O sal da terra

Final de ano. Todos nós paramos para descansar, refletir sobre tudo o que vivemos ao longo de 2023, estar com a família e — por que não? — acessar filmes e séries de TV a que não conseguimos assistir durante o atribulado ano.

Um pouco antes do Natal, comecei a assistir a The Chosen, uma série dramática de televisão com várias temporadas, dirigida e escrita pelo cineasta norte-americano Dallas Jenkins. A série concentra-se na vida de Jesus Cristo e de seus discípulos, oferecendo uma perspectiva única sobre os eventos descritos no Novo Testamento da Bíblia.

A narrativa se desenrola através dos olhos daqueles que encontraram Jesus durante seu tempo na Terra, explorando suas histórias pessoais, lutas e transformações. A série começa com a introdução de personagens-chave, como Simão Pedro, Mateus, Maria Madalena e Nicodemos. Cada episódio aprofunda suas origens, proporcionando uma representação mais humana e identificável das pessoas que desempenharam papéis cruciais no ministério de Jesus.

Conforme avança, a série abrange eventos significativos, como o Sermão da Montanha, a alimentação dos 5 mil, e as interações entre Jesus e várias pessoas. A narrativa visa a humanizar as figuras bíblicas, retratando suas dúvidas, medos e crescimento pessoal enquanto seguem Jesus e testemunham seus milagres.

The Chosen é conhecida por seus altos valores de produção, enredo envolvente e ênfase no desenvolvimento de personagens. As temporadas conquistaram uma base de fãs dedicada e é única em sua abordagem ao apresentar a vida de Jesus em um formato de série que permite que os espectadores se conectem com o contexto cultural e histórico da época, proporcionando uma perspectiva fresca e acessível sobre histórias bíblicas familiares a todos nós.

Na segunda temporada de The Chosen, no episódio que apresenta o famoso Sermão da Montanha, temos um momento crucial que captura um dos ensinamentos mais marcantes de Jesus. Nesse episódio, intitulado Além das Montanhas, as cenas se passam em uma colina onde Jesus reúne uma multidão para proferir sua mensagem profunda e transformadora.

Durante o Sermão da Montanha, Jesus compartilha ensinamentos essenciais, incluindo as Bem-Aventuranças, que destacam as bênçãos associadas a qualidades como humildade, misericórdia e pacificação. O episódio retrata o impacto das palavras de Jesus na diversificada audiência presente, mostrando suas reações e a profunda ressonância espiritual e emocional do sermão.

O Sermão da Montanha é um elemento central na fé cristã, e The Chosen o retrata com atenção aos detalhes, enfatizando a natureza compassiva e inclusiva dos ensinamentos de Jesus. O episódio não apenas captura a essência desse evento bíblico significativo, mas também explora as conexões pessoais e as respostas daqueles que estavam presentes, contribuindo para o desenvolvimento geral dos personagens e da narrativa da série.

A passagem de um dos sermões mais importantes de Jesus, onde ele fala sobre ser o “sal da terra”, encontra-se no Evangelho de Mateus. O sal era um bem valioso no mundo antigo, usado para dar sabor, conservar e purificar. Ao chamar seus discípulos de “sal da terra”, Jesus está enfatizando o papel deles em trazer sabor, preservação e pureza moral ao mundo. O alerta sobre a perda das propriedades do sal sugere a importância de manter as qualidades que têm um impacto positivo no mundo.

“Vós sois o sal da terra; e se o sal for insípido, com que se há de salgar? Para nada mais presta senão para se lançar fora, e ser pisado pelos homens.” (Mateus 5:13)

Acredita-se que o Sermão da Montanha tenha sido proferido por Jesus no início de seu ministério. Ele serve como um guia abrangente para a vida ética e moral de seus seguidores. Os ensinamentos desse sermão são considerados fundamentais para a ética cristã e foram estudados, interpretados e enfatizados ao longo da história do Cristianismo.

O contexto histórico inclui o fato de que Jesus se dirigiu a uma multidão diversificada na encosta de uma montanha, e os ensinamentos abordados no sermão são abrangentes, visitando tópicos como o amor aos inimigos, a oração, o jejum, e muito mais.

Ao longo da história cristã, essa passagem foi citada e exposta por teólogos, estudiosos e clérigos em sermões, ensinamentos e escritos. Até hoje, continua a ser uma fonte de inspiração para os cristãos que procuram compreender o seu papel no mundo e os padrões éticos estabelecidos por Jesus.

Voltando ao episódio em questão da série The Chosen, há um diálogo entre Jesus e Mateus, interpretados pelos atores Jonathan Roumie e Paras Patel, e, talvez, com alguma licença poética, que é profundamente tocante. Na preparação para um dos sermões mais impactantes e famosos da Bíblia, enquanto toma nota das palavras ditas por Jesus, o discípulo diz a seu mestre:

— Há mais más notícias aqui do que boas novas, mestre. Isso pode deixar as pessoas desanimadas e apreensivas. O senhor percebe quão pesado é o seu sermão?

Jesus responde:

— É um manifesto, Mateus. Não estou aqui para ser sentimental. Estou aqui para iniciar uma revolução. Veja, uma revolução, e não uma revolta. Vocês acharam que eu viria aqui e diria: “Ei, todos vocês, continuem fazendo o que têm feito nos últimos mil anos, já que estão indo tão bem”?

Mateus, ajudando Jesus a escrever o sermão, diz:

— Minha preocupação é o começo, mestre. No momento, sua frase de abertura é “Você é o sal da terra”. Estou preocupado, principalmente se estiver ventando ou se a multidão for maior do que esperamos, que as pessoas que estão lá atrás ouçam “Salgue a terra”. E isso pode entrar em suas mentes com uma conotação ruim, como mostra a história.

Jesus, ouvindo atentamente seu discípulo, responde:

— Compartilho suas preocupações sobre a linha de abertura, mas por razões diferentes. Acredito que o sermão precisa de algum tipo de introdução, um convite para o que será um conjunto de ensinamentos complexo e, às vezes, desafiador.

— O que significa “Você é o sal da terra”? Não sou bom com metáforas — questiona Mateus.

Jesus, com amor nos olhos, diz para seu discípulo:

— O sal preserva a carne da corrupção e retarda a sua decomposição. Quero que meus seguidores sejam um povo que detenha o mal no mundo. O sal também realça o sabor das coisas. Quero que meus seguidores renovem o mundo e a parte de sua redenção. O sal também pode ser misturado com mel e esfregado na pele para tratar doenças. Quero que o meu povo participe na cura do mundo, não na sua destruição.

E o Filho de Deus prossegue:

— Como eu lhe disse… essas coisas farão sentido para alguns, mas não para outros. Não quero seguidores passivos. Aqueles que estão verdadeiramente comprometidos irão, profundamente, perseguir a busca da Verdade.

Quando a vida parece monótona ou quando o mundo parece carente de bondade, essa passagem nos encoraja a ser o tempero que desperta a mudança positiva

Então, em uma das cenas mais emocionantes de toda a temporada, ao cair da noite daquele mesmo dia, Jesus convida Mateus para continuar anotando seus pensamentos e diz:

— Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o Reino dos céus; bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados; bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra; bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos; bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia; bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus; bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus; bem-aventurados os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o Reino dos céus; bem-aventurados sois vós quando vos injuriarem, e perseguirem, e, mentindo, disserem todo o mal contra vós, por minha causa. Exultai e alegrai-vos, porque é grande o vosso galardão nos céus. Vós sois o sal da terra!

Na correria de nossa vida moderna, onde o ritmo das mudanças pode ser avassalador e o mundo parece constantemente se transformar sob nossos pés, a sabedoria atemporal das palavras de Jesus, “Vós sois o sal da terra”, oferece uma ancoragem profunda e reconfortante.

O histórico Sermão da Montanha é um lembrete de que, em nosso cotidiano, em meio aos desafios e incertezas, possuímos o poder transformador de trazer sabor e bondade ao mundo ao nosso redor. Assim como o sal realça o sabor de uma refeição, temos a capacidade de infundir nossos relacionamentos, locais de trabalho e comunidades com bondade, compaixão e integridade moral. Quando a vida parece monótona ou quando o mundo parece carente de bondade, essa passagem nos encoraja a ser o tempero que desperta a mudança positiva.

Para 2024, desejo que nos esforcemos para preservar os valores do amor e da coragem de escolhermos ser “o sal da terra”, agindo como uma fonte de luz e esperança, mesmo diante de toda a perseguição e injustiça. E, assim como o sal, quando diluído ou contaminado, perde sua eficácia, devemos nos precaver contra a perda de nossa singularidade, lembrando que nossas qualidades únicas são o que nos torna agentes de transformação positiva no mundo.

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