Lá no meu início de jornalismo, há mais de meio século, estagiário no Jornal do Brasil, ainda que houvesse uma Lei de Segurança Nacional, aprendi que a vigilância ante os desvios da lei, da Constituição, dos valores éticos é uma constante em nossa vida de jornalista. Atentos às injustiças, aos desvios no serviço público, agíamos em defesa da sociedade, ainda que o Estado pudesse agir em defesa de si próprio. Millôr Fernandes disse que o jornalismo é crítica; o resto são secos e molhados. Meu primeiro chefe, Alberto Dines, no seu Observatório da Imprensa, dizia que jornalismo é investigativo, ou não é jornalismo. É press release — eu acrescentaria. Jornalismo é vigilância, crítica e rebeldia contra imposições do Estado, já que o Estado está a serviço da nação que o sustenta — e não o contrário.
Senti isso recentemente, quando pedi investigação sobre as comportas de barragens do Rio das Antas, ante a surpreendente inundação do Vale do Taquari. Coleguinhas não se deram ao trabalho de ir ao site da empresa administradora das represas para ver as fotos das comportas. Simplesmente repetiram o que o governo federal dizia: que nem sequer havia comportas. E, no entanto, elas estão lá — lembrando Galileu diante da fogueira da inquisição. Eppur si muove!
Hoje, por razões de afinidade ideológica com o Estado — nem quero pensar em fisiologismo —, há um silêncio eloquente sobre tudo que é esfregado na cara do povo
O artigo de Deltan Dallagnol na Gazeta do Povo, no último dia 15, expondo dez questões sobre o julgamento de réus do 8 de janeiro, me faz perguntar como chegamos a este ponto. Como deixamos que questões ofensivas ao Estado de Direito, ao devido processo legal, à Constituição fossem aceitas como normais. Aí se incluem direitos individuais fundamentais: liberdade de expressão, manifestação sem anonimato, reunião sem armas, sigilo das comunicações, inviolabilidade do domicílio, mandato, juiz natural, iniciativa do Ministério Público, inércia e isenção do juiz, direito de defesa, ônus da prova, individualização da acusação, proporção das penas, vedação de censura e de tribunal de exceção — enfim, questões comezinhas, feijão-com-arroz da democracia, abandonadas sem protesto, sem reação, sem guardiões da cidadania, da liberdade, das leis, incluindo o enterro do combate à corrupção, representado pela Lava Jato.
Hoje, por razões de afinidade ideológica com o Estado — nem quero pensar em fisiologismo —, há um silêncio eloquente sobre tudo que é esfregado na cara do povo. Ainda bem que há honrosas exceções e a bendita rede social para divulgar o deboche e o desprezo pela ordem que está inscrita na nossa bandeira. George Orwell, no seu 1984, a propósito da URSS, acaba sendo profético em relação ao Brasil, que a cada dia lembra mais a União Soviética. Talvez nem nos falte uma Sibéria, com nomes de Papuda e Colmeia. O voto equilibrado de Nunes Marques foi quase um segredo na mídia majoritária.
A ausência de jornalismo mostra como é essencial o jornalismo. Sem ele, todos perdem, inclusive os que agora se omitem. Sem ele, liberdades se vão junto com o devido processo legal, e lá vamos reproduzindo Orwell, Kafka, Gheorghiu. Uma nota oficial vale mais que o fato. O jornalismo virou burocrático, como tem insistido o professor Carlos Alberto Di Franco. A rebeldia latente da vocação repórter foi domesticada pelo professor militante; já não se quer ouvir todos os lados, basta o oficial. O Estado é para o nosso bem. Não deu certo na União Soviética, mas, afinal, agora vai dar certo, para o bem de todos. Lá do Shamayim, meu mestre Dines, se pode ver isso, está sofrendo no paraíso.
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Sou jornalista. Ler isso me deu uma nostalgia do porquê, um dia, quis ser da imprensa. Não mais.
Alexandre, já pensou então se você faz um artigo sobre a transparência e auditoria das urnas eletrônicas, tão necessárias para o futuro político de nosso pais, e que, como todos sabemos foi a causa dos conflitos de 8 de janeiro que estranhamente o Executivo e o Judiciário transformaram em GOLPE?
Estou com 78 anos e nunca vi as FFAA serem tão desrespeitadas pelo atual poder Executivo, pelo Judiciário e pelo carcomido CONSORCIO DA IMPRENSA, como fossem uns INÚTEIS que nos consomem elevados recursos sem nos oferecer qualquer contribuição. Pior ainda é existirem altas patentes que se acovardam e consentem essa crítica, esquecendo-se que estão levando a maioria da população democrática brasileira que respeita a Lei e a Ordem, a Família e os Costumes, a desacreditar de tão honrosa INSTITUIÇÃO de outrora.
Esquecem que, quem nos conduziu a entender da INSEGURANÇA das urnas eletrônicas foram os Técnicos de Informação das FFAA e de especialistas privados que criaram as urnas eletrônicas e que sugeriram aperfeiçoamentos para evitar possíveis fraudes.
Alexandre só em democracias como a nossa, pedir transparência nas urnas eletrônicas virou crime. Todos ouvimos várias vezes o presidente Bolsonaro dizer que passaria a faixa para o VENCEDOR desde que as urnas fossem transparentes e auditáveis.
Alexandre perfeito! Assistir jornais na mídia militante é desinformação certa. O governo libertou muita grama com publicidade, óbvio, como não tem nada de bom para apresentar precisa da mídia comprada para falar bem do governo. É uma piada o esforço da turma militante para passar sempre uma boa imagem do governo. As vezes fica tão difícil , que um escorrega.
Estamos sendo calados diante ao medo do que possa nos acontecer, diante dos nossos olhos a injustiça, a maldade, STF impera com os seus desmandos e desrespeito com a nossa constituição. Quem poderá nos salvar?
Como assim rebeldia latente? A rebeldia do repórter não deveria ser explícita e óbvia?
Vivemos num momento bizarro da nossa história onde se empurra goela abaixo as inverdades fabricadas pelo governo ladrão comunista terrorista genocida estelionatário fraudulento assassino crápula mentiroso, é como se estivéssemos vivendo há 200 anos atrás
Querido patrício. Já enviei alguma coisa pra ti e renovo o alerta. Todos falam de 3 barragens e escondem que existem 3 outras bem acima do Rio das Antas. Elas estão na Pedra Lisa, distrito de Cazuza Ferreira, São Francisco de Pala, divisa com Bom Jesus e Cambará do Sul. Por que a imprensa não fala delas que ali começou a enchente? Porque aquela represas estão funcionando com licenças ambientais compradas naquele escritório em São Paulo da amante do cara que foi preso pela lava-jato. O processo dela está engavetado há dez anos no STF em segred de justiça e ninguém sabe o destino ou o resultado do processo. Por esta razão o jornalismo regional é aquele criticado por ti. No fundo do sertão estão provas que a máfia não deseja aparecer.
Análise perfeita! Impressionante o que as faculdades de comunicação com ideologia político partidária fizeram e continuam a fazer com os estudantes. Todos perdem não há crítica aos absurdos do governo de plantão!