A postura do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), abre brechas para criminalizar a liberdade de imprensa no Brasil. Essa é a avaliação do jornalista Francisco Leali, em artigo publicado nesta sexta-feira, 26 no jornal O Estado de S. Paulo (Estadão).
Para o jornalista do Estadão, Lula “flerta com perseguição a jornalistas ao tomar partido de Alexandre Moraes na briga com Elon Musk”. A menção ao dono do Twitter/X ocorre em meio ao embate do empresário contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Musk acusa Moraes de ser “ditador”.
Na última terça-feira, 23, o advogado-geral, Jorge Messias, enviou uma notícia de fato ao Supremo Tribunal Federal (STF) em que acusa supostas ilegalidades na divulgação das ordens de censura do ministro do STF Alexandre de Moraes, nos Twitter Files Brasil.
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Conforme o AGU, em ofício obtido pela Revista Oeste, os documentos divulgados pelo jornalista norte-americano Michael Shellenberger “parecem reproduzir trechos de conteúdos de decisões judiciais sigilosas proferidas pelo Poder Judiciário brasileiro, em especial da relatoria do ministro Alexandre de Moraes, tanto em sua atuação no STF como no TSE”.
Situação que fez Leali criticar a postura adotada pelo governo federal. De acordo com ele, que é coordenador do Estadão em Brasília, a AGU de Lula tomou partido na história que deveria envolver apenas Moraes e Musk.
“A advocacia governamental tomou partido do Judiciário brasileiro. Mas seu alvo, lendo o tal documento de Messias, parece outro”, afirma Leali, em trecho de seu artigo. “Cita como notícia de fato supostamente criminoso a postagem do jornalista. Dito de forma mais clara, o advogado-geral do governo Lula considera delito passível de punição com cadeia expor um documento de processo judicial sob sigilo.”
AGU aciona STF, sobre Twitter Files: “Tentativa de desestabilizar o Estado Democrático de Direito”
O advogado-geral do governo Lula considera delito passível de punição com cadeia expor um documento de processo judicial sob sigilo.
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Jorge Messias alega que o ato pode ser entendido como uma “tentativa de desestabilizar o Estado Democrático instituído pela Constituição da República Federativa do Brasil de1988”.
Contudo, na avaliação do jornalista do Estadão, o “jogo de palavras” orquestrado pelo advogado-geral possui um objetivo jurídico: manter o caso com Alexandre de Moraes, que investiga supostas tentativas de golpe de Estado.
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A medida da AGU, que mira o jornalista, vai na direção de criminalizar qualquer profissional da imprensa que publique algo sigiloso, conforme o editorial do Estadão.
Entretanto, embora o sigilo das investigações sirva para não chamar atenção dos criminosos, despachos de ações ostensivas costumam ser públicos. “Vez em sempre, o dono da investigação ou quem a ela tem acesso vaza conteúdos que viram notícia”, afirma Leali. “E o guardião do sigilo não é o jornalista.”
O argumento de Jorge Messias, da AGU, é que é crime divulgar segredo de Estado. Mas, segundo o jornalista do Estadão, a história mostra exemplos de jornalistas que expuseram fatos sigilosos.
Jornalista do Estadão critica governo Lula e lembra do caso New York Times e os Papéis do Pentágono
Na década de 1960, por exemplo, o jornal norte-americano New York Times divulgou os Papéis do Pentágono. Era uma série de documentos secretos do governo dos Estados Unidos que mostravam à população que ela vinha sendo enganada sobre o que se passava na Guerra do Vietnã.
O caso foi parar na Suprema Corte dos EUA; e a decisão da Justiça foi favorável à liberdade de imprensa.
Na época, a filósofa alemã Hannah Arendt registrou que a ação dos jornalistas, ao divulgar os Papéis do Pentágono, havia exposto a mentira do Estado. “Na medida em que a imprensa é livre e idônea, ela tem uma função enormemente importante a cumprir.”
Já em 2004, o governo Lula 1 tentou expulsar do Brasil o jornalista norte-americano Larry Rohter. Depois que ele publicou uma reportagem no New York Times que vinculava o presidente brasileiro ao hábito da bebida, a gestão petista ordenou o cancelamento do visto do comunicador, o que o obrigaria a deixar o Brasil. O ato do governo foi barrado por uma decisão do Superior Tribunal de Justiça.
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