(J.R. Guzzo, publicado no jornal Gazeta do Povo em 13 de dezembro de 2021)
Sempre se pode confiar em Lula, com 100% de certeza, para assumir o lado errado em qualquer questão que venha para o debate público. É tiro e queda. Se Lula fica contra, é coisa boa. Se fica a favor, é coisa ruim. Não tem erro: ele é assim por instinto, ou por um impulso vital que o leva a tomar automaticamente, entre todas as decisões disponíveis, sempre a pior possível.
Acaba de acontecer de novo, com o seu pedido, embarcado numa “carta” de “lideranças de esquerda”, em favor da libertação do hacker australiano Julian Assange — hacker ou usuário de crimes cometidos por hackers, o que acaba dando na mesma. Assange está no palco desde 2010, quando divulgou dados digitais roubados do governo americano; nesse período tornou-se um herói da esquerda mundial, e seus problemas com a Justiça internacional ganharam o selo de causa “democrática e popular”.
Não é só Lula, na verdade, que entrou no bonde de Assange. Ele está na companhia da esquerda “latino-americana” em geral — gente da estatura, por exemplo, de uma Dilma Rousseff, que também acaba de se descobrir como defensora de Assange. O que poderia haver de pior que isso?
Pouco, ou nada, mas Lula conseguiu dobrar a própria aposta nesta história — está no bloco dos que são a favor, vejam só, de dar um Prêmio Nobel ao hacker.
O mais extraordinário nesse caso é o argumento central dos que assinam a carta: a defesa do “direito humano à liberdade de expressão e de informação”. Como assim? Todos eles, com Lula na frente, são inimigos extremados da liberdade de expressão. Lula promete, inclusive, impor o “controle social dos meios de comunicação” se for eleito. Ou seja: quer uma imprensa que só publique aquilo que ele e a esquerda aprovarem.
É sensacional, também, que Lula e os companheiros exijam que Assange não seja extraditado para os Estados Unidos, onde terá de responder por seus crimes perante a Justiça — e, exatamente ao mesmo tempo, exijam a extradição do jornalista Allan dos Santos dos Estados Unidos para o Brasil. Allan é um exilado político: deixou o seu país para não ser preso no inquérito ilegal do STF contra “atos antidemocráticos”. Ele não “hackeou” nada, nem ninguém. Apenas fala mal do Supremo e se coloca a favor do presidente da República. Mas liberdade de expressão, para Lula e a turma da carta, é algo que só deve ser aplicado em favor de gente como Julian Assange. Para Allan dos Santos eles querem cadeia.
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