Faltavam poucas semanas para o desfecho do duelo quando cismei de conferir pessoalmente, num sábado de setembro de 1959, a força do inimigo. Aos 9 anos, acompanhava atentamente a reta final da corrida rumo à prefeitura de Taquaritinga. Assistira da janela do caminhão-palanque um comício do meu pai, achei de bom tamanho a plateia atraída pelo candidato dos janistas. Era hora de comparar o que vira a um comício dos adversários de Adail Nunes da Silva. Foi o que argumentei na manhã daquele sábado em que pedi a meu irmão sete anos mais velho que me levasse ao comício dos ademaristas, marcado para as 8 da noite.
Flávio avisou de cara que não iria, poderia parecer provocação. Mas pediria a um amigo forasteiro de passagem pela cidade que me escoltasse. “Você é um moleque que nenhum adulto conhece”, ponderou. “Mesmo assim, é bom não ficar se exibindo no meio deles.” Engoli em silêncio a alusão ao meu anonimato. O primogênito saiu à procura do amigo, que aceitou a missão. Kajuru — esse era o apelido do meu guarda-costas — foi buscar-me em casa perto das 8 e meia. A discurseira já começara.
Dez minutos e cinco quadras depois, chegamos ao comício no exato momento em que o serviço de som amplificou a denúncia de um candidato a vereador: “O Adail é ladrão. Ele roubou os trilhos da estrada de ferro”. Desconcertado, nem comecei a avaliar as dimensões da manifestação. Muito mais urgente era saber o que o acusado tinha a declarar. Voltei para casa e topei com meu pai de saída. Parado no portão, ele ouviu sorrindo o relato e encerrou o assunto com três frases: “O que a gente diz nos nossos comícios é igual ou pior. Isso acontece em toda campanha eleitoral. Depois da votação tudo volta ao normal”.
Foi o que aconteceu em 1959 — e tornaria a acontecer nas incontáveis eleições das quais participei como parente de candidato, cabo eleitoral ou jornalista em serviço, discursando no palanque ou aplaudindo na fila do gargarejo. Desde 1945, quando a queda da ditadura do Estado Novo ressuscitou a escolha de prefeitos e vereadores pelo voto direto, os eleitores são confrontados com o tsunami verbal produzido, em três meses de campanha, por bons oradores e torturadores da língua portuguesa, políticos talentosos e perfeitas bestas quadradas, novatos promissores e veteranos bisonhos, propostas interessantes e ideias de jerico — além de acusações sem pé nem cabeça, golpes baixos e, sobretudo, mentiras concebidas para nocautear o oponente.
No século passado, invencionices foram disseminadas em comícios, depois por emissoras de rádio, em seguida pela TV. Todas chegaram aos eleitores, nenhuma decidiu alguma disputa. Abstraídos os municípios dominados por coronéis que comandam currais eleitorais, venceu a disputa o candidato que teve mais votos por parecer mais competente que os outros aos olhos dos cidadãos. Encerrada a apuração, vencedores e vencidos retomam o convívio dos contrários, e vida que segue. Foi assim em 1959: meu pai voltou à prefeitura sem tropeçar em trilhos ferroviários. Assim seria em 1968, quando os adversários juraram que lutavam para salvar a cidade de um comunista de alta periculosidade, e também em 1982: ao conceder-lhe o último mandato, o povo sepultou o boato segundo o qual estava idoso demais para governar a cidade. Tinha 66 anos.
Cármen Lúcia promoveu o antecessor Alexandre de Moraes a protetor da Pátria em perigo e padroeiro da democracia preservada graças a socos e pontapés na Constituição
Aos 70, a ministra Cármen Lúcia nem imagina o que acontece em eleições municipais. Nunca viu um comício de perto, jamais escalou um palanque. Em 2012, ao assumir pela primeira vez a presidência do Tribunal Superior Eleitoral sem festa nem foguetório, ela parecia saber que se tratava de um puxadinho do Supremo Tribunal Federal sem relevância suficiente para frequentar espaços nobres do noticiário jornalístico. Criada em 1932, a hoje onipresente Justiça Eleitoral nem dava as caras em eleições municipais. Candidatos indignados com abusos dos adversários que fossem queixar-se ao juiz da comarca. Magistrados não se metiam por qualquer motivo no mundo das urnas. Lidavam com pendências mais urgentes, só falavam nos autos do processo, julgavam com imparcialidade e não agiam como militantes políticos. Aquele Brasil não existe mais, informou nesta semana o retorno de Cármen Lúcia ao mesmo cargo que assumiu há 12 anos. Foi redesenhado pelo surgimento das redes sociais. Hoje ninguém mais conta mentiras; dissemina fake news. Quem faz isso não atrapalha a vida de adversários; ameaça a solidez das instituições, conspira contra o Estado Democrático de Direito e sonha com o advento da ditadura de extrema direita. É um bandido a ser duramente castigado.
Com o barulhento endosso dos 300 convidados, Cármen Lúcia promoveu o antecessor Alexandre de Moraes a protetor da Pátria em perigo, recordista em condecorações por bravura no comando da guerra que erradicou o golpismo bolsonarista e padroeiro da democracia preservada graças a socos e pontapés na Constituição. Ela prometeu espelhar-se em Moraes para que o TSE repita nas eleições deste ano o que fez em 2022. O Primeiro Carcereiro prende e arrebenta há cinco anos, mas o inimigo é teimoso. É por isso que o ataque permanente à desinformação nas eleições municipais encabeça o ranking de prioridades montado pela ministra, que vai orientar os eleitores com muita clareza.
Em discurso de posse, a nova presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministra Cármen Lúcia, elogiou seu antecessor, ministro Alexandre de Moraes. A cerimônia ocorreu na segunda-feira 3. pic.twitter.com/7ZilO0bKKu
— Revista Oeste (@revistaoeste) June 6, 2024
O que disse em seguida continua à espera de tradutores. Para a ministra, é preciso intensificar o combate a um inimigo invisível que batizou de “algoritmo do ódio”. Ela também acha que “a mentira espalhada pelo poderoso ecossistema das plataformas é um desaforo tirânico contra a integridade da democracia”. Com esse discurso, Cármen não conseguiria eleger-se vereadora de vilarejo. Mas combina com o papel de babá de marmanjo, especialista em ensinar eleitores espalhados por milhares de municípios do Brasil de Lula a identificar quem só diz a verdade ou quem prefere falsificá-la — e instalar na prefeitura o candidato certo.
Parece mentira. E é.
Para a nova presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministra Cármen Lúcia, é preciso intensificar o combate a um inimigo invisível que batizou de “algoritmo do ódio”. Ela deu a declaração na segunda-feira 3, durante a cerimônia de posse. pic.twitter.com/jpOpw4wX3G
— Revista Oeste (@revistaoeste) June 6, 2024
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Foi essa que disse: “o cala boca já morreu”. É muita cara de pau, O escárnio venceu o cinismo, palavras dela e que cabem como uma luva para as atitudes dela.
Foi essa que disse: “o cala boca já morreu”. É muita cara de pau, O escárnio venceu o cinismo, palavras dela e que cabem como uma luva para as atitudes dela.
O que, além de entristecer, desespera, é constatarmos que esses ministros avançam cada vez mais e o povo, em grande maioria, está assistindo à desinformação em massa nas TVs de suas casas, das salas de espera da maioria dos consultórios, escritórios e assemelhados, presos às falsas narrativas, às novelas, séries e filmes pueris que não passam de massificação da ideologia que assola e destrói o país. Desanimador.
Hora de elegermos uma nova constituinte e se redefinir a estrutura do Estado brasileiro. Eliminar os TSE, TCU, TCE’s, TCM, TRT,TSE’s, TRE’s; retirando poderes de presidentes de câmaras e do senado.
Genial Augusto 👏👏👏
Augusto Nunes é uma enciclopédia viva da política nacional.
Lembro que em 1982 com 25 anos mergulhei de cabeça na campanha para a primeira eleição direta para governadores dos Estados.
Morava em Curitiba e trabalhei para o candidato José Richa iniciando minha jornada nos palanques, carreatas e diretórios, sendo o candidato eleito para o mandato 1983-1986. Acabou se afastando do governo do Estado em maio de 1986 para concorrer ao Senado sendo igualmente eleito.
Eu fazia distribuição de “santinhos” até nas madrugadas de domingo nas saídas dos bailes da Sociedade Bacacheri que acontecem até hoje.
Era tudo no corpo-a-corpo e quando grupos adversários estavam na mesma região procurávamos transitar por ruas diferentes. Havia respeito.
É lamentável ouvir o discurso de posse dessa senhora na sua posse neste puxadinho do STF.
Aqui o sistema vem cumulando derrotas no Congresso e semana passada os eleitores europeus demonstram sua insatisfação com esta agenda nefasta da esquerda mundial.
Tuas colocações sempre assertivas e honestas. Sou teu fã !
Parabéns Augusto!
Prezado Augusto, na minha cidade, Agudos, eram os Cobras (janistas) contra os ratos (ademaristas) e a coisa pegava fogo na época da eleição. De vez em quando, saía tiro, mas o mais inusitado eram os carros alegóricos, dignos de desfile da Sapucaí. O que eu me lembro mais, foi um da turma do meu tio João (janista de primeira hora e prefeito por duas vezes) que trazia uma cobra enorme, toda empinada, com um ratão na boca. Simplesmente impagável. Dos adversários, o que eu lembro foi um despertador gigante, com uns três metros de diâmetro, destinado a despertar a administração do meu tio.
Sobre a sinistra Carmen Lúcia, sempre me confundo e a chamo de Carmen Súcia e penso que, por extensão ao que ela falou, podemos afirmar que, às vezes, ocorre de um canalha certo estar no antro certo, não obstante na hora errada.
Que prazer ler Augusto Nunes. Sempre fica aquela vontade de quero mais…Vida longa querido!
Sensacional!!!
Seus artigos são sempre muito bem vindos ! Aínda bem que temos um jornalista competente combatendo as verdaderas mentiras .
Antes morto na terra mas vivo e livre nos braços de DEUS do que vivo na terra e escravo nas mãos do demónio.
Afinal Augusto, quando o governador Tarcisio vai te nomear Diretor de Redação da TV Cultura para lá também ouvirmos o jornalismo verdadeiro, plural e imparcial. Quando teremos um Jornal da Cultura e um Roda Viva com jornalistas e entrevistados de todas as ideologias e imparciais?
Creio que teríamos muitos mais brasileiros esclarecidos em todos os cantos de nosso pais. Volto a insistir que nossa Revista Oeste tem que convidar e desenvolver entrevistas com toda “tucanagem” que fez o “L”, começando por FHC para nos explicar como enxerga nossa atual democracia, a tortura de inocentes patriotas democratas, a volta da destruição das estatais e outras barbaridades deste consorcio Lula/STF. Vale dizer que fui tucano desde a fundação do partido até 2019, ano que celebridades tucanas perderam o caráter e destilaram ódio ao honesto e competente governo Bolsonaro. Aos 78 anos, que vergonha ter admirado essa gente inútil e antidemocrática. Como entender o conservador extremamente religioso Alckimin ser vice daquele que “queria voltar a cena do crime”, e mais recentemente subir ao altar de uma paroquia para enaltecer o “comunista cristão” principal articulador da farsa do 8 de janeiro, para dizer a seguinte insanidade: “quis o destino que Flavio Dino fosse o Ministro da Justiça e Segurança, na hora certa e no momento certo para salvar nossa democracia e evitar o golpismo”. Como consegue dormir esse cristão?
Augusto Nunes sempre brilhante!
O assim chamado “combate à desinformação” é o apelido que a esquerda adotou para a missão de aniquilar a crítica aos donos do poder e vem escorado em expressões de efeito como “ataques à democracia” e “discurso de ódio”. Tudo de acordo com a cartilha leninista que não abre mão de tutelar o povo e de conduzi-lo ao inferno travestido de paraíso.
TSE, uma jaboticaba brasileira. Semana passada, eleições no México com voto em papel em urnas transparentes. Este final de semana, Europa com urnas semelhantes. Mas o Brasil não, o Brasil tem o TSE, a melhor coisa do mundo, que cuida com carinho das eleições…
Essa BRUXA VELHA vai dar continuidade a ditadura do antecessor e manter as perseguições aos dr direita , amordaçar a opinião pública e censurar toda e qualquer notícia que julgar que não é do agrado dela. São bisonhos esses sinistros do SUPREMO que de SUPREMO não tem nada.
Como sempre texto impecável e uma delícia de ler.
Como sempre, cirúrgico e corajoso!!!
Ela cobra quanto para assombrar uma casa de três cômodos?
A mentira sendo ameaçada pela verdade, esse é o grande terror do integrantes do sistema.
Acredito que já lemos relatos do mestre Augusto Nunes sobre sua experiência em participação de campanhas políticas de seu pai. Vivências e analogias, que nos evidenciam que os defensores da verdade estão perdendo espaço para os defensores do poder.
Acredito que já lemos relatos do mestre Augusto Nunes sobre sua experiência em participação de campanhas políticas de seu pai. Vivências e analogias, que nos evidenciam que os defensores da verdade estão perdendo espaço para os defensores do poder.
Judiciário brasileiro um caos a caminho do poço em queda livre, deprimente.
Judiciário brasileiro um caos a caminho do poço em queda livre, deprimente.
Baba de BANDIDO…
Babá.
Tudo o que vem do judiciário tem causado ojeriza em qualquer cidadão com um mínimo de senso crítico.
Benta Carneiro. Rsrsrs
MADAME MIM!!!!
Grande realidade
Tomara que a ministra “b….q…” aquela expressão imortalizada pelo próprio Augusto Nunes,leia e reflita sobre esse brilhante texto.Parabéns grande jornalista!
É urgente fechar esse supremo esse TSE e o presidente do Superior Tribunal Militar, aquele que disse que não existe mais comunismo no mundo, colocar esse idiota como traidor da pátria, aí ele vai saber aonde tem comunismo
Cuidado com a bruxa de Blair.
Muito bom, Augusto !
BRILHANTE,como sempre!!!
BRILHANTE,como sempre!!!
Está senhora foi que disse que a censura ia durar poucos dias. É outra que não respeita a constituição , pobre deste país é seu povo.
Os psicopatas narcissistas do grupo Luladrão – STF – TSE, vivem de acordo com sua inteligência ou ausência dela e são identificados por sua capacidade de serem mais espertos ou manobrar, manipular as pessoas.
São realmente os artistas do engodo, sentem-se entitulados e com poderes acima da lei.
O fato deles constantemente mentirem e trapacearem é importante para o objetivo de vencer e para a imagem de superioridade de seu ego, a qual esta baseada em sua capacidade de enganar outras pessoas.
Nesta filosofia de sucesso que o STF e seus sequazes implementaram, o fim justifica os meios e o mais recente algoritmo do ódio., mas ódio de quem?
Genial
Um bando de pirados neste STF. Pior, ganhando fortunas, vivendo como reis e só falando e fazendo m#@da.
Este país não é para amadores.
É, caro Augusto Nunes, seu artigo – este e anteriores – abordando essas figuras com cadeiras no tal STF e no fantasmagórico TSE deveria obrigatoriamente levar os focalizados personagens a um sentimento irresistível de VERGONHA e imergirem num processo de introspecção que resultasse ou na RENÚNCIA à toga ou, quando mínimo, na diametral mudança de atitudes como péssimos juízes e como seres humanos que não agem como tais.
A Justiça Eleitoral deve ser extinta.
Não é necessária.
Uma velha vagabunda uma “tiranete” cadavérica que, junto com os outros 10 sacripantas, defeca dia após dia na constituição 💩👺💩👹🐀
Parabéns Augusto Nunes. Quanto ao STF, uma bomba caseira já resolveria o problema.
Essa senhora se espelha diariamente no mal e na injustiça. Falta apenas uma vassoura e um chapéu de bruna,já possui todos os requisitos anteriores.
Que notório saber jurídico e reputação ilibada é essa gente? Como disse o autor da matéria, desrespeito a constituição a socos e pontapés. A que ponto chegou nossa nação!
¿La verdad? por la verdad la garantia soy yo!! Carmencita Burana.
Essa do “algoritmo do ódio” é uma expressão e tanto, Dona Cármem. Uma “carmina brasiliana” século XXI. O problema da canção é que sob o algoritmo binário Lula e Bolsonaro, um deles soa como Stockhausen…
Hipócrita enaltecer Moraes não está muito bem do juízo.