No despacho de 66 páginas no qual sentenciou o ex-assessor da Presidência para Assuntos Internacionais Filipe Martins a dois anos e quatro meses de prisão, por suposto gesto racista, o juiz David Wilson de Abreu Pardo citou a covid-19 e “supremacia branca”.
A decisão menciona o novo coronavírus 14 vezes, enquanto a expressão “supremacista” é citada 20 vezes.
Veja alguns argumentos usados contra Filipe Martins
Em um dos trechos do despacho que fala sobre patógeno, o magistrado escreveu: “Em 24 de março de 2021, durante sessão remota do Senado destinada ao comparecimento do então ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, a fim de discutir temas relativos à pandemia de covid-19, causada pelo novo coronavírus, Martins, com vontade livre e consciente, praticou, induziu e incitou a discriminação e o preconceito de raça, cor e etnia, em detrimento da população negra em geral e contra outros grupos sociais não brancos, como pardos, asiáticos e indígenas, mediante a realização de gesto apropriado por movimentos extremistas com simbologia ligada à ideia de supremacia branca”.
Ainda sobre a covid-19: “Em ações originárias propostas contra a União, alegando-se que o ente central tinha interrompido o custeio de leitos de UTI para pacientes de covid-19 e demorava em responder às demandas para a habilitação de novos leitos, houve concessão da tutela jurisdicional em sede liminar. Na ACO 3473, a relatora, ministra Rosa Weber, chegou a escrever que “o discurso negacionista é um desserviço para a tutela da saúde pública nacional”. E na ACO 3483, que o “cenário de incompreensível recusa da União em assumir o protagonismo da coordenação da ação dos Estados e Municípios no enfrentamento conjunto da pandemia da COVID-19 sofre, agora, o agravamento decorrente da redução dos investimentos federais no financiamento dos leitos de UTI”.
A respeito da “supremacia branca”, Pardo sustentou ainda: “Assim, ciente de que seu ato teria ampla divulgação, tendo em vista que a sessão era transmitida ao vivo pela TV Senado, além de estar sendo acompanhada com muito interesse por diversos veículos de imprensa, Martins, em certo momento, enquanto o presidente do Senado fazia uso da palavra, efetuou, por duas vezes, com a mão direita, gesto de mão popularmente conhecido como sinal de “ok” — o referido gesto pode ser descrito como a união do polegar ao indicador e a extensão dos outros três dedos —, mas que nos últimos anos foi apropriado por grupos extremistas brancos, para identificar seus apoiadores e simbolizar a supremacia da raça branca sobre as demais. O gesto realizado pelo denunciado, por duas vezes, em momentos distintos, buscou reproduzir as letras ‘W’ e ‘P’, em referência à expressão ‘White Power’ (‘Poder Branco’, em inglês)”.
O magistrado escreveu ainda no que diz respeito à supremacia: “Logicamente, seguindo as premissas fixadas justificadamente ao longo da sentença, a prática intencional de discriminação e de preconceito de raça, cor ou etnia, mediante a realização de gesto apropriado por movimentos extremistas com uma simbologia ligada à ideia de supremacia branca. A motivação diversionista requer a intenção, o desígnio consciente de, por meio do gesto, com o sentido utilizado, difundir ideia discriminatória e de incitar a discriminação de raça. É dizer, a motivação diversionista pressupõe que o meio empregado seja ofensivo ao
bem jurídico protegido penalmente, pois senão não seria eficaz a tentativa de desviar a atenção”.
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Se quiserem socorrê-lo, poderiam internar o juiz David Wilson de Abreu Pardo imediatamente num hospital psiquiátrico. Talvez ainda tenha como ajudá-lo.
De for verdade, ter sido preso por um gesto de arrumar a gravata, só confirma a falência do judiciário.