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Câmara passeio partidos
Plenário da Câmara dos Deputados | Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
Edição 133

O primeiro turno e a derrota da lulocracia

O resultado dessas eleições contrariou a famosa frase de Ulysses Guimarães, que dizia: “Vocês estão achando esse Congresso atual ruim? Então esperem pelo próximo”

Roberto Motta
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Para muitos brasileiros — sou um deles — é difícil acreditar que 57 milhões de pessoas tenham votado em uma pessoa condenada em dois processos criminais, que passou quase dois anos presa e foi acusada de envolvimento nos maiores escândalos de corrupção da história. Essa pessoa é também o autor de uma variedade imensa de declarações inacreditáveis: admitiu que mentia ao falar mal do Brasil no exterior, inventando milhões de crianças de rua que só existiam em sua imaginação, disse que o criminoso só escolhe o crime porque “não teve um tênis quando era criança, ou porque foi vítima de preconceito”, chamou todo o setor agropecuário de “fascista” e identificou as multidões — milhões de pessoas — que celebraram o 7 de Setembro como “supremacistas”.

Apesar de tudo isso, esse personagem teve milhões de votos.

Existem muitas explicações possíveis para esse resultado eleitoral. Mas não é isso que interessa agora.

O importante é notar que, quando examinamos as votações para o Congresso e para os governos estaduais, os resultados da votação de 2 de outubro sinalizam uma esmagadora vitória das forças políticas pró-liberdade e uma significativa renovação do Congresso e das Assembleias Legislativas, na direção de melhor qualidade e representatividade dos parlamentares e governadores eleitos.

O eleitor enviou para o Senado e para a Câmara dos Deputados nomes como Bia Kicis (Distrito Federal), general Pazuello e Alexandre Ramagem (pelo Rio de Janeiro), Ricardo Salles, Capitão Derrite, Carla Zambelli, Luiz Philippe de Orleans e Bragança e Marcos Pontes (São Paulo), Deltan Dallagnol (Paraná) e general Mourão (Rio Grande do Sul), para citar apenas alguns. A lista de bons nomes é enorme. Ao mesmo tempo, perderam seus mandatos vários parlamentares — entre eles muitas celebridades — que, eleitos na onda Bolsonaro de 2018, passaram os quatro anos de mandato preocupados em lacrar nas redes sociais, sem nenhum pudor de abandonar seus eleitores e trair as ideias que prometeram seguir. Foi — pode-se dizer assim — uma faxina geral.

Só isso já seria motivo para muita comemoração. Não há notícia de fenômeno parecido na história recente.

O resultado dessas eleições contrariou aquela famosa frase do deputado Ulysses Guimarães, que dizia: “Vocês estão achando esse Congresso atual ruim? Então esperem pelo próximo”.

Pois o próximo Congresso — tudo indica — será muitíssimo melhor que o atual.

O partido do presidente, o PL, elegeu a maior bancada na Câmara, com 99 deputados, conquistou maioria no Senado, com 13 senadores eleitos, e conseguiu eleger muitos candidatos para as Assembleias Legislativas nos Estados.

Essas vitórias foram obtidas apesar de uma ofensiva política e ideológica inédita no país, vinda do que se pode chamar de trinca do mal, que cerrou fileiras contra o presidente, seus colaboradores e apoiadores. Essa trinca é formada pelo consórcio de mídia, que monopolizou o discurso público e transformou jornalismo em um ataque incessante e frequentemente mentiroso — não há outra palavra — ao presidente, seus aliados e apoiadores; pelo consórcio de pesquisas, que montou uma fábrica de resultados estatísticos de intenções de voto que afrontava a realidade e cujas previsões, quando comparadas com os resultados das urnas, exibiram erros grosseiros; e pelo Partido dos Tribunais, que faz uma aplicação assimétrica das leis e, quando isso não é suficiente, cria sua própria legislação.

A trinca operou durante quase três anos em oposição implacável ao presidente, disseminando, amplificando ou criando notícias negativas, pintando um retrato fictício da opinião pública e usando instrumentos de perseguição penal — para usar um termo empregado pela própria Procuradoria-Geral da República — contra a simples emissão de opiniões e posicionamentos políticos favoráveis ao governo ou críticos de seus adversários.

Criminalizou-se a opinião no Brasil.

Os resultados eleitorais do primeiro turno destruíram a reputação dos “institutos” de pesquisa — na verdade, empresas comerciais em busca de resultados financeiros. A maioria dessas empresas errou grosseiramente ao tentar prever os resultados da votação. Ficou claro o que muitas pessoas, dentro e fora do Brasil, sempre disseram: as pesquisas são um mero instrumento para influenciar o voto, especialmente dos eleitores com menor acesso à informação.

Apesar da trinca do mal e de toda a manipulação ideológica da opinião pública, a realidade se impôs. Os resultados eleitorais positivos também se refletiram nas disputas pelo governo dos Estados mais importantes da federação.

Tarcísio de Freitas, o candidato do presidente para o governo do Estado de São Paulo, vai para o segundo turno com muita força e deverá vencer sem dificuldade, contando agora com o apoio do atual governador, Rodrigo Garcia. Em sua campanha, Tarcísio converterá votos que, no primeiro turno, foram dados ao candidato do PT pela dificuldade que alguns eleitores tiveram com o estilo pessoal do presidente, considerado por muitos como inadequado à “liturgia do cargo”. São os eleitores “regra de etiqueta”, segundo meu amigo Antonio de Moura — e eles podem representar um número significativo de votos em São Paulo. É um eleitorado cuja opinião é moldada pela grande mídia e pelas pesquisas, mas que é sensível a ajustes na mensagem e à exposição do passado político, ideológico e judicial do PT.

Governo Paulista Bolsonaro
Da esquerda para a direita, Rodrigo Garcia, governador de São Paulo, Jair Bolsonaro, presidente da República, e o ex-ministro Tarcísio Gomes de Freitas | Foto: Reprodução/Redes Sociais

As disputas eleitorais para os governos do Rio de janeiro e de Minas foram resolvidas no primeiro turno. O governador eleito do Rio, Cláudio Castro, era o candidato do presidente. O governador eleito de Minas, Romeu Zema, já declarou seu apoio a Bolsonaro. É de Minas também o deputado federal mais votado das eleições, Nikolas Ferreira, eleito com quase 1,5 milhão de votos e apoiador do presidente. No Rio Grande do Sul o ex-ministro Onyx Lorenzoni tem grandes chances de vitória para o governo no segundo turno. Ronaldo Caiado, governador eleito de Goiás, Mauro Mendes, governador eleito de Mato Grosso, Ibaneis Rocha, governador eleito do Distrito Federal, e Ratinho Junior, governador eleito do Paraná, já declararam apoio a Bolsonaro.

Ao dar voz aos sentimentos e aos valores da maioria dos brasileiros, Jair Bolsonaro pode ter, assim como Margaret Thatcher, criado algo muito maior que ele

Os Estados do Nordeste deram ao presidente a melhor votação possível, dentro da realidade atual. Não é hora de reclamar, ao contrário; é hora de agradecer por cada um dos votos do Nordeste e trabalhar para que seu número aumente, dentro da nova realidade que se apresentará no segundo turno.

Apesar de todos os ataques, dentro e fora das quatro linhas, as forças da esquerda assistiram ainda aos ícones da Lava Jato serem eleitos para o Senado (Sergio Moro) e a Câmara (Deltan Dallagnol) com votações expressivas, aumentando a capacidade do Congresso de lidar com futuros escândalos de corrupção e destruindo a narrativa petista de que a Lava Jato foi derrotada nas urnas.

Assim, o presidente Bolsonaro, mesmo ficando em segundo lugar na votação do primeiro turno, sai dele fortalecido, com 1 milhão de votos a mais do que obteve no primeiro turno das eleições de 2018 e com uma posição consolidada como líder de uma corrente política capaz de se sustentar e de crescer.

Não é pouca coisa, especialmente diante dos incessantes esforços da esquerda e de quase todo o establishment para desqualificar e demonizar o bolsonarismo, acusando-o de todos os crimes possíveis e imaginários, inclusive aqueles que a própria esquerda comete habitualmente em sua busca insaciável por poder e, principalmente, quando finalmente o alcança.

Mas, assim como o thatcherismo — a filosofia política criada a partir das reformas implantadas pela primeira-ministra Margaret Thatcher no Reino Unido —, o bolsonarismo provou ser mais do que uma mera tendência passageira de comportamento ou um artifício eleitoral temporário.

Margaret Thatcher, ex-primeira-ministra do Reino Unido | Foto: Reprodução/Flickr

Ao dar voz aos sentimentos e aos valores da maioria dos brasileiros, Jair Bolsonaro pode ter, assim como Margaret Thatcher, criado algo muito maior que ele, e que perdurará na forma de uma corrente política com um conjunto de ideias e propostas claramente definidas, centradas da defesa dos direitos naturais e da liberdade.

Em oposição à tirania socialista, essa corrente propõe a defesa dos direitos à vida, à propriedade, à liberdade de expressão e à legítima defesa, e políticas guiadas pela redução da interferência do Estado na vida privada, pelo respeito ao Estado de Direito, e pelo reconhecimento do empreendedorismo e do livre mercado como instrumentos fundamentais para o progresso, a liberdade e a prosperidade do país.

Defensores dessas ideias conquistaram agora espaço privilegiado no Congresso Nacional, nas Assembleias Legislativas e nos governos estaduais.

Em qualquer lugar do mundo isso já seria uma vitória importante.

No Brasil, é uma conquista política histórica.

Leia também “A Revolução Permanente e o ativismo judicial”

20 comentários
  1. Rosana Vargas
    Rosana Vargas

    Serei redundante: texto excelente. Estamos há 8 meses desse desgoverno e o Brasil só não desceu totalmente a ladeira em função de nossos representantes no Parlamento, que tem enfrentado uma luta árdua. Por gentileza, sugestões bibliográficas. [email protected]

  2. Antônio Cesar Bortoletto
    Antônio Cesar Bortoletto

    Parabéns Motta muito claro e objetivo, feliz por termos você na Oeste
    Volta para o Pingos nos Is no lugar daquele chato do Schelp

  3. Robson Oliveira Aires
    Robson Oliveira Aires

    Ótimo texto. Parabéns Motta. Assim como você, eu também não acredito que o Satanás de nove dedos tenha tido os 57 milhões de votos que as urnas disseram que teve. A pergunta que não quer calar: como o Bolsonaro conseguiu eleger uma base tão grande de apoiadores e não conseguiu se reeleger no primeiro turno?

  4. Vanessa Días da Silva
    Vanessa Días da Silva

    Excelente artigo Roberto Motta, preferia vc no lugar daquele Schelp no pingos.

  5. Marcelo DANTON Silva
    Marcelo DANTON Silva

    SIMPLISMENTE IMPRESSIONANTE, COVARDE MESMO…como tem gente, organizações/instituições que tentam tergiversar sobre AS FRAUDES ALGORITIMAS no processo eleitoral brasileiro
    A fraude ocorre diretamente nas urnas eletrônicas quando é para senadores/deputados/vereadores e NO PROGRAMA DE TOTALIZAÇÃO para Presidente, governadores.
    A FRAUDE pode DAR ou RETIRAR votos…jogando-os para o adversário ou simplesmente anulando-os…aumentando os indices de nulos, brancos.
    Tudo atrelado às pesquisas FAKES que tem papel essencial no “convencimento” do povo simplório de que o processo é HONESTA de primeiro mundo’ A MELHOR DO MUNDO na dialética dos canalhas golpistas fraudadores encastelados em altas posições do ESTADO ou do empresariado/BANQUEIROS….
    NADA como massagear o ego dos simplórios. Gente burra que adoram estufarem o PEITO, colocar um sorrisinho jocoso no rosto e gritar …”PARANÒICO!!! É teoria da conspiração.”
    HÁ FRAUDE SISTEMÁTICA NO PROCESSO ELEITORAL BRASILEIRO.. HÁ pelo menos 25 anos. FATO!
    As urnas eletrônicas foram inventadas na década de 90 para NÃO TER O PERIGO dos militares, conservadores/direita voltarem ao PODER.
    Mas TODOS escondem! FOI obra de SERGIO MOTTA.
    o autor do texto se desdiz …ORA fala que o POVO se esquece…ORA fala que o povo tem um “recall de memória boas para o LULADRÂO.
    ESCOLHE AMIGO…ou o brasileiro esquece ou não.
    Mais um analista anacrônico. caótico, adeptos de “uma no cravo, outra na ferradura”
    Toda matéria/texto, dialéticas, verborragias, argumentos ou “ponto de vista” que não levam em consideração a FRAUDE no processo eleitoral brasileiro é DESONESTA, MENTIROSA E CANALHA.

    1. Marcelo DANTON Silva
      Marcelo DANTON Silva

      MOTTA!!
      DESCULPE-mE…. o “autor” a que me refiro no texto acima NÃO É VOCÊ OK!!
      Falha minha.

      1. Marcus Seixas
        Marcus Seixas

        A chegada do Sr. Roberto Mota está sendo um privilégio aos leitores da revista Oeste e, à qualquer outro veículo jornalístico comprometido com a verdade, honestidade e ética. Bravo !

  6. MARIA CHRISTINA GARMS
    MARIA CHRISTINA GARMS

    A equipe da Oeste cada vez melhor. Mais um grande comentarista, da qualidade de Roberto Motta a nos brindar com esse texto primoroso.
    Bem-vindo e parabéns!

  7. Henrique Hochleitner
    Henrique Hochleitner

    Mota, bem vindo! Mas me explica porque durante a apuração são apresentadas resultado em porcentagem, não em quantidade de votos?? Acredito que seja a fraude em tempo real já que não temos nenhum parâmetro para comparar! Trata-se na minha opinião do crime perfeito! Por favor, ponha isso em pauta amanhã durante a programação da JP.
    Outra coisa, como explicar que o Pontes tenha recebido quase um milhão de votos a mais que o Tarcíso?? Será que alguém votaria no Pontes e no Haddad??
    Acho que foi a falha da fraude!

  8. Viviane Nabinger
    Viviane Nabinger

    Admiro demais a clareza, objetividade e racionalidade de teus comentários, aqui e nos Pingos nos Is.

  9. Júlio Rodrigues Neto
    Júlio Rodrigues Neto

    ARTIG🤍 PRIM🟢R🟡S💙

  10. Raimundo Penaforte Dias de Sousa
    Raimundo Penaforte Dias de Sousa

    Muito bom.

  11. Dalmacio Irapuan dos Santos
    Dalmacio Irapuan dos Santos

    Como sempre, brilhante!

  12. Érico Borowsky
    Érico Borowsky

    Que bom que você está aqui na Oeste, Motta !

  13. Andreia Rodrigues Gomes
    Andreia Rodrigues Gomes

    Excelente artigo. É assim que as coisas mudam. Votando em pessoas que têm compromisso com a verdade. Os mentirosos e aproveitadores devem ser eliminados da política, como foram muitas nessa eleição. Aos que ainda restaram, é uma questão de tempo.

  14. Luiz Antônio Bueno Costa
    Luiz Antônio Bueno Costa

    “O que foi alcançado pelo Presidente demonstra que o Bolsonarismo é uma nova força política surgida em apenas 4 anos e que na segunda disputa engoliu não somente o PT e também os demais partidos. Pode criar com isto uma política polarizada em poucos partidos 3/4 no máximo.”

  15. Marcelo Gurgel
    Marcelo Gurgel

    Queremos Bolsonaro presidente!

  16. Fernando Fuentes
    Fernando Fuentes

    Excelente artigo Motta, mas só um detalhe: lembra de 2018, quantos do PSL se elegeram graças ao Bolsonaro, e depois sairam do armário? Vamos ficar de olho nesse golpe.

  17. Valdinei Soares De Oliveira
    Valdinei Soares De Oliveira

    Eleitores “regra de etiqueta” nada mais são do que esquerdistas que envergonhados de votarem em um ladrão, se desculpam dizendo que o outro candidato é intragável.

    1. Alzira Conceição Pacheco de Lima
      Alzira Conceição Pacheco de Lima

      Concordo com você. Há criatura mais intragável do que o bandido de estimação desses idiotas úteis?

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