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Edição 174

Uma ameaça à civilização

Os lockdowns foram apenas o teste de um novo sistema social

Jeffrey A. Tucker.
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O ataque às empresas nos últimos anos — o que não significa as maiores operações com conexões políticas, mas as menores, que refletem a vibrante vida comercial — ganhou formas muito estranhas. Desde que o New York Times afirmou que o caminho a seguir era “tornar-se medieval”, as elites têm tentado fazer exatamente isso. Mas esse medievalismo não ocorreu em detrimento da big data, da big pharma, da agricultura ou da mídia. Ele afeta principalmente os produtos e serviços que influenciam nossa liberdade de comprar, negociar, viajar, estabelecer relações e administrar nossa própria vida.

Artigo do New York Times (28/2/2020) | Foto: Reprodução

O que começou nos lockdowns ganhou outras muitas formas. E continua com novos ultrajes cotidianos. Talvez não seja aleatório. 

Assim, ainda estamos tentando descobrir o que aconteceu. Considere o controle do vestuário na forma da obrigatoriedade das máscaras. Só que eles estavam apenas começando. Os pedidos da Lei de Liberdade de Informação (Foia, na sigla em inglês) revelaram e-mails de novembro de 2020 em que funcionários dos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos consideraram obrigar todos os norte-americanos a usar máscara N95 para “manter o controle e, por fim, extinguir” a covid-19, como se isso fosse possível. Se todos nós simplesmente parássemos de respirar, não haveria infecções respiratórias! 

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Foto: Reprodução

Na verdade, não se tratava de uma questão de saúde pública. Era o exercício de poder de uma pequena elite sobre toda a população em nome da ciência. 

Em seguida, foram as vacinas que o governo nos obrigou a tomar usando todos os meios necessários, um medicamento experimental de que não precisávamos e que não provou ser nem seguro nem eficaz. 

De lá para cá, outras coisas estranhas foram desencadeadas: a campanha para comer insetos, acabar com os combustíveis fósseis, abolir os fornos de pizza a lenha, impor fornos e carros totalmente elétricos, acabar com o ar-condicionado, não ter nada e ser feliz com o consumo digital, chegando até ao bloqueio do sol, ao mesmo tempo se rendendo a todas as farsas, como fingir que homens podem engravidar.

Muitas cidades estão desmoronando, abandonadas por moradores abastados e tomadas pelo crime. 

É uma loucura, mas talvez exista uma razão para tudo isso.

Em agosto de 2020, Anthony Fauci e seu coautor de longa data escreveram um artigo para a publicação científica Cell que exigia “mudanças radicais que podem levar décadas para ser alcançadas: reconstruir as infraestruturas da existência humana, das cidades aos lares, passando pelos locais de trabalho, pelos sistemas de fornecimento de água e esgoto, pelos espaços de lazer e de convivência”. 

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Anthony Fauci | Foto: D. Myles Cullen/Casa Branca

Eles queriam manter o distanciamento social para sempre, mas isso foi apenas o começo. Imaginaram o desmantelamento das cidades, dos eventos sociais de massa, o fim das viagens internacionais e, na verdade, de todas as viagens, dos animais de estimação, dos animais domesticados e um estranho mundo não patogênico que imaginavam existir 12 mil anos atrás. 

Não podemos voltar atrás, disseram, mas podemos “pelo menos usar as lições daquela época para colocar a modernidade em uma direção mais segura”.

Aí está. Preservem os serviços (e as pessoas) “essenciais”, mas livrem-se de todo o resto. Os lockdowns foram apenas o teste de um novo sistema social. Não é o capitalismo. Não é o socialismo como passamos a entendê-lo. Parece um corporativismo entre guerras, mas com uma reviravolta. As grandes empresas que se beneficiam não são da indústria pesada, mas da tecnologia digital projetada para viver de dados descartados e alimentar o mundo com brisa e raios de sol. 

Claro, até aí nenhuma novidade. De onde vem esse estranho novo utopismo? 

Prateleira fechada de supermercado em White River, Mbombela, África do Sul (4/4/2020). Produtos considerados não essenciais não puderam ser vendidos durante o lockdown | Foto: Shutterstock

Três anos atrás, Matt Kibbe e eu recordamos que, em 1952, Friedrich A. Hayek escreveu o que viria a se tornar o livro The Counter-Revolution of Science. A ideia era que, no fim do século 18 e início do 19, havia nascido um novo conceito de ciência que reverteu um entendimento anterior. A ciência não seria um processo de descoberta pela pesquisa, mas um estado final codificado, conhecido e compreendido apenas por uma elite. Essa elite impunha sua visão a todos os demais. Hayek chamou isso de “abuso da razão”, porque a razão genuína se rende à incerteza e à descoberta, enquanto o cientificismo como ideologia é arrogante e acha que conhece o desconhecido.

Não tive tempo de reler o livro, mas Kibbe o fez. Perguntei a ele se Hayek tinha dito alguma coisa pertinente aos nossos problemas atuais. Sua resposta: “Esse livro explica tudo”.

É uma recomendação e tanto. Então eu a segui. Sim, eu tinha lido essa obra anos atrás, mas cada livro de tempos anteriores traz uma sensação e uma mensagem diferentes em tempos posteriores. 

É realmente premonitório. Hayek explora em grande detalhe os pensadores do início do século 19 — sucessores e críticos do Iluminismo francês original — e sua fonte nos escritos e na influência de Henri Saint-Simon (1760-1825). 

Retrato de Friedrich Hayek | Foto: Domínio Público

Então dei um passo além e vasculhei os textos desse estranho pensador. Hoje em dia ele é chamado de socialista, mas o próprio não se definiria assim. Aliás, os escritos muito posteriores de Karl Marx, que misturaram a dialética hegeliana com a teoria socialista, enquanto condenavam pessoas como Saint-Simon, não encontram muitas raízes aqui. (A tradição hegeliana do estatismo de esquerda e direita são discutidos por mim aqui.)

Em termos simples, Saint-Simon é um elitista, mas não da forma conservadora. Ele sonhava com um mundo sem privilégios de nascimento ou riqueza herdada. Por ele, a aristocracia podia ir para o inferno. Saint-Simon imaginou um mundo do que chamou de mérito, mas não se tratava de mérito por meio do trabalho árduo e do empreendimento. Seria um mundo governado por gênios ou sábios com dons intelectuais incomuns. Eles formariam a elite dominante e administradora da sociedade. 

Retrato de Claude-Henri de Rouvroy, conde de Saint-Simon, feito por Hippolyte Ravergie | Foto: Domínio Público

Seu sistema preferido de governo consistiria em 21 homens: “três matemáticos, três médicos, três químicos, três fisiologistas, três homens de letras, três pintores, três músicos”. 

O conselho dos 21! Tenho certeza de que eles se dariam muito bem e não seriam nada corruptos. E sem dúvida seriam benevolentes! 

Descobriríamos quem são essas pessoas colocando votos no túmulo de Isaac Newton (o deus escolhido por Saint-Simon) e, no fim das contas, o consenso sobre o conselho de elite seria alcançado. Eles não seriam um governo de fato, pelo menos não na concepção tradicional, e sim planejadores de elite que usariam a inteligência para moldar toda a sociedade da mesma forma que os cientistas compreendem e moldam o mundo natural. 

Henri de Saint-Simon | Foto: Montagem Revista Oeste/Wikimedia Commons/Shutterstock

Veja, em seu modo de pensar, isso é muito mais racional do que ter uma aristocracia hereditária no comando. E esses homens, por sua vez, colocariam sua racionalidade a serviço da sociedade, que se inspiraria enormemente por ela, assim como a MSNBC tanto se entusiasma com o doutor Fauci e seus amigos. Saint-Simon escreveu: 

“Assim, os homens geniais desfrutarão de uma recompensa digna deles e de vocês; essa recompensa os colocará na única posição que lhes poderá trazer os meios para prestar todos os serviços de que são capazes. Isso se tornará a ambição das almas mais enérgicas e vai redirecioná-las de coisas prejudiciais à sua tranquilidade. Por essa medida vocês finalmente darão líderes àqueles que trabalham para o progresso de seu esclarecimento, investirão esses líderes de imensa consideração e colocarão um grande poder pecuniário à sua disposição.”

Então é isso: a elite obtém poder ilimitado e dinheiro ilimitado; todos vão aspirar a agir como essas pessoas; e essa aspiração vai melhorar toda a sociedade. Isso me faz lembrar o sistema pré-moderno na China, no qual apenas os melhores alunos podiam entrar na classe dos mandarins, que eram os nove níveis dos altos funcionários do governo da China Imperial. Aliás, Saint-Simon convidou seus seguidores a “se considerarem os governantes da operação da mente humana”.

Ilustração de um oficial mandarim viajando de barco na China, em 1604 | Foto: Domínio Público

Ele imaginou “o poder espiritual nas mãos dos sábios, o poder temporal nas mãos dos detentores, o poder de nomear aqueles chamados a desempenhar as funções dos grandes chefes da humanidade nas mãos de todos”. 

Saint-Simon levou uma vida que oscilava entre a riqueza e a pobreza, e lamentou que essa condição se abatesse sobre qualquer homem de sua genialidade. Então ele elaborou uma política que protegeria a si e aos seus das vicissitudes do mercado. Ele queria uma classe permanente de burocratas que estivesse completamente isolada do mundo liberal que havia sido celebrado apenas um quarto de século antes por gente como Adam Smith. 

Retrato de Adam Smith | Foto: Domínio Público

Seus escritos inspiraram Auguste Comte e Charles Fourier, que concordavam que a ciência deveria assumir o manto da liderança na ordem social. A grande reviravolta que Engels e Marx deram a isso foi chamar a liderança de uma vanguarda que de fato entendia a situação do proletariado. Eles compartilhavam com Saint-Simon seu elitismo essencial, que obviamente tocava na raça. 

Em uma passagem particularmente chocante, Saint-Simon escreve: “Ensinem que os europeus são filhos de Abel, que a Ásia e a África são habitadas pela posteridade de Caim. Vejam como esses africanos são sanguinários; observem a indolência dos asiáticos. Depois de seus primeiros esforços, esses homens impuros não mais se empenharam para se aproximar de minha previsão divina”.

Colocar o mundo todo em uma máscara N95 para extinguir uma doença é apenas o começo. O objetivo de fato é que eles se tornem “governantes permanentes do funcionamento da mente humana”

Esse é o cerne do que Hayek chamou de contrarrevolução da ciência. Não se tratava de ciência, mas do cientificismo no qual liberdade para todos é um inferno, gênios assumindo o controle eram a transição, e um governo permanente de sábios para moldar a mente humana era o paraíso na terra. 

O melhor livro que conheço que capta a essência desse sonho é The Treason of the Experts, de Thomas Harrington. Eles revelam não ser altruístas nem supervisores competentes da sociedade, mas sádicos covardes que governam com crueldade voltada para o avanço da própria carreira e se recusam a admitir quando sua “ciência” produz o oposto de seu objetivo declarado.

Livro The Treason of the Experts | Foto: Divulgação

O “cientificismo” como ideologia é o contrário da ciência como tradicionalmente a conhecemos. Ele não deveria ser a codificação e a consolidação de uma elite de gestores sociais, e sim uma exploração humilde de todas as realidades fascinantes que fazem o mundo ao nosso redor funcionar. Não se trata de uma imposição, mas de curiosidade, e não de normas e força, mas de fatos e um convite a um olhar mais profundo. 

Saint-Simon celebrou a ciência, mas se tornou o anti-Voltaire. Em vez de libertar a mente humana, ele e seus seguidores imaginavam ser seus governantes. Anthony Fauci na verdade é um de seus muitos sucessores, e o estranho animal do tecno-primitivismo é um monstro de sua criação que agora ameaça a própria civilização. Colocar o mundo todo em uma máscara N95 para extinguir uma doença é apenas o começo. O objetivo de fato é que eles se tornem “governantes permanentes do funcionamento da mente humana”.


Jeffrey A. Tucker é fundador e presidente do Instituto Brownstone. Ele também é colunista sênior de economia do Epoch Times e autor de dez livros, incluindo Liberty or Lockdown, e milhares de artigos para a imprensa acadêmica e popular. Tucker trata amplamente de questões sobre economia, tecnologia, filosofia social e cultura.

Leia também “A América não vai abrir mão de seus ideais”

2 comentários
  1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Este tema da pandemia precisa sempre vir a tona. Tiranetes querendo impor seus desejos aos cidadãos.

  2. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    A NOM está com China pra contolar toda população do planeta. Jogaram o vírus como arma mas o homem se adapta como a lei de Lavoisier e o planeta não precisa do homem no seu processo evolucionista. O homem tá botando os pés pelas mãos com o seu pretenciosismo

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