Acordo firmado pela Petrobras devolve dinheiro desviado pela corrupção aos cofres públicos brasileiros
(*) Por Thaméa Danelon Valiengo
Diante das constatadas fraudes licitatórias, corrupção e desvios bilionários de verbas públicas ocorridos na Petrobras, a empresa sofreu investigação nos Estados Unidos, dado que comercializa suas ações na Bolsa de Nova York. A companhia entendeu que o melhor caminho era colaborar com a apuração estrangeira, com o propósito de reduzir eventual multa que viesse a ser aplicada, e forneceu todas as informações e documentos necessários para a elucidação do caso.
As apurações das autoridades americanas foram respaldadas pelo FCPA (Foreign Corrupt Practices Acts), legislação anti-corrupção referente a pessoas jurídicas em vigor desde 1977 nos EUA. As provas reunidas resultaram na celebração de acordo entre a Petrobras e a SEC (Securities and Exchange Commission) órgão do Departamento de Justiça Americano (DOJ) semelhante à nossa CVM (Comissão de Valores Mobiliários).
No curso da celebração do acordo, os procuradores da Lava Jato em Curitiba solicitaram à SEC/DOJ que grande parte das multas aplicadas à Petrobras fosse destinada à sociedade brasileira — alvo do maior dano causado pela corrupção. Após longa negociação, o governo norte-americano concordou que 80% dos recursos pudessem ser pagos em um acordo com autoridades brasileiras.
Assim, foi realizado um acordo entre a força tarefa do MPF e a Petrobras — homologado pela 13ª Vara Federal Criminal em Curitiba. Estabeleceu-se que a Petrobras teria o compromisso de manter um conjunto de medidas com vistas a evitar novos crimes, aprimorando seus controles internos, bem como de depositar em juízo o valor de US$ 682.560.000,00 convertidos em reais. A importância corresponde a 80% do valor das multas estabelecidas nos acordos com as autoridades norte-americanas. Assim, a quantia de cerca de R$ 2,5 bilhões foi depositada em conta judicial perante a 13ª Vara Criminal de Curitiba.
Segundo o acordo, metade do valor seria destinado aos acionistas minoritários da Petrobras, que foram lesados com os escândalos de corrupção. Os outros 50% constituiriam um fundo patrimonial (endowment), administrado por fundação de interesse público a ser constituída.
Entretanto, enquanto estavam sendo estudadas as possibilidades de constituição de referida fundação, a então Procuradora-Geral da República (PGR), em março de 2019, ajuizou uma ação junto ao Supremo Tribunal Federal. A PGR entendeu que o dinheiro não poderia ser destinados pela Lava Jato e pediu a anulação da decisão judicial que homologou o acordo entre a Força Tarefa e a Petrobras.
O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, acolheu o requerimento da PGR, sob argumento de que os membros do MPF da Força Tarefa não teriam atribuição para fixar e destinar receitas públicas — uma competência do Congresso Nacional. Por fim, o ministro determinou a suspensão dos efeitos da decisão do Juízo da 13ª Vara Criminal Federal, com consequente bloqueio dos valores e encaminhamento destes a conta judicial vinculada ao STF, para que, futuramente, fossem destinados à educação.
Contudo, no segundo semestre de 2019, parte desse dinheiro, R$ 1 bilhão, foi destinado pelo STF ao combate de incêndios na Amazônia. A medida obteve a concordância do Congresso Nacional, do Planalto e do MPF.
Como até o presente momento a quantia restante não havia sido aplicada na causa educacional, e diante da emergência causada pelo coronavírus, o atual Procurador-Geral da República, Augusto Aras, requereu ao STF que os valores obtidos fossem destinados ao combate à covid-19.
O pedido foi acolhido pelo ministro Alexandre de Moraes. A decisão do Supremo determinou que o valor de 1.6 bilhão de reais fosse destinado ao Ministério da Saúde para o custeio de ações de prevenção, contenção, combate e mitigação à pandemia do coronavírus.
O dinheiro desviado pela corrupção de quem mais precisa, inclusive da saúde, está retornando para o local de onde nunca deveria ter saído. O propósito do combate à corrupção é melhorar e salvar vidas. É emblemático que os recursos sejam empregados, neste momento tão difícil pelo qual passamos, justamente com esse propósito.
(*) Thaméa Danelon Valiengo é procuradora Regional da República em Porto Alegre (RS), integrante do Ministério Público Federal desde dezembro de 1999 e ex-coordenadora do Núcleo de Combate à Corrupção em São Paulo (SP). Também integrou a equipe da Operação Lava Jato em São Paulo. É mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Escola Superior do Ministério Público de São Paulo (ESMPSP); professora de Direito Processual Penal e palestrante.
Eu só queria saber se os valores arrecadados pela lava-jato e que serão repassados para a Saúde teve a autorização do Gilmar Mendes.
Não vi ainda um empenho dos Três Poderes em reduzir despesas não essenciais e Salários das autoridades.