“Quem começa a construir uma torre sem
antes calcular o custo e ver se possui dinheiro
suficiente para terminá-la?
Pois, se completar apenas os alicerces e
ficar sem dinheiro, todos rirão dele, dizendo:
‘Esse aí começou a construir, mas não conseguiu terminar!”.
Lucas 14:28-30
Em declaração recente no exterior, mais precisamente no encerramento do Fórum Empresarial Brasil–Espanha, o atual ocupante da Presidência do nosso país, com aquele ar premeditado de irritação — tal qual um professor passando sabão permanentemente em alunos travessos —, afirmou que é impossível fazer investimento no Brasil com taxa de juros de 13,75%. Acrescentou: “Espero que a Espanha coloque dinheiro para emprestar mais barato para a gente poder ter empresário que vem aqui buscar dinheiro emprestado”. Sim, acredite, ele disse isso.
O comentário é uma confissão da incompetência do seu governo. Ou não é um despropósito assustador que um chefe de governo de qualquer nação — e ainda por cima no exterior — conclame os empresários patrícios a não investirem no próprio país? A rigor, as atitudes mais indicadas a serem tomadas depois de tal disparate deveriam ser — em ordem de prioridade crescente — a de usar o habitual clichê de que não foi bem isso o que quis dizer, ou de desculpar-se, ou, preferencialmente, de renunciar ao cargo.
Entretanto, quem se dispuser a um esforço considerável em favor da tolerância e da boa vontade e olhar apenas para os aspectos políticos, talvez entenda que tais palavras tão desatinadas eram endereçadas indiretamente ao presidente do Banco Central do Brasil. Roberto Campos Neto vem sendo o alvo preferido dos governistas, simplesmente porque sabe que, dada a voracidade com que o presidente e seus amigos se lançam aos gastos, é absolutamente necessário manter a austeridade monetária, pelo risco elevadíssimo de “argentinização” dos nossos índices de preços. Para sorte nossa, a autoridade monetária ganhou autonomia (que muitos chamam de independência), estabelecida pela Lei Complementar nº 179, de 24 de fevereiro de 2021, pois se tudo fosse como antes certamente o seu presidente e toda a diretoria já teriam sido trocados por companheiros “desenvolvimentistas”, e a taxa Selic já teria sido empurrada para baixo a marretadas.
O que os esquerdistas rupestres que estão hoje no governo não enxergam, ou fingem não enxergar, é que o problema não está no presidente do Banco Central, nem nos empresários, mas no fato de o governo abraçar vigorosamente um caminho que já se sabe ser mortífero para qualquer economia no longo prazo. No caminho está um trio de equívocos fatais formado por (a) tolerância com inflação elevada, (b) tributação pesada e (c) gastança desregrada. Não foram necessários mais do que quatro meses de trapalhadas, barafundas e bagunças quase que diárias para se chegar a essa conclusão. A verdade é que não existe um programa de governo definido, com o qual se possa concordar ou discordar. Nunca existiu e duvidamos que venha a existir — e não só para a economia, mas em todas as demais áreas cobertas pela multidão de ministros nomeados por critérios exclusivamente políticos.
Quando Keynes usou o truísmo “no longo prazo, todos estaremos mortos”, o fez para justificar suas preocupações com a Grande Depressão e enfatizar que sua nova teoria seria útil para explicar as flutuações da renda e do emprego sob uma perspectiva de curto prazo. Porém, ao fazê-lo — conscientemente, segundo Murray Rothbard e Paul Johnson — estava enaltecendo a vida da cigarra e desmoralizando a da formiga. O que fica bastante claro quando, sob o chamativo título de “paradoxo da parcimônia”, defendia a “gastança” e atacava a poupança, o que representou uma enorme inversão nos valores morais preconizados por São Tomás de Aquino, os pós-escolásticos, David Hume, Richard Cantillon, Adam Smith e toda a tradição que analisava as atividades econômicas sob o ângulo da filosofia moral. Infelizmente, a partir da contaminação do mundo acadêmico e político com as ideias keynesianas, os atos de poupar e de preocupar-se com o longo prazo passaram a ser vistos como vícios e as práticas de gastar e levar a vida na flauta como virtudes.
Os que estão governando o Brasil hoje, infelizmente, não evoluíram absolutamente nada. Parecem viver na década de 50 do século passado
A esquerda mundial sofre de uma síndrome crônica: a da cigarra, que impede seus portadores de olhar à frente, para o longo prazo, e os induz a preocuparem-se apenas com o presente e, consequentemente, a costurar remendos malfeitos. Ora, é claro que no longo prazo todos estaremos em outro plano, mas nossos filhos, netos e bisnetos estarão aqui e temos a obrigação moral de pensar neles. E pensar no longo prazo é, antes de qualquer outra coisa, vislumbrar e lutar por mudanças no sistema cultural, porque é este que influencia os sistemas político e econômico. Além disso, a boa teoria econômica é farta em mostrar que os efeitos de determinadas políticas no curto prazo costumam ser diferentes e opostos aos de longo prazo.
É preciso enfatizar isso, por mais impopular que costuma ser, e mostrar que, assim como pessoas que gastam permanentemente mais do que ganham e empresas que vivem anos operando com excesso de despesas sobre receitas têm 100% de probabilidade de passarem por sérias dificuldades, com o governo não é diferente.
A visão econômica da esquerda sempre foi, é e continuará a ser a da cigarra. Para ilustrar, podemos recorrer ao livro de Provérbios (6:6-11). É perfeitamente possível interpretá-lo — deixando de lado os aspectos teológicos, obviamente — como uma severa reprimenda à sofreguidão fiscal da esquerda, por sua defesa e apego ao trio letal acima descrito: “Observe a formiga, preguiçoso, reflita nos caminhos dela e seja sábio! Ela não tem nem chefe, nem supervisor, nem governante, e ainda assim armazena as suas provisões no verão e na época da colheita ajunta o seu alimento. Até quando você vai ficar deitado, preguiçoso? Quando se levantará de seu sono? Tirando uma soneca, cochilando um pouco, cruzando um pouco os braços para descansar, a sua pobreza o surpreenderá como um assaltante, e a sua necessidade sobrevirá como um homem armado sobre você”. É ou não é perfeitamente aplicável ao atual governo?
Os caminhos da formiga do texto bíblico são, guardadas as proporções, os do crescimento sustentado da economia, porque este depende de investimentos e porque só podem existir investimentos se, antes, houver uma fonte que os alimente, que são as poupanças privadas. Em suma, a receita do progresso é trabalhar duro, com esforço e retidão, cada um em busca de seus objetivos individuais, e poupar parte dos frutos materiais desse trabalho. E isso sem depender de chefe, supervisor e governante. Experimente dizer isso a um petista.
E por que poupar é uma virtude? Por vários motivos, mas o principal é que, ao poupar uma parte do que ganhamos com nosso trabalho (seja o salário ou o lucro, quando se trata de um empresário), estamos contribuindo para que o futuro seja melhor, tanto para nós, como para a sociedade. Os valores que poupamos serão emprestados para outras pessoas e empresas, que poderão usá-los para gerar mais produção e mais empregos. Além disso, quando poupamos, isto é, quando economizamos parte do que ganhamos e aplicamos em algum instrumento financeiro, com o tempo ganharemos os juros dessas aplicações, o que nos dará no futuro capacidade de consumir maior do que possuímos no presente.
A ânsia mórbida para gastar o dinheiro dos pagadores de impostos, o desdém estulto com os efeitos destruidores da inflação e a tara patológica pela arrecadação é tudo o que o governo conseguiu apresentar na área econômica. O ministro da Fazenda, com a “sapiência” que os dois meses de estudos econômicos que confessou possuir lhe outorgaram, às vezes nos dá a impressão de que acorda e passa os dias inteiros pensando em como arrecadar mais e, quando dorme, sonha com impostos. O recente arcabouço fiscal nada mais é do que uma licença e um estímulo para gastar sem risco de pedalar, e seus mais recentes devaneios são o digital tax, uma mãozada do governo nas encomendas do comércio eletrônico e a tributação de investimentos feitos no exterior por pessoas físicas residentes no Brasil. Este é outro avanço no bolso dos cidadãos, estabelecido pela MP nº 1.171, de 30/4/2023, que impõe alíquotas progressivas que vão de 15% para rendimentos anuais entre R$ 6 mil e R$ 50 mil e de 22,5% sobre a parcela anual de rendimentos que ultrapassar R$ 50 mil.
A seita dos adoradores do Estado precisa de impostos como nós precisamos de oxigênio para respirar; são incapazes de acreditar na capacidade do setor privado de tocar a economia para a frente por conta própria; e acreditam que precisam controlar tudo, fiscalizar tudo, tributar tudo. E, infelizmente, é decepcionante que uma parte não pequena do eleitorado ainda acredita piamente, mesmo não gostando dos políticos, que o governo é que deve conduzir a economia. A coisa é cultural e só vai ser revertida a partir de um trabalho de paciência, voltado para a juventude, em busca do resgate dos referenciais morais e éticos deixados para trás, como se representassem um velho traste a ser atirado ao lixo.
Os que estão governando o Brasil hoje, infelizmente, não evoluíram absolutamente nada. Parecem viver na década de 50 do século passado. O presidente apresenta o mesmíssimo discurso de 1980, quando seu partido foi fundado. A maioria de seus ministros não está à altura dos seus cargos e não têm apoio popular.
Por isso, o mesmo PT que sempre se vangloriava de ter lutado contra a censura nos anos 1970 e 1980 empenhou-se febrilmente para aprovar um PL que, a pretexto de combater mentiras, institui a censura nos moldes das ditaduras que maculam o mundo hoje. E que essa tentativa autoritária tem o apoio de jornalistas que vivem a falar em “estado democrático de direito”.
A índole deles é autoritária. E sua política econômica resume-se em gastar, gastar e gastar; tributar, tributar e tributar; reclamar, reclamar e reclamar; e, caso consigam tomar o Banco Central de assalto, em emitir, emitir e emitir. Até para os padrões das cigarras, é uma extravagância. Não há “perigo” nenhum de que isso tudo venha a dar certo.
Ubiratan Jorge Iorio é economista, professor e escritor
Instagram: @ubiratanjorgeiorio
Twitter: @biraiorio
Leia também “Um retrocesso econômico e social no Brasil”
Comunista vive de assalto aos cofres públicos. Como diz o artigo, precisa ser feito trabalho com a juventude desde o início nas escolas de conscientização econômica.
Excelente artigo: analítico e conclusivo!
A Coreia do Norte carrega o pomposo título de República Democrática da Coreia do Norte quando é propriedade de uma família que exige ser aclamada como deus.
A China denomina-se República Popular da China com partido único e substituição de ditadores desde 1948.
A Rússia foi tomada pelo Putin.
A Venezuela e a Nicarágua tem donos.
Cuba deixou de ser paraíso caribenho em 1959 e desde então a família Castro acumula milhões de dólares em paraísos fiscais.
No Brasil, o Zé Dirceu, terrorista treinado em Cuba, afirmou que eleição não se ganha… se toma.
O que eles querem é impor uma ditadura e ficar com a chave do cofre para fazer muito pior do que já fizeram no passado recente.
Muito bom! Eu, por mim, substituiria a República pela Monarquia!
Essa revista oeste é um poço de água mineral no deserto de jornalistas despreparados e sem escrúpulos. Ubiratan precioso
Excelente artigo.
Parbéns Iorio!!!
Na mosca!!!