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Instalação da CPMI do 8 de Janeiro. Foram escolhidos Arthur Maia como presidente e Eliziane Gama como relatora | Foto: Lula Marques/Agência Brasil
Edição 183

A escudeira de Flávio Dino

Articulações de Eliziane Gama na CPMI do 8 de Janeiro mostram que a relatora vai blindar o ministro da Justiça e figurões do governo federal que têm muito a explicar

Cristyan Costa
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Durante o depoimento do ex-GSI Gonçalves Dias à CPMI do 8 de Janeiro, membros da oposição acusaram o militar de receber, previamente, as perguntas que seriam feitas a ele pela relatora da comissão, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA). A própria parlamentar estaria envolvida no caso. Isso porque mensagens de WhatsApp obtidas por congressistas mostram um diálogo no qual o filho de Dias, Gabriel, afirma ter negociado um encontro com Erlando da Silva, chefe de gabinete de Eliziane. Depois dessa reunião, Dias teria recebido uma lista com as interpelações.

Num país sério, uma revelação desse calibre seria a bala de prata para derrubar da posição de relatora uma parlamentar que, desde o início da CPMI, trabalha para blindar o governo e Flávio Dino, ministro da Justiça. Seu padrinho político, é ele o responsável por Eliziane chegar à posição que ocupa hoje no Parlamento e na comissão. A senadora trabalha ativamente com aliados da bancada do Maranhão — a maior da CPMI — para chamar ex-membros do governo Bolsonaro, como Anderson Torres e Mauro Cid, em vez de gente que realmente tem muito a explicar sobre o 8 de janeiro, como G. Dias e o próprio Dino. Com a caneta da relatoria na mão, caberá a Eliziane indiciar pessoas ao término da CPMI, até mesmo no Supremo Tribunal Federal.

O militar e o ministro da Justiça são atores centrais do 8 de janeiro. Imagens das câmeras de segurança do Palácio do Planalto, divulgadas em abril deste ano pela CNN Brasil, mostram o então ministro do GSI auxiliando invasores e tratando-os com cordialidade. Apesar da gravidade, a CPMI só convocou o general dois meses depois de os vídeos virem à tona. A demora se deu, sobretudo, por causa de articulações do governo na CPMI patrocinadas por Eliziane, que chegou a afirmar que a presença de Dias no colegiado, logo depois da revelação, “atrapalharia o cronograma dos trabalhos”. Sobre Dino, Eliziane não viu “necessidade” de chamá-lo, em razão de “muitas informações do caso estarem sob sigilo”. O ministro da Justiça vinha sendo cobrado por imagens da sede de sua pasta no dia dos protestos. Dino, contudo, sem dar muitos detalhes, afirmou que os vídeos haviam sido apagados.

Eliziane Gama e seu padrinho político, o ministro da Justiça, Flávio Dino | Foto: Reprodução/Redes Sociais

“Eliziane fica visivelmente incomodada quando alguém toca no nome do ministro da Justiça, fala sobre o governo ou cita a Força Nacional”, afirmou o deputado federal Filipe Barros (PL-PR). “A voz se altera, e ela deixa muito claro que não haverá negociação conosco no sentido de chamar alguém que considera ‘intocável’ ou que possa se prejudicar”. De acordo com Barros, certa vez, durante uma reunião entre membros da CPMI, Eliziane saiu da sala e ligou para um contato no Ministério da Justiça para receber instruções sobre como deveria proceder naquele encontro. Não se sabe com quem ela falou na ocasião.

A percepção de Barros é a mesma do deputado federal Marco Feliciano (PL-SP), que bateu boca com a relatora depois de pedir para ela ser “mais justa” na votação de requerimentos na CPMI. Feliciano havia discordado da ordem de preferência de depoentes sugerida. “Não há dinâmica”, constatou Feliciano. “Há o ‘mundo dela’ e o nosso. Ela não é imparcial; portanto, interage com o governo e seus puxadinhos, e nos ignora. Eliziane está cumprindo uma missão: blindar o governo.” De acordo com o congressista, a oposição vê o relatório final com “suspeição”. “Esse relatório virá sob o manto do revanchismo”, disse. “Para ela e seu governo, a eleição de 2022 ainda não acabou, e Bolsonaro tentou dar um golpe de Estado, mesmo estando nos Estados Unidos.”

Outros deputados confirmam a tese segundo a qual Eliziane age com parcialidade nos bastidores e, principalmente, nas sessões diante das câmeras. Ao citar a troca de mensagens entre o filho de G. Dias e o assessor da parlamentar, o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) disse temer que as conclusões da CPMI acabem distorcendo a realidade. “Questionar a parcialidade da relatora não é um crime”, afirmou o parlamentar. “Se eu estivesse sentado na cadeira de relator, teria vergonha.”

Espera-se que o relatório final, a ser divulgado em 17 de outubro, proteja Dino e G. Dias das acusações de omissão e ocultação de provas. Nas mais recentes declarações, Eliziane disse que dará prioridade a uma segunda convocação de Mauro Cid, bem como de outros militares, como o ex-ministro Braga Netto. Cid permaneceu em silêncio, respaldado por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). No entanto, Eliziane acredita que essa postura pode mudar, especialmente depois de o militar ter sido interrogado em três ocasiões pela Polícia Federal (PF) e por causa do acordo de delação premiada que ele celebrou com a PF, homologado pelo ministro Alexandre de Moraes.

Amiga do poder

A relação amigável entre Eliziane e os parlamentares de esquerda no Congresso Nacional ficou mais estreita com a CPI da Covid, em 2021. Embora não fosse membro efetiva da comissão, o então presidente do colegiado, Omar Aziz (PSD-AM), deu a ela uma posição de destaque para atacar o governo Bolsonaro. Com a vitória de Lula, a parceria ganhou musculatura, quando o ministro da Casa Civil, Rui Costa, aprovou a nomeação do marido da senadora, Inácio Neto, para a presidência do Serviço Geológico do Brasil (SGB), uma estatal vinculada ao Ministério de Minas e Energia que faz pesquisa sobre o território nacional e suas riquezas. Além do salário de R$ 30 mil, Neto pode dar pareceres a favor de pedidos para a realização de extração de minerais. O governo Lula ignorou completamente um manifesto feito por funcionários do SGB contra a nomeação.

Rui Costa, ministro da Casa Civil | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Divulgado em março deste ano, o documento lista vários processos arquivados ou em trâmite contra Neto. O texto diz que o homem é acusado de praticar crime ambiental, elaborar e usar documentos falsos, sonegar impostos, além de denúncias de agressão à ex-mulher. “Outro agravante é a inaptidão técnico-científica confirmada pela falta de formação para o cargo pretendido, sendo formado em administração, além de inexistência de conhecimento prévio ou experiência na área de geociências, ou mesmo relacionada ao setor mineral”, diz trecho do documento enviado ao governo. A carta dos funcionários lembra ainda que, em 2021, Neto chegou a ter a prisão decretada pela Justiça no Maranhão, por não pagar R$ 560 mil de pensão alimentícia do filho do primeiro casamento.

Neto tem ainda várias denúncias contra ele no Maranhão. A publicação de algumas delas, por jornalistas que atuam em blogs independentes no Estado, renderam processos contra esses profissionais. Werbeth Saraiva, Neto Ferreira, Antônio Martins e Domingos Costa são alguns deles. O grupo acusa a senadora de usar verba de gabinete do Senado para pagar o escritório Spindola, Raposo e Ribeiro Advocacia e Consultoria, que moveu a ação. Comprovantes no Portal da Transparência do Senado confirmam que o escritório presta serviço para Eliziane.

O favorecimento a familiares da senadora por governos amigos não se restringe à esfera federal. A irmã de Eliziane, Elisvane Pereira Gama, assumiu o comando da Superintendência Federal de Pesca e Aquicultura do Maranhão

Paralelamente, a senadora usa dinheiro do gabinete para comprar notícias positivas em sites no Maranhão, entre eles, o blog do jornalista Diego Emir. Desde o primeiro depósito, em abril de 2020, até este mês, Eliziane pagou R$ 36 mil a Emir, cujo site tem vários textos sobre a parlamentar — nenhum negativo. Em determinados momentos, o jornalista põe a reportagem na página principal do site, para dar mais destaque à congressista. Além de Emir, Eliziane banca outros blogueiros. Em maio de 2021, ela desembolsou cerca de R$ 20 mil para custear o serviço desses profissionais. Os blogs beneficiados são: maramais.com; kelmartins.com; e Atual7.com. A assessoria da senadora limitou-se a dizer que a contratação dos serviços se devem à “divulgação da atividade parlamentar”.

Inácio Neto, presidente do Serviço Geológico do Brasil (SGB) | Foto: Reprodução/Redes Sociais

O favorecimento a familiares da senadora por governos amigos não se restringe à esfera federal. A irmã de Eliziane, Elisvane Pereira Gama, assumiu o comando da Superintendência Federal de Pesca e Aquicultura do Maranhão em junho deste ano. A indicação é do governador do Estado, Carlos Júnior (PSB), aliado da senadora, vice-govermador de Dino, que foi apoiado pelo ministro da Justiça na eleição do ano passado. Um mês depois, a PF do Maranhão foi acionada para investigar a atuação de um falso funcionário que oferecia vantagens a servidores, como interlocução com peixes grandes do governo federal a um alto custo.

Textos a favor da senadora Eliziane Gama | Foto: Reprodução
Trajetória política e suspeita de corrupção

Nascida em 1977, Eliziane é maranhense de Araguanã, formou-se em jornalismo, mas acabou entrando para a política em 2001. Ao longo dessa trajetória, transitou por diversas siglas. Do Partido Popular Socialista (atual Cidadania), entre 2001 e 2015, passou pela Rede entre 2015 e 2016, voltou ao Cidadania de 2016 a 2023, e ingressou no PSD neste ano, o que lhe rendeu bom trânsito com parlamentares de esquerda, principalmente Flávio Dino, contemporâneo de Eliziane na Câmara dos Deputados.

O primeiro cargo eletivo de Eliziane foi como deputada estadual. “Ela gosta mais de ser contra algo, porque dá mais o que falar, em vez de atuar a favor”, disse uma ex-assessora parlamentar de um ex-deputado de oposição da Assembleia Legislativa do Maranhão. Durante o tempo que passou na Casa, Eliziane sempre procurou algum holofote, manifestando muito interesse em presidir comissões polêmicas, entre elas a CPI de Combate à Pedofilia. Evangélica, explorou à exaustão as descobertas do colegiado e a pauta dos costumes durante esse período, o que aumentou a sua projeção no Estado.

Qualquer semelhança com a atuação na CPMI do 8 de Janeiro não é mera coincidência.

Marina Silva, Eliziane Gama e Simone Tebet | Foto: Reprodução/Redes Sociais

Leia também “O triunfo da injustiça”

18 comentários
  1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Povo maranhense precisa ficar mais atento nas escolhas políticas. É cada mala pior que a outra,

  2. Eurico Schwinden
    Eurico Schwinden

    Se ela sequer assinou o requerimento para instalação da CPMI e se torna relatora já é uma aberração regimental, que agora já se pode dizer que ela foi plantada lá por Flávio Dino para não deixar apurar nada. Mas o mais grave é que ela – numa observação dos seus trejeitos, da perda de controle por pouco e principalmente a expressão de insegurança e medo, que trai sua submissão ao comunista Flávio Dino. Dá pra imaginar alguém do seu padrão intelectual – nível secundário, padrão Maranhão – se tornar senadora e agora ter de assumir o lado torpe do episódio oito de janeiro. Dino não apagou as imagens. A chegada dos blackblocs que vieram em 104 ônibus devem ter entrado nos palácios por volta de quatro horas da manhã. Suas caras e o que quebraram são trunfos que ele guardará para usar em seu favor. Uma boa moeda de troca por uma cadeira na Suprema Corte. É da natureza dos comunistas.

  3. Marta Cardoso
    Marta Cardoso

    Quanta coisa suja essa mulher é envolvida. Parabéns pelo artigo!

  4. G.F.A
    G.F.A

    Essa vagaba só podia ser do estado que hoje é o caju do Brasil. Último lugar nos índices econômicos, um dos primeiros em criminalidade.
    Em qualquer estado do sul/sudeste talvez conseguisse (após passar por rigorosa seleção) uma vaga como doméstica.

  5. Reinaldo Terribelli
    Reinaldo Terribelli

    Put’s,,,, que trio esse da foto …. heim?
    Deus do céu , olhem só onde viemos parar.

    1. Paulo Roberto Oliveira
      Paulo Roberto Oliveira

      Como a maioria da bancada federal em Brasília, não passa de uma vigarista sem caráter e canalha. Quanto ao estado, pelo fato da população não ter conhecimento e serem massa de manobras usada por essa turma, essa cretina tem espaço.

  6. MNJM
    MNJM

    Parabéns Christyan. O que esperar de uma parlamentar aliada de Flávio Dino??? Picareta e hipócrita. Óbvio que foi colocada na CPMI para blindar G Dias e Flávio Dino, comprometidos até o pescoço, Não enxerga quem não quer.
    Além de cupincha é desqualificada para o cargo.

  7. Nerivaldo Carvalho dos Santos
    Nerivaldo Carvalho dos Santos

    Olha uma coisa é certa se essa cpmi não obrigar esse tal de flavio dino a entregar essas IMAGENS será a maior será a Desmoralização do Congresso e digo mais pra que serve ter presidente de cpmi que não tem Voz ativa pra nada só serve pra apertar a campanhia pra mandar os caras calar a boca , vamos reagir sr. presidente a oposição fica dizendo que foi Golpe , então eles tem que provar mostrando as IMAGENS ,

  8. Antonio Carlos Neves
    Antonio Carlos Neves

    Parabéns Crystian, entendo que faltou verificar se ela aprovou as REFORMAS TRABALHISTA, PREVIDENCIÁRIA, MP 871 de combate às fraudes da previdência (200 bi), MARCO LEGAL DO SANEAMENTO, MARCO LEGAL DOS PORTOS, MEDIDAS ECONOMICAS de governos anteriores, etc. etc. Vale dizer, que é coleguinha com frequência do INÚTIL RANDOLFE RODRIGUES nas votações.
    Concluo que é desumano gastar tanto dinheiro com INÚTEIS em detrimento do SANEAMENTO BASICO, SAÚDE, SEGURANÇA, enfim esses sim de inclusão social.
    Vale dizer que artigo desta Revista Oeste, já mostrou que a pior cidade entre 100 pesquisadas em SANEAMENTO BÁSICO é MACAPÁ a capital do AMAPÁ do Randolfe. E a figura votou contra o Marco. Logicamente Eliziane também. Tem condições de ser relatora de uma CPMI que tenta simular que houve um golpe e fazendo sofrer tantos brasileiros trabalhadores, honestos e democratas que jamais pegaram em armas para fazer um GOLPE. Que evangélica é essa?

  9. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Essa Elisiane bastou participar da CPI da covid pra perder o crédito e com ela na relatoria do 8 de janeiro é um circo desses que percorre os interiores do nordeste

  10. Maria Antonieta de Andrade
    Maria Antonieta de Andrade

    Será que está mulher não sente vergonha de ser a cachorrinha do ministro!? Foi para isso que as mulheres brasileiras tanto lutaram para sua emancipação? Empoderamento de quatro.

  11. Luzia Helena Lacerda Nunes Da Silva
    Luzia Helena Lacerda Nunes Da Silva

    Cristyan Costa faz a diferença em Brasília. Repórter puro sangue vai em busca da apuração dos fatos, vai investigar incansavelmente. Oeste está se firmando como grande publicação política.

  12. Teresa Guzzo
    Teresa Guzzo

    Bem está explicado nesse artigo de Cristyan Costa porquê o estado do Maranhão tem um dos piores IDH do Brasil, educação péssima, saúde e economia.A corrupção está instalada nesse estado há décadas, vivem no tempo do coronelismo, não existe luz no fim do túnel, só abismo e escuridão. Temos o pior ministro da justiça de todos os tempos.

  13. Jenielson Sousa Lopes
    Jenielson Sousa Lopes

    Sou maranhense. Não votei nessa senadora

  14. Janás Félix
    Janás Félix

    Essa criatura tem a face do ódio, e ainda se declara cristã, o Brasil infelizmente tá bem servido com esses seres das trevas, o Maranhão nos deu um presente ou melhor, presentes de grego.

    1. Lúcia Helena Fagundes Romanhol
      Lúcia Helena Fagundes Romanhol

      As feminazes devem estar felizes com esse trio,capachos dos machos!Essa senhora eliziane representa muito bem a política coronelista do estado do Maranhão : atraso,ignorância ( vejam a suplente do dinossauro!) e com o pior idh do país! Uma pena,um estado tão lindo com políticos como a sarneizada,dinossauros,elizianes etc.

  15. Leonardo Coimbra Viana Braga
    Leonardo Coimbra Viana Braga

    É só mais uma hipócrita da esquerda.

  16. CARLOS GUEDES
    CARLOS GUEDES

    Por que tantas críticas contra a pobre coitada?
    Quem não sabe que não passa de uma mula, despreparada para qualquer função pública e que está só está lá por ser sabuja do Dinão?

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