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Saidinha temporária de presos no Estado de São Paulo | Foto: Montagem Revista Oeste/Antônio Cruz/Agência Brasil
Edição 199

O Brasil precisa acabar com as ‘saidinhas’ da cadeia

Entidades de direitos humanos, mais uma vez, pressionam a base de Lula para impedir a aprovação do projeto no Senado

Rute Moraes
Rute Moraes
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No Brasil, infelizmente, é preciso acontecer tragédias para que assuntos de interesse nacional despertem a atenção de autoridades. Foi o que ocorreu na sexta-feira 5 com o policial militar Roger Dias da Cunha, de 29 anos, em Belo Horizonte (MG). O sargento foi baleado na cabeça por um criminoso que estava nas ruas, beneficiado pela tradicional “saidinha” da cadeia nas festas de final de ano. O policial ficou dois dias internado e deixou a mulher e um bebê de cinco meses. 

A morte de Roger da Cunha foi filmada por câmeras de segurança. A imagem perturbadora do sargento alvejado covardemente rodou o país. Imediatamente, a sociedade reagiu — sobretudo nas redes sociais — com uma pergunta que, ano após ano, se repete: por que um criminoso tem o direito de sair da cadeia cinco vezes por ano em feriados? Muitos não voltam, são flagrados em bares ou consumindo drogas e, no limite, cometendo novos crimes. O assassino de Roger da Cunha, por exemplo, tinha 18 registros por crimes como roubo, tráfico, falsidade ideológica, receptação, ameaças e agressão.

No Estado de São Paulo, somente na virada do ano, dos 34.547 presos beneficiados com a saída temporária,1.566 não retornaram aos presídios. No Rio de Janeiro, 1.785 presos saíram das penitenciárias, e 253 não retornaram. Desses, três são chefes do Comando Vermelho, considerados criminosos de alta periculosidade: Paulo Sérgio Gomes da Silva, o “Bin Laden”, responsável pelo tráfico de drogas no Morro Santa Marta, em Botafogo; Saulo Cristiano Oliveira Dias, conhecido como “SL”, do Complexo do Chapadão; e Willian da Silva.

É aqui que entra a política. Apesar do recesso parlamentar, a morte do sargento chacoalhou o Congresso. Já no fim de semana, diversos políticos usaram as redes sociais para lamentar a morte do policial e cobrar celeridade na votação do projeto de lei que prevê o fim das saidinhas.

“Leis ultrapassadas podem tirar a vida de mais um policial em Minas”, escreveu o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), no domingo 6. “Bandidos com histórico de violência são autorizados para a ‘saidinha’, que resulta em insegurança para todos os brasileiros. Passou da hora disso acabar. A mudança está parada no Congresso. Até quando?”

O Senado Federal tem, parado na Comissão de Segurança, um projeto que extingue as escapadas da cadeia em datas festivas: Páscoa, Dia das Mães, Dia dos Pais, Finados e Natal/Ano-Novo. O período pode chegar a sete dias em liberdade. A previsão legal, conforme a Lei de Execução Penal — artigos 122, 123, 124 e 125 —, refere-se ao “retorno ao convívio social” de detentos do regime semiaberto, para estudo profissionalizante e ao cumprimento de um sexto da pena.

Quando não retorna à unidade prisional na data determinada, o preso é considerado foragido e perde automaticamente o benefício do regime semiaberto — ou seja, quando recapturado, volta ao regime fechado.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que a morte do policial é de “gravidade acentuada” e gerou a todos “grande perplexidade e tristeza”. Além disso, Pacheco indicou que o Senado se debruçaria sobre a lei das “saidinhas”.

O projeto que está no Senado

Em agosto de 2022, a Câmara dos Deputados aprovou o PL nº 2.253/2022. O texto é um substitutivo do PL nº 6.579/2013, da ex-senadora Ana Amélia (PSD-RS), elaborado pelo então relator na Casa, deputado federal Guilherme Derrite (PL-SP), atual secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo.

Na época, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ainda incluiu no texto um trecho que exigia a realização de exame criminológico para a concessão da saída temporária aos detentos.

Por que o projeto não avança? Na Comissão de Segurança do Senado, a relatoria da proposta ficou com o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Segundo ele, a base do governo impede que o texto seja votado. “Já apresentei o relatório há meses, está pronto para ser votado, mas a base de apoio a Lula, principalmente os senadores do PT, está usando todos os artifícios regimentais para impedir a votação”, disse. 

De fato, em 26 de setembro do ano passado, houve pedido de vista do líder do PT na Casa, senador Fabiano Contarato (PT-ES). Ele argumentou que era necessária uma avaliação técnica para garantir que a lei penal fosse aplicada de maneira “correta e justa”. O presidente do colegiado, Sérgio Petecão (PSD-AC), atendeu ao pedido. Mas, mesmo depois da liberação do texto pelo petista, não houve votação — como sempre acontece na Casa, os projetos caem no esquecimento até que ocorra apelo popular.

Questionado por Oeste, o presidente da Comissão de Segurança Pública disse que o projeto será pautado depois do recesso. O senador Petecão, contudo, revelou onde está o problema: na pressão de entidades e de associações de direitos humanos. 

“Muita gente me procurou fazendo questionamentos, porque algumas pessoas saem para estudar e outras para trabalhar. Na proposta de Flávio Bolsonaro, ele corta todo mundo, e isso, segundo os especialistas, viraria um caos, uma explosão dentro dos presídios.”
(Sérgio Petecão)

Petecão disse que pediu ao senador Sergio Moro (União Brasil-PR), ex-juiz da Operação Lava Jato, que estudasse o projeto e sugerisse ajustes pontuais para que a proposta pudesse ser apreciada. Se aprovado, o texto segue para a Comissão de Constituição e Justiça e, em seguida, vai ao plenário. “Sou favorável ao tema, tanto é que vou colocar para votar”, afirmou Petecão.

Moro disse a Oeste que devem ocorrer pequenas alterações: “Eliminam-se as saídas em feriados e sem causas, que são a essência do projeto e têm gerado problemas e revoltas; preserva-se a saída para educação e trabalho para os presos do semiaberto”.

O caminho não é tão simples. Se o texto sofrer alterações, terá de voltar para a Câmara. Segundo o presidente da Comissão de Segurança da Casa, Ubiratan Sanderson (PL-RS), o tema já foi esgotado: o placar da votação foi de 311 votos a favor e 98 contrários.

Para Sanderson, a possibilidade de o preso em regime semiaberto sair da cadeia para “estudar e trabalhar”, como os senadores querem remendar, já é prevista na progressão de regime do detento; portanto, não haveria necessidade de o projeto da “saidinha” liberar essa modalidade.

“Não precisa ter mais uma saidinha”, disse Sanderson. “Não estamos acabando com a progressão de regime, mas com as saídas temporárias. Se o Senado mudar o texto, provavelmente a Câmara deve retomar os termos do deputado Derrite.”

Ou seja, é possível que, mais uma vez, o Congresso adie o desfecho de um problema que já poderia estar solucionado antes do próximo feriado. Para que a tragédia não se repetisse.

pacheco desoneração
Rodrigo Pacheco disse que o Senado se debruçaria sobre a lei das “saidinhas” | Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

Leia também “A trincheira da direita no Congresso”

7 comentários
  1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Sou a favor de pena de morte. Um sujeito com 4,5,6 condenações, vai se reeducar mais como? Não tem conserto mais.

  2. Thais de MORAES Machado Suppo Bojlesen
    Thais de MORAES Machado Suppo Bojlesen

    Bandido tem que cumprir a pena total, sem progressão, sem saidinhas, sem mordomias! Só no Brasil temos essa aberração jurídica. Como alguém com várias mortes, estupros, assaltos pode ter o direito de sair às ruas para aproveitar feriados? Enquanto as famílias das vítimas choram seus mortos? Prisão não é Resort, que estudem nas cadeias e trabalhem para que a sociedade não tenha que arcar com seus gastos. Direitos humanos nesse país só defendem os criminosos.
    R

  3. José Luís da Silva Bastos
    José Luís da Silva Bastos

    Saidinha é uma maneira que o judiciário corrupto usa para soltar os seu cupinxas sem dar a cara a tapa,entenderam ou tenho que desenhar.

  4. Vanessa Días da Silva
    Vanessa Días da Silva

    Esse pacheco está desconfortável nessa cadeira. É um bundão que cede a qualquer pressáo do lado que o chantageia. Se não tivesse o processo da Vale, provavelmente já teria pautado muito do que foi solicitado. Está acorrentado pa sua própria ganância.

  5. Olnei Pinto
    Olnei Pinto

    Há quantos anos vem se repetindo esses crimes ,após a concessão destas saidinhas , estas ocorrências são rotineiras e ação firme e decisiva do legislativo é claudicante. O Pacheco vai continuar simplesmente olhando o horizonte sem nada fazer.

  6. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Se esses parlamentares não fossem ladrões já tinham resolvido ou diminuído muito o problema da violência, punição do criminoso

  7. Luiz Augusto Pinto
    Luiz Augusto Pinto

    a pergunta que fica é: “Como tantos presos com diversos delitos e outros de alta periculosidade, ou até mesmo chefes de facções/trafico, podem estar em regime semi aberto???? no caso do Sargento assassinado, o bandido tinha ficha corrida de 18 prisões anteriores, merecia saidinha????

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