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Congresso brecha Orçamento
Senado Federal | Foto: Marcelo Moryan/Shutterstock
Edição Eleições 2022

A nova cara do Senado

Numa eleição marcada pelo fracasso dos institutos de pesquisas, a nova composição do Senado Federal traz para a Casa a força que o bolsonarismo tem nas ruas

Iara Lemos
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Dos 27 novos senadores eleitos, metade é formada por apoiadores declarados do presidente da República, Jair Bolsonaro (PL). O número acendeu sinal de alerta, sobretudo no Supremo Tribunal Federal (STF), cuja manutenção de sua composição depende dessa Casa Legislativa.

As urnas mostram que o Senado, agora, avança em mudanças que refletem o pensamento da população para além de acordos políticos. A nova bancada é a prova de que o eleitor clama por ações em relação à política e também à Corte, que retrocede em direitos já adquiridos.

Entre eles, inclui-se a suspensão de trechos dos decretos sobre a facilitação da compra e do porte de armas assinados pelo presidente Jair Bolsonaro. A facilitação do acesso às armas é uma das bandeiras que elegeram Bolsonaro em 2018, e que o mantiveram forte na disputa deste ano.

Essa é também a bandeira de boa parte dos novos senadores, que se unem à prerrogativa de fiscalizar os ministros do STF. Pela Constituição, só os senadores podem manter os magistrados no poder. A competência para colocar em tramitação qualquer pedido de impeachment de um ministro da Suprema Corte, contudo, depende da caneta do presidente da Casa, atualmente com Rodrigo Pacheco (PSD-MG). 

Mas uma nova eleição para a presidência da Casa ocorre em fevereiro. É aí que a pressão dos parlamentares faz a diferença. A nova bancada já trouxe movimentações. Poucas horas depois da eleição, senadores no mandato admitiram a Oeste que, a depender do resultado nas urnas no segundo turno, Pacheco vai ser o novo alvo das pressões. 

As articulações para suavizar o recado vindo das ruas começou. Nesta semana, líderes partidários articulam uma série de reuniões para definir os caminhos que o Senado deve costurar para o próximo mandato, que inicia em fevereiro.

“É preciso fazer uma reflexão sobre o processo eleitoral, sobre o recado das urnas”, afirmou a senadora Simone Tebet (MDB-MS), que ficou em terceiro lugar na disputa à Presidência. “Analisar os senadores eleitos. Espero que os presidentes dos nossos partidos façam uma reflexão sobre tudo que aconteceu nesta eleição”, 

Simone deixa o Senado no próximo ano, e sua vaga será ocupada por Tereza Cristina (PP-MS), ex-ministra da Agricultura de Jair Bolsonaro. Teresa se junta a outros 13 novos senadores eleitos na esteira da insatisfação com os ministros do Supremo, jamais escondida pelo maior puxador de votos da nova bancada. 

Bolsonaro trabalhou pesado para levar seus aliados ao Parlamento. “Um Senado forte faz o controle dos outros Poderes”, disse Bolsonaro em uma live em setembro, ao pedir voto para seus candidatos ao Senado. O apelo surtiu resultado. Só do PL, partido a que Bolsonaro se filiou em abril, são oito senadores estreantes. Quatro ex-ministros do presidente da República agora estarão do outro lado da Esplanada dos Ministérios. 

Entre eles, Marcos Pontes (PL-SP), que chega à Casa representando 50% do eleitorado paulista, o maior colégio eleitoral do país. Damares Alves (Republicanos-DF), que venceu Flávia Arruda (PL) com uma avalanche de votos, também é crítica do Supremo. Já Rogério Marinho (PL-RN), conhecido como o “pai da Reforma da Previdência”, é um pouco mais contido e “dá valor” às negociações políticas, mas os senadores no mandato sabem que ele não se manteria contra uma reivindicação de Bolsonaro. E a colocação de processo de impeachment de ministros do Supremo é uma delas.

Nunca antes na história deste país

A atribuição dos senadores para cassar um ministro do Supremo, contudo, jamais foi usada desde que a redemocratização do país avançou. A despeito da insatisfação popular, o Senado Federal se transformou, ao longo dos últimos anos, num escudo de proteção para atos questionáveis dos ministros. 

Somente nos últimos cinco anos, mais de 80 pedidos de impeachment contra ministros do STF foram protocolados no Senado. Nenhum deles avançou. No ranking da insatisfação, desponta o ministro Moraes, atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que tem norteado suas decisões por posições arbitrárias que envolvem desde políticos até empresários. 

Só contra ele foram 35 pedidos de impeachment. Nas mãos do ministro, até mesmo a manifestação de opiniões, como trocas de mensagens, tem se transformado em crime, gerando uma insegurança jurídica no sistema democrático brasileiro.

As canetadas de Moraes avançam com o aval dos senadores. Levantamento feito por Oeste mostra que, nos últimos cinco anos, Moraes contou com o apoio incondicional de dois dos últimos três presidentes da Casa. Só Davi Alcolumbre (União-AM), que foi eleito presidente do Senado para o biênio 2019-2020, engavetou 16 pedidos de impeachment contra Alexandre de Moraes. Ao todo, foram 41 petições que solicitavam que a Casa analisasse o impeachment de ministros da Corte. Elas foram protocoladas por cidadãos comuns, deputados federais e até mesmo senadores. 

Para o advogado Luiz Gustavo Cunha, a proteção do Senado em relação aos ministros do Supremo é prejudicial para a estrutura do Estado Democrático de Direito. “Só de receber o processo e deixar que os demais senadores tomassem a decisão já seria um avanço. Isso arrefeceria automaticamente os ânimos da sociedade”, afirma. “Esse debate precisa ser impulsionado”.

Toma lá, dá cá 

Ao poupar os ministros do avanço de um processo de impeachment, Alcolumbre estava de olho em salvar a sua própria pele. Os dois processos a que o ex-presidente do Senado e hoje presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Casa respondia na Suprema Corte foram arquivados. As decisões ocorreram quando o político ainda estava no comando do Senado, e chegaram a ficar por alguns dias em segredo de Justiça, determinado pelo próprio STF.

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Davi Alcolumbre | Foto: Pedro França/Agência Senado

No Supremo Tribunal Federal, Alcolumbre era foco de inquéritos que investigavam uso de documentos falsos na prestação de contas da campanha eleitoral de 2014, quando o político concorreu ao Senado Federal. A decisão pelo arquivamento dos processos foi dada pela ministra Rosa Weber. Durante a gestão de Alcolumbre, Rosa Weber foi alvo de duas petições que solicitavam seu impeachment. Ambas, claro, foram arquivadas. 

“Os senadores precisam cumprir seu papel constitucional, que eles estão devendo. Se eles cumprissem o que a Constituição determina, nada desses excessos dos ministros do Supremo estaria acontecendo”, avalia o advogado.

Sucessor de Davi Alcolumbre no comando do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) venceu a eleição da Casa já com a previsão feita pelos seus próprios colegas de que seria um dos líderes em arquivamentos em defesa dos ministros do Supremo. Com o mandato de presidente ainda em andamento — e costuras para se manter no cargo no biênio 2023-2024 —, Pacheco já arquivou dois dos 37 pedidos de impeachment que recebeu contra os ministros da Corte. Os outros 36 estão parados em um limbo parlamentar em que o silêncio impera de acordo com os interesses de cada comandante da Casa.

Sócio de um luxuoso escritório de advocacia, especializado em Direito penal em Minas Gerais, Pacheco não é investigado em inquéritos no Supremo Tribunal Federal, mas indiretamente tem interesse em processos cujas decisões estão nas mãos de ministros da Corte. O nome do presidente do Senado aparece em 23 processos em tramitação no Supremo Tribunal Federal.

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Rodrigo Pacheco, o presidente do Senado | Foto: Divulgação/Agência Senado

Por estar em um cargo eletivo, Pacheco está licenciado da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), mas seu nome segue constando nos processos, uma vez que tiveram início antes de o advogado ter sido eleito senador. O senador é lembrado ainda em casos envolvendo a mineradora Samarco. O escritório Maurício Campos Advogados, do qual Pacheco foi sócio, atuou na defesa de réus na ação criminal movida pelo Ministério Público contra representantes da mineradora, envolvida na tragédia ambiental de Mariana, em 2015.

Toda vez que o nome de Pacheco aponta nos processos, a luz da atenção dos ministros se acende no outro lado da Praça dos Três Poderes. Em toda a estrutura que compõe o poder, nunca há uma ação sem reação.  

Notável saber jurídico

Ainda que a indicação de quem irá ocupar uma das 11 cadeiras do Supremo Tribunal Federal (STF) seja do presidente da República, o aval para sua nomeação e, pode-se dizer, até mesmo para a permanência no cargo de ministro da Suprema Corte depende do Senado Federal. 

As Constituições posteriores a 1891 deixaram claro que os ministros do STF precisam ter notável saber “jurídico”, como uma forma de blindar a manutenção do sistema. O cargo para que são indicados é vitalício, e os ministros só deixam a Corte aos 75 anos, por aposentadoria compulsória prevista em lei. 

Ao poupar os ministros do avanço de um processo de impeachment, Alcolumbre estava de olho em salvar a sua própria pele

A sabatina dos senadores, na qual todos eles precisam passar, transformou-se em uma grande encenação. Antes de chegarem ao ponto da sabatina, todos os indicados ao Supremo fazem uma peregrinação nos gabinetes dos senadores. Os votos já são conhecidos antes mesmo de o placar ser aberto, tanto na Comissão de Constituição e Justiça quanto no plenário, as duas instâncias em que a indicação precisa ser aprovada.

“O grande problema desse sistema todo é o foro privilegiado. Caso os senadores venham a cometer crimes, eles vão ser julgados pelos ministros do Supremo. É da natureza do ser humano não querer brigar com o seu julgador, avalia a procuradora da República Thaméa Danelon. “Fica um acordo velado de proteção entre cavalheiros, em que quem perde é a sociedade.”

Nas mãos do novo Senado, a mudança

Uma possível alteração nesta conjuntura de proteção dos senadores aos ministros do Supremo Tribunal Federal seria possível se o próprio Congresso avançasse nos debates em torno da Proposta de Emenda à Constituição 333/17. De autoria do senador Álvaro Dias (Podemos-PR), a proposta que restringe o foro privilegiado está parada na Câmara dos Deputados há mais de 1,2 mil dias. 

“Se a PEC avançasse, íamos parar com esse processo de uma mão lava a outra. Isso é muito ruim, muito nefasto para a sociedade”, afirma a procuradora.

Aos defensores de freios para a atuação do Supremo, a nova configuração do Senado depois das eleições deste domingo, 2, é um bálsamo de renovação. São esses senadores que chegam a partir de 2023 à Casa que prometem reforçar a batalha da dupla Eduardo Girão (Podemos-CE) e Jorge Kajuru (Podemos-GO), que hoje lideram a lista de senadores insatisfeitos com a atuação de ministros do Supremo. 

Os dois são autores de pedidos diretos de impeachment dos integrantes da Corte. Em defesa dos processos, Girão alega que os ministros do STF agem com desvio de conduta, transformando as decisões jurídicas em elos de decisões políticas. 

“O que acontece é que todos os processos de senadores e deputados de correligionários estão nas mãos de ministros do Supremo. Quero ver os processos dos parlamentares prescreverem se começar a haver movimentação no Senado. Quem analisa os ministros do Supremo são os senadores, e quem avalia os senadores são os ministros do Supremo. Essa é a trava do mecanismo. Está tudo errado. Fica um protegendo o outro neste círculo vicioso”, avalia o parlamentar, que está em seu primeiro mandato na Casa.

Também parlamentar no primeiro mandato, Jorge Kajuru foi responsável por protocolar um documento com mais de 3 milhões de assinaturas no Senado que pede o impeachment do ministro Alexandre de Moraes. 

Alexandre de Moraes
Alexandre de Moraes | Foto: Wilton Junior/Estadão Conteúdo

Sem resposta do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, o senador protocolou um projeto em agosto em que determina aos presidentes da Câmara e do Senado o prazo máximo de seis meses para o acolhimento ou a recusa de denúncia por crime de responsabilidade. Hoje, não há prazo para que a análise seja feita.

“O prazo proposto, de seis meses, é bastante dilatado, se comparado com aqueles das demais etapas do processo. Ocorre que o eventual recebimento da denúncia pode deflagrar um quadro de instabilidade política, ao colocar o processo no centro do debate nacional. Esse lapso temporal, portanto, permite ampliar o debate público e a reflexão sobre imputações de tamanha gravidade”, explica o senador.


Alexandre de Moraes: o campeão de pedidos de impeachment

Alçado ao cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal pelo ex-presidente da República Michel Temer, Alexandre de Moraes ocupa uma cadeira na Corte desde 2017. Assumiu a vaga aberta com a morte de Teori Zavascki, que era o relator da Operação Lava Jato, mas morreu em um acidente aéreo, em janeiro daquele ano.

Dessa forma, Moraes chegou ao Supremo com o apoio de 55 senadores e apenas 13 contrários.

Sua votação ficou acima da recebida por Edson Fachin em 2015 (52) e abaixo da obtida por Luís Roberto Barroso em 2013 (59). Zavascki, o qual Moraes substituiu na Corte, recebeu 54 votos favoráveis. Nos cinco anos em que está na Corte, o ministro é o que mais reflete o descontentamento de diferentes setores da sociedade, que buscam, por meio de processos protocolados no Senado, seu impeachment do Supremo.

Edson Fachin | Foto: SCO/STF

Até o fim da eleição, já eram 36 pedidos contra Moraes, todos eles sem avanço na Casa (veja arte). Afinal, Moraes chegou à Corte com objetivos políticos entrelaçados à sua trajetória jurídica. Nos bastidores, não havia restrições em falar que Moraes assumiria o cargo de ministro para barrar as investigações contra membros do governo Temer e sua base no Congresso, fato sempre negado por ele.

Temer deixou o governo, mas Moraes não abandonou o caráter político de suas decisões. Ao contrário. Hoje, o ministro se destaca como o maior inimigo jurídico do presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição. O próprio Bolsonaro já ingressou com uma ação no Supremo Tribunal Federal contra o ministro da Corte por abuso de autoridade. Bolsonaro levou em conta “sucessivos ataques à democracia, desrespeito à Constituição e desprezo aos direitos e a garantias fundamentais” por parte do magistrado.

No processo, Bolsonaro enumerou cinco queixas contra Moraes, entre elas “injustificada investigação no inquérito das fake news, quer pelo seu exagerado prazo, quer pela ausência de fato ilícito”. Ainda sobre o inquérito das fake news, o presidente afirmou que o ministro não permitiu “que a defesa tenha acesso aos autos” e que a apuração “não respeita o contraditório”.

Em outra linha de frente, parlamentares aliados ao presidente fizeram inflar as gavetas do Senado com pedidos de impeachment contra o ministro da Corte, sem que conseguissem nenhum tipo de avanço. Tanto David Alcolumbre quanto Rodrigo Pacheco já avisaram aos aliados que não vão se indispor com o ministro, e muito menos com a Corte, colocando em debate qualquer tipo de processo que possa causar afastamento de ministros do Supremo. Uma mão lava a outra.

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5 comentários
  1. Elizabeth R.Rio
    Elizabeth R.Rio

    :Caso os senadores venham a cometer crimes, eles vão ser julgados pelos ministros do Supremo.” Como é que é? Os senadores já assumem o cargo pretendendo cometer crimes?????

  2. Joel Luiz Oliveira Rios
    Joel Luiz Oliveira Rios

    O inútil do Rodrigo Pacheco, o pachequin das Minas Gerais precisa cair fora já. O povo precisa impor isto, ou nada vai acontecer com relação a impicheman de ministros do STF.

  3. Bolso Mito
    Bolso Mito

    Para atravessar com os nossos tanques de direita, se faz necessário preparar o terreno.
    Viva a renovação a direita !

  4. Sandra A. Hipolito
    Sandra A. Hipolito

    E que LULA E SO ASFALTO DO CAMINHO DO QUE O MUNDO SE UNIU, ALCKMIN e mais um que virou capacho , mais a desculpa pra tirar SERRA, o nome foi disdo foi Traição , deve seguir o jogo das trevas.

  5. Sandra A. Hipolito
    Sandra A. Hipolito

    E porque na realidade esses SENADORES , DEPUTADOS, GOVERNADORES devem dar o SANGUE , não é pelo BOLSONARO E SIM PRO BRASIL. A NOVA ORDEM MUNDIAL ( NOM),conseguiu o EEUU a disputa agora é RUSSIA E CHINA , quem ganhar vai querer levar o BRASIL ( AGUA, COMIDA COM TERRA FERTIL, NIOBIO, MINERIOS.)O PRESIDENTECE SÓ É A PEDRA NO CAMINHO.
    ACREDITO que nosso PRESIDENTE, AS FORCAS ARMADAS E DEUS tem uma estratégia , asfaltar ESTRADAS , CAMINHOS foi uma das etapas, provar que TARCISIO, EQUIPE, HOMENS E EXERCITO estão se unindo, vamos saber do JOGO, DA ESTRATEGIA OU..E asfaltar os caminhos de chegar as urnas..sem violência, provar que somos forte e que DEUS ESTA ACIMA DE TUDO E TODOS.AMEM

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