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Luís Ernesto Lacombe Heilborn, jornalista | Foto: Arquivo Pessoal
Edição 120

“Ninguém pode relativizar a liberdade”

O jornalista Luís Ernesto Lacombe é uma das raras vozes em defesa do liberalismo nas redações do país

Pedro Henrique Alves
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Apresentador da RedeTV! e colunista dos jornais Gazeta do Povo, Notícias do Dia e O Liberal, Luís Ernesto Lacombe é um dos mais proeminentes nomes do jornalismo independente. Com passagens pelas redações da TV Globo e TV Bandeirantes, ele destacou-se na editoria de esportes, antes de mergulhar na política. Hoje, com mais de 2 milhões de seguidores no Instagram, é uma das raras vozes em defesa do liberalismo nas redações do país.

Nesta entrevista, Lacombe comenta a passagem pela maior emissora de televisão brasileita — “Nunca fui autorizado a falar de escândalos envolvendo dirigentes esportivos”, revela —; a saída da Bandeirantes, no dia seguinte a uma entrevista com Allan dos Santos, hoje exilado político nos Estados Unidos; o ativismo político que tomou conta do jornalismo e muito mais.

Confira os principais momentos da entrevista.

Em 2017, o senhor foi dispensado da Rede Globo. A saída da emissora tem relação com seu posicionamento político? O senhor chegou a ser censurado?

Minha saída da Globo nada teve a ver com opiniões políticas, até porque, à época, eu não me posicionava. Dos 25 anos que passei na rede — 20 deles no Rio e cinco em Santa Catarina —, 14 foram dedicados ao jornalismo esportivo. Meu contrato com a Globo foi o primeiro a vencer, entre os apresentadores de esporte da emissora. Eu abri uma série de demissões motivadas por cortes orçamentários. Depois de mim, também foram desligados Ivan Moré, Glenda Koslowski, Cris Dias, Luciana Ávila, entre outros. Sobre ter sofrido censura na Globo, posso dizer que nunca fui autorizado a falar de escândalos envolvendo dirigentes esportivos, como o Carlos Arthur Nuzman e o Ricardo Teixeira. Havia contratos de transmissão de eventos esportivos que pareciam estar acima de tudo.

O senhor acha que o jornalismo da chamada “grande mídia” tem uma postura ideológica?

Sou tomado por uma tristeza profunda diante de um jornalismo que parece ter um único objetivo: fazer oposição ao governo. Não importam os fatos, o que é bom não merece espaço, ou ganha poucas linhas, com conjunções adversativas para diminuir acertos e ganhos. O que é ruim fica ainda pior, e o culpado por tudo é sempre o mesmo. Um jornalismo que tem um objetivo superior ao desejo de bem informar, que passa a militar é refém de si mesmo. Acredito no jornalismo posicionado, baseado em fatos, no mundo real, que traga todos os lados da história, e repudio, com todas as minhas forças, o jornalismo militante.

Recentemente, no podcast Educação Financeira, o senhor afirmou que no programa Aqui na Band a pauta política surgiu de forma espontânea, o que o teria levado a se posicionar abertamente como um liberal clássico. Isso teve alguma coisa a ver com o fim do programa?

O Aqui na Band foi pensado para ser um programa de variedades, de entretenimento. Como entrávamos no ar logo depois de um telejornal, nossos primeiros 15 minutos eram dedicados às principais notícias. E o diretor, Vildomar Batista, nos incentivava a fazer comentários, que acabavam viralizando. Com a pandemia, a equipe do programa foi drasticamente reduzida. Perdemos todos os colunistas e boa parte da capacidade de produção de reportagens e quadros especiais. Acabamos apostando nos debates em estúdio, num fórum político. Então, o programa se aproximou mais do jornalismo, o que teria gerado protestos internos na emissora. A última edição do programa falou de conservadorismo. O conteúdo e os convidados, entre eles o jornalista Allan dos Santos, provocaram algum incômodo. O programa foi ao ar na manhã da quarta-feira 24 de junho. À noite, recebi um telefonema do meu diretor informando que o Aqui na Band não iria mais ao ar.

“Eu poderia dizer que negacionista é aquele que nega que o lockdown não ajudou em nada no combate à covid, que negacionista é quem nega o direito de ir e vir”

Lula já avisou que, se voltar à Presidência da República, fará a “regulamentação dos meios de comunicação”. Como o senhor vê o silêncio de jornalistas diante dessa ameaça de censura?

Não consigo conceber que alguém defenda a censura, qualquer pessoa, de qualquer perfil, de qualquer área. Um jornalista, menos ainda. Ninguém pode relativizar a liberdade, ela não pode ser fatiada. Ou todo mundo tem liberdade, ou ninguém tem. Aqueles que se calam agora diante das falas do “descondenado” Lula, das ações persecutórias e inconstitucionais do STF, de cancelamentos, banimentos, desmonetização, prisões, em meio à discussão de um absurdo PL das Fake News precisam entender que a liberdade de expressão é uma garantia constitucional. Ninguém precisa respeitar uma opinião, mas precisamos respeitar o direito de todos terem opinião. Não há como ser a favor da censura, em hipótese alguma, muito menos como instrumento de defesa da democracia. O jornalismo que aceita o banimento de um lado da história deixa de ser jornalismo.

O senhor já foi tachado de negacionista. Como lida com esses rótulos?

Desumanizar e desqualificar “adversários” é uma forma de afirmar que contra eles vale tudo, que devem ser combatidos com quaisquer armas. Eu poderia dizer que negacionista é aquele que nega que o lockdown não ajudou em nada no combate à covid, que negacionista é quem nega o direito de ir e vir, o direito ao trabalho, quem nega a autonomia médica. É aquele que não admite questionamentos, perguntas, que nega o debate. No caso dos prêmios que recebi em duas categorias do Comunique-se, como a definição do vencedor se deu por votação aberta na internet, posso dizer que a perdedora que me chamou de negacionista (a apresentadora Astrid Fontenelle) nega a vontade popular, a democracia.

Recentemente, foi lançada a segunda edição de Cartas de Elise: uma História Brasileira sobre o Nazismo, pela LVM Editora. Na obra, o senhor conta a história de sua bisavó Elise, alemã e judia, a partir de cartas trocadas por ela com seu avô Ernst, que passou a morar no Brasil na mesma época da ascensão de Hitler na Alemanha. Como foi relatar essa história em livro?

Meu avô alemão, Ernst, morreu ainda novo, eu tinha apenas 3 meses de vida. Minha avó nunca se mostrou disposta a falar da história da família do marido, sempre negou que tivesse guardado correspondências trocadas entre meu avô e seus parentes e amigos na Alemanha. Quando ela morreu, aos 96 anos, em 2006, descobrimos em seu apartamento centenas de cartas. A maioria enviada por Elise, mãe de Ernst, ao filho. Minha irmã caçula, Cristina, que mora na Alemanha desde 1992, guardou todas as cartas. Aos poucos, começou a traduzi-las, lançando a ideia de que eu escrevesse um livro que resgatasse a história da parte judia-alemã de nossa família. Cristina ficou responsável pela pesquisa familiar. Localizou pela internet dezenas de descendentes dos irmãos da minha bisavó e conseguiu com eles muitas informações. Eu fiquei responsável pela pesquisa histórica sobre nazismo, Segunda Guerra, Holocausto. Como eu queria escrever um livro com cara de romance, apesar de tratar-se de uma história real, usei as cartas de três maneiras: algumas serviram apenas como fonte de informações, outras foram publicadas na íntegra e parte delas foi transformada em diálogos. Foi emocionante. Jamais imaginei que fosse me sentir tão próximo de parentes dos quais sempre soube tão pouco, de antepassados que desconhecia. Todo o processo de feitura do livro envolveu sensações indescritíveis. É um livro que envolve drama, claro, mas que procura alimentar a fé em dias melhores.

Essa ligação familiar moldou suas ideias liberais?

Minha grande influência liberal foi meu pai, que trabalhou a vida toda ligado ao mundo corporativo, como executivo de grandes empresas. Era um administrador respeitado, professor da Fundação Getulio Vargas, defensor do livre mercado, das liberdades, anticomunista ferrenho. Passei minha vida escolar sendo preparado por ele para rebater os professores em sala de aula, principalmente os de história, que vendiam a União Soviética como o “paraíso na Terra”.

Com o tabuleiro político praticamente definido, o que o senhor acha que podemos esperar das eleições de outubro?

Lula só pode servir como referência negativa. Qualquer um comparado a ele, no cenário eleitoral para a Presidência da República, vai parecer um bom político: honesto, democrático, competente. Ele nem poderia ser candidato, se estivéssemos num país sério. Com tudo o que ele fez de ruim, com tudo o que promete fazer, deveria ser desconsiderado pelos eleitores. Mas a eleição está entre Lula e o atual presidente. E continuará assim. Bolsonaro tem hoje, com todas as dificuldades e limitações que a necessidade de alianças políticas provoca, com todas as barreiras impostas pelo STF, o único projeto possível para que consigamos diminuir o tamanho do Estado e vislumbrar, finalmente, um Brasil verdadeiramente liberal.

Quais são seus projetos profissionais para o futuro próximo?

Escrevo semanalmente para três importantes jornais do país: Gazeta do Povo, do Paraná, Notícias do Dia, de Santa Catarina, e O Liberal, do Pará. Estou trabalhando com a LVM Editora num livro que vai reunir minhas melhores crônicas publicadas nesses veículos. São textos que contam a estranha história do planeta Terra e do Brasil nos últimos dois anos. O lançamento está previsto para o fim de novembro.

Leia também “José Antonio Kast: ‘O Foro de São Paulo é uma ameaça real’”

11 comentários
  1. Marcelo Gurgel
    Marcelo Gurgel

    Ótima entrevista com um ótimo jornalista.

  2. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Lacombe, gosto muito de você, vou comprar seu livro

  3. Joao Batista Inacio Leao
    Joao Batista Inacio Leao

    Revista Oeste traga o Lacombe para o time de vocês. Só tá faltando ele agora para o time ficar completo!

    1. Ana Menezes
      Ana Menezes

      Excelente entrevista com um verdadeiro jornalista.

  4. Robson Oliveira Aires
    Robson Oliveira Aires

    Excelente entrevista. Parabéns ao entrevistador e entrevistado. Que o exemplo do pai do Luís Ernesto Lacombe seja seguido por outros pais e estes ensinem seus filhos a combaterem ferozmente a doutrinação comunista dentro das salas de aula.

  5. JOSE TADEU MOURA SERRA
    JOSE TADEU MOURA SERRA

    Eu sempre digo, uma das melhores formas enaltecer a qualidades das ações de alguém é RECONHECER e não ELOGIAR .
    ELOGIAR é melhor forma POLITICA para ENGANAR.
    Parabéns LACOMBE.

  6. jose angelo baracho pires
    jose angelo baracho pires

    Tudo de bom Lacombe.
    Sei que é recíproca e mútua a empatia com seus concidadãos meu irmão!!!

    1. Júlio Rodrigues Neto
      Júlio Rodrigues Neto

      Grande Lacombe, um Democrata, PATRIOTA e conservador.

      1. Maristela de Godois
        Maristela de Godois

        Parabéns pelo seu trabalho Lacombe!

  7. João Carlos de Souza Carvalho
    João Carlos de Souza Carvalho

    Quero comprar e fazer muita propaganda do livro do Luís Ernesto Lacombe ,sempre o admirei pela clareza e inteligência ! Não sabia que seu pai foi professor da FGV e que era um defensor do livre mercado ! Quem sai aos seus ancestrais não degenera ,sempre melhora !

  8. Maria Auxiliadora L C Filizzola
    Maria Auxiliadora L C Filizzola

    Sou uma admiradora do Lacombe. Sempre íntegro, seguro em suas colocações. Parabéns pela entrevista.

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