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Ubiratan Sanderson, deputado (PL) | Foto: Reprodução/Câmara dos Deputados
Edição 195

Ubiratan Sanderson: ‘Este é o pior ano para a segurança pública em décadas’

O presidente da Comissão de Segurança Pública da Câmara afirma que a esquerda afrouxou o combate às facções criminosas e deixou a bandidagem mais à vontade para atuar

Rute Moraes
Rute Moraes
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O primeiro ano do governo Lula termina com uma constatação unânime: independentemente da camada social ou da região do país, a sensação de insegurança aumentou — e muito. Diariamente, a população das cidades assiste a cenas de roubos à mão armada. Arrastões tomaram as praias do litoral. As facções criminosas cresceram ao ponto de disputar território à luz do dia. Em capitais como São Paulo e Rio de Janeiro, é impossível não conhecer alguém que teve o celular furtado nas últimas semanas.

Para o deputado gaúcho Ubiratan Sanderson (PL), presidente da Comissão de Segurança Pública da Câmara, isso é resultado da frouxidão no combate ao crime organizado. E o principal responsável por essa situação é o ministro Flávio Dino. “O Ministério da Justiça, que determina as linhas programáticas para o enfrentamento ao crime organizado, simplesmente parou, travou e não fez nada”, disse. “Não há um programa que tenha sido criado no ministério.”

Sanderson foi policial federal por 25 anos. Antes, serviu como tenente do Exército. Ele afirma que a esquerda optou pelo aparelhamento ideológico de um setor que precisa de especialistas, técnicos e muito treinamento. O deputado ainda avalia como uma “medida de mentirinha” a Garantia da Lei e da Ordem (GLO), decretada por Lula, que enviou homens das Forças Armadas para aeroportos e portos do Rio e de São Paulo. 

Deputado gaúcho Ubiratan Sanderson (PL), presidente da Comissão de Segurança Pública da Câmara | Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados

Leia abaixo os principais trechos da entrevista.

Como o senhor avalia a gestão da segurança pública neste primeiro ano de governo Lula?

A pior avaliação possível. Posso afirmar que 2023 é o pior ano da segurança pública nos últimos 30 anos. O Ministério da Justiça, que determina as linhas programáticas para o enfrentamento ao crime organizado, simplesmente parou. Não há um programa que tenha sido criado no ministério. O principal motivo é a falta de técnicos. Nos governos Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma Rousseff, eles tinham técnicos no Ministério da Justiça. Cheguei a trabalhar em várias operações com o ministério. O ministro era político, mas os demais eram técnicos — delegado da Polícia Federal, coronel da Polícia Militar, policiais civis ou rodoviários, ou ainda promotores de Justiça. Todas as secretarias eram ocupadas tecnicamente. Agora, com Flávio Dino, eles aparelharam ideologicamente o Ministério. O número dois da pasta é o jornalista Ricardo Cappelli — e ele manda. Eles detestam os policiais. Os demais auxiliares são três ex-deputados federais que não se reelegeram: Elias Vaz, secretário de Assuntos Legislativos, Wadih Damous, secretário Nacional do Consumidor e Tadeu Alencar, secretário Nacional de Segurança Pública. Eles nunca pisaram numa delegacia, não sabem nada de segurança pública. O segundo ponto é que eles já têm uma concepção ideológica e não desejam mudar. Ou seja: bandido é vítima da sociedade e há superlotação nos presídios. O terceiro ponto sempre foi o interesse político do ministro Dino em ir ao Supremo Tribunal Federal. Ele nunca se preocupou em fazer um plano de segurança pública voltado para a população, tanto que ele nunca pisou em uma delegacia, apesar de ter ido à Favela da Maré, no Rio.

Em novembro, o governo Lula decretou a Garantia da Lei e da Ordem (GLO) em alguns portos e aeroportos do Rio de Janeiro e de São Paulo. O que achou da medida? 

É uma GLO de mentirinha para gastar dinheiro público dentro de aeroporto. A GLO ajudaria só no combate ao crime organizado — e não resolveria — se ocorresse em todas as capitais e nas fronteiras. As Forças Armadas têm 300 mil homens. A Polícia Federal tem 10 mil, a Polícia Rodoviária Federal também, e eles fazem sozinhos o policiamento das fronteiras. O pessoal da PF dá risada dessa GLO em aeroporto. Retornei do exterior recentemente, pousei no Aeroporto de Guarulhos e encontrei alguns amigos da PF. Eles disseram que, naquele momento, os militares não estavam lá, mas que, quando vêm ao aeroporto, ficam uns 40 soldados em uma sala com ar-condicionado, que dizem: “Se der qualquer coisa, pode nos chamar”. Repare que o crime organizado não reclamou, nem os órgãos dos direitos humanos. Quando o então presidente Michel Temer decretou uma GLO, várias entidades fizeram notas contrárias. Agora teve alguma nota?

Qual é o caminho para desmontar o crime organizado?

A solução não é simples, mas há várias saídas. Uma delas seria a GLO em todas as capitais e nas fronteiras por um ano, como eu disse. Um patrulhamento com viatura do Exército, homens com fuzil identificando as pessoas no morro. O problema do Brasil não são as favelas, mas o crime organizado está escondido lá dentro. Para fazer isso, é preciso haver vontade política. Só alguém como o ex-presidente Jair Bolsonaro talvez pudesse fazer. Bolsonaro deu alguns passos, e a atuação das facções diminuiu. O crime não era problema no Brasil nos últimos quatro anos, mas passou a ser. 

Flávio Dino, durante Cerimônia de Lançamento do Programa Nacional de Enfrentamento das Organizações Criminosas | Foto: Isaac Amorim/MJSP
O que o Poder Legislativo pode fazer nessa área?

Apresentei um projeto de lei que tipifica o “novo cangaço” como crime hediondo e com penas altíssimas. Esse é um dos crimes que estão em crescimento. Nesses casos, as quadrilhas sitiam uma cidade pequena, com fins patrimoniais, para assaltar bancos. O projeto aumenta a pena para 40 anos e criminaliza os atos preparatórios para o crime. Atualmente, quem comete um assalto pega em média dez anos de prisão. Com o meu projeto, a média passa a ser de 20 anos, mas, se houver morte, sobe para 40. Elaborei esse projeto com a ajuda de colegas da polícia, que são especialistas. O texto está parado no Senado. Outra proposta que ajudaria é o projeto que acaba com a “saidinha” da cadeia. Assim, a bandidagem entenderia que quem comete crime vai ter vida difícil na cadeia. Essa proposta também está parada no Senado.

Por que as organizações criminosas se fortaleceram nos últimos anos?

Leniência do Estado. Fiz esse estudo. Em 30 anos, o único presidente que foi linha dura, fora da curva, foi o Bolsonaro. Tivemos 26 anos de governos omissos no enfrentamento ao crime organizado. Criou-se uma cultura de não punição no Brasil. Olhe o exemplo de El Salvador, que está fazendo a lição de casa com o presidente Nayib Bukele. Lá, ocorriam brigas de gangues com altos índices de homicídios. O presidente mandou construir um presídio de 40 mil lugares, e a polícia recolheu os criminosos. O resultado foi um ano sem homicídios. O presidente tem 90% de aprovação. Hoje, colhemos os frutos da gestão de 26 anos fracos. A economia do Brasil aumentou cinco vezes, mas as forças policiais para proteger as fronteiras diminuíram. Em 1990, a PF tinha 15 mil homens, hoje tem 10 mil. Cresceu a insegurança nos últimos anos, pois sofremos o resultado de governos covardes no enfrentamento da criminalidade. O pacote anticrime — que endureceu penas — foi aprovado no Congresso em 2019. Esse foi o único esforço legislativo feito nos últimos 40 anos no Brasil sobre legislação penal.

Na semana passada, a Câmara reprovou a urgência de um projeto de decreto legislativo, de autoria do senhor, para sustar as decisões de Lula pelo desarmamento. A oposição não consegue maioria sobre esse tema?

Precisávamos de 257 votos. Tivemos cem votos a mais do que a esquerda, mas perdemos por três votos. Estou aqui há cinco anos, mas não me lembro de algum requerimento de urgência que tenha sido aprovado sem acordo. Esse não tinha acordo, mas colocamos para votar mesmo assim. A maioria do centrão vota conosco. Quem falhou foram dez deputados do próprio PL — se abstiveram ou votaram contra. Em fevereiro, vamos tentar de novo. 

“Não há superlotação, conheço os presídios. A esquerda afirma que há 600 mil presos no Brasil, mas 300 mil estão em regime semiaberto, em prisão domiciliar ou usando tornozeleira eletrônica”

O que acontece com a bancada do PL?

Vamos firmar com o PL para que todos os deputados entreguem votos, ou então peçam para sair do PL. Já levei essa matéria ao Bolsonaro e ao líder da Câmara, Altineu Côrtes (RJ). Deixei claro para eles que não podemos trabalhar e morrer na praia por votos nossos. Se o sujeito não quer ficar no PL, tem que pedir para sair, pois contamos com esses votos.

O Senado tem uma proposta de emenda à Constituição que criminaliza qualquer tipo de posse ou porte de drogas. Quando essa PEC chegar à Câmara, acha que pode avançar?

Faremos todo o esforço para que a política contra as drogas volte a ser endurecida. Em 2006, aprovaram a Lei nº 11.343, que “despenalizou” o consumo de drogas. Na prática, foi a liberação. A pessoa que estiver fumando maconha não comete crime nenhum? Desde 2006, eu alertava que essa lei faria o consumo de drogas explodir. Se explode o consumo, explode o tráfico. Não existe tráfico sem consumo. Cada usuário, mesmo consumindo a droga dentro de casa, alimenta o tráfico — e 60% dos homicídios têm relação direta com o narcotráfico. É preciso mudar a lei para impor penas menores aos usuários, como perda do direito a tirar passaporte ou a comparecer a shows, proibição da participação em concursos públicos ou perda da CNH. Agora, pegar o usuário de droga e colocar ele sentado para assistir a uma palestra não vai resolver.

Houve um “balde de água fria” com a chegada de Lula | Foto: Reprodução/Redes Sociais/PF
Como policial federal, como o senhor avalia a atuação da PF sob o comando do ministro Flávio Dino?

Um diretor-geral da PF, apesar de ser policial, é indicado politicamente, conforme os predicados do presidente da República. Mas a indicação do diretor-geral não quer dizer que os policiais estejam subordinados ideologicamente, pois eles não estão. Essa operação recente, que apreendeu um grande contrabandista que havia introduzido 43 mil armas de fogo no país, foi uma “lição” dada pela PF a Dino. Ele mentia dizendo que os CACs [colecionador, atirador desportivo e caçador] entregavam armas para o crime organizado. Isso desarmou o discurso de Dino. As armas apreendidas nas mãos dos criminosos tinham a numeração raspada. Quando havia o número, a gente verificava, e não era arma de CAC. Houve, ainda, outro episódio, quando Dino disse a Lula que toda a PF estava a serviço dele. Ele bravateou, pois a PF é um órgão de Estado, formado por homens e mulheres de carreira que fazem concursos e não dependem da política.

Mas os agentes obedecem ordens. Há insatisfação com a atual gestão?

Houve um “balde de água fria” com a chegada de Lula. Antes, a PF e a PRF estavam quebrando recordes de apreensões de drogas. Há uma insatisfação gigantesca na PF. Bolsonaro causava alvoroço nos encontros com a corporação, o pessoal adorava ele. Que policial federal tiraria foto com Lula ou com Dino?

O que o senhor acha dessa política antiencarceramento com o argumento de superlotação do sistema prisional?

Não há superlotação, conheço os presídios. Quando há, é algo excepcional. Na Papuda e na Colmeia, no Distrito Federal, por exemplo, não há. A esquerda afirma que há 600 mil presos no Brasil, mas 300 mil estão em regime semiaberto, em prisão domiciliar ou usando tornozeleira eletrônica. Então, não são 600 mil pessoas atrás das grades, são 300 mil. Esse dado é omitido e utilizado para defender o desencarceramento. Ideologicamente, pregam que só são presos os pretos, pobres e prostitutas.

Leia também “Brendan O’Neill, editor da Spiked: ‘Estamos numa nova era de irracionalismo'”

1 comentário
  1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Sou a favor de pena de morte, para criminosos recorrentes. Só assim pode se fazer uma política de ressocialização sem lotação nos presídios.

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