seus tratados.
“Na prática, o tribunal está paralisado, o que nunca aconteceu e é algo grave. Trump não tem muito interesse na organização e, por essa razão, não nomeia novos juízes, para enfraquecer a OMC”, destaca o professor de RI Carlos Gustavo Poggio.
Protecionismo
Especialistas destacam que a questão do protecionismo é o principal desafio da organização, que foi criada justamente para defender o livre-comércio entre os países.
“Estamos pela primeira vez desde o fim da Segunda Guerra Mundial experimentando uma guerra tarifária”, afirma Poggio.
Em maio, por exemplo, o Ministério da Agriculta brasileiro lançou um documento enfatizando que o comércio internacional de produtos agrícolas pode ser afetado pelo aumento do nacionalismo e protecionismo após a pandemia.
A pasta destaca que, para estimular agroindústrias domésticas, os países podem retornar “a graus elevados de proteção e subsídios quando conveniente”.
Em agosto, os Estados Unidos afirmaram estar tomando medidas adicionais para conter as importações de aço do Brasil e do México em meio às difíceis condições do mercado interno.
Disputas entre Estados Unidos e China
Desde 2018, a disputa comercial entre Estados Unidos e China vem causando preocupações em todo o mundo. Com a pandemia, a situação pode ficar ainda mais delicada.
“A guerra comercial entre Estados Unidos e China passa à margem da OMC, que não tem a menor possibilidade de arbitragem num conflito desse tamanho”, afirma o economista Ricardo Balistiero.