Pular para o conteúdo
publicidade
Lucas Costa Beber, novo presidente da Aprosoja-MT | Foto: Reprodução/Aprosoja
Edição 196

Lucas Costa Beber, novo presidente da Aprosoja-MT: ‘A China precisa da soja do Brasil’

Eleito para comandar a instituição a partir de 2024, ele conta quais são os maiores desafios que o agronegócio enfrentará nos próximos anos

Artur Piva
-

O jantar de posse da nova diretoria da Associação Brasileira dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT) ocorreu no fim da semana passada. A nova gestão assume em 1º de janeiro, sob o comando de Lucas Costa Beber, de 40 anos.

Agricultor em Nova Mutum, no interior do Estado, Beber era vice de Fernando Cadore, atual presidente da instituição, que passará a integrar o conselho consultivo da Aprosoja-MT. Mato Grosso é responsável pela maior produção de soja do Brasil. Em 2023, a safra local superou a da Argentina — país com a terceira colheita mais expressiva do planeta.

“Passei por todos os degraus da associação”, afirmou. Beber começou a atuar na direção durante a gestão de Antônio Galvan, presidente de 2018 a 2020. “Comecei como vice-diretor administrativo na gestão dele, depois assumi essa diretoria. Na sequência, Fernando Cadore me escolheu para vice.”

Natural de Pejuçara, no noroeste do Rio Grande do Sul, Beber faz parte de uma das muitas famílias que migraram para o Estado na década de 1980 e impulsionaram a agricultura no Cerrado. Confira os principais trechos da entrevista.

O estado de Mato Grosso mudou depois da chegada da soja?

Completamente. A economia do Estado era minério e pecuária. Com a chegada da soja, houve a expansão de vários municípios que hoje têm um bom Índice de Desenvolvimento Humano. O plantio dessa cultura trouxe progresso e arrecadação de impostos. Existe uma narrativa maliciosa dizendo que a soja não arrecada imposto. Taxar a exportação é passar para o produtor um custo que ficaria com o importador. Você sacrifica a expansão da cultura. Dos 140 países que exportam, apenas dois cobram impostos diretos das vendas do grão ao mercado externo, de acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico.

Qual é a importância da exportação desse grão?

Quando um turista vem ao Brasil, ele traz dólares que vão circular na economia do país e, assim, gerar arrecadação de impostos. Com a soja é a mesma situação. A gente troca o grão in natura por dólares, que servirão para o produtor comprar, por exemplo, maquinários que têm um custo altíssimo. Isso gera arrecadação e empregos de forma direta e indireta. A máquina vai precisar de manutenção, troca de peças. O dinheiro circula. Ganham empresários e empregados, tanto do campo quanto da cidade. Esse ciclo também gera a necessidade de investimento em infraestrutura, como a construção de estradas e pontes.

Além das oportunidades de emprego, o que o setor oferece para o homem comum?

Principalmente, alimentos. Vejo algumas pessoas dizerem que não comem soja. A base das rações para frangos e porcos é milho e farelo de soja. A criação de bovinos em confinamento e semiconfinamento também está aumentando com o uso desse grão. Para produzir carne, leite e ovos, é preciso uma fonte vegetal de proteína — e a quantidade de proteína no farelo de soja é altíssima. Também existe a lecitina (um suplemento feito com soja bastante utilizado na indústria de alimentos), usada nos achocolatados e no leite em pó. Além disso, ela é usada para a fabricação de biodiesel, de produtos de limpeza e do pneu de automóvel com a maior durabilidade do mercado, entre outros itens.

Com a chegada da soja a Mato Grosso, houve a expansão de vários municípios que hoje têm um bom Índice de Desenvolvimento Humano | Foto: Shutterstock
É possível dizer que essa cultura diminuiu a abertura de áreas de pastagem?

Sim. Muitas áreas de pastagem estão sendo convertidas em áreas de plantio de soja. Com isso, o rebanho do país está crescendo ao mesmo tempo que a área ocupada por ele diminui. Isso acontece pelo desenvolvimento da suplementação da alimentação — o que é feito com o uso da soja.

Alternando a soja com o milho, o agricultor de Mato Grosso consegue duas safras de culturas de grãos por ano. Com irrigação, ele conseguiria fazer três colheitas nesse mesmo intervalo. O que falta para essa combinação acontecer?

Mais ciência e menos ideologia. Faltam estudos, muitos entraves burocráticos acabam acontecendo por causa de suposições. Nebraska, nos Estados Unidos, é o Estado com mais irrigação do mundo. Por lá, há mais áreas irrigadas do que em todo o Brasil. Eles fazem isso com poços artesianos, que passam pelo controle do nível de água. Cada produtor tem um estudo para saber como fazer o uso racional da água naquele poço. Isso se tornou possível graças à formação das associações de produtores ligadas aos governos municipais e estaduais.

A China é a maior importadora da soja do Brasil. Como é a relação entre os dois países, quem depende de quem?

Sem dúvida nenhuma a China depende do Brasil. A população chinesa tem aumentado e a economia tem crescido nos últimos anos, o que fez a população se alimentar melhor. A soja brasileira supre a produção de carne, sobretudo de frango e de porco. Eles precisam de soja para fazer o farelo e alimentar o rebanho. Além disso, há o óleo, que é muito importante para a culinária deles.

O setor precisa buscar mais clientes no mercado externo?

Sim. Apesar da menor intensidade em comparação à China, a Índia, por exemplo, tem potencial para se tornar um importador importante no futuro. Mas também é possível abrir novos mercados na própria Ásia. Entre eles, os países do Oriente Médio.

A soja brasileira supre a produção de carne, sobretudo de frango e de porco | Foto: Shutterstock
Com tantos benefícios, por que a produção brasileira ainda é tão criticada?

Um dos desafios que assumi é justamente o de melhorar a comunicação. A sociedade precisa entender quais são os números de sustentabilidade do setor. O Brasil é um exemplo de produção sustentável. O processo é mecanizado, e temos uma legislação ambiental rígida. Para ter noção, quem produz na região amazônica precisa manter 80% da propriedade intacta, com vegetação nativa. Além disso, o Brasil usa apenas 8% do território para a agricultura.

Além da comunicação, há outros desafios?

Temos a questão da moratória da soja. Desde 2008, quase 95% das empresas que compram o grão no Brasil pararam de adquirir soja da região amazônica. E isso mesmo com as fazendas que cumprem todas as exigências do Código Florestal Brasileiro, o mais restritivo do planeta. Isso acontece para atender ao mercado europeu — que representa menos de 10% das exportações do setor. A moratória da soja viola a soberania nacional e o direito à propriedade privada, porque força o agricultor a não produzir por não ter para quem vender. Além disso, existe a tentativa de implantar o mesmo sistema no Cerrado [onde é plantada a maior parte da soja do Estado].

Como é a relação do governo Lula com os agricultores?

Na semana passada, devido à aprovação do marco temporal, o presidente fez um ataque aos parlamentares que compõem a bancada do agronegócio. Lula ameaçou vetar partes do projeto. Eu gostaria que ele ouvisse os argumentos. Se Lula ama o Brasil, como tanto fala, deveria saber que estamos trabalhando pelo país. Aqui são 232 hectares por indígena — e sem o marco temporal esse número vai para 400. No Canadá, são 38 hectares por indígena, incluindo as áreas congeladas, cobertas por gelo e neve.

Presidente Luiz Inácio Lula da Silva sanciona projeto do marco temporal das terras indígenas, ao lado dos ministros Jorge Messias, da Advocacia-Geral da União (à esquerda), Sonia Guajajara, dos Povos Indígenas, e Alexandre Padilha, das Relações Institucionais (à direita) | Foto: Ricardo Stuckert/PR

Leia também: “O agronegócio brasileiro tem salvado o mundo de uma catástrofe alimentar”

0 comentários
Nenhum comentário para este artigo, seja o primeiro.
Anterior:
Imagem da Semana: a tradição da árvore de Natal
Próximo:
‘O importante na dublagem não é a voz, mas a interpretação’
Newsletter

Seja o primeiro a saber sobre notícias, acontecimentos e eventos semanais no seu e-mail.