A apoteose dos mascarados

Os antifascistas e a multidão que os acompanha não estão poupando negros e pobres de sua sanha destrutiva

Você fez muito bem em ficar trancado em casa esse tempo todo. Você é consciente e não iria botar vidas em risco. Vieram notícias de que as populações estão adoecendo sob o isolamento social, e você fez muito bem em ignorá-las. Se a maioria dos hospitalizados em Nova York, a capital da pandemia, veio do confinamento, isso não é problema seu. Te mandaram ficar em casa, então você ficará, até te mandarem sair. Você tem consciência social.

Seu vizinho disse que uma caminhada ao ar livre, guardando as distâncias recomendadas, seria saudável — e até aumentaria a imunidade. Mas você ficou firme onde te mandaram ficar, e acusou seu vizinho de irresponsável. Aí, quando a polícia desceu o sarrafo na mulher dele e a jogou dentro de um camburão, porque ela estava caminhando no calçadão, você estufou o peito e teve a certeza de que estava com a razão.

Aliás, é sobre isso que queremos falar com você. Não sobre ter razão. Sobre descer o sarrafo. É importante que agora você saia de casa. Sim, é um pouco confuso, mas você vai entender. Aquelas pessoas de preto que estão pelas ruas descendo o sarrafo em quem veem pela frente, tacando fogo e quebrando tudo com paus e pedras, estão lutando contra o fascismo. Elas precisam de seu apoio — e você, que já demonstrou quanto é consciente, não vai ficar acovardado em seu canto.

Primeiro vamos sair quebrando tudo para salvar o mundo do fascismo, depois voltamos ao isolamento

Contamos com você. Não se preocupe, a patrulha intelectual não vai incomodá-lo. Nos Estados Unidos, aqueles astros de Hollywood que mandavam todo mundo ficar em casa (“estamos de olho”, eles diziam), agora estão chamando todos para a rua. E quem não atender pode até ser considerado complacente com a violência racista.

É bem verdade que os antifascistas e a multidão que os acompanha não estão poupando negros e pobres de sua sanha destrutiva — e o irmão de George Floyd pediu paz em respeito à sua memória —, mas isso é um detalhe na luta por uma causa maior. Que causa? Ora, não venha com pergunta difícil numa hora dessas. Cale a boca e se jogue na multidão. Não se esqueça de botar a máscara.

O quê? Você quer saber se máscara é suficiente para evitar o contágio numa aglomeração? Pergunta idiota… Quem falou de contágio? Máscara é uniforme de antifascista. No meio da pandemia pega até bem, é verdade. Mas não vamos misturar os assuntos. Primeiro vamos sair em bando quebrando tudo para salvar o mundo do fascismo, depois voltamos a pregar o isolamento social. Uma ética de cada vez, senão confunde.

Antes de jogar pedras em vitrines, verifique com atenção as lojas que já foram quebradas pelo lockdown

É normal que você fique preocupado com o prolongamento da pandemia. Mas fique tranquilo: você ainda terá muito tempo para se apavorar. O pico ainda nem chegou. Ele fica logo depois do arco-íris, então ainda tem chão até lá. Enquanto isso, nessas suas andanças com os antifascistas, não destrua tudo sem critério. Verifique com atenção as lojas que já foram quebradas pelo lockdown, para não gastar pedra e gasolina à toa.

Se as coisas correrem bem e não houver acidente de percurso, até o fim do ano estará tudo quebrado. Mas isso não significa que você deverá sair de casa. Aguarde instruções. Até porque agora você já se acostumou mesmo com essa vida de merda, que é uma vida linda quando você pensa na contribuição que está dando para um bem maior. E a compreensão de que sua decadência vale a pena será recompensada: a esmola estatal há de chegar aos que souberem esperar.

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33 comentários Ver comentários

  1. Este texto do Fiuza foi lido por ele mesmo em seu canal no YouTube, gratuitamente para qualquer um.
    Não é justo pagarmos uma assinatura para lermos o mesmo texto que sai gratuitamente em outras mídias!

  2. Existe uma frase interessante, a qual diz que “É justamente com um brinquedo que não quebra que a criança quebra todos os outros”. Esses grupos baderneiros que surgem de tempos em tempos, feito certos insetos na época das chuvas, e que ninguém sabe ao certo de que inferno vieram, pois deve haver um inferno para cada tipo dessas intenções de fúria e fogo, senão vira bagunça por lá também, com certeza devem ser o brinquedo que não quebra nas mãos dos tão falados globalistas, tolerados que são pela vista grossa de nossas democracias, sempre confiante que o vendaval passa logo. E passa.

  3. Ironia fina e sarcasmo inteligente……com certeza a turma do “fique em casa” mas “saia para ESTA manifestação” vai fingir de surda….ou gritar FASCISTA…só sobrou isso mesmo pra gritar…

    1. Grande Fiuza, excelente! Sua ironia nos leva , em todos os atos, a verificar sempre onde estão os nossos verdadeiros papéis, para não nos perdermos.
      O que num momento não pode no outro pode, tudo em nome dos que mandam.
      Brilhante!

  4. Esta história dos antifas usando máscara, me fez lembrar que no domingo passado durante transmissão da CNN Brasil, ao vivo, um comentarista da “distinta” emissora observou que os “manifestantes pró-democracia” tinham consciência social (igual ao traficante Baiano do primeiro Tropa de Elite) uma vez que usavam máscaras. Como fala o Fiuza, tá achando que é brincadeira???

    1. A ironia é uma arma que poucos sabem usar bem.
      Fiuza, você é uma dessas exceções de nossa imprensa e “matou a pau” neste artigo.
      É muita falsidade…Quer dizer que agora ir para as ruas é democrático, mesmo que for para vandalizar tudo, né ?Dane-se a pandemia e o tal do isolamento social, né ?
      Parabéns, Fiuza, inclusive por sua participação brilhante no Pingos nos Is.

    2. Tinha lido o artigo da tal Selma e pensei em cancelar essa revista, mas aí vem o Fiúza e escreve um artigo que vale a assinatura anual.

      1. Henrique, a Selma é aquela que diz que houve ditadura no Brasil, Foi ensinada na faculdade pelos professores esquerdopatas das USP e Unicamps da vida.

      2. Fiquei curioso com o que ela escreveu. Estou acostumado a ler somente os que conheço já de longa data.

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