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Edição 37

O carro que voa e o trem que flutua

Deslocar-se pelo céu ou viajar a 1.200 km/h — realidades da mobilidade urbana das quais todos nós desfrutaremos

Dagomir Marquezi
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A era do carro particular está acabando. Essa era teve início em 1908 com o famoso Modelo T, concebido por Henry Ford. A partir dos anos 1950 nos Estados Unidos — e dos anos 1960 no Brasil — surgiu a ideia de que uma pessoa sem um carro não era bem-sucedida. Passou a fazer parte obrigatória de nossa ambição possuir um carro — ou mais — na garagem. E trocar de carro a cada dois ou três anos, num ritual abençoado com o “cheirinho de novo” de um automóvel zero-quilômetro.

Mesmo os que advogam que o carro representa um símbolo de liberdade individual estão tendo de repensar. O carro virou a liberdade de ficar preso num congestionamento infernal respirando monóxido de carbono. Não adianta ligar a experiência de dirigir apenas a momentos de prazer, como nos comerciais. A vida não é um utilitário de luxo levando você e sua gata para praticar esportes radicais. É mais provável que você esteja parado no congestionamento, com a cabeça pulsando de raiva pela fechada que levou no quarteirão anterior.

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As pessoas vão deixar de ter carro? Claro que não. Em certas condições específicas, ele continuará sendo absolutamente indispensável. Para aquele que mora num sítio isolado, a outra que trabalha circulando por lugares distantes, e o outro ainda que precisa transportar alguém com limitações motoras. E existem os fanáticos por automobilismo, os que encaram o carro como um sinal de status, os que prezam o controle absoluto de seus deslocamentos. São milhões que permanecerão preferindo o carro particular.

Mas o número desses fiéis aos carros tende a diminuir, e rapidamente. Um sinal concreto disso está na explosão de negócios imobiliários ao redor de estações de metrô. Carros viraram para boa parte da população sinônimo de sofrimento e dependência. Novas soluções estão surgindo para mudar esse panorama. A pandemia de covid-19 escancarou o que já estava sendo experimentado: o trabalho em casa. Outro forte fator de mudança foi o Uber. Já vivemos muito tempo divididos em duas classes, os que iam de ônibus e os que podiam se dar ao luxo de pagar um táxi. Aplicativos como o Uber nivelaram esse abismo. Cada vez mais pessoas estão aderindo ao “transporte total”, trocando o carro pelo uso combinado do metrô, ônibus e Uber, tudo coordenado a partir de aplicativos no celular. Fica bem mais barato que pagar IPVA, combustível e manutenção a cada ano.

As maiores mudanças estão por vir. Elas misturam conquistas tecnológicas com concepções urbanísticas mais pensadas. Acabou-se o tempo em que administrar cidades era alargar ruas e avenidas para que mais carros pudessem se atravancar na hora do rush. Segundo cálculos da ONU, 70% da população mundial vai morar em regiões urbanas até 2050. Ou pensamos no futuro, ou teremos um colapso. E seremos eternamente infelizes em nossos deslocamentos pelas cidades, cada vez maiores e mais lotadas.

Algumas dessas grandes mudanças estão sendo realizadas nos próprios automóveis. A poluição se reduzirá com a expansão da frota de carros elétricos. E o estresse, pelos carros sem motorista. A ideia nesse caso é que o usuário tem coisa mais importante e interessante a fazer do que dirigir. Você pode trabalhar enquanto se desloca, ler, comunicar-se com quem precisa, ou simplesmente observar a paisagem.

Na prática, os carros voadores são grandes e sofisticados drones

Em breve, os carros estarão se movimentando por si, e de modo muito mais seguro que o convencional: por meio das redes 5G, os veículos vão “conversar”, evitando qualquer acidente. Você apenas diz para onde quer ir. O carro o leva.

Melhor ainda do que não ter de dirigir, é voar até seu destino. As cidades logo começarão a conviver com os carros voadores. Vão voar usando um princípio mais seguro que o dos helicópteros, uma combinação de hélices e asas móveis. Seus motores são elétricos, e eles podem decolar e pousar em praticamente qualquer lugar plano. São, enfim, grandes e sofisticados drones. Esses carros voarão baixo e precisarão, é claro, se deslocar sob regras rígidas de segurança. Deverão seguir por “avenidas” aéreas eletrônicas, onde regras inéditas de trânsito precisarão ser criadas e cumpridas com o máximo rigor.

A brasileira Embraer já está trabalhando em seu modelo de carro voador. Possui oito hélices, espaço para piloto e quatro passageiros e alcance de 100 quilômetros. Para isso, a companhia criou uma empresa paralela para projetos inovadores, a EmbraerX. Que por sua vez é parte do Uber Elevate. Trata-se de um ramo da corporação destinado a transformar em realidade a ideia de um Uber voador em um prazo entre 2023 e 2028.

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Para a superfície e abaixo dela, outras opções estão sendo criadas. Uma delas é o Hyperloop, uma ideia de Elon Musk que conheceu sua primeira experiência prática e ainda muito limitada no mês passado. A empresa Virgin está produzindo sua primeira versão do Hyperloop, um veículo que parece ter chegado de outra dimensão. A ideia do Hyperloop é viajar dentro de um túnel a vácuo, flutuando num “colchão” magnético invisível. Calcula-se que, quando o projeto estiver concluído, o Hyperloop vá atingir a velocidade de 1.200 quilômetros por hora.

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As consequências nesse caso vão além da simples velocidade. Correndo desse jeito, o Hyperloop pode ligar São Paulo ao Rio em pouco mais de 20 minutos. Na prática, a distância entre as duas metrópoles desapareceria. Você poderia almoçar em São Paulo e comer a sobremesa no Rio, ou vice-versa. No que se refere ao transporte de passageiros, elas se tornariam uma única cidade.

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É vergonhoso para o Brasil que a ligação entre a maioria de seus aeroportos internacionais e o centro de suas cidades dependa de ônibus. Cidades bem resolvidas se ligam a seus aeroportos por trem expresso ou metrô. Os chineses foram além e conectaram o centro de Xangai ao aeroporto internacional da cidade com um maglev.

O maglev tira seu nome do princípio da levitação magnética. Ele não roda nos trilhos, mas flutua (como o Hyperloop). O único atrito em seu deslocamento é com o ar. O maglev de Xangai (conhecido como Transrapid) viaja a 430 quilômetros por hora, cobrindo a distância de 30,5 quilômetros em 7 minutos. É atualmente o trem mais rápido em operação no mundo.

Outras soluções não dependeriam tanto de novas tecnologias, mas da chamada vontade política. Como o uso de hidrovias urbanas. O caso mais didático e frustrante está em São Paulo.

Temos dois grandes rios, um cruzando a cidade no sentido sul-norte (o Pinheiros) e outro no leste-oeste (Tietê). Seriam duas vias naturais para o transporte ligeiro de passageiros. Formariam um só sistema, já que o Pinheiros deságua no Tietê.

Infelizmente, o Tietê e o Pinheiros se transformaram há muitas décadas em dois repulsivos depósitos abertos de esgoto. Desde que nasci, ouço promessas de governadores e prefeitos que juram que os rios serão despoluídos como foi o Tâmisa, em Londres. Mas as promessas nunca chegaram perto de se concretizar. E a população aparentemente não se interessa por isso.

De minha parte, continuo sonhando em viajar de barco pelo Pinheiros, observando as praias, ancoradouros e as crianças brincando nos parques de suas margens.

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Dagomir Marquezi, nascido em São Paulo, é escritor, roteirista e jornalista. Autor dos livros Auika!, Alma Digital, História Aberta, 50 Pilotos — A Arte de Se Iniciar uma Série e Open Channel D: The Man from U.N.C.L.E. Affair. Prêmio Funarte de dramaturgia com a peça Intervalo. Ligado especialmente a temas relacionados com cultura pop, direito dos animais e tecnologia.

 

11 comentários
  1. carlos roberto de moura
    carlos roberto de moura

    Boa, Dagomir! Acho que não terei tempo para desfrutar desses avanços tecnológicos, mas fico contente em saber que no futuro, por exemplo, órgãos transplantados e vítimas de acidentes poderão ser transportados mais rapidamente aos hospitais. Fora as descobertas que virão com as inúmeras pesquisas e que trarão mais conforto e segurança para todos. A eventual má intenção nasceu com os primeiros homens, lá atrás.

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  3. Robson Oliveira Aires
    Robson Oliveira Aires

    Ótimo artigo. Diversificar a pauta da revista é salutar e enriquecedor.

  4. Sebastiao Márcio Monteiro
    Sebastiao Márcio Monteiro

    Eu, hein! A linha editorial de uma revista não se limita a temas políticos. Qual o problema? Não é a primeira vez que o Dagomir aborda tecnologia em seus artigos. É importante a diversidade.

  5. Fabio R
    Fabio R

    O artigo deveria ter sido publicado na “Superinteressante”.
    Mudaram a linha editorial?
    Não entendi.

  6. Lucas Scatulin Bocca
    Lucas Scatulin Bocca

    Estou andando somente de Uber há um ano.
    Esquece. Não irei abandonar o carro (posso até usar menos, mas…).
    Carros voadores e sem motoristas?!? Temos muita filosofia e ética para discutir antes…
    E carros voadores com pilotos humanos?!?! Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
    Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
    (Converse com alguém da aviação para entender um pouco mais de “navegação aérea”… pessoal não consegue nem usar gps em 2d).

  7. Antonio Victorazzo
    Antonio Victorazzo

    Não entendi o objetivo desse artigo. Completamente fora da linha editorial de Oeste. Fora os erros conceituais e a falta de objetividade

    1. Lucas Scatulin Bocca
      Lucas Scatulin Bocca

      Fato!

  8. Elaine Almeida Souza
    Elaine Almeida Souza

    Ainda bem que até isso acontecer Eu não esteja viva pra ver (tenho 48 anos), pois adoro dirigir, e pelo jeito até esse prazer vão tirar das pessoas … a tecnologia ajuda, mas também cansa, torna tudo muito chato, as pessoas tendem a pensar iguais, e nos torna burros e preguiçosos … apesar de estar lendo uma revista digital em meu celular, muita tecnologia está me cansando e não tenho aderido a tudo que está aparecendo…

    1. FABIO
      FABIO

      Somos dois, Elaine.

      1. Lucas Scatulin Bocca
        Lucas Scatulin Bocca

        Três.

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