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Luiz Inácio Lula da Silva ao anunciar os nomes de seus ministros e ministras (29/12/2022) | Foto: Ricardo Stuckert
Edição 189

Um governo misógino

O petista exclui mulheres dos principais cargos, rifa suas ministras e mostra — mais uma vez — que a igualdade só existe no palanque

Rute Moraes
Rute Moraes
Marina Agostine
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“Se dependesse deste governo, a desigualdade acabaria hoje por decreto. Mas é preciso mudar políticas, mentalidades e todo um sistema construído para perpetuar privilégios dos homens.” A fala foi dita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 8 de março deste ano, numa celebração ao Dia Internacional da Mulher. A promessa durou pouco. Os projetos nunca saíram do papel. E as mulheres não só passam longe do protagonismo no governo como estão sendo substituídas por homens.

Em dez meses, Lula trocou três mulheres em cargos de confiança: as ministras Daniela Carneiro (Turismo) e Ana Moser (Esporte), e a presidente da Caixa Econômica Federal, Rita Serrano. Outras nove ministras estão completamente isoladas — algumas ainda não conseguiram uma agenda particular com o presidente — ou chefiam pastas esvaziadas.

Cerimônia de celebração do Dia Internacional da Mulher (8/3/2023) | Foto: Ricardo Stuckert/PR

Daniela Carneiro puxou a fila. Filiada ao União Brasil, foi nomeada porque o petista precisava retribuir o favor ao marido dela, Waguinho, prefeito de Belford Roxo, na Baixada Fluminense. Waguinho se empenhou como poucos prefeitos do Estado no segundo turno da campanha lulista. Daniela foi eleita deputada e já assumiu o Ministério enrolada com denúncias de ligação com milicianos. Lula não se importou e só rifou a aliada meses depois porque precisava de mais votos do União Brasil na Câmara.

A medalhista olímpica Ana Moser chegou ao ministério porque faz parte do time de ex-atletas “progressistas” — que usam o esporte para militância de esquerda. A pasta havia sido relegada a uma secretaria no governo de Jair Bolsonaro, depois de carregar a mácula de reduto de corrupção do PCdoB, mas Lula fez questão de recriá-la. No cargo, Ana Moser é lembrada por dar duas entrevistas que nunca ninguém compreendeu. Foi trocada pelo deputado André Fufuca (PP), ou “Fufuquinha” — porque Fufuca é o apelido do pai, prefeito de Alto Alegre do Pindaré, no Maranhão.

André Fufuca, ministro do Esporte | Foto: Reprodução/Progressistas

A demissão sem motivo pegou mal nas fileiras da esquerda. Lula agiu rápido: assegurou o maior seguro-desemprego já visto em Brasília, com uma quarentena até o final do ano de R$ 41 mil por mês, além do cargo de conselheira fiscal do Serviço Social do Comércio (Sesc), com remuneração mensal de R$ 28 mil — vaga que era de Carlos Lupi (ministro da Previdência Social).

O caso mais ruidoso foi a dispensa da presidente da Caixa Econômica Federal, Rita Serrano. Lula disse que foi obrigado a entregar a cadeira ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP- AL), em troca da votação de medidas para ampliar a arrecadação do governo. A fatura não deve parar por aí: o grupo de Lira também quer diretorias da Petrobras, de estatais e o comando do cobiçado Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), com orçamento de R$ 85 bilhões. Detalhe: o FNDE é comandado por Fernanda Pacobahyba, mais uma mulher.

“Quando você estabelece uma aliança com um partido político, nem sempre esse partido tem uma mulher para indicar”, disse o presidente. “Mas isso não quer dizer que eu não posso, no governo, tirar um homem e colocar uma mulher. Ainda posso trocar muita gente. Lamento, porque o que eu quero fortalecer no governo é passar a ideia de que a mulher veio para a política para ficar.”

As ‘desempoderadas’

Nove ministras permanecem no cargo na Esplanada. Nenhuma, contudo, desempenha o papel de protagonista no governo. As duas que chegaram mais perto da comissão de frente foram Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) e Marina Silva (Meio Ambiente e Mudança do Clima). 

A primeira ganhou o posto porque apoiou Lula no segundo turno da eleição — ela obteve 6 milhões de votos na corrida presidencial. Simone Tebet — a quem o petista chamou de “Simone Estepe” no debate eleitoral — acabou sob a tutela de Fernando Haddad (Fazenda). Ela não participa dos despachos mais importantes da equipe econômica.

Em julho deste ano, por exemplo, quando o governo anunciou o novo presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Marcio Pochmann, Tebet foi pega de surpresa. Horas antes de Pochmann ser anunciado, a ministra dizia que ainda não havia tratado do assunto com o presidente Lula. “Seria um desrespeito com um presidente que está hoje lá”, declarou à época. Foi a última a ser comunicada quando a notícia já era manchete na imprensa.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Simone Tebet, ministra do Planejamento e Orçamento | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Marina Silva passa por uma espécie de segunda humilhação na vida pública. Petista histórica, ela foi ministra do Meio Ambiente no primeiro governo Lula. Acabou rifada do cargo e abandonou o PT para fundar seu próprio partido, a Rede Sustentabilidade. O destino quase a levou ao Palácio do Planalto em 2014: ela era vice na chapa quando o candidato à Presidência da República Eduardo Campos morreu num acidente aéreo dois meses antes da eleição. Chegou a aparecer em primeiro lugar nas pesquisas, mas foi alvo da máquina da propaganda eleitoral petista. Jurou nunca mais se aproximar do partido.

Em 2022, entretanto, com a desculpa de que era preciso se unir à “frente ampla pela democracia” para combater o vilão Jair Bolsonaro, se rendeu ao PT. Levou seus hoje parcos eleitores para o lulismo. Virou ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima de novo. Mas o protagonismo de Marina durou seis meses, prazo para que a medida provisória que reorganizou o imenso Ministério caducaria na Câmara. Para aprová-la, os congressistas desidrataram o orçamento da pasta. O ponto central foi o Cadastro Ambiental Rural (CAR), transferido para Gestão e Inovação em Serviços Públicos.

O CAR é usado para manter uma base de cadastro de propriedades rurais e fazer o controle do desmatamento. A pasta comandada por Marina Silva também perdeu o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento e o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos. Ambos passaram para o guarda-chuva do Ministério das Cidades. 

Nessa seara, também perdeu espaço a indígena do Psol Sonia Guajajara. A demarcação das terras indígenas foi transferida do Ministério dos Povos Indígenas para a pasta da Justiça. 

A ministra da Saúde, Nísia Trindade, comanda uma das principais pastas do governo petista. Mas só foi descoberta pela mídia porque estava na comitiva que viajou para Cuba e, depois, foi fotografada ao lado do Zé Gotinha em campanhas de vacinação. 

Já Anielle Franco, da Igualdade Racial, irmã da vereadora Marielle Franco, virou notícia depois que uma assessora da pasta atacou a “torcida branca” do São Paulo Futebol Clube na final da Copa do Brasil, contra o Flamengo, seu time do coração. A ministra usou um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para ir ao estádio do Morumbi. Anielle acabou poupada, mas a assessora foi exonerada.

O Brasil tem uma ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, que foi colocada na cadeira com o aval da primeira-dama, Janja da Silva. Segundo relatos de políticos que acompanham a agenda de projetos destinados a mulheres e outros que frequentam o Palácio do Planalto, o isolamento feminino também tem as digitais de Janja, que faz uma triagem na agenda de Lula. São raras as aparições do petista sem a escolta da primeira-dama. Ela não aprova, por exemplo, que Lula seja fotografado ao lado de mulheres sem a sua presença. Tampouco que o marido participe de entrevistas coletivas ou de anúncios de projetos sem a sua mediação.

Recentemente, a feminista Marcia Tiburi disse que a socióloga deveria renunciar ao posto se quisesse ser “revolucionária” — e não mulher do presidente. “Se fosse a Janja, renunciava a esse cargo de primeira-dama e ia fazer alguma coisa realmente mais revolucionária. Não combina com uma feminista ser primeira-dama.”

Congresso

Apesar do discurso eleitoral para ampliar a presença feminina no Legislativo, Lula não lembra das mulheres quando escolhe seus líderes. A maioria dos dirigentes do governo — e da federação do PT — é composta de homens. Na Câmara, Zeca Dirceu (PR) comanda a bancada do PT, e José Guimarães (CE) lidera o governo. 

No Senado, Jaques Wagner (BA) lidera o governo. No Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (AP) ocupa o posto de líder. Apenas nas vice-lideranças surgem os nomes de algumas mulheres — o que é comum também em outros partidos.

Deputado Zeca Dirceu (PT-PR), líder da bancada de seu partido na Câmara | Foto: Gustavo Bezerra

Aliás, como contraponto, a única mulher à frente de uma bancada na Câmara é do Partido Novo. A deputada federal Adriana Ventura (Novo-SP) afirma que as ações do presidente Lula são “hipócritas” e que o petista usa a mulher como “moeda de troca” para um presidencialismo “completamente débil”.

“É um governo que vem com a questão de igualdade das mulheres, mas que está chutando as mulheres”, afirma. “Precisamos ver qual é a próxima. Tem outras na fila. É um governo que discursa uma coisa, mas, na prática, funciona diferente. Na hora de negociar cargos com o centrão, Lula descarta as mulheres.”

Resta ainda que existe uma cobrança da base de Lula para que ele indique uma mulher na próxima vaga disponível do Supremo Tribunal Federal (STF). Contudo, os nomes que circulam nos bastidores são de três homens: Flávio Dino, atual ministro da Justiça e Segurança Pública; Bruno Dantas, presidente do Tribunal de Contas da União (TCU); e Jorge Messias, advogado-geral da União (AGU).

“Na Câmara, os projetos são populistas, um discurso que não leva a nada, basta ver uma proposta de igualdade entre homens e mulheres [Lei nº 14.611/2023], a coisa mais absurda que já vi”, diz Adriana Ventura. “Existem cinco leis que preveem a igualdade salarial entre homens e mulheres.”

Apesar dos projetos de equiparação salarial, a deputada Lêda Borges (PSDB-GO) lembra que o próprio Ministério das Mulheres é um asterisco no Orçamento da União. “Estamos com legislações avançadas para as mulheres, mas, sem orçamento, essa legislação fica sem execução.”

Sem projetos, sem orçamento, sem cargos de comando. A política para as mulheres de Lula só existe no palanque.

Leia também “A caixa-preta do 8 de janeiro”

9 comentários
  1. Idílio Mariani Júnior
    Idílio Mariani Júnior

    Misógino ou MALÍGNO? E o pior, o dominou a cúpula do poder e hoje o sistema que deveria equilibrar e impor limites aos abusos uns dos outros, não o impõe mais. Se olharmos os últimos presidentes das casas fica claro, que somente assume, quem essa cúpula quer. Tem que estar alinhado a cúpula. Basta ver os últimos que passaram pela presidência da câmara e do senado e suas ações. Hoje temos um executivo que compra o congresso com as tais emendas parlamentares, um congresso que se vende, e um judiciário que rasga a lei, segundo juristas e a interpreta a seu bel prazer, inclusive mudando de opinião da água para o vinho e dando declarações abusivas e ofensivas como: “é inconstitucional, mas uma vez só pode”, ( em outras palavras). Somente a certeza absoluta que quem detém o poder da força, nada faria, que eles tiveram a coragem de fazer o que fizeram. Olhando esse desenho, chega a conclusão que SOFREMOS UM GOLPE DE ESTADO, DADO PELA CÚPULA DOS PODERES.

  2. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    São mulheres sem valor algum. Diferente das mulheres da Oeste, batalhadoras em busca do bom jornalismo. Rute Moraes, Branca Nunes, Ana Paula Henkel, Paula Leal, Adriana Reid, Fabi Barroso, Cristina Graeml. Sem contas as mulheres que estão nos bastidores. Obrigado a cada uma de vocês pelo grande trabalho.

  3. Celso Ricardo Kfouri Caetano
    Celso Ricardo Kfouri Caetano

    A Simone Estepe ops Tebet já deve estar na frigideira pois raramente se fala na mesma nos dias presentes. Com relação a Ana Moser lhe deram um chega prá lá e ainda foi agradecer o Lula, talvez pelo presente que ganhou depois com a sua nomeação ao Conselho do Sesc por quase R$ 30.000,00 por mês para fazer nada….aliás essas instituições dos S é uma mamata das boas….mereciam uma reavaliação séria. E para finalizar nem o meu gato confia no Lula (apesar de gatos serem desconfiados por natureza) mas o comportamento do pai dos pobres já é velho conhecido desde os tempos de sindicatos, regime militar etc mas a militância que o acompanha sabe que de uma forma ou outra estarão bem.

    1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
      Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

      O sistema S sai também da aposentadoria de cada trabalhador, na guia do INSS vem lá discriminando o percentual para cada um desses aparatos de parasitas.

  4. DONIZETE LOURENCO
    DONIZETE LOURENCO

    Lula deixará este plano como o maior e contumaz mentiroso que o Brasil já conheceu.

  5. MNJM
    MNJM

    Lula é cínico, mentiroso, HIPÓCRITA. Infelizmente, uma parte da população não tem cérebro e vota nesse traste.

    1. Emilio Sani
      Emilio Sani

      faltou a principal característica de lula: psicopata

  6. Luzia Helena Lacerda Nunes Da Silva
    Luzia Helena Lacerda Nunes Da Silva

    O palavrório mentiroso do Lula é sua marca registrada.
    Ele usa as mulheres como moeda de troca e como amantes.
    O resto é protagonista de piadas imundas.

    1. Renato Perim
      Renato Perim

      Amantes????? KKKKKKKKKK duvido o lula ficar de p@u duro, é um brocha sem solução, já parou de dar no couro há algumas décadas.

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