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Sérgio Tavares, jornalista português | Foto: Revista Oeste
Edição 206

Jornalista português conhece nossa ‘democracia’

Destaque nas redes sociais, Sérgio Tavares veio ao Brasil para cobrir o ato na Avenida Paulista — e virou alvo da Polícia Federal

Anderson Scardoelli
Tauany Cattan
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O Airbus 330-300 da Iberia, prefixo EC-MAA, voo IB6827, partiu de Madri no fim da noite de sábado, 24. O avião chegou ao Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP) às 6h23 de domingo, 25. 

Foi um voo tranquilo. Um dos passageiros, contudo, enfrentou turbulências assim que desembarcou em solo brasileiro. Depois de até conseguir dormir durante a viagem que cruzou o Atlântico por mais de dez horas, o jornalista português Sérgio Tavares teve de lidar com autoridades locais.

Num primeiro momento, o funcionário da imigração barrou Tavares e apreendeu o seu passaporte. O documento ficou em posse de agentes da Polícia Federal (PF). Sem saber o motivo de tal atitude e isolado numa sala do aeroporto, o jornalista fez o que sabe fazer de melhor: se comunicar. Em postagem nas redes sociais, denunciou o que se passava com a sua chegada ao Brasil. “Estou retido”, avisou. “Todos os passageiros tiveram autorização para sair, menos eu.”

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A autorização para deixar o Aeroporto de Guarulhos não foi rápida. Depois da postagem, o jornalista teve de encarar um interrogatório. Dois agentes da PF o levaram até a delegacia da corporação no local. Por lá, segundo Tavares, o delegado de plantão cometeu um “sincericídio”: confessou que não sabia o motivo da apreensão do passaporte nem da exigência de depoimento, mas teve de cumprir ordens “vindas de Brasília”.

No depoimento, Tavares seguiu a orientação de Eduardo Borgo, advogado que o atendeu de prontidão a pedido do locutor Alexandre Pittoli: permaneceu em silêncio. Em vez de perguntas sobre eventuais irregularidades em seu visto ou passaporte, teve de ouvir questionamentos sobre os protestos do 8 de janeiro de 2023, as urnas eletrônicas e sua opinião a respeito de figuras como os ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal.

“Percebi que o problema era o meu ‘crime’ de opinião”, conta Tavares. “E é bom dizer que a Polícia Federal mentiu. Não teve nada referente ao meu visto. O delegado, que chegou a receber um telefonema de alguém de Brasília antes de começar a me interrogar, anotou e me fez perguntas sobre política.”

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Durante todo esse tempo preso no aeroporto, o jornalista português recebeu apoio. O ex-presidente Jair Bolsonaro ligou para ele e pediu para ficar calmo. Representantes da Embaixada de Portugal no Brasil mandaram mensagens para saber como ele estava. Sem receber acusação formal alguma, Tavares foi liberado pela Polícia Federal por volta das 11h20 — quase quatro horas depois do desembarque.

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Finalmente livre no Brasil, Tavares seguiu rumo à Avenida Paulista, em São Paulo, onde cobriu a manifestação. A convite dos organizadores do evento, subiu ao palco. Ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro e de diversas autoridades, falou diante das 750 mil pessoas que haviam deixado suas casas para pedir respeito à democracia. Apanhado de surpresa pelo convite, ele admite que não soube direito o que falar. O recado principal foi dado: a necessidade de defender as liberdades individuais.

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Um professor ‘escolhido’ pelo jornalismo

Sair em defesa da democracia e das liberdades do cidadão comum não é novidade para Sérgio Tavares. Natural de Lisboa, ele é o terceiro de quatro filhos do casal Isaías e Maria Adélia. Com duas irmãs mais velhas e uma mais nova, o hoje comunicador de 44 anos é casado e tem dois filhos. 

Não estava em seus planos atuar na imprensa, ainda mais de forma independente. Professor de língua portuguesa, ele começou a lidar com a comunicação ao trabalhar como locutor do time de futebol de seu coração, o Sporting Clube, no início dos anos 2000.

Com os vídeos e as postagens de Tavares, a série de protestos conhecida como “revolta dos agricultores europeus” ganhou destaque e acabou por mobilizar profissionais de alguns países

Em 2004, deixou sua terra natal para ser professor universitário em Timor-Leste, ex-colônia portuguesa no Sudeste Asiático. Na pequena nação insular com 1,3 milhão de habitantes, Tavares viu o jornalismo o escolher. Durante seis anos no Timor-Leste, passou a ser correspondente internacional da RTP, maior rede de televisão de Portugal. Ainda na Ásia, colaborou com emissoras de rádio e jornais, além de um semanário timorense.

LOCALIZAÇÃO DO TIMOR-LESTE

O professor que se tornou jornalista no exterior voltou a Portugal em 2010. Depois de anos colaborando com a imprensa tradicional, ele percebeu a falta de empenho desses veículos em questionar e buscar respostas. Viu que era a hora de empreender na comunicação independente.

Por meio de seus perfis nas plataformas digitais, Tavares questionou se o festival de lockdowns e vacinações obrigatórias eram efetivos no combate à covid-19. Passou, conforme relata, a ser alvo da militância e de governantes que ele chama de representantes da “esquerda globalista”. Nos últimos anos, a Meta derrubou três dos seus perfis no Instagram. Canais no YouTube foram tirados do ar.

“O pior é que apenas dão strike, derrubam as páginas, e não explicam a razão”, disse. “No máximo, disponibilizam a mensagem de que violei as diretrizes da comunidade, mas não explicam que raios são as diretrizes que foram violadas.” Para conseguir se comunicar livremente, passou a investir em outras plataformas. “Por isso, dedico cada vez mais tempo ao Rumble e ao Telegram.”

Atualmente, ele conta com 361 mil seguidores no Instagram. No canal no YouTube criado em julho de 2022, soma mais de 270 mil inscritos. Seu perfil no Twitter/X foi reativado logo depois de o bilionário norte-americano Elon Musk comprar a plataforma, e o número de seguidores beira os 140 mil.

Sérgio Tavares, jornalista português | Foto: Anderson Scardoelli/Revista Oeste
A voz de quem não tinha voz

“Essa dita ‘agenda verde’ não leva em consideração o mundo real.”

Com os vídeos e as postagens de Tavares, a série de protestos conhecida como “revolta dos agricultores europeus” ganhou destaque e acabou por mobilizar profissionais de alguns países. Dessa forma, manifestações ganharam as ruas de nações como França, Espanha, Bélgica, Itália, Polônia e Alemanha. Em comum, a insatisfação com o nível de impostos a serem pagos e com a “agenda verde” que a alta cúpula da União Europeia tenta impor.

“São medidas que podem encarecer os produtos alimentícios e inviabilizar a produção em determinados pontos”, observa Tavares. “Essa dita ‘agenda verde’ não leva em consideração o mundo real. É um grupo de representantes da esquerda globalista querendo definir o que deve ser feito pelos agricultores, que passaram a lutar pelos seus direitos.”

O jornalista acredita que essa revolta pode se espalhar para outros setores da sociedade. Cita trabalhadores europeus que desejam que suas vidas deixem de ser ditadas pelo Parlamento da União Europeia, em Bruxelas. “As pessoas não se sentem representadas por esses burocratas”, diz. Tavares avalia que o movimento que surgiu com os produtores rurais pode estimular outros países a seguirem o exemplo do Reino Unido e abandonarem o bloco econômico. “Na França, começo a ver cartazes de ‘Frexit’.”

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Longe do cidadão comum

O jornalista reforça, no entanto, o entendimento de que a “esquerda globalista” não se dará por vencida nos países que compõem a União Europeia. É o que ele acredita que vai ocorrer em Portugal, onde as eleições legislativas serão realizadas em 10 de março. Ele teme pela manutenção do Partido Socialista (PS) à frente do Parlamento local. A legenda de esquerda está no poder desde 2019 e viu o então primeiro-ministro António Costa renunciar em novembro do ano passado, ao se tornar protagonista de denúncias de corrupção.

“O PS vai conseguir se manter como governo, mesmo contra a vontade do povo”, diz Tavares. “No voto, não tenho dúvidas de que eles vão perder, mas vão chegar a algum acordo com quem quer que seja para formar uma coalizão. É assim que a ‘esquerda globalista’ age: nos bastidores, longe do cidadão comum.”

Tavares diz que nem tudo está perdido para os defensores das liberdades individuais, do Estado mínimo e do liberalismo econômico. E isso vale tanto para Portugal quanto para outros lugares do mundo. Apesar de acreditar que os socialistas seguirão com o comando do Parlamento português, ele vê potencial de crescimento do partido conservador local, o Chega. Segundo suas projeções, o Chega poderá saltar dos 12 atuais para mais de 50 deputados.

Nos Estados Unidos, o jornalista afirma que os eleitores deverão fazer com que Donald Trump, do Partido Republicano, reassuma o controle da Casa Branca. Para o Brasil, a análise no momento é de que a próxima disputa presidencial terminará com vitória de quem tiver o apoio de Bolsonaro.

Mas, enquanto políticos mais alinhados ao pensamento conservador estão afastados do poder, Tavares avisa: vai seguir denunciando o que estiver errado, como a corrupção do Partido Socialista de Portugal e a tentativa da União Europeia de impor uma “agenda verde”.

Leia também “Djokovic: um campeão que não se curvou à militância”

8 comentários
  1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Muito boa reportagem, Anderson.
    E, o momento que o agente disse ter de cumprir ”ordens de Brasília”, só comprova o quanto mal foi transferir a capital para lá. Uma cidade com realidade paralela, o metro quadrado mais caro do país, onde os poderosos ditam as regras sem contato com o povo.

  2. Vanessa Días da Silva
    Vanessa Días da Silva

    O problema não são os globalistas, que são poucos, são os idiotizados, que são muitos. Estes , ao mesmo tempo pregam que querem acabar com a fome, mas odeiam os agricultores e apoiam a agenda verde que atrapalha a produção de comida.

  3. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Essa polícia federal já foi considerada a melhor polícia do mundo, hoje tá matando o mundo de vergonha, um bando de cobaia obedecendo a uma corja de bandidos ladrões comunistas terroristas genocidas

  4. DONIZETE LOURENCO
    DONIZETE LOURENCO

    Alguém tem dúvidas de que estamos em uma ditadura, e a pior delas. Ditadura do judiciário.

  5. Jackson B Silva
    Jackson B Silva

    Eis aí um genuíno herói de carne e osso!

  6. Joao Pita Canettieri
    Joao Pita Canettieri

    Desculpem os ??? São desenhos das Bandeiras. S O S

  7. Joao Pita Canettieri
    Joao Pita Canettieri

    Sérgio Tavares o Brasil ???????? agradece sua coragem. Portugal ???????? União Europeia ???????? USA ???????? o BRASIL ???????? pede SOCORRO. ????????????????????????????????????????????????

  8. MNJM
    MNJM

    A atuação vergonhosa da PF abriu p o mundo o regime ditatorial o qual vivemos.
    Democracia longe disso. Ditadura do Judiciário.

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