“Típica noite em Portland 2020. O sol se pôs e uma centena de pessoas, quase todas entre 20 e 30 anos, começa a se reunir em grupos de dois ou três em locais pré-combinados. Esta noite é na rua do centro onde estão localizadas as cortes federais e a delegacia central da cidade, conhecida como Centro de Justiça. Começa a batucada, alguns slogans do Black Lives Matter são gritados, na maioria ‘Fuck the Police’, e não há nenhum policial por perto. Policiais quase nunca aparecem durante os protestos noturnos, pelo menos até que as coisas esquentem, quando os vidros são quebrados e, como já acontece há 200 noites seguidas, as fogueiras tenham início. Nesta noite eu vi um policial. Ele está sentado sozinho na sala de entrada traseira do Centro de Justiça. Atrás dele gira um ventilador industrial. Quando eu pergunto o porquê, ele explica que na noite anterior um grupo de manifestantes jogou um pacote gigante de diarreia na sala onde ele trabalha. O ventilador é para tentar afastar o mau cheiro.”
Essa descrição abre um artigo cheio de melancolia escrito por Nancy Rommelmann para a Reason Magazine. Nancy se mudou com a família para Portland em 2004, em busca de um sonho típico da costa oeste dos Estados Unidos: combinar prosperidade com vida mais calma e saudável. Não aguentou a decadência e se mudou para Nova York. Voltou apenas para descrever o enlouquecimento de Portland.
Portland fica no Estado do Oregon, perto de Seattle. Tornou-se conhecida como um refúgio tranquilo para hippies e adeptos da alimentação orgânica. Seu meio milhão de habitantes vive numa cidade pacata e cheia de áreas verdes. (Outros 3 milhões moram na região metropolitana.)
Portland é um tradicional reduto da esquerda. Em 2016, 75% da cidade votou em Hillary Clinton contra Donald Trump. O prefeito Ted Wheeler e a governadora do Estado, Kate Brown, são do Partido Democrata. “Não constituem uma cidade nem um Estado bem governados”, declarou um alto funcionário estadual à matéria da Reason. “Portland teve seguidamente três prefeitos que fracassaram.” A cidade é controlada por “comitês” que facilitam greves e paralisações nos serviços públicos. Já está sendo apelidada de Dumptown (“Cidade-Lixeira”).
O que estava ruim piorou muito no ano passado. Foi quando o manso espírito hippie se transformou num esquerdismo extremista e intolerante. Fregueses iam tomar café e reclamavam aos berros que o salário dos baristas era baixo. O maior centro gay da cidade foi condenado por ser “branco demais”. Uma empresa familiar de fornecimento de tortillas recebeu ameaças de morte por não empregar latinos de verdade. A imprensa local publicava listas em que se denunciavam restaurantes que “cozinham a comida de outros países à custa dos povos dessas mesmas culturas”.
“O ódio parecia flutuar em todos os lugares”, escreveu Nancy Rommelmann em seu artigo. “Estava aguardando o momento certo e se tornando uma identidade em si.” Esse ódio acumulado encontrou território fértil na onda anti-Trump. E o pretexto para a explosão foi a morte acidental do negro George Perry Floyd Jr., em Minneapolis, no dia 25 de maio, sob o joelho de um policial branco incompetente.
A morte de George Floyd se tornou um cheque em branco para a violência generalizada em países democráticos. Organizações extremistas como Black Lives Matter, os black blocs e os antifas saíram quebrando tudo, derrubando estátuas, vandalizando locais de trabalho e destruindo reputações.
Os antifas (palavra que quer dizer “antifascistas”) nasceram lá mesmo, em Portland, em 2007. Dizem-se inspirados por movimentos que lutaram contra os nazistas na década de 1930. O discurso deles é típico da esquerda radical — “contra assassinatos da polícia, guerras imperialistas e massacres fascistas”. E seus métodos se parecem cada vez mais com a ação dos “camisas-pardas” de Adolf Hitler — violência, terror, chantagem. Os antifas decidem quem deve ser considerado “fascista” ou não.
O cadáver de George Floyd é explorado por esses movimentos até hoje, mas arrefeceu com o tempo. Não em Portland. Ali as coisas saíram do controle. E sem nenhuma sombra de lógica. “Aconteceu um enorme tumulto no Pearl District no dia seguinte ao da eleição de Donald Trump”, lembra o jornalista local Michael Totten. “Quantas pessoas no Pearl District votaram em Trump? Provavelmente nem 1%. Afinal, que gente é essa que declara guerra a uma parte da cidade onde ninguém votou em Donald Trump?”
A matéria de Nancy Rommelmann cita uma manifestante (branca) gritando na sua cara que “a polícia de Portland está assassinando todos os nossos amigos negros nas ruas”. Na verdade, tinham ocorrido apenas duas mortes de presos sob custódia da polícia no ano anterior. E as duas vítimas eram brancas. Mas, como sabemos bem, a realidade não importa para militantes aos berros. Vale a narrativa que justifica qualquer coisa.
Num ciclo perverso, a antigamente pacata Portland virou atração no noticiário nacional por causa da violência. E essa fama súbita viciou os ativistas. A cada noite iam além na truculência para continuar aparecendo (com simpatia) na CNN. “Os ativistas de Portland e seus apoiadores enxergaram altruísmo quando atacaram o tribunal da cidade”, lembra Nancy Rommelmann. “Quando atearam fogo no Centro de Justiça, deixando os funcionários presos no porão; quando ergueram uma guilhotina no teto do sindicato da polícia; quando esfregavam porquinhos de plástico na cara dos policiais gritando ‘Se mata!’”
Toda noite é uma noite de terror. E as autoridades não agem
Segundo o levantamento das autoridades locais, os antifas, black blocs e simpatizantes muniram-se de rifles, garrafas, morteiros, canivetes, marretas, armas de choque, spray químico, cassetetes, coquetéis Molotov, rojões e canetas de raio laser para mirar os olhos dos policiais. Queimar edifícios virou um programa para parte da população de Portland, como dançar numa rave ou assistir a um jogo de basquete dos Trail Blazers.
Nancy Rommelmann acompanhou várias dessas noites de protestos e resumiu o padrão que se repetia invariavelmente. Quando policiais apareciam, os ativistas formavam uma linha de enfrentamento (e provocação), enquanto outra ala filmava com seus smartphones tudo o que lhes interessava. No dia seguinte, as cenas mais “heroicas” estavam na imprensa, cuidadosamente escolhidas por editores simpatizantes da causa.
Várias cidades sofreram com a violência “progressista”, como Seattle, Oakland, Nova York e Chicago — todas administradas pelo Partido Democrata. Mas em Portland as autoridades deixaram que a situação se degenerasse. Em julho do ano passado, Trump enviou agentes federais para proteger temporariamente os edifícios públicos da cidade. Foi a dica para que políticos democratas e parte da imprensa culpassem o presidente pela violência. O então candidato Joe Biden chegou a declarar: “Não há razão para o presidente enviar tropas federais a uma cidade onde as pessoas estão demandando mudanças de forma pacífica e respeitosa”. Com a presença das tropas federais, o nível de violência caiu. Assim que elas partiram, tudo voltou ao anormal.
O promotor municipal Mike Schmidt deixou explícito que não iria processar pessoas que “quebraram janelas de lojas, puseram fogo em coisas e roubaram dessas lojas num ambiente de protesto”. O uso de gás lacrimogêneo foi parcialmente vetado por um juiz federal.
No meio dos tumultos, os cidadãos de Portland foram às urnas. Ted Wheeler tentava a reeleição. Sua concorrente mais próxima, a independente Sarah Iannarone, já tinha deixado claro pelo Twitter: “Eu sou antifa”. Em terceiro lugar veio Teressa Raiford, uma militante antipolícia. Os três radicais de esquerda levaram 81% dos votos. Wheeler continuou no cargo.
Toda noite é de terror na cidade. Mesmo quem não está diretamente ligado à violência — como o grupo “Mamães de Portland” — trabalha para que as manifestações corram soltas, sem interferência da polícia. É claro que nem todos concordam com essa situação. O morador Richard Maas tentou simplificar as coisas em mensagem enviada ao Wall Street Journal: “O prefeito (que acumula o cargo de chefe de polícia) e a governadora falam sobre seus planos de várias etapas para acabar com a destruição. Eles só precisam de um plano de duas etapas: prendam os criminosos e os mantenham na prisão até o dia do julgamento”.
Não foi o que aconteceu. No último dia 15, documentos oficiais revelaram que apenas 96 manifestantes foram presos nas desordens do ano passado e, destes, 47 foram liberados pelos promotores. Só dois acusados ainda estão detidos esperando julgamento. As possíveis penas são leves — serviço comunitário ou encorajar pessoas a votar.
Os vereadores obedeceram docemente às ordens dos baderneiros, cortando US$ 15 milhões do orçamento da polícia e proibindo as autoridades de apoiar forças federais ou simplesmente se comunicar com elas. Dezenas de policiais decepcionados aposentaram-se ou foram procurar outro emprego. Com a castração da polícia, o número de homicídios em Portland subiu 60% em 2020 com relação ao ano anterior.
Comunidades negras estão especialmente irritadas com o que aprontam em nome delas, como a destruição de lojas e edifícios públicos. Mas é uma destruição controlada, planejada para durar para sempre. Nas fotos que registram os manifestantes, é raro encontrar quem não seja branco.
Uma casa vermelha em que uma família de negros estava sendo ameaçada de despejo foi declarada “zona autônoma”, onde autoridades não podem entrar. Reportagem do Portland Tribune revelou que a “zona autônoma” havia se transformado num depósito de lixo, ocupada por militantes fortemente armados. Em um dos muitos cartazes à vista na “casa vermelha” está escrito: “O único bom policial é um policial morto”.
Portland comemorou seu réveillon de 2021 com bombas incendiárias destruindo parte da região central. No mês passado, o prefeito Ted Wheeler aparentemente saiu do transe ideológico e declarou: “A comunidade está farta de gente se envolvendo em atos de destruição criminosa e violenta”. Ele reconheceu que os tumultos haviam arruinado os pequenos empresários que tentavam se recuperar da crise provocada pela pandemia de covid-19. Um quarto dessas pequenas empresas fechou ou se mudou para outras cidades. Um terço delas afundou em dívidas.
Com a eleição de Joe Biden, muitos previram que a fúria que incendeia Portland todas as noites iria ceder. Não aconteceu. Na semana passada, a morte de um negro pela polícia no distante Minnesota serviu como pretexto para que pedras, fogo e pichações voltassem a assombrar a cidade. No dia em que o republicano Trump deixou o governo, os baderneiros quebraram os vidros da sede do Partido Democrata. Seus cartazes diziam coisas como “Nós somos ingovernáveis” e “Nós não queremos Biden — queremos vingança!”.
“Eles vivem num mundo pós-político”, definiu Nancy Rommelmann. “Querem o que querem, e o que querem é continuar brigando, o que os leva a precisar de novos inimigos para sustentar seus surtos noturnos de descarrego.” São crianças mimadas sem limites, maliciosas, brutais, destruindo uma cidade sem que ninguém tenha a coragem de dar um basta na traquinagem.
Leia também “Querem nos silenciar”
Que loucura! Quem terá coragem de acabar com a baderna?
A matéria deixa clara a guerra que está em curso no Brasil e no mundo, onde na mesma rua, na mesma casa e na mesma família há visões completamente opostas sobre oque fazer a respeito. Parece haver dois tipos diferentes de seres humanos.
Geração de fracos, fúteis e frivolos. Só sabem fazer panfletagem usando bandeiras que nem os contemplam. Brancos lutando fervorosamente pelos negros, enquanto estes muitas vezes não concordam nem com a forma nem com o conteúdo do que está sendo reivindicado. Tudo é pretexto para aparecer, para achar que é herói, quando na verdade sequer fazem a própria comida.
Por lá, George; por aqui Marielle. Está difícil.
Ótimo artigo.
No limite, os cidadãos de Portland escolheram viver assim. Pagam caro e pagarão muito mais.
Aqui, muita gente quer exatamente isso.
Lá, parece que as lembranças da guerra civil se apagaram.
Aqui, não tivemos coisa parecida.
O sofrimento, a dor e o desespero ensinarão novamente.
É isso aí! Votem na esquerda, vivam como um esquerdista e tenham uma vida de m¨#%!@!! Só tenho pena das pessoas de bem de Portland que irão pagar o preço por viverem em um lugar em que a maioria escolheu governantes medioicres de esquerda e uma minoria de idiotas acha bonito desejar a morte de policiais. Triste, mas que sirva de case e vitrine para todos verem ao vivo o que o pensamento esquerdista gera: caos, miséria, violência.
Às vezes me pego refletindo se alguém como Wyatt Earp sequer teria espaço nos EUA de hoje para impor a lei; seja como for, duvido muito que uma pessoa assim tolerasse que um saco de excrementos fosse atirado dentro da sua sala.
Hospício. Bem-vindo.
Dagomir Marquezi, chegará um momento que os americanos sentirão falta do Trump.
Para dispersar a horda, basta um chegar ali no meio oferecendo um emprego. Não fica um.
Quando a lei não funciona, barbárie só se combate com barbárie. Criem uma milícia e executem os vagabundos na rua e num instante a coragem dos covardes acaba.
Excelente artigo!
A ROTA daria um jeito nesses vagabundos em cinco minutos.
O nome disso é anarquia, a total falta de governo. Só resolverá com um governo forte e repressor.
Texto como sempre muito bom do Dagomir.
A loucura é universal. Faltam líderes.
Retrato do ideário comunista sendo vivido na prática.
Excelente, o artigo. Pelo visto, depois da Síndrome de Estocolmo (simpatia do sequestrado por seus sequestradores) temos a Síndrome de Portland (uma espécie de Síndrome de Estocolmo coletiva).
Esse é um case de sucesso de como o esquerdismo é desconstrutor. Torço para que piore muito antes de melhorar.
Muito bom o comentário, concordo!
Também concordo, Fernando.