(J.R. Guzzo, publicado no jornal Gazeta do Povo em 12 de maio de 2022)
A cada dia que passa, e a cada exame que se faz da situação com um grau mínimo de seriedade, vêm à luz do sol os efeitos ruinosos da mais secreta de todas as tragédias sociais que este país já teve em sua história moderna: o fechamento, por quase dois anos seguidos, das escolas, sobretudo as voltadas ao ensino público. Poucos desvarios terão um preço tão alto para o Brasil quanto esse crime legal, praticado por governadores e por prefeitos nos tempos da covid — com a licença, o incentivo e a bênção do Supremo Tribunal Federal. Roubou-se das crianças brasileiras, para toda a vida, dois anos de aprendizado, e esse roubo não pode ser ressarcido; não há seguro para tal tipo de perda. As vítimas sofrerão por causa disso, no seu dia a dia prático, até o fim das suas vidas.
Ficou combinado na mídia, na vida política e nas classes intelectuais que não se fala dessa tragédia — o que permite, naturalmente, que os responsáveis por ela não se sintam incomodados com o desastre que criaram. Ao contrário: quando tocam hoje no assunto, para denunciar “o descalabro da educação no governo Bolsonaro”, falam como se não tivessem nada a ver com a catástrofe que está aí. É a hipocrisia levada aos seus extremos. A esquerda, mais que ninguém, esteve no comando do fechamento das escolas; foi a grande fornecedora da ideologia que sustentou essa calamidade, e agiu assim unicamente porque o presidente da República estava do outro lado. Agora, com a casa no chão, vem fazer de conta que está preocupada com o problema.
A esquerda, que não fala em outra coisa a não ser na eliminação da pobreza no Brasil — prometida, mais uma vez, para o próximo governo Lula — agiu, como de costume, a favor da perpetuação das suas causas. É absolutamente simples: ignorância é miséria. Quando se leva em conta que o começo, o meio e o fim do problema social do Brasil estão no baixo nível da educação pública, que priva a população pobre da única saída real para a pobreza — a aquisição de conhecimento —, fica evidente o tamanho da agressão social contra os pobres que foi feita com o fechamento das escolas. Os pobres não saem da pobreza com “políticas sociais”. Só têm alguma chance de melhorar de vida quando adquirem conhecimentos que lhes deem a oportunidade de subir no mercado de trabalho. Perder dois anos de escola foi o que se podia fazer de mais eficaz para reduzir essas oportunidades e detonar o futuro dos que mais estão precisando delas.
Adversários ferozes da volta às aulas, na ânsia de ficar ao lado dos professores-sindicalistas-grevistas e contra o “genocídio” do governo, dizem hoje que lutaram pela “volta segura” às salas de aula. É mentira. Lutaram, na vida real, para manter as escolas fechadas pelo período de tempo mais longo possível, porque achavam que isso era fazer oposição — quanto mais tarde as aulas voltassem, tanto maior seria o prejuízo político do governo. Na verdade, os fechadores de classes ficam piores com a proximidade das eleições. Prometem agora, e como sempre, “mais investimentos para a educação” — seu candidato, aliás, diz que vai acabar com a obrigação de respeitar o teto de gastos públicos para “investir” em escolas que, até outro dia, seu partido exigia que estivessem fechadas. A tragédia continua do mesmo tamanho, com viés de piora.