Desde o início do ano, Oeste relata numa jornada praticamente solitária na imprensa brasileira o martírio dos mais de mil presos do 8 de janeiro. Foram dedicadas oito capas ao tema, além de uma série de reportagens sobre a agonia dos detidos no cárcere do Supremo Tribunal Federal (STF). Direitos fundamentais, amparados na Constituição, foram violados. Centenas de pedidos de advogados, famílias destroçadas e do próprio Ministério Público Federal foram ignorados. Agora o STF tem um cadáver para carregar ao longo da História — e não foi por falta de aviso.
Nesta semana, Cleriston Pereira da Cunha, de 46 anos, flagrado pela polícia dentro do Senado no dia 8 de janeiro, morreu no presídio da Papuda, no Distrito Federal. Oficialmente, ele sofreu um mal súbito enquanto tomava banho de sol no pátio. Deixou a mulher, Edjane, e duas filhas, de 22 e 19 anos, que tinham esperança de reencontrá-lo depois da tarde de janeiro que terminou de um jeito que ninguém gostaria.
Sem experiência com comércio, a dona de casa Edjane toca há meses, sozinha, a distribuidora de bebidas da família. Desde a prisão de Clezão, como ele era conhecido, ela tem sido amparada por familiares de Brasília, onde mora, e familiares que saíram da Bahia para ajudá-la.
Justiça omissa
A morte de Cleriston era uma tragédia anunciada desde fevereiro deste ano. Naquele mês, o advogado Bruno Sousa pediu um habeas corpus (HC) ao STF com base no “estado de saúde delicado” de seu cliente. O HC caiu na mesa de André Mendonça, que citou a Súmula 606 da Corte para sequer apreciar o pedido. Em linhas gerais, o dispositivo impede um juiz de desautorizar colegas — no caso, Alexandre de Moraes, que foi quem determinou as prisões.
Mendonça, porém, tinha outras saídas para resolver o caso, segundo o entendimento de Vera Chemim, advogada constitucionalista e mestre em Direito público administrativo pela Fundação Getulio Vargas (FGV). O direito à vida se sobrepõe a entendimentos do STF. Para a jurista, Mendonça poderia ter procurado Moraes, a fim de encontrarem uma saída para o problema, ou recorrido à própria presidência do tribunal.
Um novo pedido de liberdade foi feito ao STF em maio deste ano, em virtude de “risco de morte” de Cleriston, dessa vez diretamente a Moraes. No processo, a defesa relatou a batalha do empresário contra sequelas deixadas pelo coronavírus no ano passado: múltiplos vasos e miosite secundária. Conforme um laudo médico, a covid-19 culminou numa internação por mais de 30 dias. O advogado advertiu Moraes de que, desde que fora preso, Cleriston não havia se medicado apropriadamente, “correndo o risco iminente de sofrer um mal súbito”.
Em uma audiência virtual em julho, Cleriston reafirmou o diagnóstico ao relatar ter sofrido sucessivos desmaios e falta de ar durante o período que passou na Papuda.
Em uma audiência feita no fim de julho pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Cleriston Pereira da Cunha, que morreu na Papuda nesta segunda-feira, 20, afirmou que ele sofria de problemas de saúde dentro do presídio, com desmaios e falta de ar. O preso também disse que chegou a… pic.twitter.com/NqWZAFS5H8
— Política Estadão (@EstadaoPolitica) November 21, 2023
O Ministério Público Federal (MPF) acolheu o argumento e pediu a liberdade condicional de Cleriston ao STF. O órgão é responsável por denunciar os réus do 8 de janeiro na Corte e também por pedir a soltura dessas pessoas. “O término das audiências para a oitiva das testemunhas de acusação e defesa e a realização do interrogatório configuram importante situação superveniente que altera o cenário fático até então vigente, evidenciando que não mais se justifica a segregação cautelar, seja para a garantia da ordem pública, seja para conveniência da instrução criminal, especialmente considerando a ausência de risco de interferência na coleta de provas”, afirmou o Ministério Público. Mesmo assim, Moraes não apreciou o ofício encaminhado.
“A sensação que temos é de que o ministro nem sequer leu os pedidos de soltura que fizemos”, disse o advogado Bruno Sousa, em alusão às oito ações que protocolou na Corte, informando a situação de Cleriston.
Além disso, entre outras fragilidades do processo, o defensor afirmou que, embora seu cliente tenha sido preso no Senado, não há provas de que tenha participado da quebradeira. Essa ponderação tem sido feita pelos ministros Nunes Marques e André Mendonça, em casos do 8 de janeiro que já foram levados a julgamento.
Marques ressalta que a acusação feita à multidão que invadiu os prédios públicos naquela data se enquadra em uma classificação denominada “crime impossível” — ou seja: sem armas à mão, não haveria nenhuma possibilidade de destituir o governo Lula. Assim como Marques, Mendonça tem adotado essa interpretação, acrescentando a ressalva de que nem todos vandalizaram os bens públicos naquele dia.
Há pouco mais de um mês, Mendonça levou ao plenário físico do STF o caso de duas mulheres, cujas defesas sustentam que ambas não teriam condições de vandalizar o patrimônio em razão da idade, porte físico e bons antecedentes criminais.
Outro ponto importante nessa tragédia é que, mesmo na hora da morte, houve negligência com Cleriston. Isso porque a Papuda não tinha desfibriladores e cilindros de oxigênio no local. O atendimento médico levou 40 minutos para chegar depois de o empresário passar mal, segundo a Defensoria Pública do Distrito Federal (DP-DF), que visitou o presídio um dia após a tragédia. Cleriston já estava morto quando a ambulância chegou. O documento da polícia do Distrito Federal ressaltou o despreparo dos agentes, que demonstraram “desespero” tão logo o detendo caiu no chão enquanto tomava banho de sol.
Cadáveres em gestação
A repercussão da morte de Cleriston fez com que Moraes concedesse liberdade condicional a alguns presos que já tinham pedido de soltura encaminhado pelo Ministério Público. Mesmo assim, atualmente, 116 permanecem detidos por causa da baderna de 8 de janeiro, alguns correndo o risco de morrer. A despreocupação do STF fica mais visível quando nem a Corte sabe informar quantos, do total, são homens e mulheres, ou a quantidade de doentes.
Mesmo os réus que conseguiram a liberdade condicional há alguns meses poderiam ter morrido em decorrência de alguma comorbidade no período em que ficaram presos. A professora aposentada Iraci Nagoshi, de 70 anos, é uma delas. Solta em agosto, ela teve sucessivas crises de ansiedade, por oito meses, somadas às doenças que já vinham sendo tratadas antes de ser presa: diabetes, hipertireoidismo e dislipidemia (gordura no sangue). Hoje, a ex-professora faz fisioterapia três vezes por semana para recuperar os movimentos do lado direito do rosto, paralisado por causa de traumas associados às noites na Colmeia (ala feminina do complexo penal).
Em setembro, o STF sentenciou 25 pessoas a penas que variam de 14 a 17 anos, em regime fechado, mais pagamento de “multa solidária” sobre um montante de R$ 30 milhões. As decisões desconsideram histórico de doenças, como o de Jorginho Azevedo, de 62 anos, agricultor gaúcho de Torres. Ele tem lesões na coluna e quase dez enfermidades. Há meses, dorme em colchão impróprio e se alimenta mal. Apesar de sua advogada, Shanisys Virmond, protocolar pedidos pela liberdade e informar que ele não esteve no Quartel-General do Exército, em Brasília, como argumentou Moraes e outros ministros, Azevedo foi condenado a 14 anos de prisão e permanecerá na Papuda.
O cacique Serere Xavante cumpre condicional, com tornozeleira, por supostamente praticar “atos antidemocráticos”. Ele só pode se locomover em um raio de 1 quilômetro. Por isso, está impedido de receber tratamento em um centro médico adequado distante de Aragarças (GO), onde vive atualmente. O indígena tem diabetes grave, do mesmo tipo que vitimou seu pai há alguns dias
Enquanto isso, milhares de vidas suspensas aguardam julgamento, a maioria em liberdade condicional e correndo o risco de pegar penas altíssimas. Somados aos argumentos dos ministros Nunes Marques e André Mendonça, o advogado Cláudio Caiavano observou que aqueles que continuam presos deveriam ter sido soltos, assim como os que usam tornozeleira eletrônica, porque um dos crimes que supostamente teriam cometido e que mantém a maioria na cadeia, o de incitação, tem pena de três a seis meses de detenção. “Ou seja, estão cumprindo uma pena além daquilo que a própria lei prevê”, afirmou.
O comportamento de Moraes, de ignorar pedidos feitos pelas defesas, é também notado em outros processos, que não têm necessariamente relação com o 8 de janeiro. Há um mês, o juiz do STF manteve a prisão do ex-deputado federal Roberto Jefferson, que luta contra tumores no pâncreas, testículos, intestino, além de diabetes, hipertensão, depressão, insônia e ansiedade. Jefferson está detido em um hospital do Rio de Janeiro.
O cacique Serere Xavante cumpre condicional, com tornozeleira, por supostamente praticar “atos antidemocráticos”. Ele só pode se locomover em um raio de 1 quilômetro. Por isso, está impedido de receber tratamento em um centro médico adequado distante de Aragarças (GO), onde vive atualmente. O indígena tem diabetes grave, do mesmo tipo que vitimou seu pai há alguns dias.
Como Oeste alerta desde janeiro, e agora com a morte de Cleriston sem ao menos ter sido julgado, a questão dos presos do 8 de janeiro e demais alvos de inquéritos inconstitucionais precisa de uma solução. Se o STF não fizer uma autocrítica e rever o destino desses presos — e não há indício de que vai mudar —, caberá ao Senado interromper essa marcha da insensatez. O Brasil não precisa de outro cadáver.
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Jamais vi tamanha ousadia contra Deus. Crueldade.
Então, é isso…. Pode esperar, a sua COLHEITA será cheia de temores e sofrimentos me caro Ministro do STF (Alexandre de morais), se é que pode chamar isso de Ministro….Acredito que ninguém gostaria de estar na pele deste homem…
Concordo.
Não se pode ocultar a verdade: Alexandre de Moraes é um assassino em série protegido pelos companheiros de Toga. É fim da Justiça Brasileira que sempre foi mambembe.
Prezados Senhores, até quando iremos nos incomodar com o grito dos inocentes? O STF inunda a mídia de desmandos descabidos, prendendo quem não tem culpa e soltando bandidos declarados pela justiça em todas as instâncias. É notório o enjoo daqueles que possuem um mínimo bom senso com tanta sujeira correndo numa corte que se diz justa e imparcial, notório que mais uma vez a boca dos inocentes será amordaçada com um pano sujo de boteco de quinta categoria e nada, mas nada será feito para julgar o sangue que está nas mãos do togado “Alexandre de Moraes”. Que lástima de país é esse?
A.Brunelli
sim, a marcha da insensatez deve acabar, ou vidas ja despedassadas serao perdidas.
gostaria de saber, alem dos presos de 08/01, e alem dos mencionados em seu artigo, quais os outros, provaveis patriotas, perseguidos e/ou desmonetizados e/ou presos?
Quem vai parar os absurdos dos advogados de porta de cadeia do STF?
Para não dizer que ninguém avisou.
O PAÍS caminha para a ruína institucional, econômica e moral. O golpe do tribunal de advogados corruptos, outrora STF, associado a esquerda nazicorruptanarcotraficante e a uma imprensa degenerada jogou o PAÍS em uma insegurança institucional jamais vivida pelo PAÍS. PREPAREMOS-NOS para os desafios que virão para realização das reformas necessárias para restabelecimento da ordem e paz da NAÇÃO .
Esses juízes supremos iníquos um dia vão pagar caro pela crueldade
A foto da capa do artigo já diz tudo. A quadrilha reunida.
JUÍZES CRUÉIS – uma série da Netflix
Haverá o segundo morto
O terceiro
O quarto
Mil e uma histórias de vidas destruídas
Parabéns Cristyan, pelas informações precisas dos tristes acontecimentos. Notícias melhores certamente virão.
A propósito do Habeas Corpus negado pelo Ministro André Mendonça, num ato de covardia, com fulcro na súmula 606 do STF, seria de indagar qual a razão pela qual o Ministro André, ao diante da flagrante e agressiva ilegalidade da prisão objetivada no HC, não concedeu a Ordem de Ofício. Talvez o medo de contrariar o todo poderoso Alexandre de Morais.
O caos jurídico está estabelecido no país.
Uma dúzia de advogados togados entre ministros e procurador geral estão agindo à margem da CF, das leis brasileiras e de todos os tratados internacionais sobre processos criminais.
Que os verdadeiros culpados sejam identificados, que se abra os devidos processos legais, que seja dada amplo direito a defesa, que sejam julgados e se condenados que cumpram suas penas em conformidade com as regras estabelecidas.
Colocar todos na mesma cesta, é um ato de covardia do STF que simplesmente abandonou a justiça e age em conformidade com suas canalhices.
É crueldade nua e pura. Xandão é psicopata, narcisista e sádico. Querem provar a tese do golpe de estado e punir exemplarmente os “bolsonaristas”. Cristian, aqueles individidos que foram filmados quebrando nosso patrimônio estão entre esses que estão à mercê do psicopata ou foram “sumidos”?
Acredito que Alexandre de Moraes nem se dá ao trabalho de ler o que os advogados de defesa escrevem, vai negando tudo que é favorável às vítimas ( vítimas dele Alexandre) para continuar a sua cruel sanha contra pessoas de bem.
A lava jato chegou perto dos “ministros” do STF. Reagiram tirando Lula da cadeia para derrotar o Bolsonaro nas urnas: claramente fraudadas. E agora mantém o governo e o “casamento” sem querer traição. Se não!! ameaçam todos que ousarem a tirar o osso da boca dos cachorros. A farsa quer dizer o golpe foi dado por eles.
Se o Senado não se posicionar de forma veemente, os absurdos da corte maior vão continuar, sugiro o impeachment de uns 3 ou 4 urubus para acionar o freio de mão desses carrascos
Quer matar mais “bolsonaristas” , um é muito pouco.
Moraes tem pacto com o diabo, não é possível um tirano integrar uma corte Constitucional.
A Constituição para ele não existe, arrogante, cínico e debochado, não tem ética.
Peço que a justiça divina seja bem rigorosa com esse monstro e lhe dê o castigo que ele merece.
SER DESPREZÍVEL.
Quem aqui é inocente para achar que juiz lê alguma coisa?
Os miseráveis canalhas de plantão agora c as mãos sujas de sangue, destruindo vidas e familias, É desolador o q vem acontecendo em ns pobre pátria amada
Seu artigo foi direto ao ponto.
ALeXANDRE DE MOARES, já ea um ser abjeto, arrogante, pretecioso, desrespeitador das Leis e da Constiuição, sem ética nem moral. Agora é também um ASSASSINO. Simples assim.
Abaixo todos do STF
Parabéns Cristyan Costa pelo artigo brilhante e por todo trabalho na Revista Oeste. Fico feliz em ver como tantos jovens estão seguindo o trabalho de vocês, sem dúvida alguma fazem um jornalismo de excelência, melhor impossível.
Obrigado, cara Teresa. A sua audiência e palavras cordiais me prestigiam. Forte abraço
Cristyan,o prazer é todo meu em seguir os seus passos.