Minutos antes de um punhado de jornalistas russos publicarem uma entrevista com o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, o órgão regulador de telecomunicações da Rússia determinou o seguinte: “Recusem-se a publicar o material”. Aqueles que não obedecessem à ordem emitida pelo Kremlin sofreriam as consequências.
Ao The Wall Street Journal, o jornalista Ivan Kolpakov disse não ter considerado sequer a hipótese de aceitar a “proposta”. A Meduza, veículo de notícias independente de que Kolpakov é editor-chefe, decidiu publicar a entrevista completa no YouTube. Quase 6 milhões de pessoas assistiram à conversa dos jornalistas russos com o líder ucraniano. “Nosso principal objetivo agora é mostrar essa guerra pelos olhos dos ucranianos”, afirmou.
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Enquanto o Exército da Rússia lança mísseis em diversas cidades ucranianas, o Kremlin trava uma guerra de informação para controlar as notícias que seus cidadãos leem sobre o conflito. Moscou decidiu banir sites de notícias por descreverem o que está ocorrendo na Ucrânia como “guerra” — o governo comandado pelo presidente Vladimir Putin prefere chamar de “operação militar especial”. Quem disser o contrário poderá ser preso por até 15 anos.
Isso levou importantes meios de comunicação russos, como Novaya Gazeta, Echo of Moscow e TV Rain, a fecharem as portas. “Enquanto isso, a propaganda do governo está inundando os programas de televisão e as mídias sociais”, relatou o repórter Sam Schechner. “As forças de segurança prenderam mais de 15 mil pessoas que protestaram contra a guerra.”
Apesar da onda de repressão, uma imagem mais completa do que está acontecendo na Ucrânia continua a chegar aos russos. Pelo menos àqueles que decidirem procurar por informações sobre o tema.
“A Meduza está entre as maiores agências de notícias não controladas pelo Kremlin que continuam a relatar todos os fatos, desde os esforços da propaganda de Moscou até seus ataques a alvos civis”, diz a reportagem publicada no The Wall Street Journal.
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Com o objetivo de alcançar os leitores russos, essas publicações estão driblando as restrições digitais do Kremlin. Para isso, utilizam as ferramentas que o governo não bloqueou, como o YouTube e o aplicativo de mensagens Telegram. Os usuários estão sendo aconselhados a acessar o conteúdo através das redes privadas virtuais, que impedem a localização real dos indivíduos.
Desde sua fundação, há oito anos, a Meduza opera em um exílio virtual localizado na Letônia. “Quando começamos a trabalhar, éramos como pessoas em um filme que mostravam um cartaz escrito ‘O apocalipse está próximo’. Agora, o apocalipse está acontecendo. E dissemos a vocês”, afirmou Kolpakov.
Leia mais: “Rússia X Ucrânia — De que lado você está?”, artigo de Dagomir Marquezi publicado na Edição 97 da Revista Oeste