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Jason Miller | Foto: Shutterstock
Edição 122

Big techs farão com Bolsonaro o que fizeram com Trump’

Fundador da Gettr, Jason Miller comentou a censura nas redes sociais, criticou a imprensa tradicional e disse que há um apelo global pela liberdade de expressão

Cristyan Costa
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Nascido em Seattle, o empresário Jason Miller atua na política desde os anos 1990. Ele ganhou fama em virtude de suas boas técnicas de comunicação. Nos anos 2000, por exemplo, Miller ajudou o então deputado Rick Keller a garantir a reeleição na Câmara. Em 2004, apoiando o empresário Jack Ryan para o Senado, conseguiu fazê-lo vencer uma disputa acirrada pela indicação do Partido Republicano. Não fosse a desistência precoce de Ryan, Miller acredita que o candidato teria vencido o rival Barack Obama à época. A partir daí, tornou-se um respeitado consultor político e estrategista hábil.

Miller ganhou notoriedade em 2016, graças à campanha bem-sucedida do então candidato Donald Trump à Presidência, de quem foi porta-voz até 2021. Em junho daquele ano, o estrategista de comunicação do republicado decidiu lançar a plataforma Gettr, para fazer frente à tirania das big techs. Seu lema é: “Uma rede social baseada na liberdade de expressão e que rejeita a censura política e a cultura do cancelamento”.

Em entrevista à Revista Oeste, Miller declarou que o Twitter pode repetir com o presidente Jair Bolsonaro o que fez com Donald Trump em 2020. “O correto a fazer é descentralizar os meios de comunicação e usar as plataformas que estão ao alcance”, recomendou a Bolsonaro, na mais recente visita que fez ao Brasil, no ano passado.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Como nasceu a Gettr?

A Gettr surgiu como resultado de uma discriminação política nos Estados Unidos em 2020, que não se restringiu apenas ao caso do laptop de Hunter Biden [o Twitter censurou o perfil do jornal New York Post por publicar uma reportagem sobre o filho do então candidato Joe Biden]. Qualquer pessoa que ousou dizer algo “fora do script”, como a possibilidade de o novo coronavírus ter vindo de um laboratório em Wuhan, por exemplo, sofreu com isso. Há dois anos, testemunhamos as big techs, e seus aliados da grande mídia, conspirando para silenciar a liberdade de expressão nos EUA. Com o tempo, vimos que esse não era um problema apenas dos norte-americanos, mas, sim, do mundo todo, inclusive do Brasil, do Reino Unido, da França e de outras democracias. Percebemos que há um clamor global por liberdade de expressão. Foi aí que surgiu a Gettr.

De que modo o senhor vê as big techs e qual deveria ser o papel delas?

A Seção 230 da Lei das Comunicações, desconhecida por muitos norte-americanos, precisa de uma reforma. Aprovada em 1996, esse dispositivo assegura algumas imunidades e determina que as plataformas digitais não são responsáveis pelo conteúdo de terceiros postado nelas, desde que esse material não seja ilegal. As big techs, contudo, estão usando a Seção 230 para cometer abusos, ao permitir que apenas uma ideologia fale, enquanto censura outras, por meio de “mecanismos de moderação”. Só porque uma opinião política “não é popular” não significa que ela seja ilegal ou prejudicial a alguém. Quando se trata de debate e liberdade de expressão, as big techs não devem escolher os “perdedores e os vencedores”. A Gettr é contra conteúdos ilegais e violentos, mas entende que todos têm o direito de falar.

O senhor avalia que há censura nas redes sociais?

Com certeza, sobretudo no Twitter, no Facebook, no TikTok e no Instagram. Essas plataformas usam a política da discriminação e da censura para calar pontos de vista de que elas discordam. Em linhas gerais, é isso. Inicialmente, as big techs tinham o objetivo de integrar as pessoas de diferentes partes do mundo. Em determinado momento, porém, isso mudou para um “queremos apenas reunir pessoas que pensam como nós”. O grande pivô foram as eleições de 2016, quando os setores de esquerda da mídia e da sociedade culparam o Twitter e o Facebook por “elegerem” o ex-presidente Donald Trump. Eles perceberam que os candidatos não tradicionais tinham mais chances de vencer por meio das redes sociais do que pela velha imprensa. Decidiu-se, então, pôr um basta nisso.

Qual o diferencial da Gettr para as demais redes sociais, incluindo as conservadoras, como a Parler, e quais os principais desafios da plataforma para crescer?

Somos mais competitivos, porque estamos tanto na Apple Store quanto na Google Play. Além disso, juntamos o que há de melhor nas outras redes sociais, como a timeline e as livestreams [transmissões ao vivo] do Twitter e do Facebook. Recentemente, incluímos uma ferramenta chamada Voice, que permite ao usuário publicar vídeos curtos, como no Instagram e no TikTok. Então, tudo o que o usuário da Gettr precisa está lá, na palma da mão: a linha do tempo com os últimos posts, transmissões de conteúdo ao vivo e 24 horas por dia (em breve, teremos mais conteúdo em português) e vídeos curtos, que os jovens gostam.

É impossível falar em redes sociais e não mencionar a cultura do cancelamento. O que ela é para o senhor?

A cultura do cancelamento é quando as big techs e a imprensa decidem excluir para sempre de suas plataformas alguém cuja opinião não é “popular” para esses gigantes da tecnologia. A prática não se restringe a políticos ou militantes partidários. O comediante David Chappelle é um exemplo disso. Sem sucesso, tentaram cancelá-lo por causa de suas piadas sobre a comunidade trans. Isso sem falar no cerco ao comediante Rick Gervais ou à cantora Nicky Minaj, que falou sobre possíveis efeitos colaterais das vacinas contra a covid-19 e foi suspensa do Instagram. Não é algo exclusivamente voltado ao Partido Republicano ou do presidente Jair Bolsonaro. O que a cultura do cancelamento está fazendo é eliminar pessoas das redes e tornar suas vozes radiativas, porque não se enquadram na cultura das big techs. Fico imaginando a quantidade de pessoas nas empresas e até na mídia que acabam cedendo ao autoritarismo, por medo de ser canceladas pelos demais.

Quando se tem um presidente fraco na Casa Branca, o Partido Comunista da China e a Rússia se sentem empoderados e tomam decisões agressivas, como invadir a Ucrânia

Qual a sua avaliação sobre a imprensa tradicional norte-americana e as agências de checagem?

É impossível que um ser humano seja politicamente imparcial. Todos têm opiniões, mesmo aqueles eleitores independentes, que não se alinham a partidos. Por isso, seria tolice dizer que os checadores de fatos são um grupo redimido e puro. O que estavam fazendo os checadores de fatos quando a imprensa publicou sobre o suposto conluio entre Trump e a Rússia em 2017 e 2020? Mais tarde, provou-se que essa história não era verdade. Em janeiro de 2020, Anthony Fauci garantiu que a covid-19 não seria tão grave assim. Um mês depois, esse mesmo cientista pediu para não usarmos máscaras. Na sequência, recomendou utilizarmos mais de uma máscara. Qual dos dois Anthony Fauci está correto e qual deles tem de ser checado?

Como o senhor viu a reação do establishment diante da possibilidade de Elon Musk comprar o Twitter?

Nunca achei que Musk conseguiria comprar o Twitter, principalmente porque os termos do contrato eram muito ruins. Ainda que Musk conseguisse adquirir a empresa, o Twitter não permitiria que ele fizesse muitas mudanças. Os funcionários estavam tão preocupados com seus empregos que começaram a sabotar a negociação logo no início. Vimos ainda os horríveis ataques pessoais ao empresário, com vazamento de áudios ofensivos e vídeos de empregados tirando sarro de Musk. Repentinamente, ele se tornou um “monstro da direita” para essas pessoas, ainda que nunca tenha votado em republicanos.

O senhor acha que a desistência de adquirir a empresa foi uma jogada?

Acredito que ele não desistiu de comprar o Twitter por causa da quantidade de “perfis falsos” que a companhia se recusou a mostrar. Ao olhar para a estrutura de monetização da plataforma, Musk percebeu que teria de quadruplicar o número de usuários ativos diários. Isso é muito difícil, tendo em vista a ideia original de comprar o Twitter: ter de volta os eleitores do presidente Trump. Ele perderia pessoas do outro lado. Penso que Musk entendeu que não conseguiria monetizar a plataforma como pretendia no começo. Além disso, a cultura do Twitter não pode ser mudada. Por isso, precisamos cada vez mais de novas plataformas.

Em 2021, o senhor foi detido pela Polícia Federal a pedido do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Por que o senhor acha que isso ocorreu?

Foi um ato político voltado a atingir o presidente Jair Bolsonaro. Lembro-me de estar no Aeroporto de Brasília, depois de participar do CPAC Brasil, quando fui preso pela Polícia Federal. Perguntei por que havia sido preso. Eles responderam que eu estava sendo investigado em duas “apurações secretas” do STF. Interpelei o que seria isso e me disseram que, como era tudo sigiloso, não poderiam me dizer. Então, pediram para eu assinar um documento de mais ou menos sete páginas e, depois disso, estaria liberado. A papelada estava em português, idioma o qual eu não falo. Foi claramente uma tentativa de intimidar alguém que eles enxergam como aliado do presidente Bolsonaro. O que ocorreu é fruto da politização da Suprema Corte. Ressalto algo bem importante: na Gettr, não tomamos lado em campanhas eleitorais. Queremos gente da esquerda, da direita e aqueles que não estão nem aí para política.

O presidente Joe Biden completou pouco mais de um ano na Casa Branca. Como está sendo o governo dele?

Biden tem sido nada menos que uma vergonha, não apenas para a América, mas também para outras democracias. Penso que, quando se tem um presidente fraco na Casa Branca, o Partido Comunista da China e a Rússia se sentem empoderados e tomam decisões agressivas, como invadir a Ucrânia ou ameaçar uma investida contra Taiwan. Espero que possamos tirar Biden da Presidência em 2024, e é o que deve ocorrer.

Estamos em ano eleitoral aqui no Brasil. É possível que o Twitter repita com o presidente Jair Bolsonaro o que fez com Donald Trump em 2020?

Quando estive com Bolsonaro, falei para ele procurar alternativas em outras plataformas. Não é uma questão de “se”, mas de “quando” as big techs irão atrás dele. Pode ser meses antes das eleições ou uma semana. O correto a fazer é descentralizar os meios de comunicação e usar as plataformas que estão ao alcance. Falo isso para qualquer político. Precisa-se obter vantagem usando diversos meios. Se você colocar todos os ovos em apenas um ninho, vai acabar igual ao presidente Trump e ser excluído. Ou eles decidem tirar de circulação uma história, como a do laptop de Hunter Biden.

Leia também “O Brasil valoriza pouco os heróis nacionais”

9 comentários
  1. Jenielson Sousa Lopes
    Jenielson Sousa Lopes

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  2. Valesca Frois Nassif
    Valesca Frois Nassif

    Parabéns pela excelente entrevista! 👏👏

  3. Robson Oliveira Aires
    Robson Oliveira Aires

    Excelente entrevista. Parabéns ao entrevistador e entrevistado. O Jason Miller foi muito feliz em alerta o presidente Bolsonaro em usar todas as redes sociais disponíveis e não ficar refém de algumas.

    1. Cristyan Costa

      Obrigado pelo feedback, amigo. Continue lendo a Oeste

  4. Aldo Oliveira da Silva
    Aldo Oliveira da Silva

    Concordo com Jason Miller , as plataformas não deveriam ser um agente de censura . Estão claramente desvirtuando -se do seu objetivo inicial. Quem deu está autoridade para censurar ?As pessoas que usam em sua maioria,com certeza não.

    1. Cristyan Costa

      Obrigado, caro Aldo. Continue conosco. Abração

  5. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Não interessa o que as Big tech pensam, nossa moeda de troca vale mais, são nossas riquezas, principalmente o alimento

  6. Ranieri Ferreira Nunes
    Ranieri Ferreira Nunes

    É proibido fotografar a tela da urna, no momento do voto?

    1. Jorge Apolonio Martins
      Jorge Apolonio Martins

      Sim, é proibido. Inclusive e proibido adentrar com celular na cabine.

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