Na primeira parte, abordamos os eventos dos incêndios que tomaram parte da região interiorana do Estado de São Paulo na última semana de agosto de 2024. Também tecemos alguns comentários a respeito do período de estiagem que atinge grande área do Brasil devido às características de seus respectivos anos hidrológicos, definindo os meses de junho a setembro como de pouca ou nenhuma chuva. Esta última situação pode se estender até mesmo por meses seguidos, onde o fator climático da continentalidade é intensificado pelo grande sistema de alta pressão em superfície que impera sobre boa parte do país.
Também já relatamos anteriormente sobre as condições do fenômeno La Niña, que estão a se estabelecer, dificultando um pouco mais a concretização de quadros meteorológicos com melhores probabilidades de ocorrências de chuvas, excetuando a área da calha norte do país, que em breve terá seu ciclo de precipitação renovado com mais intensidade. Isso ocorrerá com o retorno da Zona de Convergência Intertropical nos próximos meses, quando esta migrará do Hemisfério Norte, diminuindo a atividade dos furacões no Oceano Atlântico.
Outro ponto abordado do caso em questão e que vale para muitos outros exemplos foram os autores dos incêndios, cujo cunho soa como arquitetado, especialmente pela situação do quadro sinóptico meteorológico do evento. O problema foi marcado por intensos ventos, que facilitaram a propagação do fogo. Tal situação foi verificada em boa parte dos municípios interioranos do estado de São Paulo.
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Nesta continuação, abordaremos alguns pontos críticos observados, notoriamente quando querem transformar o país em uma selva. Primeiro, faremos referência ao tópico da segurança humana. O Brasil tem uma extensa área imersa na região tropical, permitindo uma gama maior de biomas, com algumas áreas urbanas inseridas em suas adjacências. O caso de São Paulo acende um alerta para o fato dos incêndios em matas causarem danos de maior vulto às estruturas urbanas e agrícolas de uma forma mais direta e perigosa, semelhante aos que vemos em outros países, como Portugal, oeste dos Estados Unidos, algumas regiões no sul do Canadá, sudoeste e sudeste australianos e outras regiões análogas pelo mundo. A maioria dos casos é composta por residências ou pequenas vilas que estão isoladas de centros maiores, mas muito imersas dentro da área de vegetação.
A estiagem brasileira
Para a situação brasileira, onde a condição de matas é a regra e não a exceção, fato contrário ao que os ambientalistas e alarmistas gostam de divulgar, o quadro torna-se mais perigoso nos períodos de estiagem porque nossos centros urbanos são de micro e pequeno porte, cercados por imensas áreas vegetais, de proteção, de preservação, de lavouras. Isso faz com que Mogli, Tarzan e King Kong se sentirem naturalmente em casa, correndo-se o risco de aparecerem para o jantar. São verdadeiras “ilhas de urbanização”, que são cercadas por mato de todos os lados. Essa condição se repete em São Paulo, o Estado mais urbanizado do país.
Este é um ponto importante, especialmente porque ainda dentro dos centros urbanos, legislações inadequadas à nossa realidade impuseram áreas de preservação que se misturam aos equipamentos da cidade. Quando ainda estão isolados, a condição é mais favorável, mas normalmente o que vemos são áreas contíguas entrelaçadas, com muitas delas apresentando significativas áreas vegetais com imenso potencial de material biológico. De fato, vemos uma imersão de vulto entre urbano e o material vegetal ao ponto de termos de um lado da rua casas e até edifícios, enquanto que do outro, mata bem fechada.
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Antes que os ambientalistas comecem a gritar, achando que estamos aqui defendendo uma tese de desmatamento, o que pareceria mesmo hilário, pois não saberiam discernir a razoabilidade do discurso. Na verdade, a proposta é simplesmente a aplicação do que já existe há muito tempo. Trata-se das chamadas “zonas de segurança”, ou “zonas de amortecimento”. Lamentavelmente, no entanto, elas são esquecidas ou ignoradas pela sanha de transformar e preservar tudo, achando que não existem mais matas e florestas pelo mundo.
“Zonas de amortecimento” nas cidades
Uma zona de amortecimento pode ser caracterizada de várias formas, dependendo do tipo de vegetação. Vejamos o exemplo da rua com casa de um lado, e mato do outro. Conforme o porte, algumas linhas de árvores devem ser abatidas, sim, criando uma faixa livre que não deve ser mais ocupada pela mesma vegetação. Ela poderá ser coberta por vegetação rasteira ou arbustiva a fim de cobrir o solo, mas não mais pela original.
Essa é uma das técnicas mais simples que poderiam ser aplicadas nas cidades brasileiras, tendo em vista que há uma insistência doentia em se preservar toda e qualquer área, por mais exígua que seja, mesmo entre os equipamentos urbanos. Posso citar a gravidade disso com um exemplo dado por uma micro área de preservação permanente que existe em frente a minha residência. Trata-se de uma mata que “preserva” uma ravina entre um açude e um córrego, com uma largura de apenas 100 metros e uma extensão de 500 m. Há alguns anos, essa mata se incendiou e suas ligações com outros corredores propagou o fogo por algumas ruas, transtornando vários bairros. Por sorte, em um ponto mais afunilado, foi possível interromper a sequência de propagação.
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Entrementes, esse exemplo nos trouxe outro fator interessante a se reportar. Observando muitos dos casos dos incêndios em São Paulo, notamos que foram fogos ligeiros, idênticos ao visto no quadro descrito anteriormente. Eles ocorrem pela queima da vegetação mais rasteira, composta por capim e arbustos que, mesmo atingindo a copa das árvores, na maioria dos casos não compromete a estrutura vegetal completa. Isto é um bom sinal, porque no retorno do período chuvoso, boa parte dos indivíduos floresce novamente.
Exemplo para servir de alerta
O “laboratório” em frente de casa se esverdeou completamente em menos de 36 meses. Apenas duas árvores secaram totalmente. É a benesse de se viver em um país tropical, mas também devemos nos lembrar do crescimento vegetal generalizado que temos acompanhado por todo o planeta, desde o início do monitoramento realizado por satélites que data de 1978. O grande “problema” que o dióxido de carbono (CO2) tem feito foi tornar a vegetação e a produção de comida mais abundante por meio da sua ação de fertilização. Isso deveria nos alertar que a adoção de medidas de incorporação de áreas de amortecimento é uma necessidade.
“Além do já batido slogan do “Brasil não cuida de suas florestas”, como se fôssemos homens das cavernas e que todo pedaço de terra com mato se transforma em Amazônia, nós ainda aguentamos a propagação dos discursos absurdos pela velha imprensa marrom”
Ricardo Felício
O segundo ponto a ser abordado envolve as restrições legais do que classifico como a formação de “bancos” de água. Vejamos que o câncer implantado no mundo e exacerbado no Brasil chamado por “uso da terra” se transforma em um verdadeiro choque de paradigmas quando chegamos ao momento da definição das prioridades. País que quer ser floresta tem que permitir, facilitar e até mesmo incentivar a formação de açudes, lagos e lagoas nas propriedades, bem como pequenas “barragens de metro”, como são chamadas, dentro de cursos d’água de porte menor. Elas são essenciais para a segurança hídrica e para aplicações emergenciais.
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Também é importante relembrar como esse tema se envolve nos cenários geopolíticos mundiais, especialmente quando o entreguismo do país está em alta cotação. Além do já batido slogan do “Brasil não cuida de suas florestas”, como se fôssemos homens das cavernas e que todo pedaço de terra com mato se transforma em Amazônia, nós ainda aguentamos a propagação dos discursos absurdos pela velha imprensa marrom. Chegou-se a propagar que várias pessoas tiveram problemas respiratórios por causa do, veja bem, “CO2 tóxico” que foi emitido por causa dos incêndios! Nota-se claramente que os sujeitos que trabalham para uma redação como essa devem ter frequentado as aulas com Greta Thunberg, ou melhor, se ausentado delas, porque confundir um gás com fuligem e material particulado formador da fumaça é demais para qualquer um.
Incêndios florestais em meio à estiagem
Quanto às questões que envolvem incêndios de origem criminosa, urge a apuração das ocorrências, não só as observadas em São Paulo, mas também no resto do país. Devemos também abrir os olhos para essa tendência observada mundialmente nos últimos anos, toda vez que um determinado lugar passa por seu período de estiagem. Essas ocorrências têm aumentado artificialmente o número de focos com a finalidade de se emplacar o discurso das “mudanças climáticas” causam incêndios. Quando computamos os reconhecidos de origem espontânea, o número segue praticamente estável, dentro da proporção das estiagens ano a ano.
“Um país que anseia ainda por resolver problemas fundamentais e necessita de, em muitos aspectos, infraestruturas de base, deve-se perguntar quais são as suas prioridades”
Ricardo Felício
Esse fato foi levantado inclusive pelo cientista físico Ned Nikolov, que trabalha no Serviço Florestal nos EUA, quando demonstrou que não havia tendências de aumento no número de focos, denunciando seu superior que propagava bobagens. Nikolov acabou tomando uma suspensão de um mês no seu emprego. Ele é um cientista que abordaremos mais vezes, em outros temas, devido ao seu vasto conhecimento.
De qualquer forma, afinal, quanto custa preservar mato? Um país que anseia ainda por resolver problemas fundamentais e necessita de, em muitos aspectos, infraestruturas de base, deve-se perguntar quais são as suas prioridades. Melhorar a vida das pessoas ou cuidar de mato? Se nós pretendemos aumentar ainda mais a área vegetada brasileira, o que é desnecessário, então se torna fundamental utilizar técnicas mais baratas para emergências como essas que ocorrem em meio à estiagem.
“É necessário parar de seguir agendas que não nos cabem no Brasil, simplesmente para obedecerem a ordens externas, com discursos pré-formatados”
Ricardo Felício
Aqui não tratamos de “achismos”, mas da aplicação de métodos técnicos úteis e experimentados. Cabe aos legisladores brasileiros terem bom senso, no mínimo. É necessário parar de seguir agendas que não nos cabem no Brasil, simplesmente para obedecerem a ordens externas, com discursos pré-formatados. Como sempre, missão cumprida e aviso dado!
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Ou seja, a diferença bioética entre ‘manejo’ e ‘conservação’. Conservação, a princípio, é para áreas anecúmenas, cujo atrativo econômico é o turismo de fruição estética do ambiente (trilhas, passeios, cachoeiras, lagos). Manejo é para o uso adequado dos recursos florestais, tais como o cultivo do cacau sob as cabrucas ou o adensamento do palmito açaí. Mas, como dito, há uma histeria que considera o manejo um pecado, a ponto que é melhor drenar um pântano do que criar jacarés. E temos fazendas de porcos, que transmitem cisticercose, em detrimento de fazendas de capivara, que não são suscetíveis a esse verme. Terceiro-mundismo não se improvisa, é obra de séculos (Nélson Rodrigues).