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Plantação de arroz no Rio Grande do Sul | Foto: Alf Ribeiro/Shutterstock
Edição 218

Não vai faltar arroz

Embora o governo federal insista numa importação desnecessária do grão, a safra deste ano está garantida

Artur Piva
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Mesmo sem existir qualquer problema com relação à falta de abastecimento ou de estoque, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu: o governo federal deve importar arroz — um mercado muito bem resolvido no Brasil. A ideia inicial era adquirir até 1 milhão de toneladas e distribuí-las pelas gôndolas país afora, com preços subsidiados e em embalagens com logo oficial, como se o Estado — e não os produtores — garantisse alimentos a preços justos. A decisão foi tomada depois da tragédia no Rio Grande do Sul, Estado que tem a maior produção nacional do grão.

A ideia não soou bem, e o primeiro (e único) leilão, que estava marcado para a última terça-feira, 21, foi cancelado. Contudo, ainda pesa sobre os produtores a liberação da importação, que causaria um desequilíbrio no mercado nacional. 

Antes das chuvas, o produto que vinha de fora do Mercosul era taxado. O desastre serviu como pretexto para abrir as fronteiras.

Rótulo do arroz que seria importado pelo governo federal | Foto: Divulgação

Na prática, isso pode prejudicar ainda mais a recuperação econômica do Estado. Enquanto o povo luta para se recuperar da maior tragédia da história gaúcha, com cidades destruídas, quase duas centenas de mortos e dezenas de desaparecidos, Lula resolveu pôr a mão em uma das poucas riquezas com que a população local ainda pode contar depois da devastação causada pelas chuvas. Mesmo com as tempestades e os incontáveis problemas causados por elas, os agricultores gaúchos conseguiram colher o suficiente para garantir uma safra no mínimo igual à de 2023. Ainda assim, o governo federal tenta usar a tragédia para intervir no mercado.

Apesar da tragédia

Os arrozais são um negócio tradicional para produtores de todos os tamanhos no Rio Grande do Sul há gerações. A resiliência do setor é uma prova de que quem alimenta o povo, seja em momentos de tranquilidade, seja em meio a grandes tormentas, é o agronegócio.

Mesmo com todos os problemas que estão enfrentando, os agricultores rio-grandenses devem abastecer cerca de 70% de todo o consumo nacional desse grão em 2024. A safra estadual deve fechar em mais de 7 milhões de toneladas, de acordo com as estimativas da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) — é mais do que a produção do ano anterior, quando nenhum leilão público foi anunciado.

“Quando o governo afirma que vai importar arroz por temer a falta, ele causa um pânico na sociedade. As pessoas saem desesperadas para fazer compras sem necessidade”

O governo conhece esses dados. A Conab é um órgão federal e está sob o comando de Edegar Pretto — aliado de Lula e filho de um dos fundadores do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Trata-se de um grupo famoso por invadir terras e se opor ao agronegócio.

É verdade que uma parte das lavouras está debaixo d’água, fazendas foram devastadas, criações morreram e há muito prejuízo para encarar. Entretanto, segundo a própria companhia, 84% da safra de arroz de 2024 já foi colhida e está segura. O Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga), uma instituição vinculada ao governo estadual, estima que essa fração corresponda a 6,5 milhões de toneladas. Do restante, em torno de 700 mil toneladas aguardam para ser colhidas em áreas não atingidas pela tragédia. O total ultrapassa as 6,9 milhões de toneladas de 2023. 

Postes derrubados pelas chuvas em uma propriedade rural no município de Dona Francisca, no Rio Grande do Sul | Foto: Reprodução/Irga

Rodrigo Machado, presidente do Irga, está visitando as áreas atingidas. Ele afirma que o Estado tem plenas condições de escoar e fornecer a safra de 2024. Na opinião dele, não é momento de falar de importação ou de leilão. Agora o foco precisa ser a reconstrução da agricultura gaúcha.

“Em algumas áreas afetadas não há mais como produzir”, diz. “Não é uma questão de financiamento apenas, e sim de como recompor o solo fértil que a água levou.” 

Machado conta que o problema é uma questão social. Entre os produtores atingidos também estão pequenos proprietários, com apenas 10 hectares de terras, sem dinheiro para passar por essa crise.

Problema ideológico

De acordo com Antônio da Luz, economista-chefe da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), o governo criou problemas em vez de soluções. “Quando o governo afirma que vai importar arroz por temer a falta, ele causa um pânico na sociedade”, diz o especialista. “As pessoas saem desesperadas para fazer compras sem necessidade, gerando uma demanda para a qual os supermercados e os centros distribuidores não estão preparados. Daí a gente tem escassez, mas tudo isso acaba sendo causado pelo governo.”

A inflação artificial também chegou aos importadores, conforme mostra uma fala de Carlos Fávaro, ministro da Agricultura, sobre o cancelamento do leilão programado para o dia 21. O plano era adquirir 100 mil toneladas. Porém, a elevação dos valores reduziu o poder de compra.

“Nós iríamos comprar 100 mil toneladas, mas, pelos preços que estavam anunciando, só compraríamos 70 mil”, disse Fávaro, ao anunciar o cancelamento.

Lavoura devastada pela chuva no distrito de Arroio Grande, no município de Santa Maria, no Rio Grande do Sul | Foto: Reprodução/Irga
Importação de uma crise

Por enquanto, não houve anúncio de data de um novo leilão. Contudo, a tarifa comum de importação sobre o arroz do Mercosul segue suspensa. Isso faz os cerealistas poderem importar cereal de menor qualidade para misturar ao brasileiro. 

Esse mecanismo pode levar a uma distorção no mercado, e o preço pago ao agricultor gaúcho pode cair. O valor menor seria um estímulo a menos para o plantio em 2025. E aí, sim, a falta seria um problema. Nos cálculos feitos antes de toda essa confusão, o Ministério da Agricultura estimou o valor bruto das lavouras de arroz do Rio Grande Sul em R$ 16,4 bilhões.

Eduardo Muñoz, agrônomo no Estado, resume o sentimento de muitos agricultores locais. “O arroz era o único cultivo que vinha com uma boa rentabilidade”, afirma. “Agora o governo vem e nos tira isso.”

Por volta de 5 mil famílias vivem dessa cultura no Rio Grande do Sul. Pelas estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, elas estão distribuídas em cerca de 180 municípios gaúchos. Apesar de muitos produtores terem sido afetados pelas enchentes, os brasileiros podem ficar tranquilos com pelo menos uma certeza: não vai faltar arroz.

Leia também “O pesadelo dos tiranos”

6 comentários
  1. Gilcimar Botteon
    Gilcimar Botteon

    Não há perigo desse país melhorar. Discutir arroz, que não vai faltar, e não os vitimadas pela enchente é o fim da picada. Não é possível viver nesse desajuste de paulas. E tem outra, nenhuma família vive só de arroz. Aqui em casa, três pessoas, gastamos menos de um pacote por mês, em média 29 reais, mas tem o feijão, que é mais caro; o queijo, mais caro, o tomate, batata, verduras, leite, tudo muito mais caro do que o arroz; e frutas nem pensar, hoje não comemos barato nem as frutas que na minha infância era de graça; também, e óleo de soja. E algum pobre pode se dar ao luxo do milagre do Azeite para o coração? Pensam que é só isso, há se o problema fosse um pacote de arroz por mês! Gastamos cerca de 200 reais (7pct de arroz) de gasolina por mês, 148 reais (5 pct de arroz) de energia elétrica, um celular gasta uns 130 reais (4 pct de arroz) por mês e não é mais luxo ter celular, etc, etc, etc. E tem algo mais dolorido, vamos no mercado e compramos o arroz, o feijão e o resto básico do básico, e lá no final do cupom vem destacado em média 34 porcento de impostos.E esse governo do amor está preocupado com o arroz!

  2. Valesca Frois Nassif
    Valesca Frois Nassif

    Sempre tirando proveito das tragédias! Desconheço alguém com maior falta de empatia! Inacreditável !

  3. DONIZETE LOURENCO
    DONIZETE LOURENCO

    A esquerda é um câncer incurável e ainda temos outras mazelas assolam este país que foi formatado para nunca dar certo.
    O Estado deveria, e não fez de forma adequada, prestar assistência direta às vítimas desta tragédia climática.
    O país somente terá êxito quando o Estado tratar apenas de suas funções típicas que são: saúde, educação e segurança.
    Problemas de produção, abastecimento e distribuição temos hoje no país uma cadeia com profissionais capaz de suprir todas as necessidades dentro da lógica do mercado.

  4. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Isso já era esperado, faz parte da essência da quadrilha petista, que vive sempre em busca de meios de saquear o dinheiro público travestido de ações ”humanitárias” como esta.

  5. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Esse Lula é um sábio entende de sindicato entende de agricultura entende de economia entende de enchente entende de bolsa de valores entende de diplomacia entende de guerra entende de sociedade entende de capitalismo entende de comunismo entende de administração entende de política, só não entende de roubar

  6. jorge alves
    jorge alves

    NÃO IRIA FALTAR ARROZ LILO importou arroz para prejudicar o AGRONEGOCIO esse é DESONESTO de CARTEIRINHA…

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