Numa discussão entre patrão e empregada, o personagem de Miguel Falabella dizia: “Não vem com essa conversa pra cima de mim que a luta de classes tá fora de moda”. Isso foi no Sai de Baixo, há 27 anos. Os clichês provenientes da doutrina marxista já tinham saído de moda naquela época.
Era um programa de humor, e o “sair de moda” era o jeito sarcástico de dizer que o debate político baseado em referências como aquela estava superado. E estava mesmo. O lendário Caco Antibes só não poderia imaginar que décadas depois esse entulho voltaria, mais anacrônico ainda, a pautar o debate — e não apenas na cozinha.
O moralismo dos tempos atuais dá uma boiada pelo conflito. Onde não tiver, ele cria. Na época, tratar como “folgada” uma empregada doméstica que não fosse submissa a patrões elitistas e autoritários já era um comportamento totalmente fora de esquadro — a ponto de virar piada. Não para ridicularizar as oprimidas, naturalmente, mas para constatar o ridículo dos opressores. Há 27 anos o esclarecimento contido na frase anterior não seria necessário.
O personagem de Falabella chegava a fazer onomatopeia de chicotada (“shlept!”) ao falar com a empregada Edileuza, personagem de Cláudia Jimenez, que por sua vez esculhambava a caricatura aristocrática da patroa. Cassandra, interpretada por Aracy Balabanian, era chamada de “Dona Casseta” por Edileuza, que ouvia de volta tratamentos como “serviçal”, “doméstica” e outros depreciativos sociais referentes à “criadagem” — termo que, de tão bizarro, virava piada nas falas de Aracy (piada ridicularizando a madame, claro, para não deixarmos de fazer o esclarecimento que tempos mais sagazes não exigiam).
Hoje é preciso carimbar nos arquivos do programa que ele “reflete os costumes da época”. Cala a boca, Magda.
O melhor negócio para quem quer ter poder acima das leis hoje em dia é se maquiar de vermelho
A luta de classes já tinha saído de moda em 1996 por vários motivos. O Muro de Berlim tinha caído sete anos antes — e com ele as últimas ilusões da doutrina marxista, que subsistia artificialmente nos países da Cortina de Ferro como uma espécie de museu sociológico. A utopia comunista se desmanchava ao vivo com o fim da União Soviética.
No Brasil, a libertação da economia das miragens estatizantes beneficiava, ao mesmo tempo, empresários e trabalhadores. Era um período de redução da pobreza e da inflação, com aumento da distribuição de renda. Todas as “classes” ganhando ao mesmo tempo. Os bordões marxistas estavam sendo aposentados não por “direitistas” ou “anticomunistas”, mas pela boa e velha realidade.
Quase três décadas depois, é difícil acreditar que esse entulho retórico tenha voltado a pautar o debate político de forma significativa. Ou, mais que isso, decisiva. Obviamente é um “não debate”. Uma atriz talentosa foi patrulhada por criticar os “delírios comunistas”. Claro que são delírios. Só um anacronismo delirante pode justificar o uso desse conceito para balizar alguma coisa nos dias de hoje.
“Comunistas” enfiados até o pescoço na vida burguesa, beneficiários convictos das liberdades capitalistas, inclusive quando passam pelo poder. “Comunistas” que faturam alto no velho capitalismo vendendo verniz “revolucionário”. Cada vez que um barão das big techs é chamado de “esquerdista” pelos distraídos, ele fica mais rico com seu “comunismo” de butique.
O melhor negócio para quem quer ter poder acima das leis hoje em dia é se maquiar de vermelho. Logo aparecerá a patrulha “anticomunista” saída das catacumbas oferecendo os pretextos tão aguardados para se fazer o diabo contra o perigo da “extrema direita”. Serão felizes para sempre nessa doce e lucrativa “polarização”. Sai de baixo.
Leia também “A vida às vezes é justa”
Comunistas S.A,
A foto da realidade !
Gostei…uma boa análise, parabéns.
Sempre sensacional esse nosso querido Fiuza. Parabéns!
Que bom ter você de volta, Fiuza!
Os detentores do poder, no governo e no estado, na atualidade, gritam sai de baixo, porque pousaram sobre os brasileiros decentes, transformando cada brasileiro em Edileuzas do aparato estatal.
De tempos em tempos a sociedade de bem precisa demarcar território contra o comunismo. Seja com guerra ou derrubando muro.
Muito bem observado. O comunismo se disfarça em novas terminologias e roupagens, mas continua à espreita para destruir a civilização em nome de pseudoutopias que, na vida real, só trazem controle e totalitarismo.
O brilhante Guilherme Fiúza de volta. Comunistas hoje em dia não passam de um bando de hipócritas e vigaristas cujo o único objetivo é se beneficiar dos recursos dos impostos do povo trabalhador , através do estado. Ou são candidatos a um cargo eletivo ou buscam um cargo na máquina pública. Além de não trabalharem não contribuem com nada para o país.
Por mais competente que seja,Fiuza, discordo de você. O comunismo nunca deixou de existir. Embora haja gente que ganhe com isso e seja hipócrita, trabalha pela causa.O comunismo é um movimento, uma cultura. E segue em frente. Só não vê quem não quer.
“…o esclarecimento contido na frase anterior não seria necessário.” <3
Olá Fiúza, é muito bom voltar a ler os teus artigos,mas tenho saudades daquele comentário específico no programa, pingos nos Is, “ lula é ladrão.”
Fiuza, caminhamos para trás.
Maravilhoso Fiuza, sempre cirúrgico, amo seus textos, vc é brilhante.
Comparação perfeita!????
Comparação perfeita!!!( ( não é??? )
Fuiza, na minha visão se o comunismo / socialismo / progressistas, ou qualquer outro termo que seja criado para identifica-los entregassem ao menos metade do que prometem o muro de Berlim ainda estaria em pé.
A polícia que patrulhava o muro impedia que as pessoas do lado oriental passassem para o lado ocidental. O contrário ninguém desejava fazer.
Luiz Inácio e sua caterva, a exemplo de Caco Antibes, odeiam pobres e os utilizam unicamente como massa de manobras.
E o Sai de Baixo na real, foi para tirar de cima o Topa Tudo Por Dinheiro, que ficava em primeiro lugar na audiência aos Domingos, claro, na minha infância preferia assistir ao Topa Tudo!
Esses cínicos não são mesmo comunistas, nem de longe. Eles usam desse rótulo pra sinalizar virtude que nos dias atuais, todo mundo precisa sinalizar essa bondade, essa “empatia” pelo próximo que não existe pq eles faturam alto com isso. Nessa época do Sai de Baixo nós éramos mais livres, mais felizes e mais bem humorados, não existia babaquice toda de agora.
Com muita sabedoria, estudando muito, pensando muito, procurando compreender tudo e todos, um homem consegue, depois de mais ou menos quarenta anos de vida, aprender a ficar calado.Millôr Fernandes
Os anticomunistas são piores ue os comunistas. São covardes.
Preciso e infalível. Uma pena que muitos jovens não entendem.