O judoca Messaoud Redouane Dris, da Argélia, deveria disputar a atual edição dos Jogos Olímpicos. Ele, contudo, acabou desclassificado da Olimpíada de Paris sem disputar ao menos uma única luta. A razão para isso está um tanto quanto nebulosa.
Oficialmente, Redouane Dris foi desclassificado por estar acima do peso, mais de 73 kg. Assim, não poderia participar da categoria para a qual havia se classificado para o evento esportivo.
No entanto, há a versão de que problemas relacionados à ordem religiosa e à geopolítica tenham feito com o que o argelino decidisse ficar de fora dos Jogos deste ano. Pelo cruzamento da Olimpíada, ele, islâmico, teria de encarar Tohar Butbul, de Israel, país de maioria judaica.
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Como o Comitê Olímpico Internacional (COI) proíbe manifestações políticas e religiosas, dois especialistas em Direito Esportivo consultados por Oeste sinalizam que o judoca da Argélia, país que não mantém relações diplomáticas com Israel, pode sofrer punições. Isso caso seja confirmada que a recusa da luta se deu por causa da religião ou da nacionalidade do oponente.
“Nenhum tipo de demonstração ou propaganda política, religiosa ou racial é permitido nos locais oficiais das competições”
Mariana Araújo
“A Regra 40 da Carta Olímpica dispõe que todos os competidores e suas equipes têm o seu direito à liberdade de expressão garantido”, afirma Mariana Araújo, advogada especialista em Direito Desportivo e de Entretenimento, ao citar o documento que funciona como um guia em eventos regidos pelo COI. “De todo modo, na Regra 50, que versa sobre a expressão de opiniões de atletas e participantes, consta que nenhum tipo de demonstração ou propaganda política, religiosa ou racial é permitido nos locais oficiais das competições, instalações ou outras áreas relacionadas ao evento.”
Há exceções aceitas pelo COI
O advogado Felipe Crisafulli, sócio do escritório Ambiel Advogados e especialista em Direito Desportivo e Integridade no Esporte, explica que em determinados casos um atleta pode se recusar a participar de uma luta na Olimpíada. Nenhuma dessas exceções se aplica ao caso do judoca argelino, conforme explica.
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“Pode-se deixar de competir por motivos ligados à sua integridade física, como aconteceu, em Paris 2024, com a boxeadora italiana Angela Carini, que abandonou a luta depois de apenas 46 segundos de combate por causa das dores que não mais suportava em seu nariz”, diz Crisafulli. Nesse sentido, o advogado cita o caso em que a outra lutadora era a argelina Imane Khelif, que é intersexual.
O especialista relembra, por exemplo, o caso de Simone Biles. Ouro em Paris 2024 no individual geral de ginástica artística, a norte-americana desistiu de disputar determinadas provas em Tóquio 2020 por problemas de saúde mental. Ela falou em crises de ansiedade e pressão excessiva.
“Esse tipo de conduta vai mesmo na contramão do que prega o esporte”
Felipe Crisafuli
“Agora, quando o atleta se recusa a apertar a mão do adversário ou se nega a participar de prova em decorrência de razões diferentes das que citadas anteriormente, os princípios da Carta Olímpica são postos em causa”, argumenta Crisafulli. “Esse tipo de conduta vai mesmo na contramão do que prega o esporte, em particular o espírito olímpico — ainda mais quando possível comprovar-se que a recusa terá decorrido de um pretexto político, religioso ou racial.”
Argelino sofre punição por conduta na Olimpíada de 2020
A partir das explicações da dupla especialista em Direito Esportivo, Messaoud Redouane Dris deve começar a se preocupar com possíveis punições em razão de ter abandonado a Olimpíada de Paris para não ter de enfrentar um judoca israelense. Ficar de fora de determinadas competições por um certo período e até ser banido dos Jogos Olímpicos são algumas das possibilidades.
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Além do COI, punições podem ocorrer por meio de outras autoridades esportivas, como, por exemplo, a Federação Internacional de Judô. Situação que ocorreu, a saber, com um outro judoca argelino.
Nos Jogos Olímpicos de Tóquio, que ocorreu em 2021 em virtude da pandemia de covid-19, Fethi Nourine deixou o evento esportivo para evitar a luta contra um atleta de Israel. O judoca argelino e o seu então treinador, Amar Benikhle, sofreram punições. A Federação Internacional de Judô retirou a dupla de suas competições pelo período de dez anos.
De acordo com a entidade, Nourine e Benikhle usaram os Jogos “como uma plataforma de protesto e promoção de propaganda política e religiosa”.
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O problema é que o próprio COI não dá bons exemplos vide a abertura das olimpíadas onde a falta de respeito aos cristãos deitou e rolou.