Em entrevista coletiva em Brasília, o presidente Lula, como sempre extremamente preocupado em posicionar o Brasil como liderança em pautas internacionais que estamos completamente despreparados para coordenar, sinalizou seu propósito de reunir mandatários do mundo inteiro para discutir estratégias. O objetivo: reagir ao avanço global da “extrema direita”.
Nunca neguei a existência de movimentos populistas hostis às esquerdas ou, por outra, de forças reacionárias que efetivamente pouco ou nada têm a ver com o liberalismo. A esquerda não é o único inimigo ou adversário dos liberais e da liberdade. Porém, o que acontece, de fato, aqui e acolá, é que integrantes de uma esquerda e um progressismo engravatado, histéricos e sequiosos de calar todos aqueles que não comungam de seus valores deturpados, acreditam que, quando seus críticos vencem eleições, significa que a democracia acabou.
Ao dizer que é preciso reagir aos triunfos da “extrema direita e seus matizes”, Lula conclama a que participem desse esforço os presidentes “de esquerda, progressistas, democráticos” — ou seja, são democráticos apenas os esquerdistas. Não seria essa afirmação uma explícita demonstração de extremismo? O ponto mais interessante nisso tudo, porém, é que Lula ainda afirmou, para justificar seu senso de urgência diante do que considera um grave e excepcional problema: “Os Estados Unidos, que eram o espelho da democracia, da coisa em ordem, do respeito às instituições, estão do jeito que estão. Então, eu acho que nós estamos vivendo um novo período.”
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Logo os Estados Unidos, para Lula, eram um exemplo de democracia e ordem? Um país em que conservadores e “direitistas” em geral disputam e vencem eleições majoritárias diversas vezes? É decepcionante da parte de Lula que, na hora de dar testemunho de suas ideias brilhantes, ele prefira se afastar de suas amadas democracias relativas e recorrer ao modelo do imperialismo ianque…
As estratégias que o Brasil deveria estar discutindo são as que se fariam necessárias para frear o autoritarismo judiciário. Esse é o imediato e genuíno interesse nacional. É esse autoritarismo que hoje, em nosso país, avilta instituições — o Legislativo, o Estado de Direito, a liberdade constitucional de expressão e associação — e nos distancia da “coisa em ordem” para nos mergulhar no caos jurídico. Deveríamos considerar o imperativo de consertar isso antes de pretendermos salvar o mundo. O Brasil não está subjugado por uma “extrema direita”. Ele está subjugado por uma “extrema juristocracia”. Elon Musk e a Câmara dos Estados Unidos, juntamente com a imprensa internacional, ajudaram a demonstrar esse conceito contraintuitivo, porém lamentavelmente legítimo, ao público estrangeiro. Precisamos agora fazer a nossa parte.
A ameaçadora “extrema direita” temida por Lula, porém, não parece tão disposta a fazer o necessário sequer para efetivar esse enfrentamento. O senador Flávio Bolsonaro, filho do ex-presidente que supostamente lidera essa terrível “extrema direita fascista” no Brasil, disse em Copacabana, no último dia 21, em cima de um carro de som, que Alexandre de Moraes “interferiu nas eleições de uma forma totalmente parcial. Ele desequilibrou a livre concorrência nas eleições para beneficiar o Lula. Infelizmente, essa é a realidade. (…) Há uma perseguição implacável por um ministro apenas, que a gente lamenta”.
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A gente lamenta; porém, como enfrentar esse problema? De acordo com a Constituição brasileira, as soluções passariam por um Legislativo que tivesse um pingo de pudor e virilidade e tomasse uma atitude contra o arbítrio judiciário. Mas o que disse o mesmo Flávio Bolsonaro pouco antes, no último dia 8, em rede nacional? Que é contra impeachment de ministros do SFT e prefere o “caminho do diálogo”. “Diálogo” resolve o problema de um ministro que persegue pessoas e interfere em processos eleitorais? Acho que não. A juristocracia permanece e, por conveniências diversas, aqueles a quem compete fazer alguma coisa não a querem discutir.
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